domingo, 30 de março de 2008

Mais coisas do Diabo

No jornal de sexta-feira 28 de Março [P2, pg. 7]: [título] "1936-2008 - Richard Widmark". [No texto] "Tinha 93 anos"...

O PÚBLICO fez grande caso da manchete errada em que previa que fulano ia perder (ou ganhar). Comparou-se com outros jornais de qualidade que fizeram a mesma coisa.

Isto, na minha opinião, é soberba, orgulho impróprio. Muito pior são os erros diários, como este referido em cima, que fazem duvidar da competência do jornalista que escreveu o artigo, ou dos técnicos que o prepararam para ser publicado, ou da redacção... ou de todos os que fazem o jornal.

O jornal Volkskrant, da Holanda, publica cada dia os erros que fez no dia anterior. Parece-me uma maneira mais efectiva de combater o desleixo, treinar os que trabalham para o jornal e criar confiança nos leitores.

Gerrit Jan van der Duim
Odiáxere, Lagos

NOTA DO PROVEDOR. Richard Widmark tinha de facto 93 anos: nasceu em 14 de Dezembro de 1914, não em 1936.

Novas coisas do Diabo

Não fora o mau serviço prestado aos leitores, o provedor só teria a agradecer ao responsável pelo fecho da edição do PÚBLICO de segunda-feira (24 de Março). É que a manchete desse dia, "Fisco multa noivos que não derem informações sobre casamanto", acentuava tudo o que aqui se dissera na véspera sobre gralhas, lapsos e erros crónicos do jornal (“O Diabo está nos detalhes”). Houve pelo menos um leitor, Francisco Crispim, que no próprio dia não deixou passar o assunto em claro: “Depois da crónica de ontem do provedor, nada melhor do que a manchete da edição impressa de hoje. Se dúvidas restassem quanto ao ‘manto’ (este sim...) de descuido e deixa-andar que cobre neste momento o PÚBLICO, elas dissiparam-se completamente. Ora, isto está a minar, de forma talvez irremediável, a credibilidade do jornal junto dos leitores. Não haverá nada a fazer?”

Porque entretanto ocorreram casos idênticos ao longo da semana, o provedor julga ser de interesse para o PÚBLICO e os seus leitores insistir no tema. Exemplo: um dos alertas lançados dizia respeito à constante falta de concordância verbal em frases contendo como sujeito o pronome relativo “que” (como em, correctamente, “Era este Catual um dos que estavam corruptos pela Maumetana gente”, de Os Lusíadas). Pois na edição da última sexta-feira lá vinha na pg. 7 do P2, como entrada ao obituário de Richard Widmark (o que implica responsabilidade pelo menos ao nível de editor): “Foi um dos mais significativos actores do pós-guerra americano. Um dos que melhor encarnou a ambiguidade do anti-herói”.

Falando ainda de concordâncias verbais, uma situação tem levado o leitor José Oliveira ao desespero (conforme já referido no blogue do provedor). Indignou-se primeiro quando, a 25 de Janeiro, na pg. 34, um jornalista da secção de Desporto escreveu que “a desconfiança em relação a Hicks e Gillett são, no entanto, recentes e não estiveram presentes”, em vez, naturalmente, "a desconfiança em relação a Hicks e Gillett é, no entanto, recente e não esteve presente”. E quando o mesmo jornalista voltou ao mesmo erro na pg. 29 da edição de 22 de Março (“o prémio monetário que as vitórias representavam eram um estímulo importante, já que garantiam o pagamento dos salários") o leitor foi ao rubro: “Basta! Estou farto! Quando será que os revisores acordam e corrigem devidamente estes erros infantis de jornalistas ignorantes?” Que terá ele dito então, assim como muitos outros leitores, ao ler na 1ª página de anteontem (28 de Março): “A operação Ataque dos Cavaleiros causaram em três dias quase 200 mortos”? A questão aqui é só uma: onde têm os jornalistas a cabeça quando redigem estas coisas?

Há oito dias falava-se em repetição de notícias na mesma edição. Temos agora um caso de notícia repetida em diferentes edições: no “Pessoas” do P2 de 21 de Março (pg. 16), o destaque era "R.E.M. - Michael Stipe sai do armário" e na mesma secção dois dias depois (23 de Março, pg. 14) o destaque tinha por título "Michael Stipe - Vocalista dos REM revela que é gay", sempre com uma grande foto do protagonista (no mesmo concerto). Ainda por cima, a informação não era nova: fora revelada pela revista Time há sete anos, como o próprio PÚBLICO reconhecia logo a 21. A inexplicável redundância não escapou à observação de alguns leitores do PÚBLICO, conforme consta do blogue do provedor.

Igualmente indesculpável é escrever-se, como na pg. 7 da edição de quinta-feira, “tive um ano e tal sem ver o meu filho” em vez de “estive um ano e tal sem ver o meu filho”. Nada justifica a importação para a escrita desta corruptela da língua falada (se o jornalista quisesse transmitir a coloquialidade da expressão, o que não parecia ser o caso, deveria colocar apóstrofo no lugar da sílaba elidida).

E, já que falámos em obituários, veja-se o que apareceu na edição de 22 de Março a propósito da morte do militar e político Carlos Galvão de Melo: “Católico e patriota ferveroso, o general não deixou contudo de acompanhar a política nacional, criticando a sua mediocridade”. Redigindo deste modo, o jornalista assume como opinião sua que a política nacional é medíocre. Se o pensa, não o deve escrever, à luz do Livro de Estilo do PÚBLICO, pois trata-se de matéria opinativa introduzida em matéria noticiosa. Se não o pensa (como julga o provedor ser o caso), deveria ter colocado a palavra “mediocridade” entre aspas (se de facto o visado a usou nesse contexto).

Outra questão diabólica: factos históricos e nomes. Mantenhamo-nos ainda nos obituários: no artigo “Vida e morte da ‘duquesa vermelha’”, sobre a aristocrata espanhola Luísa Isabel Álvarez de Toledo, na pg. 10 do P2 desta quinta-feira (27 de Março), escreve o correspondente do PÚBLICO em Madrid, Nuno Ribeiro: “Como neta de Antonio Maura, ministro da República espanhola, era republicana”. É verdade que Maura, chefe do governo espanhol por cinco vezes (1903-04, 1907-09, 1918, 1919 e 1921-22), foi um destacado estadista do país vizinho, mas em qualquer dessas ocasiões esteve sempre no trono o rei Afonso XIII, que o indigitou. Maura morreu aliás em 1925, seis anos antes de ser instaurada a II República espanhola (e era um jovem estudante de Direito ao tempo da efémera I República, tendo iniciado a carreira política oito anos depois).

O leitor Marco Bertolaso, citado na anterior crónica do provedor por criticar a informação errada de que Angela Merkel foi o primeiro estadista a discursar em alemão no Knesset, voltou esta semana a reclamar sobre o tratamento de temas germânicos no PÚBLICO, a propósito da notícia "Empresas alemãs querem reforço da opção nuclear", na pg. 15 da edição de terça-feira (25 de Março): “Encontrei no artigo uma referência ao jornal ‘Deutsche am Welle’. Qualquer pessoa com conhecimentos básicos da língua alemã sabe que ‘Deutsche am Welle’ gramaticalmente não faz sentido nenhum. Mais importante: a Deutsche Welle não é um jornal, mas a Rádio e Televisão Internacional da República Federal. Esta instituição é bastante conhecida no mundo inteiro – com a excepção da redacção do PÚBLICO, parece”. Realmente...

Noutro capítulo, as ambiguidades da língua portuguesa tornam-se autênticas rasteiras para o jornalismo, onde a clareza deve estar acima de tudo. Foi dessa forma que o leitor P. B. Teixeira viu a manchete da edição de quarta-feira (26 de Março): “Bolsas recuperam mas a economia cai abaixo do previsto nos EUA”. “’Cai abaixo do previsto’ quer dizer cai ‘mais’ do que o previsto ou cai ‘menos’ (em valores absolutos)?” – interroga o leitor. “Genericamente, poderíamos dizer que ambas as interpretações são possíveis, embora a segunda me pareça mais natural, porque ‘queda’ já dá ideia de um valor negativo. Lendo o artigo percebe-se que é a primeira interpretação a que se pretende transmitir. Este excesso de polissemia da língua portuguesa é uma enorme qualidade na literatura, mas um defeito horrível em termos científicos (e jurídicos e etc…). Penso que é preciso ter um especial cuidado nestes casos, sobretudo porque uma alternativa clara está ali mesmo ao lado: ‘Economia cai mais do que o previsto nos EUA’. Nem sequer há a justificação da falta de espaço. Que nunca justifica um mau título”.

Ambígua é também como se classifica a expressão “duas mulheres envolvidas no caso, ambas portuguesas e conhecedoras de muitos empresários portugueses e espanhóis”, contida na notícia de terça-feira (pg. 4) sobre a libertação de um espanhol mantido sob sequestro em Monte Gordo. Será que o jornalista não poderia explicar que tipo de actividade leva mulheres a serem “conhecedoras de muitos empresários portugueses e espanhóis”?

Por fim, outra ambiguidade, muito mais sensível. A 1ª página da edição de sexta-feira era dominada pela fotografia de uma mulher numa sala de aulas sobre o seguinte título (acompanhado da respectiva notícia): “Docente do Porto fez queixa judicial contra toda a turma”. Deduzia-se que aquela era a professora levada à fama (apesar de anónima) pelo infausto episódio da disputa à volta do telemóvel de uma aluna da Escola Carolina Michaëlis, o que seria um importante exclusivo do PÚBLICO. Afinal, abrindo a pg. 10, descobria-se que a personagem da foto era um dos protagonistas da reportagem “Professores – Desencanto multiplica reformas antecipadas”, título que encimava a imagem de capa mas que, sendo despersonalizado (ao contrário da notícia sobre a professora do Porto), o leitor não ligava à pessoa. Quem olhou para a 1ª página sem ler o interior do jornal ficou a pensar ter por fim conhecido o rosto da professora da luta do telemóvel – e este arranjo enganador (que se poderia desfazer com uma simples legenda) não faz parte dos padrões de comportamento do PÚBLICO, cujo estatuto editorial rejeita “o sensacionalismo e a exploração mercantil da matéria informativa”. O provedor acredita não ter havido intenção malévola na maquetagem, mas não pode deixar de chamar a atenção para os perigos decorrentes deste tipo de descuidos, para mais sobre um tema que suscita tanta controvérsia na sociedade portuguesa.

A recomendação do provedor sobre estas matérias já foi feita há uma semana. Seria chover no molhado.

Publicada em 30 de Março de 2008

sexta-feira, 28 de março de 2008

Há cinema em Santa Maria!

O Cinecartaz do PUBLICO.PT já tem, na sua grelha de cinemas, o Cine Atlântida na ilha de Santa Maria. No entanto, dá-nos a informação de que não há filmes em exibição neste cinema. Como habitante desta ilha e assíduo frequentador deste cinema, posso informar que há sessões todas as semanas e que é possível saber, com bastante antecedência, quais os filmes que vão ser exibidos. Basta contactar o Cine Atlântida (que pertence ao Clube ANA) ou a Câmara Municipal de Vila do Porto. Os senhores jornalistas que façam o trabalho de pesquisa que lhes compete.

Leitor anónimo

Mais ou menos?

O título de capa de hoje [26 de Março] é enganador/ambíguo: “Bolsas recuperam mas a economia cai abaixo do previsto nos EUA”. “Cai abaixo do previsto” quer dizer cai “mais” do que o previsto ou cai “menos” (em valores absolutos)? Genericamente, poderíamos dizer que ambas as interpretações são possíveis, embora a segunda me pareça mais natural, porque “queda” já dá ideia de um valor negativo. Lendo o artigo percebe-se que é a primeira interpretação a que se pretende transmitir.

Este excesso de polissemia da língua portuguesa é uma enorme qualidade na literatura, mas um defeito horrível em termos científicos (e jurídicos e etc…). Penso que é preciso ter um especial cuidado nestes casos, sobretudo porque uma alternativa clara está ali mesmo ao lado: “Economia cai mais do que o previsto nos EUA”. Nem sequer há a justificação da falta de espaço. Que nunca justifica um mau título.

P. B. Teixeira

quarta-feira, 26 de março de 2008

Ainda a propósito da Alemanha

Não sou uma pessoa que passa a vida a escrever para os jornais, mas permita que envie mais uma mensagem para sublinhar o meu argumento. Escrevi que o lapso no artigo sobre a senhora Merkel era só um exemplo para as dificuldades que o PÚBLICO tem em seguir correctamente a política e a cultura da Alemanha. Ontem [edição de 25 de Março, pg. 15] encontrei no artigo "Empresas alemãs querem reforço da opção nuclear" uma referência ao jornal "Deutsche am Welle". Qualquer pessoa com conhecimentos básicos da língua alemã sabe que "Deutsche am Welle" gramaticalmente não faz sentido nenhum. Mais importante: a Deutsche Welle não é um jornal, mas a Rádio e Televisão Internacional da República Federal. Esta instituição é bastante conhecida no mundo inteiro - com a excepção da redacção do PÚBLICO, parece. Um outro exemplo é uma negligência dificilmente compreensível: no artigo em questão, o jornalista escreve o nome do senhor Kohler (que não é o presidente da agência DENA, mas sim o seu o director-executivo) primeiro correctamente e depois "Koller".

Tenho a forte impressão de que seria uma boa ideia para o PÚBLICO aprofundar os seus conhecimentos sobre a Alemanha, que é um parceiro importante para Portugal.

Marco Bertolaso

terça-feira, 25 de março de 2008

Notícia velha

O jornalista que escreveu uma notícia no P2 do dia 23 de Março [pg. 14] sobre o vocalista dos ["Michael Stipe - Vocalista dos REM revela que é gay"] REM não sabe do que fala. Não é verdade que Michael Stipe tenha revelado agora que é homossexual. Essa revelação foi feita há sete anos numa entrevista à revista Time. Há sete anos! Como é que o PÚBLICO dá à estampa um erro grosseiro destes? A própria revista Spin, citada na notícia, desmente que se trate de uma revelação aqui. Bastava ter usado o Google: aqui (Time) e aqui (BBC).

L.B.

ACTUALIZAÇÃO DO PROVEDOR. O leitor e assinante Augusto Küttner de Magalhães chama pertinentemente a atenção para o facto de a mesma notícia ter sido publicada na mesma secção do P2 ("Pessoas") dois dias antes (21 de Março) com o título "R.E.M. - Michael Stipe sai do armário", tendo, nos dois casos, sido sempre o destaque da página. Na verdade, nem Stipe saiu agora "do armário" nem revelou ser gay (o que já antes acontecera). A primeira notícia reconhece aliás que a revelação fora feita na Time há sete anos, o que torna ainda mais incompreensível os títulos e, sobretudo, a repetição da notícia (ver, a propósito deste tipo de lapsos, a última crónica do provedor).

Um caso de reincidência

Detectei uma incorrecção grave na redacção de uma notícia do PÚBLICO de 25 de Janeiro. Na secção de desporto, pg. 34, no artigo intitulado "Adeptos querem ver os donos do Liverpool na rua, mas Hicks e Gillett não aceitam" (título longo de mais talvez, não?), escreve Jorge Miguel Matias, no 7º parágrafo, o seguinte: "A desconfiança em relação a Hicks e Gillett são, no entanto, recentes e não estiveram presentes quando (...)".

Basta! Quando será que os jornalistas aprendem que uma frase quando se inicia no singular termina no singular? Basta de começar no singular e terminar no plural ou vice versa! Basta! A redacção correcta seria: "A desconfiança em relação a Hicks e Gillett é recente. E a formulação correcta da restante frase deveria ser: (...) Ambos não estiveram presentes quando (...) etc"

Que notícia tão mal redigida, meu Deus! Só porque se rouba espaço ao texto para encaixar à força uma foto (tendência que se agravou de forma exponencial após a remodelação do jornal, com consequências nefastas na qualidade da elaboração das notícias), quer-se encafuar de modo forçado o que deveria caber em duas frases apenas numa. Ora, o resultado só podia ser catastrófico. E este flagelo gramatical não é exclusivo da imprensa escrita: nos media audiovisuais (TV, rádio), o problema é idêntico. Escreve-se muito mal (cada vez pior) nos media em geral, e na imprensa em particular.

Falo com a autoridade que me é concedida por ser leitor do PÚBLICO desde o nº 1 e de há muitos anos ler jornais (o Expresso desde o nº 1, o Diário de Lisboa, o República, etc.). Sei por isso avaliar estes erros e turbulências, e, no caso concreto do PÚBLICO, tenho o privilégio de o ler de ponta a ponta todos os dias, por estar desempregado e ter uma actividade 'liberal' (sou músico). Por isso, raramente me escapam estes atentados à nossa pobre língua.

José Oliveira

Exaustão! Exaustão! Exaustão! Não há outra palavra para designar a minha reacção quando deparo com este erro, que aliás não é exclusivo da imprensa escrita (ainda ontem ouvi num telejornal esta formulação errada). Mas basta! Basta! Estou farto! Quando será que os revisores acordam e corrigem devidamente estes erros infantis de jornalistas ignorantes? Resta acrescentar que, ao contrário do que sucedia com o provedor anterior, Rui Araújo, o actual provedor não tem publicado as cartas dos leitores (que seguramente receberá em quantidade abundante). Resulta daqui uma maior falta de ligação entre os leitores e o seu jornal. Não basta gastar páginas inteiras a discutir questões éticas e deontológicas. Convém dar voz aos leitores, pois sem eles o jornal não tinha razão de ser. Talvez com esta minha chamada de atenção o novo provedor acorde para esta situação, ou então é uma sua teimosia...

Mas vamos aos factos: acabei de ler no PÚBLICO de hoje (22 de Março), página 29, no artigo de Jorge Miguel Matias com o título "Ontem, quem levou a taça foi Carvalhal. Bento quer levá-la hoje", 5º parágrafo, 6ª linha, o seguinte: "(...) E reconheceu que, nos primeiros jogos, o prémio monetário que as vitórias representavam eram um estímulo importante, já que garantiam o pagamento dos salários."

Desculpe? Importa-se de repetir? Terei lido bem? O PRÉMIO ERAM? O PRÉMIO GARANTIAM? Jorge Miguel Matias é reincidente nestes erros, eu sei porque já o criticava no tempo do anterior provedor, mas a verdade é que não há maneira de J.M.M. aprender a escrever e formular correctamente as frases, ou então quem deveria rever o que ele escreve (os copy-desks) não desempenha a sua missão com o rigor mínimo exigível.

Mas desde quando, meu Deus, é que uma frase iniciada no singular tem o seu correspondente no plural? Se se escreve "o prémio" (singular), o que se deveria escrever a seguir seria "ERA" e não "ERAM", como é mais que óbvio. Menos, claro, para a pequena cabecinha de J.M.M., que insiste em escrever mal e dar estes erros sistematicamente.

Por isso basta!, basta! Se eu gasto (com sacrifício, pois estou desempregado) o meu dinheiro a comprar um jornal que se diz "de referência", tenho o direito de exigir que quem nele escreve o faça correctamente e com rigor. Infelizmente, não é isso que acontece em muitos casos.

Um dia serão casos a mais, e nessa altura o PÚBLICO perderá um leitor e este mundo ganhará mais uma criatura desencantada!

José Oliveira

segunda-feira, 24 de março de 2008

Mais do mesmo

Depois da crónica de ontem do provedor, nada melhor do que a manchete da edição impressa de hoje ["Fisco multa noivos que não derem informações sobre casamanto"]. Se dúvidas restassem quanto ao "manto" (este sim...) de descuido e deixa-andar que cobre neste momento o PÚBLICO, elas dissiparam-se completamente. Ora, isto está a minar, de forma talvez irremediável, a credibilidade do jornal junto dos leitores. Não haverá nada a fazer?
O leitor de sempre,
Francisco Crispim

domingo, 23 de março de 2008

O Diabo está nos detalhes

Não existe rosa sem espinhos nem jornal sem gralhas. Nem valerá a pena dramatizar a ocorrência de um ou outro desses acidentes (alguns identificados no blogue do provedor): prestar demasiada atenção à gralha ocasional é olhar para a árvore e não ver a floresta. O problema é que quando as gralhas abundam, e se repetem podendo ser evitadas, tornam-se elas próprias numa floresta. Uma floresta de enganos, que revela afinal desleixo na produção de um periódico.

O PÚBLICO apostou de início num sector de revisão atento e exigente, mas a secção tem vindo a ser reduzida por razões de contenção de custos. A tal ponto que nem todos os textos são revistos, o mesmo sucedendo com a paginação e o conteúdo global de cada edição. Vejamos alguns casos recentes.

A 6 de Janeiro, o PÚBLICO abria assim uma notícia na pg. 12: “Um dos feridos no incêndio ocorrido no último dia do ano num lar de idosos em Serpa morreu sexta-feira, elevando para quatro o número de vítimas mortais do sinistro”. Mas na pg. 22 da mesma edição, encimando outra notícia aliás mais destacada, o leitor deparava com este título: “Subiu para cinco o número de mortos no incêndio ocorrido no lar de idosos de Serpa”. Não só o mesmo evento foi noticiado em dois locais diferentes da mesma edição como a informação divergia num e noutro. Felizmente para os sobreviventes da tragédia, não houve, nas páginas subsequentes, novas notícias alargando ainda mais o número de vítimas mortais.

O título principal da pg. 6 da edição de 10 de Março era assim escrito, em discordância verbal: “Atrasos no hospital de Aveiro leva Estarreja a retomar protesto contra fecho de urgência”. E cinco dias mais tarde lia-se este outro na pg. 20: “Brasil extradita para traficante para os EUA”. O leitor Augusto Küttner de Magalhães, que protestou ao provedor pela preposição a mais, comentava: “Não se trata de detalhes e muito menos de andar à procura do erro, mas ‘má vista’ este género de titulos..., algo recorrente no PÚBLICO!” Não será difícil, com efeito, encontrar outros títulos gralhados na leitura recente do jornal.

Palavras como “concluio” em vez de “conluio” (11 de Março, pg. 6), apesar de erro frequente de escrita (vá-se lá saber porquê), também não são desculpáveis no PÚBLICO.

Mudando de tema: a notícia “Lei eleitoral autárquica vai a votos”, inserida a 20 de Março (quinta-feira última) na pg. 13, terminava assim: “Um mês depois, o PSD, já liderado por Luís Filipe Menezes, questionou o”. Para o leitor, nada será mais irritante do que chegar ao fim de um texto e descobri-lo irremediavelmente cortado a meio de uma frase, que parte da notícia (pequena ou grande, não sabe) se perdeu algures no circuito informático e nunca chegou a encontrar o papel. Não seria grave ocorrido uma vez. Mas não é preciso recuar muito para encontrarmos idênticas situações nas páginas do PÚBLICO, não se percebendo por que razão os responsáveis, logo após o primeiro caso, ainda não tomaram medidas para evitar a sua repetição.

Por vezes, os erros são toponímicos, como o referido pelo assinante José António Ribeiro da Cunha: “Não é primeira vez que detecto lapsos idênticos ao que vou referir. No PÚBLICO de hoje [16 de Março, há oito dias], na 1.ª página, sob a fotografia do comício do PS no Porto, diz-se que o mesmo teve lugar no ‘pavilhão do Atlético do Porto’. Na pg. 3, há uma fotografia aérea da área, onde se assinala o ‘Pavilhão do Atlético do Porto’. Que eu saiba, no Porto não há nenhum clube com tal nome. Dir-se-á que é um pormenor sem grande importância, mas não poderei concordar, por três ordens de razões: 1 - há um clube, antigo, de grandes tradições, denominado ‘Académico’, onde decorreu o comício; 2 - o Porto não é, exactamente, uma vila perdida no interior do país, pelo que considero um desrespeito esta falta de rigor; 3 - seria de esperar que o PÚBLICO não incorresse em tal lapso (...). Maior rigor, por favor.” O erro (ausente do texto da notícia) não foi corrigido posteriormente.

Outras vezes, a falha é de natureza histórica. No blogue do provedor, foi já publicada a denúncia de Paulo Almeida sobre a notícia "Ala do Museu do Prado reabre com Giordano" (P2, 22 de Fevereiro, pg. 14), que fala da “Ordem del Tóison, uma ordem de cavalaria criada para celebrar o casamento de Felipe II de Espanha com a portuguesa Isabel de Avis." Vale porém a pena retomar a reacção do leitor: “Ninguém sabe no PÚBLICO que a Ordem del Tóison é a Ordem do Tosão de Ouro? E que não foi fundada por Filipe II, mas sim por Filipe, o Bom, Duque de Borgonha e Conde de Flandres, para celebrar o seu casamento com Isabel de Portugal (filha de D. João I, Mestre de Avis)?”

A autora do texto admitiu o erro e pediu desculpas aos leitores. Mas deve dizer-se que hoje em dia, com ligação permanente à internet, os jornalistas possuem à distância de um clique a confirmação de dados factuais, eventos históricos, datas, números e grafia de nomes, pelo que não há explicação para a persistência de certos destes erros na imprensa. Na passada terça-feira (18 de Março), o PÚBLICO anunciava na pg. 16 que “a língua alemã será ouvida hoje, pela primeira vez, no Parlamento de Israel, quando a chanceler Angela Merkel fizer um discurso que muitos descrevem como histórico”, quando, afinal, os presidentes alemães Johannes Rau e Horst Köhler já o haviam feito (o jornal fez a correcção no dia seguinte, após alertado pelo provedor com base numa queixa do leitor Marco Bertolaso).

Outra dificuldade jornalística (quiçá relacionada com as médias dos estudantes portugueses a matemática, mas nem por isso justificável) consiste em lidar com números. Ainda na primeira pg. do PÚBLICO de terça-feira, escreveu-se: “Os confrontos provocaram uma centena de feridos, entre os quais pelo menos 20 soldados franceses da Kfor, 63 polícias da UNMIK e 80 manifestantes”. Como diria António Guterres, basta fazer as contas. O blogue do provedor menciona casos ilustrativos, de errada conversão de euros para escudos ou de deficiente leitura de um orçamento de Estado com enganos da ordem dos mil milhões, assim como de confusão entre valores relativos e valores absolutos. Curiosamente, alguns desses erros são praticados por jornalistas da secção de Economia...

Ainda outro tema, decerto uma frustração para os leitores adeptos de jogos e desafios, conforme queixa recente de Jorge Rino: “Na edição de hoje (17 de Março), as grelhas das palavras cruzadas (P2, pg. 19) estão trocadas, e o mesmo aconteceu na edição de domingo. Se uma falha pode acontecer em qualquer jornal, nem numa ‘folha de couve das berças’ um erro é repetido em duas edições sucessivas”.

E agora, um desafio aos leitores: qual a formulação correcta do início da estrofe 81 do canto VIII de Os Lusíadas – “Era este Catual um dos que estavam corruptos pela Maumetana gente” ou “Era este Catual um dos que estava corrupto pela Maumetana gente”?

O provedor aposta dobrado contra singelo em como a maior parte dos jornalistas escreveria do segundo modo. Analisando porém os versos, vemos que, das duas orações existentes, o sujeito da primeira é o Catual e o da segunda o pronome relativo “que”, referido ao antecedente artigo definido “os” (contraído aqui com a preposição “de”). O que vincula o predicado da segunda oração à terceira pessoa do plural: “Era este Catual um dos que estavam corruptos pela Maumetana gente”.

Sucede, na verdade, que se tem vindo a criar um terrível hábito, na língua portuguesa escrita e falada, de singularizar o sujeito da segunda oração em construções frásicas deste tipo. É uma praga espalhada tanto por jornalistas da imprensa, rádio e TV como por intervenientes e protagonistas noticiosos, desde figuras públicas a anónimos.

Vejamos o resultado de uma leitura superficial das mais recentes edições do PÚBLICO, onde o vírus também foi inoculado: “Francisco José Viegas (...) é um dos autores portugueses que mais vende na ASA” (19/03, pg. 13); “É daqueles que nos faz perguntar (...)” (05/03, P2, pg. 34); “Brian achava que o seu amigo era um metrossexual, daqueles que gosta de roupas e cremes” (11/02, P2, pág 12); “Uma das actividades que tem estado no centro destas transformações (...)” (P2, 20/01, pg. 5); “Fassbinder, um dos realizadores que ‘leu’ Sirk e o ‘recuperou’ para as gerações que vieram depois” (Ípsilon, 18/01, pg. 54); “Mike Nichols, um dos raros cineastas americanos que (ainda) sabe como fazer comédia” (idem, pg. 55); “McCain é um dos que mais longe tem levado a dissidência” (13/1, P2, pg. 9); “Foi um dos naturalistas que mais contribuiu para o conhecimento dos territórios ultramarinos portugueses” (entrada de artigo, 08/01, P2, pg. 6); “O Porto foi um dos que registou diminuições mais acentuadas” (26/12, pg. 6); “Já atira um daqueles olhares que põe em sentido qualquer forasteiro” (08/12, pg. 24); “Um dos investigadores que esteve em contacto com este espólio” (06/12, P2, pg. 4). Nem mesmo os cronistas escapam à epidemia: “Dos autores que li no curso de História, Joel Serrão foi dos que mais me impressionou” (Eduardo Cintra Torres, 15/03, P2, pg. 14); “Paul Feyerabend, talvez um dos filósofos do século XX que mais foi acusado de relativismo” (Rui Tavares, 20/01, pg. 36); “Um dos traços que se acentuou nesta década triste foi a infantilização cada vez maior do mundo dos adultos” (destaque do texto de José Pacheco Pereira de 05/01, pg. 37, sendo contudo a frase correctamente escrita - “Um dos traços que se acentuaram” - no corpo da crónica); “Nem eles, nem qualquer das luminárias que geriu a coisa entre 1999 e 2007” (Vasco Pulido Valente, 23/12, pg. 40). O director, José Manuel Fernandes, escrevia na passada quinta-feira (pg. 8): “Um dos ícones da esquerda norte-americana que apoiou a guerra do Iraque”.

Recomendação do provedor. Um jornal que aspira ser o principal diário de referência nacional, e que em editoriais sucessivos reclama para Portugal a aplicação dos mais elevados padrões de exigência, deve combater a displicência sujeitando toda a matéria a publicar a rigoroso processo de copy-desk e revisão.

Publicada em 23 de Março de 2008

quinta-feira, 20 de março de 2008

O fim do "Digital"

Venho manifestar o meu desagrado pelo facto de terem decidido acabar com o suplemento "Digital". Eu era uma das pessoas que compravam o PÚBLICO ao sábado devido a este suplemento, uma vez que tinha grande qualidade. Tenho pena que decidam acabar com uma área com cada vez maior importância na nossa sociedade - as tecnologias de informação. Espero que consigam reforçar esta área no vosso site para compensar a perda.
Pedro Sebastião

É na minha opinião uma decisão deplorável encerrar o suplemento "Digital". O PÚBLICO acha que não tem espaço para falar de novas tecnologias? De internet? Ou será que o "Digital" estava a transformar-se num veículo demasiado incómodo (lembro-me de artigos recentes denunciando más práticas da Optimus e da Clix - será o fim coincidência?) Ou será que o PÚBLICO pretende continuar a extinguir o melhor que tem para enveredar apenas pelo fácil, pelo fútil e pelo comercialóide?
A. Matos

NOTA DO PROVEDOR. O provedor não possui qualquer elemento que permita fazer uma ligação entre conteúdos do referido suplemento relativos a empresas do grupo proprietário do PÚBLICO e o seu fim.

Irradiar é expulsar?

Na edição do PÚBLICO de 8 de Março, na pg. 35, lê-se [em título] que "Blatter defende irradiação...". Irradiação - s. f. acção de irradiar; difusão de raios luminosos; propagação; expansão. Será que se pretendeu escrever "erradicar"? (do lat. eradicare, v. tr., desarraigar; arrancar pela raiz; fig., suprimir totalmente uma doença endémica).
A.T.

NOTA DO PROVEDOR. Tem o leitor razão. Mas o recurso ao termo "irradiar" no sentido de "expulsar" está tão difundido que esta será talvez uma causa perdida da língua portuguesa. Em todo o caso, enquanto a palavra não estiver consagrada com esse significado nos dicionários, os jornalistas do PÚBLICO deviam abster-se de a utilizar em tal sentido.

Grifos de borla

O meu irmão é fã dos vossos grifos, mas recebeu uma conta astronómica de consumos de internet que não consigo explicar de outra forma. Poderia, por favor, informar-me (ou encaminhar-me para o sitio certo) de qual o tráfego associado à visualização da vulture cam?
Nuxa

ESCLARECIMENTO DO EDITOR DO PUBLICO.PT:
A câmara dos grifos está na internet, na rede da FCCN, é totalmente gratuita e não é um serviço de valor acrescentado, nem podia mesmo ser. A leitora tem de se dirigir ao seu ISP e perguntar o que se terá passado para ter uma conta de internet tão elevada.
António Granado

Uma morte tarde de mais

Ontem comprei o PÚBLICO porque na capa surgia em grande destaque a notícia da morte de Arthur C. Clarke, com direito a uma fotografia de grande dimensão. Ao procurar dentro do jornal a notícia correspondente nada encontrei. Pensei que tivesse procurado mal e tornei a folhear o jornal, até chegar à conclusão de que efectivamente nenhuma notícia existia.

Julgo que este tipo de notícia, ou seja, uma referência na capa sem notícia interior, deve ser de todo evitado porque pode, na prática, como sucedeu no meu caso, induzir a compra do jornal defraudando o leitor. Gostaria que comentasse esta situação até porque, tanto quanto me recorde, é a primeira vez que deparo com uma situação destas no PÚBLICO.

Paulo Santos

NOTA DO PROVEDOR. A notícia esgotava-se em si mesma, isto é, além da foto do falecido, continha as informações essenciais para a tornar completa, além de que não fazia remissão para o interior do jornal, ao contrário das outras chamadas sintéticas que costumam aparecer na primeira página do PÚBLICO. Não se pode por isso dizer que os leitores foram defraudados, pois não se prometeu mais do que se lhes deu. O que terá sucedido, de acordo com o momento em que a notícia surgiu de véspera nas televisões (que o provedor acompanhou), é que a informação chegou à redacção do jornal já a uma hora demasiado tardia, em cima do fecho da edição, sem possibilidade de se preparar um desenvolvimento nas páginas interiores, desenvolvimento esse - três páginas, além de chamada na primeira - que, justificadamente, foi dado ao acontecimento na edição seguinte.

Alemão no Knesset

Gostaria de chamar a atenção para mais um erro do PÚBLICO ao escrever sobre assuntos alemães. Na edição de ontem [18 de Março, pg. 16], encontra-se um artigo sobre a visita da chanceler Angela Merkel a Israel ("Merkel faz hoje um discurso histórico em alemão no Parlamento de Israel"). Lemos o seguinte: "A língua alemã será ouvida hoje, pela primeira vez, no Parlamento de Israel, quando a chanceler Angela Merkel fizer um discurso que muitos descrevem como histórico, no Knesset (Parlamento), em Jerusalém". Isso não é verdade. Já os Presidentes da República Johannes Rau e Horst Köhler foram convidados para um discurso em alemão no Knesset. Johannes Rau pronunciou o seu discurso no dia 16/02/2000, Horst Köhler no dia 02/02/2005. Tendo em conta a relação especial entre a Alemanha e Israel, isto não é apenas um pormenor.

A minha impressão é que o PÚBLICO ultimamente tem tido dificuldades em seguir a política e a cultura da Alemanha. Acho uma pena, porque a Alemanha tem um papel importante para Europa e também para Portugal, um país que tem aqui muitos amigos atentos.

Marco Bertolaso
Colónia, Alemanha

NOTA DO PROVEDOR. O PÚBLICO rectifica a informação na edição de hoje, após o provedor ter alertado a sua direcção com base nesta mensagem do leitor.

Critérios editoriais

Gostava de saber que critérios editoriais presidem à feitura dos destaques e dos títulos do PÚBLICO. No artigo assinado por Leonete Botelho, com Luciano Alvarez, intitulado «Mini-remodelação responde a contestação», da edição de 30 de Janeiro, destaca-se com fotografia uma opinião de Vital Moreira, quando se podia destacar a de um opositor às políticas de Correia de Campos, como Manuel Alegre. O catedrático de Coimbra mais não tem feito, desde que Sócrates tomou posse, do que apoiar cegamente todas as medidas governamentais. Alegre, do mesmo partido, sempre tem parecido mais isento para que dele se destaque opinião. Umas vezes bate, outras suporta (como no referendo). Ouvir a versão oficial ou oficiosa é razoável, dar-lhe destaque contra as outras parece um frete. A coisa agrava-se na página seguinte com o título, que quase parece um elogio, de um texto de Joana Ferreira da Costa, "Correia de Campos [é] o reformista mal-amado que não soube [coitadinho...]explicar as reformas".

Nuno Magalhães

RESPOSTA DO PROVEDOR:
O provedor acha não existir na questão matéria para se pronunciar, dado que as escolhas que o leitor refere são prerrogativas legítimas dos jornalistas que produzem este periódico, as quais, na avaliação global do jornal, não põem em causa a sua independência.

RÉPLICA DO LEITOR:
Se acha de facto que o mais importante facto político-governamental dos últimos tempos se compadece com um tratamento pobrezinho (mas legítimo) e quase oficioso num jornal de referência, então muito bem. Parece que estamos conversados (mas que saudades do Rui Araújo).

Nuno Magalhães

domingo, 16 de março de 2008

Palavra de assessor e palavra de jornalista

A notícia, saída no PÚBLICO da última quarta-feira (dia 12), tinha por título “Portugal é o terceiro país da União Europeia onde mais caiu o rendimento dos agricultores”, mas o que interessa para este caso não é o seu conteúdo mas o quarto parágrafo: “O PÚBLICO pediu uma reacção ao Ministério da Agricultura sobre esta situação, mas até ao fecho desta edição não obteve resposta”.

Mário Ribeiro (M.R.), assessor de imprensa do ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, enviou uma reclamação ao provedor sugerindo a existência de, no mínimo, má vontade da jornalista autora da notícia, Ana Fernandes (A.F.), em receber na véspera o esclarecimento do ministério. O assessor descreve os passos dados nesse dia desde que, às 17h03, recebeu de A.F. um e-mail a pedir uma reacção: “Solicitei aos serviços deste Ministério que me fornecessem dados para que pudesse elaborar uma resposta. (...) Às 18h46, A.F. envia um SMS a perguntar se podia contar com uma reacção ‘para hoje’ (dia 11). Às 18h47, respondo que ainda não tinha informação disponível para lhe enviar. Às 18h49, a jornalista informa que irá avisar quando já não puder esperar mais (...). Mas, às 19h43, A.F. informa que terminou o trabalho e que se houver uma resposta que lhe seja enviada na manhã seguinte (dia 12). A resposta deste gabinete ficou disponível por volta das 20h00, altura em que liguei para a redacção do PÚBLICO, mas sem sucesso, visto ninguém ter atendido”.

E comenta: “O PÚBLICO exigiu uma resposta deste Ministério em menos de três horas a uma questão (...) que exigia o cruzamento de dados e a elaboração de tabelas. Mais importante, a jornalista começou por dizer que avisaria com antecedência qual seria a sua hora limite (...), mas a verdade é que se limitou a dizer que já tinha terminado o seu trabalho. O resultado não podia ser mais tendencioso, ao dizer que "o PÚBLICO (..) até ao fecho desta edição não obteve resposta". O PÚBLICO fecha a sua edição às 19h43? Depois das 20h00 o telefone da jornalista não funciona?”

A queixa não fica por aqui, transformando-se em requisitório contra a jornalista: “Não é a primeira vez que A.F. tem este procedimento em relação ao Ministério da Agricultura. No passado dia 13 de Fevereiro, A.F. contactou este gabinete de imprensa a pedir uma posição do Ministério em relação ao aumento dos cereais. Informei-a que o ministro Jaime Silva estaria nessa manhã em Santo Estêvão, numa reunião com produtores de cereais, e que teria toda a disponibilidade de conversar no final da reunião. A jornalista ficou de aparecer em Santo Estêvão para entrevistar o ministro. Não apareceu. Num contacto posterior ficou combinado, pela segunda vez, um encontro do ministro com A.F. Desta vez para a Assembleia da República (A.R.). A jornalista não apareceu. O que apareceu foi uma notícia, no dia 14, onde A.F. afirmava que ‘o PÚBLICO tentou ouvir o ministro da Agricultura mas sem sucesso’. Ou seja, a jornalista faltou a dois encontros com o ministro Jaime Silva, mas na notícia dá a entender que foi o MADRP que não quis falar com o jornal”.

Para depreciar ainda mais a atitude de A.F., o assessor compara-a à de outro jornalista do PÚBLICO que, antes de publicar um texto sobre a mesma área, terá aguardado por resposta um dia além do estabelecido.

Solicitada a esclarecer o assunto, A.F. classifica a reclamação como “notável pela quantidade de mentiras”. Primeiro, no que respeita ao objecto da queixa: “M.R. tenta, sabendo que costumo sair por volta das 20h00, alegar que me ligou. Acontece que tenho o meu telefone fixo reencaminhado para o telemóvel, que ficou sempre ligado e que nunca tocou, como posso facilmente provar através do registo de chamadas. A resposta nunca veio, nem por mail, nem por telefone, nem por via nenhuma”.

Quanto à alegada combinação feita para entrevistar o ministro em Santo Estêvão sobre a outra notícia, A.F. responde: “Como o meu primeiro contacto com M.R. sobre o assunto foi feito à hora de almoço, como é que eu posso ter combinado lá ir de manhã? Isto é tanto mais mentira quanto ele me disse que o ministro já tinha falado à saída da reunião com a agência Lusa sobre o assunto e que eu poderia aproveitar essas declarações. Insisti, já que tinha perguntas muito específicas sobre a subida do preço do trigo. Ele respondeu-me que nessa altura não dava para falar com o ministro porque ele estava com pressa para chegar a Lisboa, uma vez que tinha de estar na A.R. nessa tarde. O que nos leva ao segundo facto falso”.

O qual é a marcação do encontro em S. Bento: “Disse a M.R. que tinha uma consulta nessa tarde (tenho papéis de exames que o provam), mas que lhe ligaria assim que saísse do consultório para ver se ainda estavam na A.R. e ir lá. Assim fiz, e ele não me atendeu. Liguei então para o outro assessor de imprensa do Ministério, que me disse que já tinham regressado. Pedi-lhe que desse o recado a M.R. para me ligar de volta, pois continuava interessada em falar com o ministro. (...) Esperei em vão. No final da tarde, como não havia resposta, voltei a ligar. O telemóvel de M.R. estava desligado”.

Quanto à razoabilidade do prazo para aguardar reacção a uma notícia, A.F. dá a resposta lógica e previsível: “M.R. sabe, tão bem quanto eu, que quando estamos a tratar de histórias próprias podemos esperar algum tempo pelas respostas, como aliás já aconteceu várias vezes entre mim e o Ministério. Mas, nos dois casos de que me acusa, estão em causa notícias do dia, que o PÚBLICO não poderia deixar de dar [na edição seguinte]”.

O provedor ouviu de novo M.R. sobre as “mentiras” de que a jornalista o acusa. Replica o assessor de Jaime Silva: “A jornalista diz que eu não lhe liguei. Quanto a este facto é a palavra de um contra a do outro. É verdade que não lhe enviei a resposta, porque não consegui falar com A.F., mas (...) pareceu-me que já não adiantava enviar uma resposta para uma notícia que a jornalista já me tinha dito que tinha terminado”. Igualmente quanto à notícia sobre o preço do trigo: “A.F. diz que só falou comigo à hora do almoço. Também aqui é a palavra de um contra o outro. (...) Acontece que este foi o segundo contacto no dia 13. E como A.F. não tinha comparecido combinámos a entrevista para a A.R. Também é verdade que A.F. me referiu uma consulta, mas nunca disse que isso era impeditivo de se deslocar à A.R. Estranho que diga que o meu telemóvel estava desligado, visto isso só acontecer quando me desloco em viagens de avião. (...) E, inclusive, respondo sempre às chamadas que não posso atender no momento”.

“É de facto a palavra de um contra o outro”, reconhece A.F., “mas acontece que o meu telemóvel, como o de todos, regista a entrada de chamadas, e não tenho registo dessa chamada, nem atendida nem por atender”. E insiste: “Volto a repetir: não houve chamada nenhuma, e não tenho razão para mentir, pois a reacção do Ministério era muito relevante para o artigo, pelo que era do meu total interesse obtê-la. Ele também não refere que no último SMS que lhe mandei a dizer que tinha terminado o texto, ao qual não respondeu, lhe dizia que continuava interessada numa reacção, mesmo que viesse no dia seguinte. Ele confirma que nunca me enviou nada, nem na altura, nem até hoje”.

Quanto a Santo Estêvão, a jornalista explica: “Só após contactar [por telefone] os produtores de cereais, no final da reunião [com o ministro nesse local], e perante acusações feitas, percebi que tinha de ouvir o Ministério. Como é que eu poderia necessitar da reacção do ministro antes de ter um motivo? Só nessa altura ligo para M. R., pelo que não percebo que outro telefonema de manhã cedo lhe fiz, se não tinha assunto para falar com ele. (...) M.R. confirma também que lhe falei na consulta. Por que razão? Só para lhe dar conhecimento da minha vida pessoal, ou porque ela poderia inviabilizar que eu fosse à A.R. em tempo útil? E por que não responde ele ao facto de eu lhe ter ligado ao sair da consulta, sem que ele tivesse atendido, e de eu ter deixado recado ao outro assessor de imprensa de que queria falar com ele, sem que ele nunca tivesse voltado a ligar? Quanto ao telefone desligado, mais uma vez asseguro que é verdade – posso pedir o registo da chamada”.

A.F. trabalha há longo tempo em matérias relacionadas com a agricultura, tendo tido por isso muitos contactos com o respectivo ministério. Poderá haver neste conflito antecedentes que o provedor desconhece e inquinem a queixa apresentada. No que respeita às razões de ambas as partes, as explicações de M.R. apresentam inconsistências que prejudicam a sua argumentação, como, em relação ao caso cronologicamente anterior, a suposta combinação de um encontro com o ministro quando a jornalista ainda não o havia solicitado ou, mais tarde, a falta de seguimento a um pedido por ela feito a outro assessor para obter a reacção de Jaime Silva. Por outro lado, não se comprova ter telefonado à jornalista para tentar entregar a resposta do MADRP ainda a tempo de ser inserida na notícia em causa. Não se conclui assim que A.F. tenha incorrido no incumprimento dos seus deveres profissionais, pelo que o provedor não encontra fundamento na reclamação.

O acto jornalístico não se esgota numa única edição, mas constrói-se progressivamente ao longo do tempo. Lamenta-se por isso que a reacção do Ministério da Agricultura não tenha sido entregue à redacção do PÚBLICO mesmo fora do prazo útil da notícia, para eventual divulgação em edição posterior.

Documentação complementar

CARTA DE MÁRIO RIBEIRO, ASSESSOR DE IMPRENSA DO MINISTRO DA AGRICULTURA:

No dia 11 de Março de 2008, a jornalista Ana Fernandes enviou a este gabinete de imprensa um e-mail onde solicitava uma reacção do Ministério sobre dados do Eurostat em que se afirmava que Portugal é o terceiro país dos 27 onde mais caiu o rendimento por trabalhador agrícola. O e-mail da jornalista foi enviado às 16H51.

De imediato, às 17h03, solicitei aos serviços deste Ministério para que me fornecessem dados para que pudesse elaborar uma resposta para responder à Jornalista. Acontece, que por se tratar de dados estatísticos foi necessário cruzar informação de vários serviços.

Às 18h46, a jornalista Ana Fernandes envia um SMS a perguntar se podia contar com uma reacção 'para hoje' (dia 11). Às 18h47, respondo que ainda não tinha informação disponível para lhe enviar. Às 18h49, a jornalista informa que irá avisar quando já não puder esperar mais tempo por uma reacção do Ministério. Mas, às 19h43, Ana Fernandes informa que terminou o trabalho e que se houver uma resposta que lhe seja enviada na manhã seguinte (dia 12).

A resposta deste gabinete ficou disponível por volta das 20h00, altura em que liguei para a redacção do PÚBLICO, mas sem sucesso, visto ninguém ter atendido.

Feitas as contas, o primeiro contacto do PÚBLICO foi feito às 17h03. O último às 19h43. Ou seja, o PÚBLICO exigiu uma resposta deste Ministério em menos de três horas a uma questão que não podia ser dada apenas por uma simples conversa, mas que exigia o cruzamento de dados e a elaboração de tabelas. Mais importante, a jornalista começou por dizer que avisaria com antecedência qual seria a sua hora limite para receber a informação deste Ministério, mas a verdade é que se limitou a dizer que já tinha terminado o seu trabalho. O resultado do seu trabalho não podia ser mais tendencioso ao dizer que "o PÚBLICO pediu uma reacção ao Ministério da Agricultura sobre esta situação, mas até ao fecho desta edição não obteve resposta". O PÚBLICO fecha a sua edição às 19H43? Depois das 20H00 o telefone da jornalista não funciona?

Acontece que não é a primeira vez que a jornalista Ana Fernandes tem este procedimento em relação ao Ministério da Agricultura. No passado dia 13 de Fevereiro, Ana Fernandes contactou este gabinete de imprensa a pedir uma posição do Ministério em relação ao aumento dos cereais. Informei-a que o ministro Jaime Silva estaria nessa manhã em Santo Estêvão, numa reunião com produtores de cereais, e que teria toda a disponibilidade de conversar no final da reunião. A jornalista ficou de aparecer em Santo Estêvão para entrevistar o Ministro. Não apareceu.

Num contacto posterior ficou combinado, pela segunda vez, um encontro do ministro com a Ana Fernandes. Desta vez para a Assembleia da República. A jornalista não apareceu. O que apareceu foi uma notícia, no dia 14, onde Ana Fernandes afirmava que "o PÚBLICO tentou ouvir o ministro da Agricultura mas sem sucesso". Ou seja, a jornalista faltou a dois encontros com o ministro Jaime Silva, mas na notícia que publicou dá a entender que foi o MADRP que não quis falar com o jornal.

Aproveito para dar conta de outro tipo de comportamento, inverso ao tido pela jornalista atrás referida. Um outro jornalista do PÚBLICO, Carlos Dias, no passado dia 10 de Março, às 16h36, contactou este gabinete de imprensa a solicitar uma série explicações sobre o abate de azinheiras no concelho de Serpa. Foi-lhe dito que precisávamos de reunir informação para poder responder com exactidão às questões que colocava. A urgência na obtenção dos dados requerida era de 24 horas. A resposta foi enviada ao jornalista Carlos Dias apenas às 9h53 do dia 12, muito além do combinado, e a notícia aguardou pelas respostas.

RESPOSTA DA JORNALISTA ANA FERNANDES:

Esta reclamação [do assessor de imprensa do Ministério da Agricultura] é notável pela quantidade de mentiras, facilmente desmontáveis, o que me faz supor que se destina mais a consumo interno, para se justificar perante a sua hierarquia, do que externo. Passo a explicar, ponto por ponto:

- "A resposta deste Gabinete ficou disponível por volta das 20h00, altura em que liguei para a redacção do PÚBLICO, mas sem sucesso, visto ninguém ter atendido. (...) O PÚBLICO fecha a sua edição às 19H43? Depois das 20h00 o telefone da jornalista não funciona?" Mário Ribeiro tenta, sabendo que costumo sair por volta das 20h00, alegar que me ligou. Acontece que tenho o meu telefone fixo reencaminhado para o telemóvel, que ficou sempre ligado e que nunca tocou, como posso facilmente provar através do registo de chamadas. A resposta nunca veio, nem por mail, nem por telefone, nem por via nenhuma.

- "No passado dia 13 de Fevereiro, Ana Fernandes contactou este gabinete de imprensa a pedir uma posição do Ministério em relação ao aumento dos cereais. Informei-a que o ministro Jaime Silva estaria nessa manhã em Santo Estêvão, numa reunião com produtores de cereais, e que teria toda a disponibilidade de conversar no final da reunião. A jornalista ficou de aparecer em Santo Estêvão para entrevistar o Ministro. Não apareceu." Como o meu primeiro contacto com Mário Ribeiro sobre o assunto foi feito à hora de almoço, como é que eu posso ter combinado lá ir de manhã? Isto é tanto mais mentira quanto ele me disse que o ministro já tinha falado à saída da reunião com a agência Lusa sobre o assunto e que eu poderia aproveitar essas declarações. Insisti, já que tinha perguntas muito específicas sobre a subida do preço do trigo. Ele respondeu-me que nessa altura não dava para falar com o ministro porque ele estava com pressa para chegar a Lisboa, uma vez que tinha de estar na Assembleia da República nessa tarde. O que nos leva ao segundo facto falso.

- "Num contacto posterior ficou combinado, pela segunda vez, um encontro do ministro com a Ana Fernandes. Desta vez para a Assembleia da República. A jornalista não apareceu. (...) Ou seja, a jornalista faltou a dois encontros com o ministro Jaime Silva, mas na notícia que publicou dá a entender que foi o MADRP que não quis falar com o jornal." Tal como já disse, houve um único contacto, em que ele me falou da presença do ministro no Parlamento, altura em que me disse que seria a oportunidade para o apanhar. Disse-lhe, logo aí, que tinha uma consulta nessa tarde (tenho papéis de exames com data e hora que o provam e que como se sabe têm de ser marcados previamente, pelo que nunca poderia ter combinado isso), mas que lhe ligaria assim que saísse do consultório para ver se ainda estavam na AR, para ir lá. Assim fiz, e ele não me atendeu. Liguei então para o outro assessor de imprensa do Ministério para confirmar se eles ainda estavam no Parlamento. Ele disse-me que não, que eles já tinham regressado ao Ministério. Pedi-lhe então que desse o recado ao Mário Ribeiro de que eu tinha ligado e para este me ligar de volta, pois continuava interessada em falar com o ministro. Note-se, que neste caso, o interesse na conversa com o ministro era sobretudo meu já que a subida do preço dos cereais é algo que o ministro não controla. Portanto, não se tratava de um contacto para dar hipóteses ao ministro de refutar qualquer crítica, mas tão só emitir uma opinião sobre um sector que tutela. Esperei em vão. No final da tarde, como não havia resposta, voltei a ligar. O telemóvel de Mário Ribeiro estava desligado.

- A última situação relatada por Mário Ribeiro também é notável. Ele sabe, tão bem quanto eu, que quando estamos a tratar de histórias próprias podemos esperar algum tempo pelas respostas, como aliás já aconteceu várias vezes entre mim e o Ministério. Mas, nos dois casos de que me acusa, estão em causa notícias do dia, que o PÚBLICO não poderia deixar de dar: o recorde do preço do trigo e a divulgação dos dados da Eurostat, de que as televisões já estavam a falar.


RESPOSTA DE MÁRIO RIBEIRO:

Ao contrário do que a jornalista Ana Fernandes afirma, não preciso de me justificar perante a minha hierarquia, visto a mesma conhecer o meu trabalho e ter sido sempre informada do que se estava a passar. Inclusive tive, como é óbvio, que dizer ao ministro Jaime Silva que a jornalista Ana Fernandes pretendia falar com ele. Quer em Santo Estêvão, quer na Assembleia da República.

A jornalista diz que eu não lhe liguei. Quanto a este facto, é a palavra de um contra a do outro. É verdade que não lhe enviei a resposta, porque não consegui falar com a jornalista, mas como poderá comprovar a resposta foi enviada a este gabinete de imprensa pouco depois das 20h00. E, como me pareceu que já não adiantava enviar uma resposta para uma notícia que a jornalista já me tinha dito que tinha terminado, não enviei:

«-----Mensagem original-----
De: Rita Horta [mailto:ritahorta@gpp.pt]
Enviada: terça-feira, 11 de Março de 2008 20:12
Para: Ana Isabel Paulino
Assunto: Re: FW: Eurostat

Ana Isabel Paulino wrote:
Rita,
Resposta urgentissima a esta questão. Obrigada,
Ana Paulino
Chefe do Gabinete
do Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas

-----Mensagem original-----
De: Mário Luis Ribeiro
Enviada: terça-feira, 11 de Março de 2008 16:55
Para: Ana Isabel Paulino
Assunto: FW: Eurostat

O que digo? Ou melhor quem pode responder? Hoje.

MRibeiro

-----Mensagem original-----
De: Ana Fernandes [mailto:Ana.Fernandes@publico.pt]
Enviada: terça-feira, 11 de Março de 2008 16:51
Para: Mário Luis Ribeiro
Assunto: Eurostat

Mário, já te ligo mas aqui vai a pergunta:

- Segundo o Eurostat, Portugal é terceiro país dos 27 onde mais caiu o rendimento por trabalhador agrícola em 2007. Qual a reacção do Ministério a estes números?

Ana»

Sobre o que se passou a 13 de Fevereiro, a jornalista Ana Fernandes diz que só falou comigo à hora do almoço. Também aqui é a palavra de um contra o outro. No entanto envio um endereço electrónico [http://portal.min-agricultura.pt/portal/page/portal/MADRP/PT/servicos/Imprensa/NT_2008/REUNIAO_CEREAIS_12FEV08.pdf?_template=] onde está a nota de imprensa a informar os jornalistas deste encontro. Nota de imprensa que a jornalista Ana Fernandes recebeu, visto fazer parte da listagem de jornalistas deste Ministério. Talvez a jornalista também possa desmentir ter recebido esta nota de imprensa, e por isso desconhecia a realização da reunião.

É verdade que a jornalista Ana Fernandes falou comigo à hora do almoço. Acontece que este foi o segundo contacto no dia 13. E como Ana Fernandes não tinha comparecido combinámos a entrevista para a Assembleia da República. Também é verdade que Ana Fernandes me referiu uma consulta, mas nunca disse que isso era impeditivo de se deslocar à Assembleia.

Estranho que a jornalista diga que o meu telemóvel estava desligado, visto isso só acontecer quando me desloco em viagens de avião. De resto, nunca desligo o telemóvel e, inclusive, respondo sempre às chamadas que não posso atender no momento (excepto aquelas em que não aparece identificação).

Por último, refiro que este gabinete de imprensa tenta dar todas as informações com o máximo de brevidade, porque sabe que a maioria das vezes os pedidos feitos pelos jornalistas são urgentes. Tem sido assim ao longo dos últimos três anos. Tem sido assim no relacionamento com a jornalista Ana Fernandes. Dai que tenha tido necessidade de apresentar uma reclamação junto do provedor do PÚBLICO. É que nos últimos trabalhos assinados pela jornalista Ana Fernandes surge sempre a indicação que o Ministério da Agricultura não respondeu.

NOVA RESPOSTA DE ANA FERNANDES:

O que interessa é se Mário Ribeiro me ligou ou não às 20h00, o que garanto que não aconteceu, pois tive sempre o telefone ligado. Aliás, só reencaminhei o meu telefone fixo para o telemóvel por isso mesmo, para prevenir essa eventualidade e porque essa resposta era importante para mim. É de facto a palavra de um contra o outro, mas acontece que o meu telemóvel, como o de todos, regista a entrada de chamadas, e não tenho registo dessa chamada, nem atendida nem por atender. Mesmo quando o telefone não tem sinal – no meu caso raramente acontece, pois estava em Lisboa, onde o sinal é forte -, o telefone avisa quando houve uma tentativa de contacto. Volto a repetir: não houve chamada nenhuma, e não tenho razão nenhuma para mentir, pois a reacção do Ministério era muito relevante para o artigo, pelo que era do meu total interesse obtê-la. Ele também não refere que no último SMS que lhe mandei a dizer que tinha terminado o texto sobre o Eurostat, ao qual não respondeu, lhe dizia que continuava interessada numa reacção, mesmo que viesse no dia seguinte. Ele confirma que nunca me enviou nada, nem na altura, nem até hoje.

Em relação ao encontro com os produtores de cereais (dia 13), estava agendado há muito e todos sabiam disso, eu também, como é óbvio. Mas note-se que não houve nenhum compromisso de ir, como não há nunca. Como sabe, notas das agendas dos ministros, conferências de imprensa, etc., recebemos imensas diariamente. Não vamos a todas. Alguns pedem-nos para confirmar se vamos ou não, geralmente os que trabalham com agências de comunicação. No caso do Ministério da Agricultura - como na generalidade do Governo -, isso nunca aconteceu. Limitam-se a mandar a nota de agenda e pronto.

Não fui a esse encontro porque tinha uma questão pessoal a tratar nessa manhã em Lisboa, o que me impedia de ir a Santo Estêvão (Ribatejo). Decidi então tratar o assunto pelo telefone quando cheguei ao jornal, já a manhã ia avançada. Comecei por contactar os produtores de cereais, os quais só apanhei no final da reunião. Só depois dessa conversa, e perante acusações feitas, percebi que tinha de ouvir o outro lado, no caso o Ministério. É só nessa altura que ligo para o Mário Ribeiro, pelo que não percebo que outro telefonema de manhã cedo é que lhe fiz, se antes não tinha assunto para falar com ele. Ao argumentar com esta nota de agenda, Mário Ribeiro tenta dar a entender que estaria algo combinado quando viu desmontado o argumento de que à hora de almoço eu não poderia ter combinado encontrar-me com o ministro de manhã. Mas voltamos ao mesmo: como é que eu poderia ter necessidade de obter uma reacção do ministro antes de ter uma razão para isso, o que só aconteceu quando falei com os produtores de cereais, por telefone, no final da dita reunião?Como se percebe pelo fio do tempo, quando faço essa chamada já a reunião tinha acabado e já o ministro estava a caminho de Lisboa.

Cai assim por terra o argumento de que tinha combinado lá ir para falar com o ministro. O Mário Ribeiro confirma também que eu lhe falei na consulta. Então por que razão lhe falei nela? Só para lhe dar conhecimento da minha vida pessoal, ou porque ela poderia inviabilizar que eu fosse à Assembleia em tempo útil? E por que não responde ele ao facto de eu lhe ter ligado ao sair da consulta, sem que ele tivesse atendido, e de eu ter deixado recado ao outro assessor de imprensa de que queria falar com ele, sem que ele nunca tivesse voltado a ligar? E, quanto ao telefone desligado, mais uma vez asseguro que é verdade, e posso pedir o registo dessa chamada.

Em toda esta questão está um dos grandes problemas do jornalismo: ter de lidar com a mentira, com pessoas que dão o dito por não dito, ou o não dito pelo dito, como é o caso. Quando se trata de vozes oficiais, como é o caso de ministros, muitas vezes já gravamos as conversas para nos protegermos. Será que temos de começar também a gravar as conversas com os assessores, conversas que ainda por cima são muitas vezes de mera combinação, mas se calhar mais perigosas porque o seu papel é gerir politicamente a imagem pública de quem servem? Parece-me que sim.

Quantos desmentidos já houve de notícias, em todos os jornais, que mais tarde se revelaram verdade? Quando os assuntos incomodam, a primeira reacção é muitas vezes a negação. É claro que também acontece o contrário, mas esses casos seguem para os tribunais, enquanto os outros criam apenas uma barreira de fumo, pondo em causa a honra de profissionais, ficando-se apenas nesta discussão estéril: “É a minha palavra contra a dela, em quem acreditam mais?”.

Na minha opinião, a verdade é a principal matéria-prima da minha profissão. Se ao longo de 18 anos, em que nunca fui acusada de nada, não tivesse uma profunda fidelidade à verdade já teria a carreira acabada, pelo menos no PÚBLICO.

domingo, 9 de março de 2008

O público no PÚBLICO

“Um jornal também deve ter um assinalável contributo dos leitores”, escreve, de Vila Real, António Cândido Miguéis, para solicitar a concessão de mais espaço para a publicação de cartas enviadas pelo público ao PÚBLICO. "Desde que estes revelem artigos inteligentes, bem estruturados e bem escritos. Artigos que tragam ‘revelações’, polémicas, esclarecimentos, vivências que ‘escapam’ aos jornalistas e ‘escapam’ aos seus distintos colaboradores. Alguém afirmou que ‘os jornais são os ponteiros de segundo da História’. Eu acrescento: as opiniões dos leitores são ‘estetoscópios’ que ‘auscultam’ o bem ou o mal estar político, económico, social, civilizacional...”

Na semana em que o PÚBLICO atinge a maioridade, vale a pena reflectir na interacção que se estabelece entre o jornal e os seus leitores. Este conceito sofreu nos últimos tempos um extraordinário desenvolvimento devido ao advento da internet. O cidadão já não é um consumidor passivo de informação, mas um interveniente no circuito comunicacional, que pode em qualquer momento comentar notícias publicadas, difundir opiniões, enviar novas informações (em texto ou imagem) ou até mesmo, em último caso, criar o seu próprio órgão de comunicação – um blogue.

Esta nova característica tem levado os meios de comunicação tradicionais a abrirem-se a maior participação do público. Num jornal, por exemplo, dado que grande parte das notícias da edição em papel já foi difundida de véspera através do seu site na internet, é possível imprimir essas notícias já acompanhadas de comentários de leitores (prática porém ainda pouco habitual). Ou solicitar o envio de questões a serem colocadas numa entrevista agendada com uma figura pública. Neste capítulo, aliás, estamos apenas no início...

Na imprensa, as novas formas de comunicação acabam também por influenciar o desenvolvimento da tradicional zona de interactividade com o público, que é a secção de cartas dos leitores. Não se trata de mero espaço de desabafo ou de posta restante. Uma secção de cartas de leitores editada com atenção, sensibilidade e equilíbrio, além que constituir uma estimulante experiência profissional para quem o faz (testemunha-o o provedor por conhecimento directo), é quase sempre, numa publicação, uma das suas páginas mais lidas e com um público mais fiel (embora, curiosamente, os jornalistas disso não se costumem aperceber). O leitor de Vila Real explica porquê: "As cartas dirigidas ao director representam o verdadeiro pulsar da sociedade; explicitam o contentamento ou descontentamento das pessoas face aos governos; revelam atropelos, patenteiam injustiças dos serviços, mostram estados de alma, estados de espírito. Dão a real dimensão do país que não é aquela que os políticos propalam. Acusam. Protestam. Evidenciam insatisfações. E podem estimular polémicas interessantes e esclarecedoras".

É natural que o provedor do leitor procure dar satisfacções aos leitores sobre esta área, que lhes pertence por direito próprio. E os primeiros dados que a esse respeito recolheu, logo que assumiu funções, não são dos mais entusiasmantes. A começar pelo facto de a secção não ser editada por um jornalista, mas sim por um elemento do secretariado da redacção. Não está em causa a dedicação com que esse trabalho é desenvolvido, mas sim tudo aquilo que nele seria obrigatório e fica por fazer: remissões, verificação factual de certas informações e alegações, moderação das palavras nos limites do civismo, da urbanidade e do bom gosto, sintetização dos textos para efeitos de clareza, rigor e abertura do espaço à participação de mais correspondentes, diálogo com os leitores, indução de foruns de debate sobre temas específicos ou elaboração de dados estatísticos acerca do correio recebido.

A segunda informação desanimadora é que – revela o responsável – as cartas recebidas em papel (seja por correio, por fax ou em mão) são automaticamente lançadas ao cesto dos papéis, por não existir na redacção do PÚBLICO quem tenha disponibilidade para as teclar ao computador. Numa segunda conversa sobre o assunto tida pelo provedor com a mesma pessoa, foi admitida a possibilidade de uma ou outra dessas cartas ser repescada, mas não há dúvida de que prevalece como critério de admissão inicial o envio das mensagens por correio electrónico. Não deixa de ser preocupante que um jornal cujo Estatuto Editorial (EE) proclama que "a existência de uma opinião pública informada, activa e interveniente é condição fundamental da democracia e da dinâmica de uma sociedade aberta" discrimine desta forma, logo à partida, os dois terços de portugueses que ainda não dispõem de acesso à internet.

Por outro lado, nem se pode falar propriamente de um trabalho de edição desta secção, já que o elemento responsável, com uma intervenção muito sumária, se limita a seleccionar por cada número do jornal, segundo directivas da direcção, duas cartas para eventual publicação, dado que não cabem mais. Não será até uma diminuta percentagem perante as poucas dezenas de cartas recebidas por dia (20 a 30, sendo que algumas não preenchem as condições exigidas e outras são enviadas para vários periódicos em simultâneo). O New York Times, por exemplo, publica em média, por edição, 15 das cerca de mil cartas que chegam diariamente à sua redacção, e o britânico Guardian a mesma coisa, entre 300 a 400 recebidas cada dia. Mas também é um facto que a publicação de um maior número de cartas incentivaria mais leitores a participarem.

E isto leva-nos ao problema mais visível (na opinião de muitos, pouco visível): o espaço em si. Na página onde são impressas, foi reservado às cartas, após a última reformulação gráfica do PÚBLICO, um enclave entalado entre o editorial e as correcções do jornal (de referir que a revista «Pública» tem um espaço à parte). Pior do que isso, estas duas secções possuem sempre prioridade sobre a colaboração dos leitores. Isto é: às cartas é destinada a área residual remanescente após elaborados os demais textos da página. Pode até acontecer que, perante um editorial prolixo (caso da passada sexta-feira), não sobre sequer lugar para cartas. Não se pode por isso considerar que os editores e directores do PÚBLICO mantenham, pelo menos nesta página, grande respeito pelos leitores do jornal.

Poder-se-ia alvitrar que os leitores possuem à sua disposição o PUBLICO.PT, onde é possível a publicação de comentários sem restrições de número ou de dimensão. Trata-se, sem dúvida, de um importante forum de intervenção, como o atestam os cerca de 230mil comentários já inseridos na sua base de dados. Mas, pelo menos na fase actual, o PUBLICO.PT apenas admite uma participação reactiva – o leitor pode comentar uma notícia publicada mas não introduzir dados ou opinião sobre um novo tema, como se admite na secção de cartas da edição em papel.

O EE do PUBLICO.PT invoca o recurso «às novas possibilidades técnicas que se oferecem à informação, quer no domínio da produção de informação quer no da sua distribuição, explorando as capacidades de permanente comunicação e interacção com os seus leitores». Quanto à edição impressa do jornal, não existe no EE qualquer provisão respeitante à consideração e ao tratamento a dar às cartas dos leitores (embora no Livro de Estilo se estabeleçam regras para a divulgação de cartas reagindo à matéria jornalística).

Mas a questão pode ser abordada no âmbito do espírito que presidiu à elaboração do EE e que sempre esteve presente entre os princípios do PÚBLICO: o reforço dos valores de cidadania. Nesse sentido, estimular os leitores à participação e conceder-lhes um espaço digno para o efeito não pode deixar de ser um desígnio deste jornal.

Recomendação do provedor. De acordo com os valores defendidos pelo PÚBLICO, às cartas dos leitores deveria ser reservado um espaço fixo e maior do que o actual, a ser gerido por um editor próprio.

Publicada em 9 de Março de 2008

quarta-feira, 5 de março de 2008

Amigo de Peniche

No PÚBLICO de 6 de Fevereiro (pág. 19) foi publicada a notícia intitulada "Foca bebé recupera de agressões em Peniche" contendo o seguinte:

"Uma foca bebé está há duas semanas no parque Zoomarine a recuperar de feridas provocadas por agressões de populares na praia da Areia Branca, próximo de Peniche, disse o director científico do recinto algarvio. [...] Quando foi detectada pelo vigilante de natureza da zona de Peniche, a 21 de Janeiro, a foca cinzenta bebé - uma fêmea - estaria a ser agredida por populares, em plena praia."

A notícia merece da minha parte um comentário:

A Praia da Areia Branca fica de facto "próximo de Peniche" (a cerca de 15 Km), mas fica bem mais próxima da sede do concelho a que pertence: Lourinhã. Sendo assim, fico sinceramente incomodado ao constatar o título utilizado na peça. As agressões foram cometidas na Lourinhã e não em Peniche. Não se trata de uma questão de pormenor nem de bairrismo da minha parte: trata-se principalmente de uma questão de veracidade dos factos e justiça nas afirmações feitas. A utilização do nome de Peniche para dar conta da localização da praia é, no meu ponto de vista, descabida, sendo que ainda induz o leitor em erro.

A única relação deste caso com Peniche poderá ser o facto da situação ter sido descoberta pelo vigilante da natureza que actua na zona dessa cidade piscatória e que tem como "jurisdição" também o concelho da Lourinhã.

Pelo que apurei, a notícia do PÚBLICO acaba por ser praticamente um copy/paste de uma notícia da Agência Lusa, o que parece apenas revela falta de confirmação e atenção às notas da agência noticiosa, assumindo o que dela emana como verdade inquestionável.

As gentes de Peniche acabam por ficar (uma vez mais) envolvidas numa história macabra, não tendo no entanto nada a ver com ela.

Hélder Gois

Caça-gralhas (IV)

Na edição de 4 de Fevereiro, são várias as situações a reclamar reparo, em textos dispersos por diversas rubricas:

Texto de Catarina Gomes (pág. 4): enquanto o título faz, correctamente, a concordância ("Quase 40 por cento dos idosos passam mais de oito horas sós"), já o subtítulo ("No total, 21 por cento depende de terceiros") dela prescinde. Porquê? É aleatório?

Texto de Mariana Oliveira (pág. 8): quando escreve "utilizou os aparelhos [...] mudou-lhes o software original e substitui-os por um outro", o terceiro verbo não devia concordar, em tempo, com os outros? Último parágrafo: não será risível, no mínimo, o resultado da incorrecta colocação dos constituintes frásicos em "Ricardo Jalles, responsável pela área de combate à fraude da Zon TV Cabo, explica"; "a empresa fez 250 queixas-crimes de cidadãos": na situação em questão, o segundo elemento não fica no singular?

Texto de Filomena Fontes (pág. 9, título): "querem uma maior fatia do IRS" - porquê a anteposição do adjectivo, que nada justifica, além de dar origem a um quase cacófato?

Texto de Joana Ferreira Costa (pág. 9): "esta não foi uma mini-remodelação", duas vezes assim grafado, quando o Houaiss preconiza "minirremodelação"?

Texto não assinado (Lusa) (pág. 11): além da repetição facilmente evitável ("inquérito sobre as decisões do Governo PSD-CDS sobre o Estoril-Sol"), uma afirmação no limiar do non-sens (e com nova repetição): "O PND, em comunicado, critica o CDS-PP, que já liderou, acusando a liderança dos democratas-cristãos de".

Texto de Rita Siza (pág. 17, título): como explicar a grafia "Super Terça-Feira"?

Texto de Fernando Sousa (pág. 20): que pretenderá o autor dizer com "deixam antever um processo semelhante ao da libertação semelhante ao de Clara"?

Texto sem autor (pág. 20): "matam em dois dias 32 pessoas e ferem outras 164", "mataram no Sri-Lanka 32 pessoas e feriram 164 outras", "matou seis homens e 14 mulheres, e feriu 68 outras pessoas"(?!): aceite como um dado adquirido que os mortos, antes de o serem, também foram feridos, justificar-se-á a repetição do "outras" que confere ao escrito um cariz redundante?

Texto de Vítor Costa (pág. 33): "fora da europa" (entrada); "irão aumentar dez vezes uma vez que"; "comissões mistas [...] encarregues" (o Livro de Estilo não recomenda os particípios regulares, "encarregadas" na situação em apreço?); "um acordo visando" (não seria recomendável a substituição do gerúndio pela oração relativa?).

Mário Pinto

O problema está só na simplificação do título

No texto com o título «PIB português recupera, mas continua abaixo do valor de 2000», publicado em 13 de Fevereiro na secção de Economia do PÚBLICO, há uma grosseira e vergonhosa manipulação dos números publicados neste estudo do Eurostat. Os números referidos no artigo são o valor do PIB EM RELAÇÃO À MÉDIA EUROPEIA, e não o seu valor absoluto. Assim, é verdade que o valor do PIB português em percentagem da média europeia continua mais baixo do que em 2000, mas o seu valor real absoluto subiu claramente! A questão foi que a média europeia subiu mais rápido que os valores portugueses. Logo, o título "PIB português recupera, mas continua abaixo do valor de 2000" é totalmente falso. Verifica-se exactamente o oposto.

Miguel Carvalho

ACTUALIZAÇÃO DO PROVEDOR. O leitor discorda do título dado a este post (que é da responsabilidade do provedor), por entender que não se trata de uma mera simplificação, mas de uma inversão do conteúdo da notícia (ler comentário). Em rigor, tem razão. Mas, por questão de economia de palavras e de espaço, nem sempre os títulos correspondem com exactidão aos textos das notícias. É uma constatação, não uma justificação, que deverá servir de chamada de atenção aos editores, sobretudo quando há o risco de se deturpar o sentido da notícia.

Caça-gralhas (III)

Atenção à preposição na sintaxe (manchete do PÚBLICO de 3 de Março): Onde se escreve "Parlamento vai passar a ter acesso e a fiscalizar os segredos de Estado", devia ter-se escrito: "Parlamento vai passar a ter acesso aos segredos de Estado e a fiscalizá-los". Quando duas ou mais palavras têm o mesmo complemento regido de preposição, é necessário que esta convenha a cada uma das palavras consideradas separadamente. O erro do PÚBLICO é grave e está, infelizmente, generalizado.

fmentel (via e-mail)

Caça-gralhas (II)

Sou um leitor assíduo do PÚBLICO, e não posso deixar passar em branco alguns erros que considero inadmissíveis num jornal que quer ser, e é, de referência. Na edição de 4 de Março, na pág. 9, num artigo que fala sobre uma visita de Santana Lopes, a jornalista Joana Ferreira da Costa escreve o seguinte: "Se a preplexidade dos alunos é natural...". E mais à frente: "Uma visita onde não esteve Pedro Duarte, o deputado com o pelouro da educação, que ontem constestou o silêncio de Cavaco Silva." Pensava eu que já eram erros a mais, mas enganei-me: "Isso pressupõem muito mais recuros." Lamentável. Podem ser erros apenas causados pela pressa e pela falta da básica função de voltar a ler o que se escreveu. Mas não deixam de ser lamentáveis e a evitar em notícias futuras.

André Pereira

segunda-feira, 3 de março de 2008

Não há férias grátis

Estive a ler no blogue as respostas à questão que ontem abordou na crónica («Não há almoços grátis») e fiquei com uma dúvida: e quando um jornalista mete férias para aceitar um convite, seja ele para um destino exótico, seja para outro local? Como deverá reagir a direcção de um jornal ao saber disso? Questiono-o pois considero a questão muito pertinente, porque conheço casos desses, não no PÚBLICO, mas noutros jornais nacionais.

Francisco Falé

RESPOSTA DO PROVEDOR. A aceitação de um convite nessas condições recairia no previsto no Livro de Estilo do PÚBLICO sobre «recusa de favores» (ponto 52 dos «Princípios e normas de conduta profissional»), onde se preconiza a recusa de todas as ofertas em valor superior a 60 euros.

Não há almoços grátis

A revista «Pública» dedicou há três semanas a capa e 11 páginas interiores ao norte-americano Tommy Hilfiger. Para os leitores menos familiarizados com a figura, Hilfiger criou uma marca de sucesso comercial no ramo das confecções, ao estabelecer certo conceito de imagem adoptado pela geração jovem. A própria reportagem considera que ele «não é tanto um designer de roupas, mas mais um vendedor de ideias e um homem de negócios». O artigo veio a propósito de um livro que o «homem de negócios» acabara de conceber e lançar internacionalmente (e em Portugal nessa semana). O volume, no formato de coffee table book, consiste numa antologia de emblemas gráficos da civilização ianque, aquilo a que nos EUA se chama Americana e que ao longo do tempo tem sido objecto de diversas abordagens editoriais (com a particularidade de o modesto Hilfiger se colocar a ele próprio entre as imagens dessa simbologia).

Os responsáveis do PÚBLICO são inteiramente soberanos nas suas opções editoriais, e não compete ao provedor pronunciar-se sobre elas (a não ser em caso de flagrante contradição com o Estatuto Editorial). Mas, de qualquer modo, tendo em conta a prática habitual e os meios do PÚBLICO, surpreende tão extensa cobertura do assunto, que implicou uma ida a Nova Iorque para o jornalista falar com o protagonista. Só que o motivo revela-se por uma frase no fim do texto: «O jornalista viajou a convite da Tommy Hilfiger». O jornal apenas publicou o trabalho sobre a personagem porque esta pagou a viagem e a estada ao repórter.

O método observa-se hoje com frequência na imprensa portuguesa: a oferta de deslocações a jornalistas, por empresas e instituições privadas, na ânsia de obterem cobertura noticiosa para as suas actividades. Um dos factores de sucesso na sociedade mediatizada em que vivemos consiste no grau de notoriedade pública alcançado (a extensão das referências nos media ao nome ou ao produto, mais do que o elogio das suas características), e há quem esteja disposto a pagar por isso. Alguns jornais não referem sequer o «pormenor» da oferta, mas o Livro de Estilo do PÚBLICO estabelece que quando «os jornalistas viajam a convite de empresas ou em comitivas oficiais [que o provedor coloca em categoria distinta da relativa às entidades privadas], esse facto deve ser referido de forma clara junto aos textos resultantes dessas viagens.»

Só que esta prática suscita interrogações mais complexas, a que o Livro de Estilo não responde. A primeira é saber se o jornal não perde deste modo a autonomia editorial, já que a sua agenda passa em parte a ser definida não em função uma hierarquia de prioridades informativas, estabelecida pelos seus responsáveis editoriais, mas em função de quem oferece viagens. Além de que a tendência será para destacar editorialmente os que pagam e ignorar os que não pagam. Todas as três reportagens do caderno P2 de 18 de Fevereiro, por exemplo, eram custeadas por entidades externas ao jornal, uma delas o turismo espanhol.

É claro que o jornalismo português vive em tempos de vacas magras. E que, em tal aflição, a cavalo dado não se olha o dente (para manter metáforas quadrúpedes). Por outro lado, as deslocações oferecidas garantem maior diversidade de matérias tratadas: «Não aceitar significa privar os leitores de conteúdos que só na forma destes convites estão acessíveis», explica Ana Gomes Ferreira (AGF), editora da «Pública», solicitada pelo provedor a esclarecer o caso Hilfiger. Dado que «o mundo da moda e da beleza faz naturalmente parte do conteúdo da revista», a jornalista explica que «os grupos que representam as marcas de moda e de beleza organizam sessões de entrevistas com os criadores, convidando um grupo de jornalistas que, em junket ou individualmente, entrevistam o criador em questão e são postos em contacto com o trabalho que realizam», sendo os convites «ponderados do ponto de vista do interesse jornalístico e da linha editorial da revista, e aceites ou recusados». Em suma, «a revista optou por tratar estes convites da mesma forma que o jornal trata outros convites em que as despesas são pagas por quem convida». (Nestas explicações não se coloca a hipótese de o jornal pagar as deslocações dos seus repórteres se realmente tem interesse editorial nas matérias em causa).

Não estarão os jornalistas a abdicar assim da sua função de gatekeepers, aqueles a quem os teóricos da comunicação sempre atribuíram a fulcral missão de escolher os temas a lançar no espaço público? Não é por acaso que um jornal com elevados padrões éticos como The New York Times tem esta regra interna: «Os membros da redacção não podem aceitar transportes e alojamento gratuitos ou com desconto, excepto quando circunstâncias especiais fornecem escassas ou nenhumas opções. Tais casos especiais incluem certas expedições científicas e militares e outras viagens para as quais as alternativas seriam impraticáveis – por exemplo, uma entrevista a bordo do avião de uma empresa, de que não resulta nenhum benefício para além da própria entrevista.»

O director do PÚBLICO, a quem o provedor pediu que se pronunciasse, revela que «o tema da aceitação pelo jornal de viagens oferecidas» sempre suscitou debate no seio do jornal, tendo-se chegado de início «a equacionar a inclusão de uma norma em que isso deveria ser expressamente vedado». Mas a opção foi diferente: «Após alguma discussão, verificou-se que havia viagens com interesse jornalístico e que, caso o PÚBLICO não aceitasse o convite, perderia a possibilidade de dar informação útil e importante aos seus leitores». José Manuel Fernandes (que há dias viajou a convite de uma fundação portuguesa para escrever sobre a sua actividade na Índia) historia em detalhe o debate interno que o PÚBLICO tem tido sobre o assunto, para chegar às normas actuais: «a) Sempre que o jornal ou um seu jornalista recebem um convite, é dado conhecimento à chefia e à direcção editorial. b) A chefia e/ou a direcção editorial decidem se o convite tem interesse jornalístico e, mesmo tendo, se a relação entre o tempo que o jornalista estará deslocado e a informação que produzirá é positiva para o jornal (...). c) A decisão sobre o jornalista que acompanha uma viagem oficial ou uma deslocação para uma apresentação comercial, ou se desloca a convite de outro país ou organização internacional, é tomada pelas estruturas de chefia. Não há convites pessoais no PÚBLICO.»

O director reconhece porém: «O ideal era que tivéssemos condições financeiras para fazer como alguns jornais americanos, que aceitam os convites mas fazem questão de pagar as despesas, ou de pagar aos organizadores o equivalente a um cálculo do que representariam as despesas se fizessem a viagem por sua conta. Não é essa, porém, a situação da maioria dos órgãos de informação em Portugal, razão por que muitas vezes recusamos convites». E ainda: «Não posso pois deixar de admitir que alguns eventos não seriam cobertos in loco pelo jornal se este não tivesse sido convidado. Não porque não tivessem interesse jornalístico, mas porque todos os dias temos de gerir um orçamento e uma equipa que não nos permitem realizar todas as reportagens que gostaríamos de realizar».

Coloca-se ainda outra questão: estará o jornalista que beneficiou de uma viagem oferecida em condições de escrever com total independência sobre quem ofereceu? O provedor tem dúvidas, mas dá a palavra a AGF, que disso não duvida: «Quando se aceita um destes convites, são válidas as regras que regem todo o jornal: se a matéria se revela fraca e sem interesse jornalístico, não se escreve; se a matéria é má, aplica-se um olhar crítico; se houver pressões ou imposição de regras (...), não se aceita. Os três casos já aconteceram na revista (...). Porém, se o resultado for bom e adequado a capa, é o que acontece». (Ler as explicações integrais de AGF e JMF no blogue do provedor).

Tendo-se posto a fazer contas, o provedor concluiu que, excluindo a capa, onde não é possível anunciar, 11 páginas da «Pública» custam em publicidade 55.550 euros (+ IVA). Para os potenciais anunciantes, a ideia é óbvia: «Se procura promoção, não ponha publicidade na imprensa; pague antes uma viagem a um jornalista. Sai mais barato e a mensagem poderá ser mais eficaz».

O provedor gostaria de fazer uma recomendação sobre o tema, mas abstém-se por realismo. Fica só este alerta para um problema que subsiste.

NOTA: O director de Comunicação e Imagem Corporativa do Grupo Espírito Santo, Pedro Pinto Fernandes, enviou um esclarecimento acerca do conteúdo da anterior crónica desta página, o qual poderá ser lido no blogue do provedor.

Publicada em 2 de Março de 2008

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR

Esclarecimentos de Ana Gomes Ferreira, editora da «Pública»:

Os grupos que representam as marcas de moda e de beleza organizam sessões de entrevistas com os criadores, convidando um grupo de jornalistas que, em junket ou individualmente, entrevistam o criador em questão e são postos em contacto com o trabalho que realizam (através da mostra das últimas criações etc.).
A revista optou por tratar estes convites da mesma forma que o jornal trata outros convites em que as despesas são pagas por quem convida: para visitas a exposições, para junkets de cinema, para visitas ministeriais ou presidenciais, para reportagens relacionadas com o trabalho de organizações não governamentais, para promoção de regiões turísticas, por exemplo.

O mundo da moda e da beleza faz naturalmente parte do conteúdo da revista, como outros temas (cinema, diplomacia, sociedade, viagens) fazem naturalmente parte do conteúdo do corpo principal do jornal ou de outros suplementos. Desta forma, optámos por não tratar os convites de moda e de beleza de forma distinta apenas porque o lado comercial é mais óbvio do que uma visita ministerial ou uma estreia de cinema. Os convites são feitos, ponderados do ponto de vista do interesse jornalístico e da linha editorial da revista e aceites ou recusados.

A comparação feita não é, obviamente, pacífica – colocar no mesmo patamar uma reportagem sobre sida na Tailândia, um junket com Tom Cruise, uma entrevista com Tommy Hilfiger. Mas os exemplos estão unidos por uma questão comum: não aceitar significa privar os leitores de conteúdos que só na forma destes convites estão acessíveis.

Quando se aceita um destes convites, são válidas as regras que regem todo o jornal: se a matéria se revela fraca e sem interesse jornalistico, não se escreve; se a matéria é má, aplica-se um olhar crítico; se houver pressões ou imposição de regras (tem que ter x páginas, tem que ser capa, tem que...), não se aceita. Os três casos já aconteceram na revista; os três casos já aconteceram em convites sobre moda-beleza (convites para ver colecções de que não se gostou, e assim se escreveu; convites para tratamentos de beleza que, afinal, não eram mais do uma tentativa de fazer propaganda a determinado hotel, e nem uma linha foi escrita; propostas de entrevista que teriam que ser capa e que se recusaram). Porém, se o resultado for bom e adequado a capa, é o que acontece.

Ana Gomes Ferreira

Esclarecimentos de José Manuel Fernandes, director do PÚBLICO:

O tema da aceitação pelo jornal de viagens oferecidas é objecto de discussão desde a redacção da primeira versão do Livro de Estilo, onde se chegou a equacionar a inclusão de uma norma em que isso deveria ser expressamente vedado. Após alguma discussão, verificou-se que havia viagens com interesse jornalístico em que, caso o PÚBLICO não aceitasse o convite, perderia a possibilidade de dar informação útil e importante aos seus leitores. Estabeleceram-se por isso as seguintes regras:

(Primeira versão do Livro de Estilo)

Os jornalistas do PÚBLICO devem manter uma atitude independente e crítica perante todos os poderes e interesses estabelecidos mas nunca de forma preconceituosa, ressentida ou hostil. Por isso, e para isso, todas as despesas de reportagem, contactos ou deslocações em serviço ficam a cargo do jornal. O único critério para agendar e efectuar um serviço é o seu indiscutível interesse jornalístico.
Não se aceitam presentes, viagens, convites ou benesses de outro género, sempre que possam condicionar, de algum modo, a independência de quem escreve. As situações que possam suscitar dúvidas ou ambiguidade deverão ser aclaradas previamente com a Direcção, ouvido o Conselho de Redacção.


[Viagens incluídas na comitiva oficial do Presidente da República ou do primeiro-ministro por exemplo, ou os bilhetes de espectáculos, livros, discos e restante material que é objecto de crítica especializada estão naturalmente excluídos desta preocupação.]

A experiência dos primeiros 12 anos de vida do jornal, e a discussão, pela Direcção Editorial ou em sede do Conselho de Redacção [CR], de vários casos concretos que suscitaram dúvidas, levaram-nos a alterar estas regras. As alterações mais importantes traduziram-se na obrigatoriedade de indicar no jornal as condições em que o jornalista havia viajado (uma regra de transparência que está longe de ser comummente praticada mesmo na imprensa de referência internacional) e, no caso dos presentes, foi estabelecido um limite monetário para o valor daqueles que podiam ser aceites.

Cito as normas em causa, segunda e actual versão do Livro de Estilo, acompanhadas por notas que traduzem a discussão então havida:

52 - Para que o jornalista do PÚBLICO mantenha uma atitude independente e crítica perante todos os poderes e interesses estabelecidos não se aceitam presentes, viagens, convites ou benesses de qualquer género, sempre que possam condicionar ou coarctar, de algum modo, a independência editorial. De todas as ofertas deve ser dado conhecimento à hierarquia e ofertas de valor estimativo superior a 60 euros devem ser remetidas ao expedidor (será disponibilizada uma carta tipo para efectuar esse tipo de recusas). As situações que possam suscitar dúvidas ou ambiguidade deverão ser aclaradas previamente com a Direcção que, se entender necessário, pode ouvir o Conselho de Redacção.

(Aquando da introdução desta norma, o responsável pela sistematização do novo Livro de Estilo acrescentou a seguinte nota:
Livro de Estilo, p.43. Questão discutida e reforçada na reunião do CR de 10 de Outubro de 1991. Na reunião do CR de 6 de Maio de 2004, o director mostrou-se aberto a propostas para o estabelecimento de regras diferentes das habituais para prendas e viagens e falou de The New York Times, onde, esclareço eu, os jornalistas não podem receber qualquer tipo de prendas, desde que elas ultrapassem os 25 dólares (ver parágrafo 33 das regras do NYT). Ou seja, podem aceitar canetas e uma caneca com o logo de uma empresa, e pouco mais. O Livro de Estilo do Le Monde diz: “Tout cadeau dont une estimation rapide permet de penser qu’il coûte plus de 70 euros est renvoyé au expediteur” (p.8 do Livro de Estilo do Le Monde). Os 75 corrigem o valor da inflação desde que saíram as normas do Le Monde

Oscar Mascarenhas na sua proposta à Lusa faz a seguinte distinção:
Brinde é aquilo que se recebe e não se importa de dar a outra pessoa; prenda é aquilo que se recebe e custa privar-se disso. Outro critério pode ser o do valor: brinde tem valor inferior a 15/20 euros; prenda tem valor superior. Mas mais importantes são a transparência e a frontalidade. Por isso, os jornalistas da Lusa têm a obrigação de informar, com verdade, a hierarquia editorial de qualquer oferta de que sejam alvo, independentemente do seu valor, sob pena de procedimento disciplinar.
A hierarquia pode não autorizar que o jornalista fique na posse da oferta, determinando a sua devolução ou entrega a uma instituição. Se o jornalista insistir em ficar na posse da oferta, será afastado da área noticiosa relativa à pessoa ou entidade ofertante por um período nunca inferior a um ano.
OM sugere também que os jornalistas da Lusa podem aceitar convites para refeições, mas devem discutir com a hierarquia editorial a possibilidade de retribuir. (Ad. G.)

O Adelino Gomes sugere ainda que distribua por todos uma carta-modelo de recusa igual à do NYT. (Esta sugestão é também intenção do director). Para além da distinção que a Lusa faz entre “brindes” e prendas, ou presentes, e que julgo nos poderão ajudar a encontrar a formulação mais adequada (ver nota) defendo que em qualquer dos casos se acrescente um parágrafo relacionado com ofertas “de lazer”, nos seguintes termos: “Tratando-se de convite para deslocação ou alojamento de lazer, em período de folga ou férias do jornalista, este deve informar previamente a hierarquia editorial, que decidirá.” A São José e o Ricardo Felner estão contra este acrescento pois acham que “um convite "para deslocação ou alojamento de lazer em período de folga ou férias do jornalista" só pode ser aceite se houver nele interesse jornalístico. Se não é uma "oferta" como outra qualquer.”)

53. Nos casos em que os jornalistas viajam a convite de empresas ou em comitivas oficiais, esse facto deve ser referido de forma clara junto aos textos resultantes dessas viagens.

(Durante o processo de discussão, António Granado sublinhou que esta norma resultou da sua “interpretação minha de discussões do Conselho de Redacção de 4 de Fevereiro de 2004, 4 de Março de 2004 e 6 de Maio de 2004")

Sendo estas as regras em vigor, cabe saber se têm sido bem aplicadas.

As rotinas internas adoptadas têm sido os seguintes:
a) Sempre que o jornal ou um seu jornalista recebem um convite é dado conhecimento à chefia e à direcção editorial.
b) A chefia e/ou a direcção editorial decidem se o convite tem interesse jornalístico e, mesmo tendo, se a relação entre o tempo que o jornalista estará deslocado e a informação que produzirá é positiva para o jornal. É também avaliado se os custos suportados pelo jornal (nem todos os convites incluem o pagamento de todas as despesas) se enquadram no mesmo critério de custo/benefício editorial.
c) A decisão sobre o jornalista que acompanha uma viagem oficial ou uma deslocação para uma apresentação comercial, ou se desloca a convite de outro país ou organização internacional, é tomada pelas estruturas de chefia. Não há convites pessoais no PÚBLICO.

De uma forma geral, quais são as situações mais frequentes com que o jornal é confrontado?:

- Viagens oficiais, sendo que nestas é raro estarem cobertas todas as despesas (há situações em que é o jornal que paga o bilhete de avião, noutras em que paga o alojamento, em quase todas tem de suportar as despesas locais realizadas pelo jornalista, como refeições, deslocações e transmissões).
- Viagens a convite de governos estrangeiros ou de organizações internacionais, o que sucede com mais frequência por alturas de uma mudança de Presidência europeia, nas vésperas de uma visita oficial e para proporcionar encontros ou entrevistas com as autoridades desse país, por ocasião de eventos como um grande evento desportivo ou ainda quando uma ONG ou um departamento das Nações Unidas está a lançar uma campanha de sensibilização (foi assim, por exemplo, que uma jornalista do PÚBLICO foi “apanhada” no Chade aquando da recente tentativa de golpe de Estado: ia a caminho dos campos de refugiados do Darfour num grupo levado pela ONU).
- Viagens para a apresentação de produtos comerciais ou promoção de eventos culturais. Por exemplo: ir ao Prado antes da inauguração de uma grande exposição; ir assistir a um espectáculo de uma tournée que vai passar por Portugal; ir conhecer um novo automóvel com a possibilidade de o guiar; ir conhecer a operação de empresas portuguesas com grandes investimentos no estrangeiro.
- Viagens para conhecer destinos turísticos, por regra a convite das autoridades turísticas de um país.
- Viagens para destinos exóticos para apresentação de resultados de uma empresa.

De todo este tipo de viagens, as últimas estão formalmente vedadas, tendo já acontecido que a Direcção Editorial mandou um jornalista recusar um convite quando tomou conhecimento dele em cima da hora.

As viagens para destinos turísticos, por regra utilizadas em peças no suplemento Fugas, são objecto de um escrutínio atento, pois são por vezes as mais apelativas para os jornalistas.

Na maior parte das outras situações, as deslocações de trabalho correspondem a acompanhar eventos que não poderíamos custear com o orçamento que temos para deslocações, que consideramos constituírem oportunidades para dar uma informação de qualidade acrescida aos leitores e que, quase sempre, implicam uma carga de trabalho acrescida para quem se desloca.

Apesar da existência de todos estes cuidados, não quer dizer que tudo corra como deve ser sempre. Já aconteceu aceitarmos uma viagem para conhecer a operação de um grande banco português numa ex-colónia e, depois, verificarmos que 90 por cento do programa era turístico. Já aconteceu (comigo) aceitar um convite que apenas incluía o pagamento da estadia e o agendamento de contactos oficiais ao mais alto nível, correndo o mais caro, a deslocação, por conta do jornal, e o facto de se ter indicado que se estivera naquele país a convite das autoridades oficiais (algo que não fizeram os jornalistas de The Times, El País, Figaro e Frankfurter Allgemeine Zeitung que estavam na mesma deslocação comigo) ter criado uma controvérsia entre os leitores. Já se teve de pesar bem, e por vezes recusar, a aceitação de viagens que se estavam a tornar repetitivas.

Tem havido o cuidado de não aceitar convites que, mesmo sendo realizados com a melhor das intenções, por vezes podem criar situações equívocas. Foi por isso que eu próprio, apesar de ter recebido convites para todos os jogos da selecção portuguesa durante o Euro 2004, convites que estou seguro não implicavam qualquer “contrapartida”, preferi não os aceitar.

A minha avaliação global é que actuamos neste domínio com equilíbrio e sensatez e que os cuidados que temos têm permitido que os jornalistas actuem com independência e espírito crítico (o que sei não ser frequente, pois já recebi protestos espantados de entidades que tinham convidado jornalistas do PÚBLICO e, depois, estes tinham escrito peças muito “independentes”).

Algumas notas finais:

1. O ideal era que tivéssemos condições financeiras para fazer como alguns jornais americanos, que aceitam os convites mas fazem questão de pagar as despesas, ou de pagar aos organizadores o equivalente a um cálculo do que representariam as despesas se fizessem a viagem por sua conta. Não é essa, porém, a situação da maioria dos órgãos de informação em Portugal, razão por que muitas vezes recusamos convites ou porque não temos jornalistas disponíveis para enviar, ou porque as despesas associadas, que existem sempre, não estão de acordo com os critérios que aplicamos aos investimentos que fazemos em deslocações por nossa iniciativa.
2. Não posso pois deixar de admitir que alguns eventos não seriam cobertos in loco pelo jornal se este não tivesse sido convidado. Não porque não tivessem interesse jornalístico, mas porque todos os dias temos de gerir um orçamento e uma equipa que não nos permitem realizar todas as reportagens que gostaríamos de realizar.
3. A esmagadora maioria dos temas que são tratados no quadro de viagens a convite são na mesma tratados no jornal quando não as acompanhamos (por não termos sido convidados ou por não termos aceite o convite), mas há situações em que os convites proporcionam reportagens únicas e interessantes que nunca poderiam ser realizadas caso não os tivéssemos aceite. É o caso, a meu ver, do trabalho sobre Tommy Hilffiger editado na «Pública».
4. Apesar de tal regra não ser referida nos pontos do Livro de Estilo relativos às viagens, o PÚBLICO nunca aceita pré-condições relativas ao destaque que será dado ao noticiário resultante de um qualquer convite (remeto para o ponto 60 do Livro de Estilo que veda qualquer hipótese de negociar com as fontes o destaque a dar a uma notícia, por exemplo).

José Manuel Fernandes