domingo, 30 de novembro de 2008

A Casa Pia da ministra da Educação

Será relevante colocar num título sobre a venda de um imóvel do Estado que Maria de Lurdes Rodrigues estudou nele?



Tender-se-á a ver insinuado na menção à ministra algo que afinal não se desvenda


O título, relativo à notícia principal da pág. 27 da edição do PÚBLICO de 19 deste mês, na secção Local, chamava a atenção pelo carácter insólito: “Estado quer vender colégio da Casa Pia onde a ministra da Educação fez o curso comercial”. Na verdade, Maria de Lurdes Rodrigues não fazia parte desta história, assinada pelo jornalista José António Cerejo (J.A.C.), acerca das regulares transacções imobiliárias de património público, a não ser pela circunstância totalmente marginal de a ministra ter estudado no colégio casapiano que até há dois anos funcionou no edifício agora em leilão (Convento do Desagravo, contíguo ao Panteão Nacional).

O leitor Vítor Moura exprimiu a sua perplexidade: “Não percebi a razão do título nem percebi as razões que levaram o jornalista a referir no texto por duas vezes a frequência do referido estabelecimento de ensino pela actual ministra da Educação (...). O facto parece absolutamente irrelevante. Mas, quando um jornalista refere um facto deste tipo (...) sugere a existência de uma relação e suscita curiosidade. Será que, nas entrelinhas, se sugere que uma escola frequentada por uma ministra nunca deveria ser vendida pelo Estado? É pouco provável. Ou será que apenas nos quer dizer que a ministra andou numa escola comercial? A notícia será um pretexto para dizer que ‘a ministra da Educação fez o curso comercial’, como se lê no título, em vez de num colégio privado suíço? Da Casa Pia, para mais? Há uma coisa que não se pode negar: o texto é exemplar. Raramente se atinge este nível. Terá o director do PÚBLICO alguma coisa a dizer sobre ele? Não quererá felicitar publicamente o seu autor?”

Contactado pelo provedor, J.A.C. admite ter sido assaltado pela dúvida: “Neste caso, como em muitos outros, o título escolhido é muito discutível. Confesso que sou o autor dele e que eu próprio me interroguei sobre a relevância da minha opção. Sucede que não sabia que a ministra lá tinha estudado e achei curioso o facto. É decerto um pormenor lateral à notícia, e por isso talvez não merecesse vir no título. Ao mesmo tempo, porém, fiz um raciocínio que me parece legítimo: se acho piada, é provável que muitos leitores achem também. Foi apenas por isso que decidi assim, e não, como é óbvio, por uma qualquer das várias sugestões mais ou menos deslocadas do leitor. Devo aliás dizer que a referência ao curso comercial só ficou no título para o equilibrar graficamente, uma vez que não gosto de linhas penduradas e deselegantes, como resultaria da expressão ‘Estado quer vender Colégio onde andou a ministra da Educação’, ou outra semelhante e igualmente curta em palavras. Acresce que a insinuação do leitor sobre a minha suposta intenção de desvalorizar o curso comercial que a ministra fez na Casa Pia é completamente infundada, quanto mais não seja porque eu próprio fiz, e tenho muito orgulho nisso, o curso comercial na Escola Veiga Beirão, no Largo do Carmo, em Lisboa”.

E para o jornalista as referências ao curso comercial de Maria de Lurdes Rodrigues “não resultam de uma qualquer intenção de repisar e repetir um facto para apoucar a senhora”: “Resultam apenas de uma regra da minha profissão: a ideia resumida nas primeiras linhas da notícia (lead) dever ser (em princípio) desenvolvida ou complementada no corpo do texto. Não o fiz da melhor maneira? É bem possível! Todos os dias tento fazer melhor”.

Também contactado pelo provedor, o director do PÚBLICO, José Manuel Fernandes, informou: “O título foi discutido na reunião de editores da manhã em que saiu a notícia. A opinião geral foi que se tratava de um aspecto lateral e sem relação de causa-efeito com a notícia. Podia e devia constar do corpo do texto, como curiosidade, mas não se justificava que estivesse no título”.

Essa é também a opinião do provedor. É certo que não há qualquer aspecto a objectar em relação ao recorte técnico da notícia, que para a construção do título obedeceu inclusive à regra do Livro de Estilo do PÚBLICO segundo a qual “os títulos dos textos informativos devem ser sempre inspirados no lead, o que implica o rigor deste.” E também não está em causa tal rigor, pois a ministra frequentou a escola em questão.

O problema é que os media têm pelo menos dois níveis de leitura: aquele mais imediato transmitido pelas meras palavras e um outro mais subtil (ou subliminar) que tem a ver com a disposição, o jogo e a interacção dos diversos elementos que constituem a mensagem: maquetagem, imagens, sons, títulos, sequências noticiosas, associações por proximidade, etc. Foi essa a questão que o provedor já suscitou há três semanas, a propósito de uma fotografia da zona púbica do David de Miguel Ângelo contígua a uma manchete sobre Paulo Pedroso e o caso Casa Pia, com a qual não tinha qualquer relação directa (como, já agora, esse caso também não tem a ver com o de hoje).

Dada a linguagem a que o PÚBLICO habituou os seus leitores, tender-se-á a ler neste título, ou ver nele insinuado, algo que afinal acaba por não se desvendar, o que causou o desconforto do leitor.

A notícia “Portugal não tem registo de erros de medicação que são responsáveis por sete mil mortes anuais nos EUA”, assinada por Catarina Gomes (C.G.) e inserida na pág. 6 da edição de 27 de Outubro, motivou a reclamação de um leitor anónimo por suposta troca de país: “Segundo as próprias palavras da presidente da Associação Portuguesa dos Farmacêuticos Hospitalares [APFH], numa entrevista que ouvi ontem na rádio (...), o número de sete mil mortes/ano está estimado para Portugal e não para os EUA. Aida Batista [A.B.] (...) Quando penso que, por ano, podem morrer 7000 pessoas nos hospitais por erros de medicação, gostaria que tal facto fosse, ao invés de menosprezado num exercício de péssimo jornalismo, trazido para a primeira página”.

Esclarece afinal C.G.: “As informações que o PÚBLICO veiculou são as correctas. O artigo da [agência] Lusa que deu origem a esta notícia (...) foi tendo vários desmentidos ao longo do dia. O PÚBLICO teve que voltar a falar com os implicados. A história inicial da Lusa assentava num erro: A.B. estava de facto convencida de que as sete mil mortes se referiam a Portugal. Acontece que a sua fonte eram números apresentados em 2005 pelo então vice-presidente do Infarmed, Faria Vaz [F.V.], e foram mal interpretados. Tal como o próprio disse ao PÚBLICO, e a outros órgãos, trata-se de números referentes aos EUA. Portugal não tem registos, tal como se diz na notícia, nem sequer estimativas. (...) A Lusa passou ao final da tarde já a falar de 7000 mortos internacionalmente, mas F.V. (...) esclareceu-me que os dados que divulgou são só dos EUA. O dia foi a prova de que a rapidez da informação nem sempre é amiga da verdade dos factos”. De facto

Perante as evidências, C.G. só pode ser elogiada por ter corrigido uma notícia errada – e aliás bastante alarmista para Portugal.

NOTA: A crónica do provedor não se publicará no próximo domingo.

CAIXA:
Respeito pela História

Neste mesmo canto, alertou o provedor na crónica anterior para o pouco rigor por vezes verificado na menção de factos históricos. Atente-se a esta carta da leitora Alexandra Pelúcia, sobre as informações contidas nas págs. 46/47 de 15 deste mês, que, embora de divulgação de uma iniciativa comercial do PÚBLICO, Arte de Portugal no Mundo, constituem matéria editorial:

“Considero admissível a existência de gralhas ou lapsos em qualquer género de publicação, talvez ainda mais numa de periodicidade diária (...). Talvez seja neste âmbito que se possa explicar a divulgação das datas de 1487 e de 1637 para evocar, respectivamente, a passagem do Cabo da Boa Esperança por Bartolomeu Dias e o fim da presença portuguesa no Japão, apesar de, na realidade, os referidos factos terem ocorrido nos anos de 1488 e de 1639. Conhecidos os pârametros de exigência e de qualidade do PÚBLICO, bem como a missão formativa que também o norteia, afiguram-se bem mais desconcertantes, se não preocupantes, outras afirmações veiculadas no texto e no mapa anexo. Assim, o leitor incauto ficou a saber que o descobrimento do Brasil se deveu a Vasco da Gama e não a Pedro Álvares Cabral; que a ilha de Socotorá está localizada no Golfo Pérsico e não perto do Corno de África, na zona de acesso ao Mar Vermelho; e que Afonso de Albuquerque ocupou o reino de Ormuz em 1507, quando apenas levou a cabo uma tentativa fracassada, ficando adiada a concretização desse objectivo até 1515. Em face do exposto, parece-me imperiosa a correcção dos dados junto dos leitores, e sugiro com veemência que, de futuro, seja dedicada maior atenção à redacção e à revisão final de textos, se possível por parte de alguém suficientemente credenciado na matéria.

Por último, estando longe de constituir o motivo principal desta chamada de atenção, diria que é de todo escusado o tom panegírico adoptado pelo mesmo artigo e por outros antes dedicados à mesma colecção, traduzido no uso do adjectivo ‘glorioso’ para qualificar o processo dos descobrimentos e da expansão portuguesa. A importância deste é aferida e reconhecida, objectivamente, pelos impactos profundos que ocasionou a váriados níveis. Neste sentido, tanto a História como o jornalismo deverão evitar a tentação do elogio fácil e rasgado”.

Como Bartolomeu Dias andou duas semanas sem terra à vista em fins de 1487, talvez nem o próprio saiba se passou para “o lado de lá” antes ou depois do réveillon, mas a maior parte das fontes consultadas pelo provedor inclina-se para 1487. Também é um facto que Albuquerque ocupou Ormuz em 1507, apesar de ter sido obrigado a retirar antes da conquista definitiva, oito anos depois. E o desembarque de Vasco da Gama no Brasil parece um claro lapso de quem redigiu, embora devesse ter sido objecto de rectificação em “o PÚBLICO errou”. Fica porém mais este alerta para a necessidade de respeitar o rigor histórico.

Publicada em 30 de Novembro de 2008

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR

Carta do leitor Vítor Moura:

Gostava de saber as razões que levaram o PÚBLICO a publicar uma notícia assinada pelo jornalista José António Cerejo com o título "Estado quer vender colégio da Casa Pia onde a ministra da Educação fez o curso comercial" (dia 19). Não percebi a razão do título nem percebi as razões que levaram o mesmo jornalista a referir no texto por duas vezes a frequência do referido estabelecimento de ensino pela actual ministra da Educação: “onde a ministra da Educação frequentou o Curso Comercial na década de 60” e “Nas suas instalações chegaram a estudar cerca de 500 alunos, incluindo a actual ministra Maria de Lurdes Rodrigues”.

O facto parece absolutamente irrelevante. Mas, quando um jornalista refere um facto deste tipo, em aparência irrelevante, sugere a existência de uma relação e suscita curiosidade. Será que, nas entrelinhas, se sugere que uma escola frequentada por uma ministra nunca deveria ser vendida pelo Estado? É pouco provável.

Ou será que apenas nos quer dizer que a ministra andou numa escola comercial? A notícia será um pretexto para dizer que “a ministra da Educação fez o curso comercial” como se lê no título, em vez de num colégio privado suíço? Da Casa Pia, para mais? Há uma coisa que não se pode negar: o texto é exemplar. Raramente se atinge este nível. Terá o director do PÚBLICO alguma coisa a dizer sobre ele? Não quererá felicitar publicamente o seu autor?

Vítor Moura

Explicações do jornalista José António Cerejo

Neste caso, como em muitos outros, o título escolhido é muito discutível. Confesso que sou o autor dele e que eu próprio me interroguei sobre a relevância da minha opção. Sucede que não sabia que a ministra lá tinha estudado e achei curioso o facto. É decerto um pormenor lateral à notícia, e por isso talvez não mercesse vir no título. Ao mesmo tempo, porém, fiz um raciocínio que me parece legítimo: se eu acho piada, é provável que muitos leitores achem também.
Foi apenas por isso que decidi assim, e não, como é óbvio, por uma qualquer das várias sugestões mais ou menos deslocadas do leitor. Devo aliás dizer que a referência ao curso comercial só ficou no título para o equilibrar graficamente, uma vez que não gosto de linhas penduradas e deselegantes como resultaria da expressão “Estado quer vender colégio onde andou a ministra da Educação”, ou outra semelhante e igualmente curta em palavras. Acresce que a insinuação do leitor sobre a minha suposta intenção de desvalorizar o curso comercial que a ministra fez na Casa Pia é completamente infundada, quanto mais não seja porque eu próprio fiz, e tenho muito orgulho nisso, o curso comercial na Escola Veiga Beirão, no Largo do Carmo, em Lisboa.

Já agora convém lembrar que o título das notícias mais destacadas, no modelo gráfico do PÚBLICO, é imediatamente complementado com uma “entrada” impressa em letras maiores e que, neste caso, está logo aí a dimensão do negócio que o Estado se propunha fazer. Seria melhor ter ido ai - aos 30 milhões de euros, ou aos dois conventos - buscar a ideia do título?
Admito que sim!

Mas, que diabo? É isso motivo para que o leitor se permita, ironicamente, dizer que “o texto é exemplar”, além de me fazer um processo de intenções que me deixa boaquiaberto?

Nota: as duas referências que fiz no texto à ministra não resultam de uma qualquer intenção de repisar e repetir um facto para apoucar a senhora. Resultam apenas de uma regra da minha profissão: a ideia que é resumida nas primeiras linhas da notícia (lead) dever ser (em princípio) desenvolvida ou complementada no corpo do texto. Não o fiz da melhor maneira? É bem possível! Todos os dias tento fazer melhor; Só espero que o severo leitor que assim me avalia faça o mesmo na sua profissão.

José António Cerejo

sábado, 29 de novembro de 2008

Confusão histórico-geográfica

Uma carta de um leitor anónimo, datada de 4 de Junho mas actual:

Em 8 de Abril, na pág. 13, o PÚBLICO divulgou uma notícia sobre a visita do ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, ao sultanato do Omã, que, segundo informava, era um "país do Golfo Pérsico onde são mais visíveis os traços da presença portuguesa (...), com dezenas de fortes ao longo da costa".

Porém, a realidade é bem diferente, desde logo porque o Omã NÃO É UM PAÍS DO GOLFO PÉRSICO, situando-se sim na costa do Oceano Índico da Península Arábica, e o pequeno e quase inacessível enclave do Cabo Musandam, que delimita, a sul, o Estreito de Ormuz, não justifica, de nenhuma forma, aquela designação.

Depois, porque na costa em causa os portugueses, na época em questão, apenas recensearam 11 (e não dezenas de!) fortificações, e, nesse conjunto, quatro delas – Quelba (Kalba), Libédia (Bydiyah), Corfacão (Khor Fakkan) e Doba – situam-se na costa do Índico dos Emirados Árabes Unidos, nomeadamente no Fujairah, e Mada (Mada), também encravada nesse emirado, uma pequena povoação, é considerada como fazendo parte do Omã, e, portanto, mais uma vez não é verdadeiro aquilo que foi afirmado.

O que torna inevitável a conclusão de que aquela notícia fala de Omã com tanto rigor como se falasse da Lua ou de Marte, o que não deixa de ser surpreendente, atendendo a que estamos no séc. XXI.

Por outro lado, acontece ainda que, das referidas 11 fortificações, a maior parte foi apenas ocupada pelos portugueses, e, por isso, não se trata de "fortes portugueses", mas sim de construções árabes temporariamente utilizadas pelos portugueses.

Os textos da época são bem claros e esclarecem que Curiate "fizeram mouros", Sibo era um forte "já antigo, feito pelos arábios", etc., e, na realidade, apenas as construções de Mascate são da inteira responsabilidade dos portugueses. Mas nesta cidade a diplomacia portuguesa irá chegar (quando chegar!) com inultrapassável atraso, porque em 1983 o sultão mandou demolir totalmente as muralhas que defendiam o perímetro urbano e que estavam relacionadas com a ocupação portuguesa, para as substituir por umas "novas", todas "bonitinhas" e acabadas de fazer, assim um pouco como o actual "Portão dos Varadouros" da cidade do Funchal. [A notícia fala de um "programa de inventariação, conservação e reabilitação da presença portuguesa"].

Sucedendo também que, com respeito ao património português no Omã, circula na internet o apelo de um arqueólogo (fvcastro@tamu.edu) relativamente ao espólio de navios portugueses naufragados nas costas desse país no séc. XVII, que, provavelmente, irá ser explorado por "caçadores de tesouros" com objectivos meramente comerciais.

Depois destes esclarecimentos, nota-se que o Sr. ministro dos Negócios Estrangeiros declarou com a natural pompa e circunstância: "Quero anunciar o lançamento de um programa de inventariação, conservação e reabilitação do património da presença portuguesa no Mundo". Mas parece ter esquecido que, a partir de Setembro do ano passado, a Fundação Calouste Gulbenkian iniciou um inventário com esse objectivo, sob a coordenação do historiador José Mattoso e a óbvia cooperação com o governo do Sr. ministro, e, por isso, não se percebe como é que irá surgir um novo "inventário", a não ser que a palavra seja vista em relação com a sua origem, ou seja, se trate de uma "invenção" governativa…

Além disso, vinda de um ministro dos Negócios Estrangeiros, era um bocado estranha a afirmação de que o Governo português tem um programa de "reabilitação" desse património, porque o mesmo se situa em países soberanos, e, portanto, para que seja possível fazer o que quer que seja, será primeiramente imprescindível negociar com os governos desses países, não fazendo qualquer sentido um anúncio que não tem essa realidade em conta.

Sem se pretender aprofundar afirmações que têm a ver com outro tipo de matérias, que não se dominam, não deixa de parecer estranha a afirmação de que a visita de Luís Amado seria a primeira da diplomacia portuguesa ao Omã, dado que o Presidente da República Mário Soares (só podia ser ele…) já pernoitou nesse país, na sua qualidade de Chefe de Estado português e acompanhado de numerosa comitiva nacional em representação do País.

Independentemente deste aspecto, que é totalmente marginal ao assunto que se pretendeu abordar, seria bom que a nossa comunicação social dedicasse maior atenção quanto à localização do Golfo Pérsico e aos vestígios da presença portuguesa naquela zona do globo, não sendo de mais recordar que o Barem restaurou a sua "Fortaleza Portuguesa" sem qualquer interligação com os responsáveis do nosso País e que, ainda em Dezembro do ano passado, um importante encontro internacional que aí foi realizado e onde "brilhou" essa fortaleza não teve qualquer representação nacional.

Tudo leva a crer que o ministro dos Negócios Estrangeiros não terá responsabilidade nos erros inicialmente referidos na imprensa, mas pode-se colocar a dúvida se estará devidamente informado quanto à importância dos vestígios portugueses na Península Arábica e Golfo Pérsico.

NOTA DO PROVEDOR: Eis uma boa matéria para questionar as autoridades portuguesas e pôr em causa as notícias oficiais, o que parece não ter acontecido da parte de nenhum jornalista.

domingo, 23 de novembro de 2008

Mais jovem 70 anos

Pelos vistos, fazer coisas antes de nascer está para o PÚBLICO como as abóboras gigantes para o Entroncamento. Ora vejam o que diz a edição impressa de 21 de Outubro [pág. 17, sob o título "Leilão - Francis Bacon pintado por Lucien Freud vendido por quase sete milhões"]:

"Um retrato de Francis Bacon (1909-1992) pintado pelo seu amigo Lucien Freud (n. 1992) foi vendido no domingo na Christie's de Londres por 6,97 milhões de euros. Pertencente a uma colecção privada e arrematado por um comprador não identificado, o referido retrato foi pintado em 1956/7 e é o mais recente dos dois que Freud dedicou ao seu mestre e especial amigo - o outro, pintado em 1952, foi roubado de uma exposição em Berlim, em 1988, e continua desaparecido".

Nasceu em 1992, conseguiu de chucha e fraldas ser amigo de Bacon e ainda o pintou em 1956/57 e em 1952, ou seja, várias décadas antes de nascer. Milagre, milagre!

Artur Lopes Cardoso

E Beethoven era austríaco...

Repara o leitor Augusto Küttner de Magalhães que na pág. 22 do PÚBLICO de 19 de Outubro, na notícia "Jörg Haider teve um funeral digno da princesa de Gales", se escreve: "Além do mais, chegara a elogiar a política de tabalho seguida pelo líder nazi alemão Adolph Hitler".

E comenta: "Como sabemos, Adolph Hitler, sendo chefe supremo do nacional-socialismo e consequentemente do nazismo, era austríaco, e isto é demasiado importante, dado que se tivesse sido bem aceite na Áustria como pintor talvez não viesse a ser o que foi... E ao falar-se de Jörg Haider, austríaco, mais uma razão para sublinhar: Hitler, também austríaco..."

Como alguém disse, os austríacos tiveram a capacidade para convencer o mundo de que Beethoven era austríaco e Hitler alemão. Aquela notícia terá sido apenas uma prova do sucesso da campanha.

Uma originalidade económica

A propósito da crise do sistema financeiro, notou o leitor P. Ferrão na edição de 4 de Outubro:
“Pude ler na pág. 2: ‘O Governo francês afirmou que o país está em recessão técnica nesta segunda metade do ano, após dois trimestres consecutivos com o PIB negativo.’ Sugeria ao jornalista que atentasse na frase ‘dois trimestres consecutivos com o PIB negativo’, ainda que possa tratar-se de uma transcrição da fonte. Como é óbvio, o PIB não pode ser negativo, mas, no caso, apenas a sua variação trimestral”.

O eterno retorno

Por falta de melhorias palpáveis, reincide-se num tema já abordado: os detalhes que prejudicam a imagem do jornal









Um leitor confessa que “não sabia que o urso polar representado [na camisa de Palin] era assim tão popular”





O “Bartoon” da edição do PÚBLICO de 18 de Setembro repetia-se no dia seguinte, assim como era também a mesma a crónica “A minha TV” de 20 e 21 desse mês. Nada disto é novo (a própria coluna de Jorge Mourinha já havia saído também repetida, como o provedor assinalou, em 17 e 18 de Junho). Mas, apesar das chamadas de atenção, constata-se que permanecem por aplicar os elementares sistemas de controlo que poderiam evitar estes e muitos outros lapsos reveladores de um lado mais desleixado na produção do jornal.

Uma das ocorrências mais exasperantes para os leitores são os textos que não acabam. Mesmo com os alertas já lançados acerca deste problema de resolução simples, o mal persiste. Verifiquem-se estes finais: “’O Governo conseguiu estar à altura do próprio Carlos Fragateiro na maneira como o exonerou’ com” (2 de Novembro, pág. 14); “Aqui, Cruise, gordo e calvo, interpreta um agente de” (P2, 21 de Agosto, pág. 13); “conseguiu comemorar o sucesso com um calmo jantar com” (idem); “Como Barreto é um comentador realmente independente, deveria sair da Regra do Jogo, deixando Júdice a falar sozinho com” (P2, 15 de Junho, pág. 14) “Seis horas depois a Polícia Judiciária deslocou-se ao” (1 de Maio de 2008, pág. 12).

O leitor Luís Filipe Lopes explica a frustração de se chegar ao fim de um texto e se descobrir que está incompleto: “O artigo de Jorge Almeida Fernandes publicado na edição de hoje, 10 de Agosto (P2, pág. 9), não tem conclusão: a última expressão é mas também por ’nacionalismo – sem fecho de aspas e sem ponto final. Por acaso, Almeida Fernandes é um dos poucos colaboradores que ainda me fazem comprar este jornal. Azar o meu: li o artigo e, chegado ao seu termo gráfico, fiquei a ignorar o que lhe faltava para o termo lógico (uma palavra, um parágrafo, duas páginas?). Sinto-me obviamente defraudado: comprei mercadoria deficiente, perdi o meu tempo. Vai o PÚBLICO republicar o artigo, com a conclusão do autor, ou, como tem sido hábito, nem sequer mencionar o erro?” Desta vez, as palavras em falta saíram em “O PÚBLICO errou” do dia seguinte (obrigando à aquisição de duas edições para se ler o artigo), mas o mesmo não aconteceu nos restantes casos mencionados.

Especial atenção será necessário ter também ao facto de saírem duas edições diárias do PÚBLICO, uma em Lisboa e outra no Porto, sem que por vezes a primeira página esteja articulada com distintos conteúdos na secção Local. Queixa-se Carlos Dantas Teixeira de que a chamada “Água do Alqueva contaminada por fontes poluentes”, na 1ª pág. na edição Porto de 29 de Junho, remetendo para a secção Local, remetia de facto para coisa nenhuma. Leitor interessado no assunto e antes nele envolvido, ficou na ignorância do que agora se passava (o provedor confirma que o texto vinha na edição Lisboa, o que mais uma vez obrigaria à compra de dois jornais para o ler).

Outro pormenor a ter em atenção: as legendas de fotografias. Para evitar o que aconteceu na pág. 7 do P2 de 23 de Setembro, onde a foto estava legendada do seguinte modo: “Legenda com duas linhas alinhada a uma coluna”.

A propósito de legendas, um leitor anónimo chamou a atenção para a que acompanha uma foto de Sarah Palin na pág. 16 de 24 de Outubro: ”O urso popular na camisa preserva a marca Alasca”. O leitor confessa que “não sabia que o urso polar representado era assim tão popular”.

Por falar em política norte-americana, no dia das recentes eleições presidenciais dos EUA, 4 deste mês (quando se provou que, afinal, o tal urso polar de Palin não era assim tão popular), foi perguntado a várias figuras públicas, para o destaque do PÚBLICO, o que fariam nessa noite e quais as suas espectativas, mas o depoimento de João Gil acabou por ser a reimpressão do de Joana Vasconcelos (ou terá sido o contrário?), sem que tenha havido correcção posterior.

E como estamos quanto à praga de Catual, que os leitores regulares desta crónica conhecerão, dada a denúncia que o provedor tem feito de tal pecha da comunicação pública nacional? Há sinais de que os jornalistas do PÚBLICO estarão agora um pouco mais atentos à armadilha, mas mesmo assim, numa leitura longe de ser exaustiva, foi possível detectar nos últimos meses discordãncias como estas: “Esta eleição é uma das coisas mais extraordinárias que alguma vez aconteceu na América” (frase a abrir um depoimento de Paul Auster na pág. 7 do P2 da passada segunda-feira); “Um dos lotes que irá à praça no leilão do espólio de Fernando Pessoa” (13 de Novembro, pág. 11); “Manuel Alegre parece ser dos poucos dentro do PS que continua a pensar por si” (P2, 12 de Novembro, pág. 2); “Era uma das centenas de milhares de pessoas que ali estava” (P2, 10 de Novembro, pág. 4); “Uma das estrelas que mais brilhou durante as décadas de 40 e 50 do cinema português” (“Pública”, 9 de Novembro, pág. 6); “Esta é uma das coisas que o distingue do actual Presidente” (1 de Novembro, pág. 7); “Esse foi um dos factores que fez a diferença entre Kennedy e Nixon” (27 de Setembro, pág. 3); “Nenhum dos crimes que está imputado à senhora presidente foi cometido” (11 de Setembro, pág. 8); “É um daqueles livros que tem a palavra ‘romance’ bem visível na capa” (“Ípsilon”, 29 de Setembro, pág. 2); “Um dos bombeiros que chegou ao local do acidente” (22 de Agosto, pág. 16); “Este é um daqueles casamentos que não funciona” (“Bartoon”, 19 de Agosto).

Nem estas são as únicas discordâncias regulares. Vejamos as de singular/plural, também muito frequentes: “Eles mantém a memória viva” ( título da capa do P2, 9 de Novembro); “O crescimento das cidades levaram a uma recomposição do eleitorado” (6 de Novembro, pág. 3); “A busca de soluções e de propostas para a sociedade são sempre ideológicas” (1 de Novembro, pg. 44, frase repetida no destaque do artigo); “Há quem sustente que o texto destas críticas saíram da boca do próprio Estaline” (P2, 25 de Setembro, pgs. 2/3; “disse ao PÚBLICO que os problemas levantados com a fonética dos signos foi superada” (24 de Setembro, pág. 5); “A idade avançada e os problemas de saúde dos acusados torna imprevisível o desenlace do processo” (entrada de artigo, 13 de Setembro, pág. 18); "O comediante inglês Russell Brand acabou por ser a principal atracção da entrega dos prémios da MTV, que decorreram ontem nos Estados Unidos" (PUBLICO.PT, 8 de Setembro). O provedor penaliza-se aliás por, precisamente na sua anterior crónica dedicada a este problema (23 de Agosto), ter incorrido no mesmo tipo de distracção (não corrigida na revisão) ao escrever: "Iniciativas como a deste blogue, com cidadãos, individualmente ou em grupo, constitui ainda a forma mais eficaz de regulação dos media”.

Depois há ainda outros maus tratos linguísticos que, de tanto reiterados, ameaçam passar a norma. É o caso do uso errado da palavra “solarengo” (relativo a solar, casa nobre ou senhorial) como sinónimo de “soalheiro”: “A cidade japonesa de Ota, situada num dos locais mais solarengos do país, é testemunha da aposta nas energias renováveis” (PUBLICO.PT, 11 de Novembro); “O tempo foi passando. Solarengo, queimando o pasto e levando o ganadeiro a não pagar o empréstimo” (24 de Agosto, pág. 8). E agora até temos um clamoroso desconhecimento do tratamento do verbo haver: “A disposição das ossadas mostra o cuidado de quem sepultou a família à 4600 anos” (início de artigo na pág. 21 da passada quarta-feira). Ou da correcta conjugação verbal: “O anúncio, segundo a Reuters, vem a público no dia em que blogues liberais norte-americanos terem dito que Sarah teria fingido estar grávida” (PUBLICO.PT. 1 de Setembro).

E se o rigor é de regra no texto, também o deve ser nos gráficos. Não é aceitável, por exemplo, que num mapa das matas nacionais publicado na pág. 4 da edição de 21 de Agosto, a Mata Nacional das Mestras, nas Caldas da Rainha, apareça localizada no concelho da Marinha Grande, junto a Leiria, ou que Alcobaça esteja a sul das Caldas, surgindo a sua Mata Nacional do Vimeiro perto do Bombarral. (Noutro mapa de Portugal impresso 14 páginas à frente, a propósito de um tema diferente, já surgem correctamente situadas estas localidades).

Regressou-se nesta crónica a um tema já por diversas vezes aqui abordado, o dos detalhes que prejudicam a imagem do PÚBLICO – periódico que se define como “orientado por critérios de rigor”, “numa tradição europeia de jornalismo exigente e de qualidade” (do Estatuto Editorial), mas onde muitas vezes se nota a falta do esforço extra que dê sentido a estas palavras. É a falta de melhorias palpáveis que obriga à reincidência.

A História a pente fino

O tratamento das efemérides históricas evocadas nas págs. 2/3 do P2 costuma ser detalhadamente escrutinado pelos leitores, que desmonstram especial atenção à secção. “O jornalista faz uma quase exacta síntese do que fora a batalha de Trafalgar”, escreve Luis Manuel Alvarez Garcia a propósito da menção a este evento em 21 de Outubro. “Mas a certa altura diz que ‘para chegar ao canal da Mancha, a esquadra franco-espanhola teria de atravessar o cabo de Gibraltar’. Imagino que está a querer dizer ‘estreito de Gibraltar’, porque ninguém atravessa um cabo (?). Mesmo assim, consta que a esquadra franco-espanhola estava em Cádis, a oeste do dito estreito de Gibraltar. Ou seja, só teria que atravessá-lo se fosse para a Turquia, nas antípodas da Mancha. Peço para corrigir este erro geográfico e histórico, em favor das futuras gerações!”

Também José Paulo Vieira de Andrade, dias mais tarde, considerou: “Dá a ideia de que a esquadra francesa e espanhola se dirigia para o Canal da Mancha para se iniciar um desembarque próximo. Nada mais errado, como qualquer pessoa que estude essa batalha e a situação política na Europa no início do século XIX verificará”. Mas a sua preocupação era outra, a evoção, em 24 de Outubro, da conquista de Lisboa aos mouros: “Ultrapassa os limites do aceitável. De facto, essa crónica termina afirmando que a nação portuguesa se iniciou com a conquista de Lisboa!”

Publicada em 23 de Novembro de 2008

domingo, 16 de novembro de 2008

Um drible de Cristiano Ronaldo

Não há prazo máximo a observar entre a realização de uma entrevista e a sua publicação, mas o ideal é ser tão cedo quanto possível

Um site inglês sustentou que a entrevista do PÚBLICO ao craque foi retida um mês

A entrevista foi dada à estampa pelo PÚBLICO em 7 de Agosto (manchete e págs. 2/3), houve quem dissesse que fora feita cerca de um mês antes, mas o protesto pelo suposto diferimento só chegou quase um mês depois. Em 4 de Setembro, o leitor Luís Paiva escrevia ao provedor alegando que a empresa Gestifute, que representa os interesses do futebolista Cristiano Ronaldo (C.R.), alegadamente “conseguiu fazer publicar uma entrevista” ao jogador neste jornal “apenas um mês depois de ter sido efectuada.”

Não era uma entrevista qualquer, porque o craque não se abre assim todos os dias à imprensa, mas um exclusivo com repercussões além-fronteiras, em que C.R. punha termo à incerteza quanto ao tema mais especulado no defeso do futebol europeu deste ano, anunciando que acabara de optar por permanecer no Manchester United pelo menos por mais uma temporada, apesar da insistência do Real Madrid para a sua contratação e do seu próprio desejo de jogar em Espanha. “Ficar no Manchester United não será um sacrifício mas uma honra enorme”, anunciava o jogador no título da entrevista, conduzida por Bruno Prata (B.P.).

Para sustentar o que dizia, o leitor remetia para um texto difundido, no dia a seguir à saída da entrevista, no site inglês football365.com, onde se escrevia: “Uma cuidadosa leitura da entrevista exclusiva (...) na qual C.R. anunciou a sua decisão de ficar no Manchester United indica que tanto a entrevista como a decisão datam de há cerca de um mês. No início da entrevista, (...) C.R. é citado como afirmando: ‘O meu treinador teve a amabilidade de se vir encontrar comigo há dias, em Lisboa, como já penso ser público.’ De facto, embora se desconheça a data exacta, é sabido que [Alex] Ferguson se encontrou com C.R. na segunda semana de Julho.” O artigo on-line explicava a seguir que fora Ferguson a convencer em Lisboa C.R. a ficar, especulando que o anúncio público da decisão só interessaria “na semana em que o avançado deverá regressar a Inglaterra”, como o “início de uma tentativa coreografada do lado de C.R. para ganhar de novo a confiança dos adeptos do United, que se puseram contra o seu ex-herói ao serem conhecidas as suas manobras para se desvincular de Old Trafford”. E o site dizia ainda: “Não deve ter dado muito trabalho convencer B.P. a adiar a publicação da sua entrevista exclusiva: ele é casado com Manuela Brandão, funcionária de Jorge Mendes, [dono da Gestifute e] agente de C.R.”

O leitor limitava-se a perguntar: “A que título ‘congela’ o jornal uma entrevista por um mês? E qual a relação desta matéria com o facto de o editor de desporto do jornal [cargo que B.P. já ocupou mas de que, de facto, se desvinculou há dois anos] ser casado com uma funcionária da Gestifute?”

Chegado a este ponto, o provedor entende ter a obrigação de fazer uma declaração de interesses: dirigiu nos últimos dois anos e meio um projecto editorial sobre a história do futebol em Portugal (Crónica de Ouro do Futebol Português, Círculo de Leitores, 2008) do qual B.P. foi um dos colaboradores, e cujos cinco volumes têm vindo agora a ser distribuídos. Mas julga que esta proximidade não afectará a sua capacidade de análise independente do assunto (da mesma forma que acha, aliás, para responder a uma das questões levantadas, não ser legítimo deduzir que as opções editoriais de um jornalista são automaticamente determinadas ou influenciadas pelos interesses do cônjuge).

Solicitadas as necessárias explicações, respondeu B.P.: “A notícia publicada no site inglês (...) contém um erro grave. É mentira que a entrevista tenha sido guardada na gaveta durante um mês. Um mês e meio antes da data de publicação, (...) existiu de facto uma conversa com C.R., mas acabou por ficar desactualizada e não foi utilizada. Ou seja, foi para o lixo – isso aconteceu quando Alex Ferguson utilizou um avião particular para ir a Lisboa conversar com C.R., que na altura chegou a um princípio de entendimento com o seu técnico para se manter em Inglaterra, como de resto foi noticiado nos mais diversos órgãos de informação. A realidade tinha mudado, e quem esteve atento ao arrastado ‘romance’ (...) não terá dificuldade em entender isso mesmo. Basta atentar ao facto de, um mês e meio antes, C.R. ter proferido diversas declarações públicas em que indiciava claramente a sua vontade de se transferir para o Real Madrid. Um mês e meio depois, foi combinada nova conversa, de que resultou a entrevista publicada, em que jogador explica, designadamente, por que alterou a sua posição, coisa que evidentemente não poderia ter feito se a entrevista já tivesse um mês. Estes factos sempre foram do conhecimento da Direcção do PÚBLICO, que sempre insistiu para eu não desistir definitivamente da entrevista.”

Esclarece ainda B.P.: “É verdade que a minha mulher trabalha há vários anos na Gestifute. Mas isso nunca foi segredo para ninguém. É público, inclusive, que foi ela que escreveu a biografia de C.R. [Momentos, editora Ideias & Rumos, 2007]. Retirar daí qualquer outro tipo de ilação é mais do que maldade – é pura burrice.”

O leitor justificava a sua reclamação “pelo facto de o PÚBLICO estar a ser utilizado, pela segunda vez, como veículo de uma empresa privada” – e daí só ter protestado mais tarde: “No dia em que escrevo, surge um texto em tom laudatório sobre o jogador Ricardo Quaresma [R.Q.].” Esse artigo, que o provedor detectou no PUBLICO.PT mas não na edição em papel, abria do seguinte modo: “É o último grande artista da nova geração a abandonar o futebol português. R.Q. foi uma das poucas razões para ir ao futebol em Portugal nos anos mais recentes.” Rematava o leitor: “Afinal, o PÚBLICO anda a servir os interesses de uma empresa privada? Se sim, a que título? E a credibilidade do jornal, como fica?”

B.P. afirma não ter sido o autor deste segundo texto nem saber de quem se trata (o artigo não está assinado): “De facto, ele deve ter sido publicado nas minhas folgas, e nem sequer o li ainda.” E alega em sua defesa: “R.Q. é um jogador representado pelo empresário Jorge Mendes a exemplo de tantos outros. Nos meus textos, já disse bem das exibições de uns e mal das de outros. Isso já aconteceu, em diferentes jogos naturalmente, relativamente ao próprio R.Q., como é normal, sendo uma tremenda maldade e falsidade tentar fazer crer que as minhas opiniões variam em função do representante de cada jogador. A prova disso é que fui dos mais acérrimos críticos de Luiz Felipe Scolari durante a sua passagem pelo futebol português. Para quem não sabe, o ex-seleccionador nacional é representado por Jorge Mendes, de quem sou (e pretendo continuar a ser) amigo desde os tempos em que ele ainda estava longe de ser um empresário de sucesso no mundo do futebol.”

Não está estabelecido um prazo máximo a observar entre a realização de uma entrevista e a sua publicação, o que depende do critério editorial do respectivo órgão de informação. Mas é claro que o ideal é que a sua difusão se realize com a máxima brevidade possível, por uma questão de actualidade. No caso vertente, desconhece-se se a tal “conversa com C.R.” que B.P. teve mês e meio antes se destinava a ser publicada em forma de entrevista e, se sim, as razões por que não o foi logo. Mas é compreensível, do ponto de vista editorial, que se uma entrevista é ultrapassada pela evolução dos factos a sua publicação pode deixar de fazer sentido, e terá se ser posta de parte ou repetida. De alguma forma, é o que parece ter aqui acontecido com C.R,, pelo que o provedor não encontra fundamentos para criticar a conduta editorial do PÚBLICO neste episódio.

CAIXA:

Casos da semana

Para ilustrar a manchete de domingo passado, sobre a manifestação de professores na véspera em Lisboa, os editores do PÚBLICO escolheram, como a grande fotografia de primeira página, a imagem de... um microfone. É certo que atrás, desfocadas, sem se perceber o que representavam, se via uma meia-dúzia das bandeiras desfraldadas no desfile. Mas em grande plano, para onde convergia todo o olhar, a única coisa em evidência era mesmo o tal artefacto electrónico. A mensagem perdia-se por ela própria, mas sobretudo se comparada com a da capa do mesmo dia do concorrente mais directo do jornal, o Diário de Notícias, mostrando em perspectiva, na Avenida da Liberdade, os 120 mil professores que terão tomado parte no evento. O provedor gostaria de saber que informação pretendia transmitir aos leitores o responsável por aquela opção.

Já que se fala do matutino que disputa idêntico terreno ao PÚBLICO, faz-se aqui uma correcção ao que este jornal noticiou na pág. 8 do P2 da passada quarta-feira, a propósito da visita a Portugal de Daniel Okrent, primeiro provedor do New York Times (não, não é Matusalém: apesar de este jornal ter sido fundado em 1851, só admitiu a figura do provedor do leitor em 2003): “Amanhã, vai a Coimbra para também apresentar o seu livro, juntamente com o provedor dos leitores do Diário de Notícias, José Carlos Abrantes”. José Carlos Abrantes findou o seu mandato no DN em Julho de 2007, tendo-lhe sucedido Mário Bettencourt Resendes, actual detentor do cargo. O provedor aguardou por uma rectificação em “O PÚBLICO errou”, que porém nunca chegou.

Publicada em 16 de Novembro de 2008

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR

Carta do leitor Luís Paiva

Escrevo esta reclamação pelo facto de o PÚBLICO estar a ser utilizado, pela segunda vez, como veículo de uma empresa privada.

Refiro-me em concreto à Gestifute, que conseguiu fazer publicar uma entrevista a Cristiano Ronaldo nesse jornal apenas um mês depois de ter sido efectuada.

A história é contada com mais desenvolvimento aqui.

A que título "congela" o jornal uma entrevista por um mês? E qual a relação
desta matéria com o facto de o editor de desporto do jornal ser casado com
uma funcionária da Gestifute?

E no dia em que escrevo, surge um texto em tom laudatório do jogador Ricardo Quaresma.

Afinal, o PÚBLICO anda a servir os interesses de uma empresa privada? Se sim, a que título? E a credibilidade do jornal, como fica?

Luís Paiva

Explicações do jornalista Bruno Prata

A notícia publicada no site inglês a que se refere o leitor contém um erro grave. É mentira que a entrevista tenha sido guardada na gaveta durante um mês. Um mês e meio antes da data de publicação da entrevista no PÚBLICO existiu, de facto, uma conversa com o futebolista Cristiano Ronaldo, mas a mesma acabou por ficar desactualizada e não foi utilizada. Ou seja, foi para o lixo – isso aconteceu quando Alex Ferguson utilizou um avião particular para ir a Lisboa conversar com Ronaldo, que na altura chegou a um princípio de entendimento com o seu técnico para se manter em Inglaterra, como de resto foi noticiado nos mais diversos órgãos de informação. A realidade tinha mudado, e quem esteve atento ao arrastado “romance” relacionado com a possibilidade de Ronaldo se mudar do Manchester United para o Real Madrid não terá dificuldade em entender isso mesmo. Basta atentar ao facto de, um mês e meio antes, Ronaldo ter proferido diversas declarações públicas em que indiciava claramente a sua vontade de se transferir para o Real Madrid.

Um mês e meio depois, foi combinada nova conversa, de que resultou a entrevista publicada, em que o jogador explica, designadamente, por que alterou a sua posição, coisa que evidentemente não poderia ter feito se a entrevista já tivesse um mês. Estes factos sempre foram do conhecimento da Direcção do Público, que sempre insistiu para eu não desistir definitivamente da entrevista. O Provedor do leitor do PÚBLICO poderá confirmar estes factos, designadamente, com o director-adjunto Manuel Carvalho. Não são da minha responsabilidade, naturalmente, as fugas de informações para o exterior do jornal, mais a mais sendo elas erróneas e/ou maldosas, mesmo que misturadas com meias verdades. Também não vou perder tempo a comentá-las.

Sobre a notícia relativa a Ricardo Quaresma, não fui o autor do referido texto. Não sei sequer quem o escreveu. De facto, ele deve ter sido publicado nas minhas folgas, e nem sequer o li ainda.

De resto, Quaresma é um jogador representado pelo empresário Jorge Mendes a exemplo de tantos outros. Nos meus textos, já disse bem das exibições de uns e mal das de outros. Isso já aconteceu, em diferentes jogos naturalmente, relativamente ao próprio Quaresma, como é normal, sendo uma tremenda maldade e falsidade tentar fazer crer que as minhas opiniões variam em função do representante de cada jogador. A prova disso é que fui dos mais acérrimos críticos do treinador Luiz Felipe Scolari durante a sua passagem pelo futebol português. Para quem não sabe, o ex-seleccionador nacional é representado por Jorge Mendes, de quem sou (e pretendo continuar a ser) amigo desde os tempos em que ele ainda estava longe de ser um empresário de sucesso no mundo do futebol. Poderia acrescentar diversos outros exemplos.

Aproveito ainda para esclarecer que já não edito o desporto do PÚBLICO há cerca de dois anos. Desde aí, não tenho (nem pretendo vir a ter) quaisquer responsabilidades ou intervenções sobre a edição ou sobre os temas abordados no jornal, com excepção obviamente dos meus próprios trabalhos.

É verdade que a minha mulher trabalha há vários anos na Gestifute. Mas isso nunca foi segredo para ninguém. É público, inclusive, que foi ela que escreveu a biografia de Cristiano Ronaldo. Retirar daí qualquer outro tipo de ilação é mais do que maldade. É pura burrice.

Bruno Prata

domingo, 9 de novembro de 2008

Os limites da decência

Alguns leitores sentem-se chocados por certos “monólogos” da vagina... e do pénis surgidos no PÚBLICO. Até onde deve ir o jornal?


Ninguém se escandalizaria se a pág. 1 do PÚBLICO de 3 de Setembro inserisse a fotografia frontal do David de Miguel Ângelo mostrando toda a figura na sua esplendorosa nudez. Mas os editores optaram por seleccionar apenas a genitália, ampliando-a à largura total da capa. “Espero que na capa do PÚBLICO seja hoje publicado o quadro de [Gustave] Courbet L’Origine du monde [A origem do mundo], desafiou logo a seguir a incomodada leitora Stella Gaspar da Silva, que para não restarem dúvidas anexava uma reprodução da obra do pintor realista francês (e cujo desejo fica aqui satisfeito).

Claro que a fotografia não era de actualidade (pode estar o mundo descansado: nada aconteceu à escultura orgulhosamente guardada por Florença), mas apenas ilustrativa, acompanhando o título “Instabilidade amorosa dos homens é genética, diz novo estudo sueco”, que remetia para o interior. Insinuando haver na escolha uma agressiva afirmação de domínio masculino (embora o provedor julgue saber que a opção foi de uma editora), Stella Gaspar da Silva especula sobre a notícia que deveria acompanhar a pintura de Courbet: “Sugiro: ‘Não foi descoberto nenhum gene que leve compulsivamente a mulher a arrumar a cozinha – e pur si muove, isto é, arruma-a.’ Quanto a mim, fiquei feliz de saber que foi cientificamente provado que é por um puro e exacto movimento pré-determinado pelo ADN que os homens arfam até à exaustão do orgasmo tendo previamente ‘escolhido/sido obrigados a escolher’ (mas isso é outra descoberta mais antiga) a fêmea que mais feromonas deixa como rasto”.

Mas para a leitora não era esse o problema de fundo: “Outra questão seria saber se também é compulsiva a escolha do que é realmente relevante para pôr na 1ª pág. de um jornal (...). Vocês lá sabem o que merecem, mesmo que compulsivamente...” E não desarmava: “Não é o vosso Livro de Estilo que diz que não se deve retirar do contexto uma frase de um entrevistado? Deviam saber que também se não deve retirar um pormenor de um quadro – se potencialmente é ofensivo para quem o disse também o pode ser para quem o pintou. E de certeza há por aí na redacção homens que ficariam felizes de ver publicado na 1ª pág. o seu ‘mais que tudo’, digo o seu (deles) pénis. Com ou sem identificação...”

Estando sob uma manchete que dizia “Prisão de Paulo Pedroso obriga Estado a pagar a maior indemnização de sempre”, a imagem poderia ainda, adicionalmente, suscitar uma leitura mais perversa, que não escapou a A.J.M. Quintela: “É uma capa que gerou alguma confusão, porque a fotografia é imediatamente ligada a Paulo Pedroso. No dia em que foi publicada pareceu-me uma infeliz coincidência. Ao ler o editorial do dia seguinte e constatar nova referência a Paulo Pedroso, concluí que a capa nada tinha de ingénuo e foi pensada para associar e chamar”. (Aqui já pareceu ao provedor descabida a ligação, mas no primeiro dia teria sido de facto preferível evitar o que, na hipótese mais benigna, não terá passado de coincidência).

Combinar pudor e liberdade de expressão é uma circunstância inerente à civilização. O alargamento dessa liberdade tem sido conquistado em grande parte por protagonistas que ousam romper as barreiras normativamente impostas em cada época, desde o Marquês de Sade aos casos clássicos do século XX envolvendo por exemplo Ulysses, de James Joyce, O Amante de Lady Chatterley, de D. H. Lawrence, ou Lolita, de Vladimir Nabokov.

Numa sociedade aberta como a portuguesa, onde o valor da liberdade de expressão e informação está constitucionalmente salvaguardado, os órgãos de informação não estão sujeitos a esse tipo de constrangimentos policiais ou judiciais (no caso sobre os órgãos sexuais), devendo decidir por eles próprios, em função da relação com a sua audiência, quais os parâmetros que, nesse campo, limitam a matéria que editam. Tais parâmetros variam de um meio de comunicação para outro, embora na maior parte (como no PÚBLICO) não estejam definidos e sejam deixados à sensibilidade dos editores do momento.

Uma vez por outra, haverá um leitor deste jornal a sentir-se ofendido por achar que se pisou ou foi ultrapassado o risco. Já fora o caso de António Cândido Miguéis, que reclamou acerca do título da capa de 17 de Maio “Gays: Lisboa já tem um clube privado de sexo”, abordado pelo provedor na sua crónica de 8 de Junho. Outros protestos têm entretando sido recebidos.

A mesma Stella Gaspar da Silva haveria de reclamar de novo contra as fotos publicadas quase um mês depois na reportagem “O Lux de pernas abertas” (págs. 8/9 do P2 de 1 de Outubro), sobre a celebração do 10º aniversário da abertura daquele bar lisboeta, e onde se via os convivas a entrarem nas suas instalações através de uma gigantesca vagina simulada na porta, com as correspondentes pernas estendidas para o meio da rua (não, o strip-tease fotografado por João Cutileiro e surgido na pág. 1 do dia seguinte não motivou qualquer objecção). “Nada me move contra a exposição da genitália, quer masculina quer feminina, considerando ambas tão válidas quanto o rosto daqueles a que pertencem... quiçá até mais reveladoras”, reincidia a leitora. “Mas considero que como notícia de 1ª página [que não era neste caso, para descanso dos guardiães dos bons costumes], é esta mais típica dos jornais grátis com que nos inundam – só que por estes não pagamos!”

A leitora enviou mesmo um e-mail a jornalistas do PÚBLICO onde escrevia: “A pergunta que fica não é se no público em geral e no PÚBLICO em particular há uma clara obsessão voyeurista/exibicionista (claro que há), mas sim se não há uma certa confusão entre o que é um jornal de referência e uma revista tipo Caras. É que a Caras eu não compro e o PÚBLICO... acho que vou deixar de comprar”. (Seguiam-se alguns termos e considerandos impublicáveis, mesmo numa perspectiva muito tolerante).

Também o leitor António Coelho se sentiu chocado, não propriamente pelos monólogos fotográficos da vagina: “Não acho digno de um jornal ‘normal’ essa publicidade descarada a um bar que faz 10 anos... Não pretendendo que cada noticia que vem no PÚBLICO me interesse, acho no entanto descarado que me façam pagar um jornal onde há duas páginas de publicidade camuflada em conteúdo redactorial. Se pago tenho o direito de encontrar notícias que tenham passado o (já muito ténue) filtro da deontologia da profissão de jornalista. Sendo as duas páginas da noticia tão estranhas, li até ao fim, e fiquei a saber [de] uma nova entrada para o bar... uma vagina! (...) Senti-me enganado. Se é para vender, então deixem de pretender ser jornal de referência, e assim não há mal-entendidos. Por mim sei o que farei: passo a agarrar nos jornais gratuitos – eles são honestos (...) e nós, leitores, sabemos qual é a linha: vender cérebros abertos à publicidade”.

Outra matéria a suscitar protestos foi o artigo "Não preciso de ter um pénis para ser um homem", publicado (com foto explicitamente demonstrativa da afirmação) nas págs. 4/5 do P2 de 23 de Setembro, incluindo chamada na pág. 1 com o mesmo título. Paulo Nuno Magalhães expressou o seu “vivo repúdio” por esta “entrevista feita por telefone a uma estrela do cinema porno (...), que, ficamos a saber, era há 15 anos uma mulher, hoje é um homem, se bem que não operado”. Pormenoriza o leitor: “Para além do duvidoso interesse da matéria em causa, e do relevo que esta teve nas páginas de um jornal de referência, chocou-me vivamente a fotografia. (...) A crueza pornográfica desta é em si mesma de uma violência estética e mau gosto intrínseco que não esperava ver nas páginas do PÚBLICO.”

Acrescentou José Maria Eça de Queiroz (julga o provedor que não o próprio autor de Os Maias comunicando do além-túmulo) sobre o “infelicíssimo artigo”, que lhe criou “dúvidas sérias” quanto a “manter a fidelidade ao jornal”: “Não sou tão conservador que não aceite não só essa profissão como a aberração do senhor barbudo que exibe orgulhosamente uma vagina (...).

Uma coisa é certa: a fotografia de grande formato (...), para lá de um mau gosto patente, é realmente pornográfica no pior sentido (...). Na minha inocência de cidadão mediano sempre achei que este tipo de notícia era veiculada pelo inominável Jornal do Incrível, com o qual nunca gastei um centavo. (...) Mera ilusão, como o vosso jornal me provou.”

Ao provedor não compete fazer julgamentos na matéria (que seriam uma interferência na liberdade de publicar por parte do jornal), menos ainda elaborar normas. Quando muito, apenas definir os termos da equação que aqui se coloca. Sendo que a liberdade nunca é total, pois implica responsabilidade, e portanto limites, importa que os responsáveis do PÚBLICO possuam um entendimento sobre um tema acerca do qual o Livro de Estilo é omisso. O critério é subjectivo e tem a ver com muitos factores: relação com os leitores, sensibilidade do público, valores morais, bom gosto, etc. Romper barreiras será positivo, alienar leitores nem tanto.

CAIXA:
As costas largas da ex-ministra

A manchete "Falta de dinheiro e de funcionários está a asfixiar a rede de museus”, da edição de 6 de Outubro, com o respectivo destaque inserido nas págs. 2-5, suscitou a Manuel Pais um comentário: “Não me parece nem curial nem esclarecedor do objecto da notícia que, no decurso de uma reportagem que mereceu uma cuidada preparação (...), não tenha sido incluída nenhuma declaração do actual ministro da Cultura [José António Pinto Ribeiro] ou do seu gabinete (...). Tanto mais estranho quanto a figura do responsável máximo da tutela surge com uma referência – com fotografia! – à anterior responsável [Isabel Pires de Lima] – passados cerca de nove meses. Confunde-me o fundamento da decisão: nove meses é pouco tempo para dispensar a referência à anterior responsável e é, simultaneamente, pouco tempo para responsabilizar o actual ministro?”

Explica a jornalista Alexandra Prado Coelho, responsável pelo trabalho: “Contactámos o gabinete do ministro da Cultura, mas o seu assessor disse-nos que, sobre o assunto, devíamos falar com o director do Instituto dos Museus e da Conservação, Manuel Bairrão Oleiro”.

É claro que a recusa do actual ministro em prestar declarações não deve impedir a publicação do trabalho jornalístico, mas há pertinência nas palavras do leitor quando observa que são atiradas responsabilidades para quem já saiu em Janeiro do cargo, poupando-se o seu sucessor até de ser referido num dossiê tão completo.

Publicada em 9 de Novembro de 2008


DOCUMENTAÇÂO COMPLEMENTAR

Carta do leitor António Coelho:

Não acho digno de um jornal "normal" essa publicidade descarada a um bar que faz 10anos...

Ficámos enfim a saber que esse tal Lux-Frágil faz dez anos. Não pretendendo que cada noticia que vem no PÚBLICO me interesse, acho no entanto descarado que me façam pagar um jornal onde há duas páginas de publicidade camuflada em conteúdo redactorial. Se pago tenho o direito de encontrar noticias que tenham passado o (já muito ténue) filtro da deontologia da profissão de jornalista. Sendo as duas (2)páginas da noticia tão estranhas, li até ao fim, e fiquei a saber que a putativa Fernanda e a putativa Rosalina tinham encontrado o putativo Rui e o que é que ele nos tinha preparado? Uma surpresa - uma nova entrada para o bar... uma vagina! (os nomes devem ser outros mas já os esqueci). Será que é um exercício literário demasiado evoluído para a minha compreensão? Depois de ter lido fiquei com a impressão de só ter lido um monte de disparates/merdas onde falavam de pessoas sem interesse e só conhecidas dos iniciados (ou deveria dizer introduzidos?) membros duma sociedade onde reina a vacuidade, onde a aparência varreu o ser.

Senti-me enganado. Se é para vender então deixem de pretender ser jornal de referência e assim não há mal entendidos. Por mim sei o que farei: passo a agarrar nos jornais gratuitos - eles são honestos e não há mal-entendidos - dizem claramente o que são e nós leitores sabemos qual é a linha: vender cérebros abertos à publicidade.

António Coelho

Carta do leitor Paulo Nuno Magalhães:

Venho por este meio, como fidelísssimo leitor do PÚBLICO desde a primeira hora, expressar o meu vivo repúdio pelo texto contido no suplemento P2 da passada terça-feira, dia 23 de Setembro.

O trabalho em questão - com chamada de primeira página com o sugestivo título de "Não preciso de ter um pénis para ser um homem" - consiste numa entrevista feita por telefone a uma estrela do cinema porno radicada no Canadá, estrela essa que, ficamos a saber, era há 15 anos uma mulher, hoje é um homem, se bem que não operado. A filmografia deste senhor consta, ao que percebi, das propostas da edição deste ano do Festival de Cinema Gay e Lésbico.

Para além do duvidoso interesse da matéria em causa, e do relevo que esta teve nas páginas de um jornal de referência, chocou-me vivamente a fotografia ilustrativa do dito artigo. A crueza pornográfica desta é em si mesma de tal violencia estética e mau gosto intrínseco que, como calcula, não esperava ver nas páginas do PÚBLICO.

Paulo Nuno Magalhães

Carta do leitor José Maria Eça de Queiroz

Sou um leitor diário, e fiel, do vosso jornal, e, embora possa discordar aqui ou ali de algumas opções editoriais, nunca deixei de o adquirir (e ler) religiosamente todos os dias.

Barafustei a nível íntímo aquando da mudança de imagem e criação do P2, mas continuei a ser um fiel leitor. Hoje, porém, criei dúvidas sérias se devo ou não continuar a manter a fidelidade ao jornal.

Falo de um infelicíssimo artigo levado à estampa no P2 com chamada à primeira página: "Não preciso de um pénis para ser homem", afirma uma criatura que dá pelo nome de Buck Angel e é apresentada como pornógrafo profissional.

Não sou tão conservador que não aceite não só esta profissão bem como a aberração do senhor barbudo que exibe orgulhosamente uma vagina: é com ele, mas certamente que não é comigo!

Em primeiro lugar, pergunto-me da real importância do Festival de Cinema Gay e Lésbico de Lisboa. Serão assim tantos? Justifica um noticiário tão sensacionalista?
Uma coisa é certa: a fotografia de grande formato que ilustra o texto acerca do referido senhor(?)/senhora(?), ou lá que raio é aquilo, é para lá de um mau gosto patente, é realmenmte pornográfica no pior sentido do termo.

No principio do sec. XX havia os chamados "Circos dos Horrores", que apresentavam os aleijões mais informes com o intuito de ganhar dinheiro, nos quais nunca faltava a "Mulher Barbada", que, tal com o o especimen que hoje vocês exibem tão orgulhosamente, não passava de uma aberração tal como o bezerro de duas cabeças, apenas tinha mais decoro e não mostrava a vagina como se de um troféu se tratasse.

Na minha inocência de cidadão mediano, sempre achei que este tipo de notícia era veículada pelo inominável Jornal do Incrível, com o qual nunca gastei um centavo, e sempre tive a ideia peregrina de que a chamada imprensa de referência não embarcava neste tipo de sensacionalismo.

Mera ilusão, como o vosso jornal me provou hoje.

Tenho gasto com prazer 90 centimos por dia; no entanto a partir de hoje fico na dúvida se realmente valerá a pena, pois para matérias como a que foi publicada, e com o destaque com que o foi, na minha apreciação a vossa publicação desceu mais que a bolsa de valores neste conturbados tempos.

Tenho realmente pena que uma Direcção Editorial responsável tenha dado lugar à irresponsabiliodade de deixar publicar uma matéria de tão mau gosto e de interesse mais do que duvidoso.

Que fique bem patente o meu protesto, o qual tem o peso e valor de um leitor fiel desde o primeiro numero do vosso jornal.

José Maria Eça de Queiroz

Carta do leitor Manuel Pais:

Na sua edição do dia 6 de Outubro passado, o jornal apresenta uma notícia em destaque na 1º página com o título "Falta de dinheiro e de funcionários está a asfixiar a rede de museus”. O mesmo assunto é destacado nas páginas 2 a 5. Aparece assinado por Alexandra Prado Coelho, com Sérgio C. Andrade e Vanessa Rato.

Não me parece nem curial nem esclarecedor do objecto da notícia que, no decurso de uma reportagem que mereceu uma cuidada preparação - elaboração de um inquérito, o seu envio a 34 museus portugueses e respectivo tratamento; mobilização de três jornalistas seniores; início da fase das entrevistas há, pelo menos, "perto de duas semanas" (p. 4); transcrição de declarações de seis directores de museus nacionais, de uma ex-directora e de um director-adjunto de um museu privado -, não tenha sido incluída nenhuma declaração do actual ministro da Cultura ou do seu gabinete, como se o responsável máximo fosse o director do Instituto dos Museus e da Conservação.

Tanto mais estranho quanto a figura do responsável máximo da tutela - o ministro - surge no decurso da notícia com uma referência - com fotografia! - à anterior responsável - passados cerca de nove meses. Confunde-me o fundamento da decisão: nove meses é pouco tempo para dispensar a referência à anterior responsável e é, simultaneamente, pouco tempo para responsabilizar o actual ministro?

Manuel Pais

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

A fonte do mal

Repesca-se aqui um dos casos que ficaram para trás, a propósito de uma notícia sobre um documentário que punha em causa as explicações mais consensuais para o actual aquecimento global:

Leio no PÚBLICO de hoje, 22 de Julho de 2008, na pág. 13, numa peça intitulada «Crítica a Gore condenada no Reino Unido», assinada por Joana Azevedo Viana, o seguinte:

"Mas, cientificamente, esta corrente está desacreditada. Tem-se provado que muitos do que a defendem são financiados por grandes empresas petrolíferas".

A corrente que a jornalista considera desacreditada é, segundo ela, que "[O autor do documentário, Martin] Durkin, (...) defende que os efeitos do aquecimento global não são mais do que movimentos de equilíbrio que se repetem de milhares em milhares de anos".

Esquecendo a confusão do texto demonstrativa da pouca segurança com que a jornalista escreve sobre um tema de real importância, saliento aquilo que pode ser considerado uma difamação: "são financiados por grandes empresas petrolíferas", além da frase "cientificamente, esta corrente está desacreditada".

A este propósito escrevi, recentemente, o seguinte texto que se pode ler na íntegra no link http://mitos-climaticos.blogspot.com/2008/07/explicaes-oficiais-confusas.html: "Para concluir, a citação abaixo destina-se àqueles - alguns intitulando-se cientistas ou investigadores - que se referem ao som das caixas registadoras a tilintar com a entrada de dinheiro pago pelas petrolíferas e que estão a esquecer-se muito convenientemente do dinheiro que, à custa dos contribuintes, recebem de políticos ignorantes. Global Warming defenders always follow three methods: a) Never discuss scientific facts, every time these are not in their favour; b) Ignore or marginalize opposition; c) If that does not work attack opponents in persona and try to smear them with everything you've got - ad hominem attacks."

Ou seja, os defensores de uma tese, essa sim, refutável difamam os oponentes com o objectivo de condicionar o cérebro do cidadão comum para que este nem pense que possa haver quem demonstre cientificamente (aqui sim, aplica-se esta palavra!) que eles estão errados.

Deste modo, solicito que indague junto da referida jornalista para obter respostas às seguintes questões:

1) Como é que ela prova que, "cientificamente, esta corrente está desacreditada". Cientificamente? Onde é que ela viu essa prova?

2) Como é que ela demonstra que "tem-se provado que muitos do que a defendem são financiados por grandes empresas petrolíferas." Tem-se provado? Onde é que ela viu essa prova?

Claro que estes desvios em relação a um jornalismo que se pretende sério são possíveis pela falta de abertura do PÚBLICO ao debate sobre este tema de grande relevância. Se tal não acontecesse, a jornalista provavelmente não escreveria o que escreveu. Ela própria pode ser vítima de uma propaganda sem contraditório.

Aproveito a ocasião para sugerir que o PÚBLICO diga a verdade aos seus leitores escrevendo um artigo apoiado no seguinte texto que indico no link:

http://mitos-climaticos.blogspot.com/2008/07/dramtica-confisso-e-em-portugal.html

Rui G. Moura

Resposta da editora Clara Viana, da secção Mundo:

Fui eu que editei a notícia da Joana Azevedo Viana e inseri algumas informações que a tornam mais afirmativa. Infelizmente, era uma notícia pequena, e o tema exigiria talvez mais espaço para se poder explicar o que estava em causa. Assim, não foi possível citar todas as fontes que seria desejável citar, para esclarecer o mais possível os leitores, como seria desejável. No entanto, essas fontes estão amplamente disponíveis, e o PÚBLICO tem noticiado muitos estudos e tendências relevantes ao longo dos anos.

Mando em attachment alguns documentos [não inseridos aqui] que não poderiam ser publicados na íntegra, nem amplamente citados nesta resposta, que pretende apenas ser um apanhado tão incisivo quanto possível do que está em causa. Remeto também para a edição actual da Columbia Jouralism Review (http://www.cjr.org/the_observatory/quashing_climate_dissent.php ), onde se pode encontrar um artigo, um editorial e um comentário desencadeado por um articulista de outra revista, a Slate, precisamente sobre os problemas e desafios de escrever sobre o clima, e que espaço dar aos dissidentes do consenso científico em torno do aquecimento global e das alterações climáticas.

O responsável pela secção de documentários do Channel 4 britânico, Hamish Mykura, é citado pelo jornal The Guardian de 21 de Junho dizendo que o documentário de Martin Durkin foi encomendado "para apresentar o ponto de vista da pequena minoria de cientistas que não acredita que o aquecimento global é causado pela produção de dióxido de carbono de origem antropogénica" [produzido pelo homem]. O organismo regulador do audiovisual britânico concluiu que no documentário o Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), um grupo de milhares de cientistas que trabalham sob a égide da ONU para avaliar o que está a acontecer em termos de aquecimento global e do seu impacto no planeta, "foi tratado de uma forma injusta", bem como o antigo conselheiro para a ciência do Reino Unido, David King, e outro cientista, Carl Wunsch. "O programa fez algumas alegações significativas sem oferecer hipóteses apropriadas e oportunas de resposta", diz o organismo regulador, concluindo que o Channel 4, com a exibição do documentário "The Great Global Warming Swindle", quebrou as regras de imparcialidade em temas "de grande importância política e industrial num tema importante que está em discussão em termos de políticas públicas".

Portanto, o parecer do organismo regulador britânico que é o objecto da notícia e as declarações de responsáveis do Channel 4 reconhecem que o documentário representava uma visão minoritária na comunidade científica. O consenso científico é obtido através da discussão dos melhores especialistas nas várias ciências implicadas no aquecimento global e nas alterações climáticas - nomeadamente, sob a égide do IPCC.
Remeto o leitor para os últimos relatórios do IPC. Foram divulgados em 2007 e estão disponíveis no site www.ippc.ch para download. Recordo também que o IPCC foi agraciado com o Prémio Nobel da Paz de 2007, como reconhecimento da importância do seu trabalho, juntamente com Al Gore, pelo seu trabalho de divulgação e alerta para as alterações climáticas.

O trabalho do IPCC tem sido amplamente divulgado nos meios de comunicação social de todo o mundo, e igualmente no PÚBLICO.

Por outro lado, e isto entronca também com a segunda questão colocada pelo leitor, há bastante investigação e documentação sobre as tácticas usadas pelos cépticos do clima para tentarem desacreditar a ciência (envio documentação em anexo que fala disto [também não inserida aqui]), sobretudo nos Estados Unidos. Assemelham-se aos meios usados por outras correntes de negação da investigação científica, como os criacionistas, que não aceitam a teoria da evolução através da selecção natural, ou até as tácticas usadas pela indústria tabaqueira para, durante anos, negar os efeitos funestos do tabaco sobre a saúde. Por exemplo, um dos lemas dos criacionistas nos EUA é "ensine-se a polémica" nas escolas, quando não há qualquer polémica nem qualquer dúvida entre os biólogos de que a teoria da evolução é a melhor explicação para o que se vê na natureza. Digo a "melhor explicação" e não a explicação definitiva, porque a ciência é assim mesmo: não tem explicações definitivas ou dogmáticas, o consenso científico vai evoluindo, em torno das hipóteses e explicações que melhor descrevem a realidade.

Concretamente quanto à acusação de que muitos dos que defendem o cepticismo sobre o clima são financiados por grandes empresas, remeto o leitor para o relatório da Union of Concerned Scientists sobre o tema, e também para as investigações levadas a cabo nos EUA sobre a interferência na redacção de relatórios sobre temas ambientais (nomeadamente as alterações climáticas) feitas por elementos da administração Bush ligados à indústria petrolífera. Em causa estão, por exemplo, relatórios da Agência de Protecção Ambiental (EPA na sigla em inglês) e dos Centros de Controlo e Prevenção das Doenças (CDC). Estes casos tiveram ampla cobertura nos melhores jornais norte-americanos, como The New York Times e The Washington Post, por exemplo, ou até nas secções de notícias das mais prestigiadas revistas científicas, como a Nature e a Science.

Clara Barata

NOTA DO PROVEDOR. Podendo haver fundamento no que afirma a editora do PÚBLICO, a notícia em causa, na passagem que deu origem à reclamação ("Mas, cientificamente, esta corrente está desacreditada. Tem-se provado que muitos do que a defendem são financiados por grandes empresas petrolíferas."), não cumpre uma das disposições do Livro de Estilo do jornal: a menção das respectivas fontes. Dado, para mais, que se trata de matéria polémica (e que pelo menos a primeira frase é de natureza opinativa, o que segundo o Livro de Estilo implica identificação da fonte), a qual não foi obtida sob garantia de confidencialidade, seria forçoso que a notícia informasse qual a sua origem.

domingo, 2 de novembro de 2008

Ter assento e ter assunto

Há e haverá sempre gente a queixar-se de que o partido da sua preferência não foi tratado de forma equilibrada


Podia a imprensa alemã prever a carreira de Hitler quando ignorou os seus primeiros comícios?



Duas reclamações sucessivas da assessora de imprensa de “Os Verdes”, Maria Luis Nunes, foram recebidas pelo provedor nos dias 14 e 15 de Outubro. O tema era comum a ambas: o PÚBLICO ignora as posições deste partido. Por outras palavras, “Os Verdes” serão para este jornal um partido com assento parlamentar mas sem assunto para noticiar.

A primeira reclamação referia-se à notícia desse dia sobre uma série de audiências dos partidos parlamentares com o primeiro-ministro a propósito do então iminente Conselho Europeu para enfrentar a crise financeira mundial. Constatou Maria Luis Nunes que o jornal citou “as declarações feitas por todos eles (os da oposição), à excepção das de ‘Os Verdes’ (...), passando ao leitor do PÚBLICO a ideia de que apenas existem quatro partidos políticos da oposição com assento parlamentar”. A assessora indica a razão pela qual acha que as palavras dos seus dirigentes também deviam ser mencionadas: “No estatuto editorial do jornal pode ler-se que o ‘PÚBLICO é um jornal diário de grande informação, orientado por critérios de rigor e criatividade editorial, sem qualquer dependência de ordem ideológica, política e económica’”. E conclui: “’Os Verdes’ esperam que aquele rigor seja aplicado de forma escrupulosa, de modo a evitar que ‘desinformações’ como a descrita acima voltem a ocorrer”.

O protesto seguinte foi motivado pela cobertura da entrega do Orçamento de Estado à Assembleia da República: “Dá-se destaque às reacções dos representantes dos partidos da oposição com assento parlamentar, mas, incompreensivelmente, as declarações da deputada Heloísa Apolónia, proferidas neste âmbito (...), foram omitidas”. Para Maria Luis Nunes, “mais uma vez, fica incompleta e imprecisa a informação que o PÚBLICO transmite aos seus leitores, deixando ainda transparecer a ideia de que ‘Os Verdes’ ou não reagiram a esta apresentação ou não fazem parte do grupo dos partidos da oposição com assento parlamentar”.

Este tipo de lamentações faz parte do universo e da circunstãncia da comunicação nas sociedades modernas. À esquerda e à direita, houve, há e haverá sempre gente a queixar-se de que o partido da sua preferência não foi tratado de forma equilibrada por este ou aquele órgão de informação.

Outra recente reclamação ao provedor veio do leitor Vasco Leitão em 30 de Setembro, desta vez por causa do (não) tratamento dado pelo PUBLICO.PT a (mais) uma tomada da posição do Partido Nacional Renovador (PNR, um grupo sem assento em S. Bento mas por vezes com muito assunto): “Segundo se pode ler no site do PNR, esse comunicado foi enviado para todas as redacções às 7h00 de hoje. Vários jornais divulgaram esse comunicado (...). Não está em questão, como é óbvio, se os editores/jornalistas concordam ou não com essa posição. Acontece que quem visitasse o site do PÚBLICO às 15h00 deparava com, na página inicial, três chamadas de atenção sobre posições do PCP (...). Dentro da secção de política, mais uma notícia principal do PCP e quatro chamadas de atenção sobre o PCP nos títulos abaixo (...). Ora, e novamente, não se trata de ser a favor ou contra determinadas posições, penso que o PCP tem tanto direito quanto os outros a ver as suas posições divulgadas. Nem sequer se respeitam as devidas diferenças de proporção de votos, visto que sobre o PNR nunca nada foi publicado e sobre o PCP é o que se vê, o que parece um critério não-pluralista e talvez tendencioso”.

Também o leitor Rafael Rodrigues enviou em 8 de Setembro o seguinte protesto (digamos, de sinal contrário): “Na edição de hoje, o espaço e destaque concedido pelo jornal à Universidade de Verão do PSD [discurso de Manuela Ferreira Leite – foto-legenda na pág. 1 e “destaque” de duas páginas], à criação de uma fundação pelo PS [uma página] e à Festa do Avante! pelo PCP [discurso de encerramento de Jerónimo de Sousa – dois quintos de página] parecem-me completamente em desfavor deste último. Qualquer critério jornalístico de ordem de importância não é justificação”.

Importa saber quais as normas editoriais do PÚBLICO para o relevo a dar às posições dos partidos políticos. Foi sobre isso que o provedor questionou o director do jornal. Eis as explicações de José Manuel Fernandes:

1. “O primeiro critério é, como é óbvio, o do interesse jornalístico. Pode haver tomadas de posição do PNR com mais interesse do que comunicados do partido no poder, o PS. Depende do tema que abordam, como o abordam, da sua actualidade, oportunidade, novidade, potencial geração de controvérsia, número potencial de leitores a quem o tema pode interessar, etc.

2. Face a tomadas de posição ‘de agenda’, isto é, das que os partidos tomam porque é o dia de tomá-las (...), tende-se a privilegiar os partidos com mais impacto juntos dos eleitores, aqueles sobre os quais a maioria das pessoas quer estar informada. No caso português são cinco: PS, PSD, PCP. CDS e BE. Há mais partidos representados na AR – ‘Os Verdes’, que nunca concorreram em listas próprias mas formam um grupo parlamentar, julgo que ainda o PPM (um deputado eleito nas listas do PSD) e um grupo de independentes católicos na bancada do PS –, mas, por regra, noticiamos as suas tomadas de posição quando são substantivas, não por obrigação.

3. Fora dos períodos eleitorais, não temos nenhum critério ‘métrico’ para ‘equilibrar’ o noticiário vindo dos diferentes partidos, pois seguimos apenas critérios jornalísticos. Nos períodos eleitorais, em que é mais importante dar voz a todos, mesmo sem seguirmos critérios ‘métricos’, procuramos dar espaço (...) até aos mais pequenos. Mas mesmo nessas alturas é natural que os partidos parlamentares recebam mais cobertura, pois os leitores estão mais preocupados em conhecer as suas posições, até para escolherem. Isso não impede que, quando sentimos que há fenómenos políticos novos, os destaquemos. O BE foi exemplo disso mesmo quando ainda não tinha deputados. As recentes candidaturas independentes à Câmara de Lisboa também. Aqui é a nossa sensibilidade para captar o sentimento dos eleitores (ou as sondagens) que ajuda a tomar decisões”.

Sobre a edição de 8 de Setembro, José Manuel Fernandes acrescentou: “Fazendo parte do papel dos jornalistas escolher uma pequeníssima parte das notícias que nos chegam, as que merecem ser publicadas, tal como as que merecem mais desenvolvimento, isso significa que não praticamos uma ciência exacta. Por vezes enganamo-nos. Com os partidos e com outros temas. Não me parece ser o caso desta Festa do Avante!. Pelo menos a cobertura da Universidade de Verão do PSD, durante a qual se esperava de Manuela Ferreira Leite declarações relevantes, mereceria sempre mais atenção, à partida, do que mais uma Festa do Avante! que nem sequer era a primeira do actual secretário-geral do PCP. Já a criação da fundação do PS talvez tenha tido mais cobertura do que merecia por comparação com a festa do PCP. Foi assim este ano. Para o ano pode ser totalmente diferente. Dependerá do nosso julgamento sobre o que é mais importante nessa altura”.

No quadro constitucional de liberdade de expressão e informação em que se insere a nossa imprensa, é prerrogativa de um jornal relatar as posições políticas que entender, dentro dos princípios editoriais previamente definidos para a sua actividade (a invocação do estatuto editorial do PÚBLICO por Maria Luis Nunes não colhe neste caso, porque a omissão da posição do seu partido não denota falta rigor ou independência). Poderia ser diferente com um órgão estatal de serviço público, obrigado a certos constrangimentos nesta área (traduzidos caricatamente na absurda cronometragem pela Entidade Reguladora para a Comnunicação Social dos tempos ocupados pelos vários agentes políticos nas emissões da RTP), mas tal grelha não se aplica nem se pode aplicar a um meio de informação que é propriedade privada.

Além disso, sendo o espaço editorial de um periódico sempre limitado, será necessário que os seus jornalistas escolham o que julgam mais importante para publicação (princípio consagrado na célebre divisa de The New York Times: “Todas as notícias que merecem ser impressas”). E aqui entra em aplicação o tão falado critério jornalístico, que muita gente contesta (no seu legítimo direito) mas que não encontra substituto em nenhum outro.

Quanto ao grau de importância, nem sempre os jornais o conseguem reflectir, mas também isso é inerente à sua actividade e deve ser encarado como normal: podia a imprensa alemã, por exemplo, adivinhar o que viria a ser a carreira de Hitler quando ignorou os seus primeiros comícios?

O provedor nada tem por isso a objectar às respostas de José Manuel Fernandes, que esclarecem devidamente os casos expostos.

CAIXA:

O pudor diplomático

Que este jornal escreva «Ibramovich» no título e «Abramovich» no texto (pág. 15 do P2de ontem) é uma coisa, mas que contenha contradições no seu conteúdo é outra. Terá sido o que se passou em duas notícias relacionadas com o reconhecimento da independência do Kosovo, publicadas a 8 e 9 de Outubro?

Reclamou o leitor Pedro Amorim: “O PÚBLICO de 8 de Outubro titulava na pág. 1 que ‘Portugal reconhece país e tenta agradar à Sérvia’. Na notícia [pág. 8], o título afirmava que ‘Portugal (...) apoia pedido de parecer sérvio na ONU’ (...). No dia seguinte, (...) na pág. 15, afirmava-se que Portugal se abstivera na votação levada a cabo na Assembleia Geral da ONU para aprovar o pedido da Sérvia para avaliar a legalidade da independência do Kosovo (...), isto é, não apoiara o pedido da Sérvia. Esta eventual mudança de atitude de Portugal deveria ser motivo de notícia! Por que mudou a posição portuguesa? Sobre isso nem uma palavra! A dúvida que de imediato assalta o leitor é a da credibilidade da notícia do dia 8 (...). Como pode o PÚBLICO dar uma informação tão importante (...) e no dia seguinte ver a realidade desmentir essa informação, sem que tenha a preocupação de apresentar qualquer explicação? Leviandade? Falta de rigor? (...) É óbvio que o leitor carece de uma explicação”.

Sendo as notícias oriundas de diferentes editorias – Portugal e Mundo, respectivamente –, o provedor pediu a ambas um comentário, que nenhuma forneceu. Lida porém a primeira notícia, nela consta que a abstenção na ONU era já uma das formas pelas quais que se previa que Portugal viesse a expressar a sua “aprovação” da posição de Belgrado. A diplomacia tem destas coisas: a abstenção pode ser maneira, encapotada ou envergonhada, de votar a favor. Nenhum reparo a fazer, portanto.

Publicada em 2 de Novembro de 2008.

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR:

Reclamações do partido "Os Verdes"

Na edição de hoje, 14 de Outubro, do PÚBLICO, os jornalistas Cristina Ferreira e Sérgio Aníbal assinam uma notícia que tem como título “Estado entra no capital dos bancos que não liquidem dívidas”. Escrevem sobre as audiências de ontem em que os partidos com assento parlamentar foram recebidos pelo primeiro-ministro, a propósito do Conselho Europeu, dando conta das declarações feitas por todos eles (os da oposição), à excepção das de “Os Verdes”.

A delegação de “Os Verdes”, composta pelos dirigentes nacionais Afonso Luz e Vítor Cavaco, prestou declarações à imprensa à saída da audiência, mas os jornalistas em causa optaram por omitir as afirmações proferidas, passando ao leitor do PÚBLICO a ideia de que apenas existem quatro partidos políticos da oposição com assento parlamentar.

No estatuto editorial do jornal, pode ler-se que o “PÚBLICO é um jornal diário de grande informação, orientado por critérios de rigor e criatividade editorial, sem qualquer dependência de ordem ideológica, política e económica”. “Os Verdes” esperam que aquele rigor seja aplicado de forma escrupulosa, de modo a evitar que “desinformações” como a descrita acima voltem a ocorrer.

Maria Luis Nunes

Na edição de hoje, 15 de Outubro, do PÚBLICO, pode ler-se um extenso artigo sobre a apresentação e entrega do Orçamento de Estado na Assembleia da República. A certa altura, dá-se destaque às reacções dos representantes dos partidos da oposição com assento parlamentar, mas, incompreensivelmente, as declarações da deputada Heloísa Apolónia, proferidas neste âmbito, no mesmo local e momento em que todos os outros as fizeram, foram omitidas.

Mais uma vez, fica incompleta e imprecisa a informação que o PÚBLICO transmite aos seus leitores, deixando ainda transparecer a ideia de que “Os Verdes” ou não reagiram a esta apresentação ou não fazem parte do grupo dos partidos da oposição com assento parlamentar.

O PEV lamenta o sucedido e espera que omissões semelhantes não voltem a ocorrer.

Maria Luis Nunes

Reclamação do leitor Vasco Leitão

Escrevo-lhe para chamar a s/ atenção para o tratamento editorial do jornal PÚBLICO às notícias relacionadas com política.

Assisti de longe às guerras recentes levantadas por militantes do PCP a esse propósito.

Hoje, há uma notícia que, pelo seu teor, é novidade no panorama político português e merecedora de difusão.

Trata-se da tomada de posição do PNR - Partido Nacional Renovador - sobre a questão da imigração.

Segundo se pode ler no site do PNR, esse comunicado foi enviado para todas as redacções às 7h00 de hoje.

Vários jornais divulgaram esse comunicado, ou excertos do mesmo, como por exemplo o jornal Sol.

Não está em questão, como é óbvio, se os editores/jornalistas concordam ou não com essa posição.

Acontece que, quem visitasse o site do PÚBLICO às 15h00 de hoje deparava com, na página inicial, três chamadas de atenção sobre posições do PCP (aqui).

Dentro da secção de Política, mais uma notícia principal do PCP e quatro chamadas de atenção sobre o PCP nos títulos abaixo (ver aqui).

Ora, e novamente, não se trata de ser a favor ou contra determinadas posições, mas penso que o PCP tem tanto direito quanto os outros a ver as suas posições divulgadas.

Nem sequer se respeitam as devidas diferenças de proporção de votos, visto que sobre o PNR nunca nada foi publicado e sobre o PCP é o que se vê, o que parece um critério não-pluralista e talvez tendencioso.

Ainda para mais quando, nas últimas semanas, foram várias as tomadas de posição do PNR (e igualmente enviadas para a redacção do PÚBLICO) e nenhuma a divulgada.

Isto, novamente, num país onde o PNR - goste-se ou não - tem posições políticas únicas e diferenciadas de todos os outros partidos políticos.

Vasco Leitão

Reclamação do leitor Rafael Rodrigues

Na edição de hoje, o espaço e destaque concedido pelo jornal à Universidade de Verão do PSD, à criação de uma Fundação pelo PS e à Festa do Avante! pelo PCP parecem-me completamente em desfavor deste último. Qualquer critério jornalístico de ordem de importância não é justificação.

Rafael Rodrigues

Explicações do director do PÚBLICO

1. O primeiro critério é, como é óbvio, o do interesse jornalístico. Pode haver tomadas de posição do PNR como mais interesse do que comunicados do partido no poder, o PS. Depende do tema que abordam, como o abordam, da sua actualidade, oportunidade, novidade, potencial geração de controvérsia, número potencial de leitores a quem o tema pode interessar, etc.

2. Face a tomadas de posição "de agenda", isto é, das que os partidos tomam porque é o dia de tomá-las (como no caso de "Os Verdes", cujo tomada de posição derivava de um encontro de agenda), tende-se a privilegiar os partidos com mais impacto juntos dos eleitores, aqueles sobre os quais a maioria das pessoas quer estar informada. No caso português são cinco: PS, PSD, PCP. CDS e BE. Há mais partidos representados na AR – "Os Verdes", que nunca concorreram em listas próprias mas formam um grupo parlamentar, julgo que ainda o PPM (um deputado eleito nas listas do PSD) e ainda um grupo de independentes católicos na bancada do PS –, mas, por regra, noticiamos as suas tomadas de posição quando são substantivas, não por obrigação.

3. Fora dos períodos eleitorais, não temos nenhum critério "métrico" para "equilibrar" o noticiário vindo dos diferentes partidos, pois seguimos apenas critérios jornalísticos. Nos períodos eleitorais, em que é mais importante dar voz a todos, mesmo sem seguimos critérios "métricos", procuramos dar espaço a todos, até aos mais pequenos. Mas mesmo nessas alturas é natural que os partidos parlamentares recebam mais cobertura, pois os leitores estão mais preocupados em conhecer as suas posições, até para escolherem. Isso não impede que, quando sentimos que há fenómenos políticos novos, os destaquemos. O BE foi exemplo disso, mesmo quando ainda não tinha deputados. As recentes candidaturas independentes à Câmara de Lisboa também. Aqui é a nossa sensibilidade para captar o sentimento dos eleitores (ou as sondagens) que ajuda a tomar decisões.

Um pequeno acrescento:

Fazendo parte do papel dos jornalistas escolher uma pequeníssima parte das notícias que nos chegam, as que merecem ser publicadas, tal como as que merecem mais desenvolvimento, isso significa que não praticamos uma ciência exacta. Por vezes enganamo-nos. Com os partidos e com outros temas.

Não me parece ser o caso desta Festa do Avante!. Pelo menos a cobertura da Universidade de Verão do PSD, durante a qual se esperava de Manuela Ferreira Leite declarações relevantes, mereceria sempre mais atenção, à partida, do que mais uma Festa do Avante! que nem sequer era a primeira do actual secretário-geral do PCP. Já a criação da fundação do PS talvez tenha tido mais cobertura do que merecia por comparação com a festa do PCP.

Foi assim este ano. Para o ano pode ser totalmente diferente. Dependerá do nosso julgamento sobre o que é mais importante nessa altura.

José Manuel Fernandes

Reclamação do leitor Pedro Amorim

O PÚBLICO de 8 de Outubro titulava na pág. 1 que "Portugal reconhece país e tenta agradar à Sérvia". Na notícia [pág. 8], o título afirmava que "Portugal (...) apoia pedido de parecer sérvio na ONU", e mais à frente podia ler-se: "Portugal comprometeu-se junto da Sérvia a apoiar o seu pedido de parecer sobre a legalidade da declaração unilateral kosovar junto do Tribunal Internacional de Justiça (TPI) das Nações Unidas". No dia seguinte, numa notícia de Isabel Gorjão Henriques publicada na pág. 15, afirmava-se que Portugal se abstivera na votação levada a cabo na Assembleia Geral da ONU para aprovar o pedido da Sérvia para avaliar a legalidade da independência do Kosovo. Repare que no dia 8 se afirmava que Portugal iria apoiar na ONU o pedido da Sérvia e no dia 9 noticiava-se que Portugal se abstivera na votação, isto é, não apoiara o pedido da Sérvia. Esta eventual mudança de atitude de Portugal deveria ser motivo de notícia! Por que mudou a posição portuguesa? Sobre isso nem uma palavra! A dúvida que de imediato assalta o leitor é a da credibilidade da notícia do dia 8, onde se afirmava que Portugal ia apoiar o pedido sérvio. Como pode o PÚBLICO dar uma informação tão importante (Portugal vai apoiar a Sérvia) e no dia seguinte ver a realidade desmentir essa informação, sem que tenha a preocupação de apresentar qualquer explicação? Leviandade? Falta de rigor? A notícia do apoio de Portugal não correspondia à realidade da intenção da diplomacia portuguesa? É óbvio que o leitor carece de uma explicação”.

Pedro Amorim