domingo, 20 de dezembro de 2009

O real e o virtual na Alta de Lisboa


No passado dia 8 de Agosto saiu no PÚBLICO [págs. 18-19, secção Local] uma reportagem sobre os saldos de apartamentos na Alta de Lisboa. Em dada passagem do artigo, o site Viver na Alta de Lisboa é citado dando um parecer negativo do enquadramento social do bairro. A frase citada está longe de ser o resumo da nossa análise da realidade social da Alta de Lisboa.

Foi antes retirada de um artigo a dar conta de uma iniciativa rara na cidade de Lisboa, envolvendo inúmeras instituições, associações e entidades do bairro, que arrancará no próximo ano lectivo. Não fomos contactados nem por e-mail nem por telefone, e consideramos abusivo de vossa parte a utilização de uma frase do artigo para ser transformada em posição e opinião oficial do nosso Movimento Cívico. Lamentamos a utilização tendenciosa de artigos do nosso site para sustentar a leitura simplista e redutora da jornalista sobre a Alta de Lisboa, criada à distância, sem contactar directa e pessoalmente qualquer uma das forças vivas da população deste bairro.

A Alta de Lisboa tem sido prejudicada pelos sucessivos atrasos na execução do plano de urbanização subjacente, por responsabilidade quase total da Câmara Municipal de Lisboa (CML), conforme temos vindo a denunciar há mais de quatro anos. Por dezenas de vezes temos dado conhecimento ao PÚBLICO de diversos aspectos dessa realidade – através de inúmeros telefonemas e e-mails enviados para a vossa redacção – sem que isso tenha resultado em tratamento jornalístico. São esses atrasos que sacrificam a sustentabilidade do projecto e condenam a integração social da população realojada, um dos principais objectivos do Plano de Urbanização lançado pela CML no início dos anos 80.

Estranhamos pois que o PÚBLICO ignore as causas primeiras da realidade social do bairro e opte pelo registo fácil de amplificar a degradação do edificado e o absentismo escolar. Terem colocado uma fotografia com mais de três anos, eliminando o Parque Oeste – o maior espaço verde criado de raiz em Lisboa desde o parque florestal de Monsanto – revela mais uma vez o desleixo profissional com que a jornalista abordou o assunto.

É uma pena que o PÚBLICO recorra a textos do nosso site - porque lhe convêm ter uma entidade a dar a cara pelo que pensa a jornalista - e não tenha o incómodo de nos contactar, não se coibindo depois de fazer jornalismo de uma forma fácil mas enviesada, incompleta e injusta.

Há uma máxima que muito irrita os jornalistas, mas que se aplica em muitos casos: "Não deixe que a verdade estrague uma boa história".

Tiago Figueiredo
Viver na Alta de Lisboa

NOTA DO PROVEDOR:

O provedor entendeu solicitar à autora da notícia, Ana Henriques, uma justificação, tendo respondido a jornalista:

Uma simples pesquisa ao site deste grupo de moradores, Alta de Lisboa, é suficiente para percebermos que o vandalismo é, efectivamente, um problema do bairro. Veja-se, por exemplo, uma carta enviada aos moradores pela Unidade de Projecto do Alto do Lumiar. Ou este post.

O relato dos próprios responsáveis do site, a que eles aludem neste e-mail que enviaram ao PÚBLICO, é, aliás, bastante elucidativo sobre a questão.

Há cerca de dois anos eu própria desenvolvi um trabalho aprofundado sobre os problemas da Alta de Lisboa, no qual eram mencionados os atrasos da concretização deste projecto e vários outros aspectos relevantes. As “causas primeiras da realidade social do bairro” não eram, desta vez, o tema central da notícia, que está focada nas casas em saldo. A questão do vandalismo é apenas o enquadramento da peça jornalística em causa. Uma questão que, de resto, não pode ser escamoteada, por muito que ela não agrade a estes habitantes: se alguém pensar em comprar apartamento no local, deve saber ao que vai. Quando às razões do surgimento do vandalismo, não era esta a peça jornalística indicada para as esmiuçar, nem às tentativas de resolução – embora as explicações que surgem no site e foram citadas sejam suficientemente elucidativas. Confesso não perceber por que razão considera este movimento cívico abusiva a utilização das suas frases. Não era essa a sua posição? Então por que razão a expressaram no site?

Será que uma das rotinas diárias de qualquer jornalista – seleccionar, pela sua relevância, frases que integram discursos substancialmente maiores – configura, para estes habitantes, uma automática e condenável retirada de conteúdos do seu contexto?

Não me pareceu relevante ouvir este movimento aquando da elaboração do texto em questão, uma vez, repito, que o vandalismo era apenas um assunto de enquadramento. Mas também não me passava pela cabeça que estes habitantes pudessem não se rever nas suas próprias e inequívocas palavras…

Apenas reconheço razão aos habitantes num aspecto: a foto estava, de facto, desactualizada. Eu própria insisti no dia da paginação do artigo para que fosse feita nova foto, mas tal não foi possível.

Ana Henriques

O provedor considera satisfatórias as explicações da jornalista.

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