sábado, 19 de julho de 2008

Quem é o dono da pergunta?

Perguntar não ofende, mas, ao que parece, “mexer” na pergunta sim

Em busca de uma forma diferente de abordar por antecipação o recente debate parlamentar sobre o Estado da Nação, na edição do próprio dia em que teria lugar (10 deste mês), o PÚBLICO concluiu, nas palavras do seu director, que “era mais interessante pedir a um conjunto muito alargado e muito diverso de personalidades portuguesas que formulassem perguntas ao primeiro-ministro do que entregar esse trabalho a jornalistas da casa especializados nas diferentes áreas”.

A ideia, segundo José Manuel Fernandes, “implicava vários riscos”, sendo que “o primeiro era conseguir que um número suficiente e suficientemente diversificado de personalidades acedessem ao nosso convite”. Conclui José Manuel Fernandes: “Essa aposta foi ganha, mas implicou envolvermos na recolha das perguntas 16 jornalistas”.

Um desses jornalistas foi Isabel Coutinho, que em mensagem ao cineasta António-Pedro Vasconcelos explicava: “O PÚBLICO quer registar a pergunta que gostaria de fazer ao primeiro-ministro caso pudesse estar presente no plenário da Assembleia da República (...). Terá de ser curta e directa, embora a possa antecipar com uma breve (400/500 caracteres) justificação dos motivos que o levam a considerar como fundamental”.

António-Pedro Vasconcelos correspondeu à solicitação, avisando porém Isabel Coutinho: “Mesmo depois de muito cortar no texto de introdução, não consigo resumir mais. Sobretudo porque a questão é demasiado genérica para dispensar o preâmbulo”. Isto tinha a ver com o segundo risco apontado por José Manuel Fernandes: “Conseguir que os que convidávamos (...) respeitassem o número de caracteres que lhes havia sido pedido. Isso não foi conseguido, e (...) imaginámos uma forma de paginação com alguma elasticidade e capaz de acomodar textos de diferentes dimensões.”

Mas quando António-Pedro Vasconcelos abriu o PÚBLICO desse dia descobriu que toda a introdução da sua pergunta havia desaparecido. “Não queria acreditar”, escreveu a Isabel Coutinho. “Disse-me que estava tudo bem. O problema é este: tal como saiu, a minha pergunta é de um atrasado mental. E não havia necessidade, como dizia o outro. Bastava deixar-me de fora, em vez de me obrigar a fazer figuras tristes”.

Sem responsabilidades no sucedido, pois limitou-se a reencaminhar a pergunta para a direcção, Isabel Coutinho ainda informou António-Pedro Vasconcelos que as 34 questões recebidas, incluindo a sua, estavam integralmente transcritas no PUBLICO.PT, o que porém foi fraco consolo para o realizador: “Há muita gente, como eu, que continua a preferir o papel”. Além de que haviam sido publicadas pelo jornal perguntas tão extensas como a dele, de José Saramago e Gonçalo M. Tavares – sugerindo, adianta o provedor, que o PÚBLICO deu aqui vantagem aos homens das letras em detrimento dos homens das imagens.

A questão completa dirigida por António-Pedro Vasconcelos a José Sócrates (em que a introdução tinha uns 300 caracteres a mais do que o pedido) era esta: “Parece uma evidência que o mundo está sem resposta para a profunda crise económica e social que aí vem. Não há medidas reformistas que travem a explosão dos preços, a escassez dos recursos e a escalada de protestos. A proletarização das classes médias vai agravar-se. O recurso ao roubo, à fraude, à fuga dos compromissos com o crédito, vai aumentar. Já não temos o recurso da guerra nem dos regimes duros para mascarar as crises. Há o risco sério de o Estado baquear, de o poder cair na rua e de o caos se instalar. Portugal é o elo mais fraco da UE. Nestas circunstâncias, as oposições não vão perder nenhuma oportunidade para criticar o governo por tudo o que acontecer. E, se as coisas azedarem, o PM não pode esperar, como já se percebeu, a solidariedade do PR. Num mundo globalizado, numa Europa enfraquecida, o que acha que pode prometer ainda aos portugueses?”

Na edição em papel, surgiu apenas a última frase. Reacção do autor junto da jornalista: “Não estou para passar impunemente por um imbecil. (...) Exijo ser tratado com correcção. Não fui eu que pedi para fazer uma pergunta ao Sócrates. E tive a precaução de pedir que me ligasse se houvesse problema com o tamanho. A ter que cortar, cortava eu [apesar de – note-se – ter antes confessado a sua incapacidade para o fazer]”. E na consequente queixa que fez ao provedor fundamentou ainda António-Pedro Vasconcelos: “Entendo que se trata de um injustificável e inexplicado atentado aos meus direitos. No limite, aceitaria que me dissessem que a minha pergunta estava longa, que havia respostas a mais, tudo menos reduzi-la à sua expressão mais simples, que me faz passar por um idiota”.

O provedor declara desde já entender que a pergunta, tal como saiu, é coerente e não faz de António-Pedro Vasconcelos idiota, imbecil ou atrasado mental. Haverá também quem diga que este caso se trata de uma tempestade num copo de água. Admitiu aliás António-Pedro Vasconcelos a Isabel Coutinho: “Dirá que estou a ferver em pouca água [a do copo?]”. E na sua reclamação reconhece, do mesmo modo: “Dir-me-ão (já me disseram) que o assunto não tem a importância que eu lhe estou a dar”. Mas conclui: “Para mim é uma questão de princípio: se deixamos passar estas coisas, deixamos passar tudo”.

O problema, na verdade, não está em saber se o que saiu desvirtuou a pergunta mas sim em apurar se o jornal pode tomar a iniciativa de mutilar uma colaboração escrita que pediu sem, no mínimo, prevenir o autor e obter o seu acordo.

Nas explicações que o provedor lhe solicitou, José Manuel Fernandes explana o processo de produção das duas páginas com as perguntas solicitadas, invocando ainda um terceiro risco: “Conseguir fechar a horas, isto é, (...) que todos enviassem as suas contribuições em tempo útil. (...) À hora de almoço da véspera da publicação apenas tinham chegado umas 20 contribuições”.

Para o que aqui importa, o director relata: “Dos 34 textos que recebemos, 21 tiveram de ser condensados. (...) Este trabalho de edição levou cerca de cinco horas (...) e obrigou a várias adaptações para ir conseguindo ‘encaixar’ as novas contribuições que iam chegando”. E faz uma comparação talvez devida ao perfil do reclamante: “A opção de reduzir os textos pareceu-nos absolutamente adequada: da mesma forma que um filme ganha ritmo se for limpo de cenas redundantes ou menos importantes, aquele trabalho ficaria virtualmente ilegível. A forma como foi apresentado e, ao mesmo tempo, complementado com a publicação na íntegra dos textos no on-line [cuja remissão José Manuel Fernandes lamenta não ter sido feita no papel, “um erro, motivado pelos atrasos”] fez com que tivéssemos recebido muitos elogios de leitores”.

Quanto ao texto de António-Pedro Vasconcelos, “optou[-se] por deixar apenas a pergunta, que (...) pareceu pertinente”. Mas resta a questão fulcral: a legitimidade para o jornal proceder unilateralmente ao corte. “Em condições ideais o PÚBLICO deveria ter consultado de novo as 21 personalidades cujos textos tiveram de ser adaptados, (...) mas as condições em que se processa o fecho de jornal diário não o permitiriam nunca, sobretudo porque muitas das contribuições chegaram-nos muito tarde”, alega José Manuel Fernandes. “Compreendemos que António-Pedro Vasconcelos possa sentir que o seu texto foi irreparavelmente truncado, mas agimos de absoluta boa-fé”.

É claro que a boa-fé (de que o provedor não duvida no caso) não substitui as regras. Não existe no Livro de Estilo do PÚBLICO uma norma específica para esta situação, mas por analogia entende o provedor que lhe é aplicável a alínea c) do ponto 6 do capítulo “Os factos e a opinião”, que estipula a certa altura: “Toda a intervenção do jornal num texto de opinião só é admissível com prévia autorização do autor”. Esta é a recomendação do provedor na circunstância. À redacção competirá fazer com que tal seja possível.


CAIXA:

Forma e conteúdo

Nas suas reclamações ao provedor, os leitores dividem-se em duas correntes: os que acham as gralhas, discordâncias linguísticas ou erros técnicos questões menores, inevitáveis em artes gráficas, e os que projectam esses acidentes como faceta essencial (da suposta decadência) do PÚBLICO. O provedor acha que não deve tomar posição, competindo-lhe estar atento a essas duas componentes do seu ofício. Ambas concorrem para dar ou retirar consistência ao projecto do PÚBLICO como jornal que se pretende de referência.

Compreende-se assim, por um lado, a argumentação do leitor Carlos Machado Acabado que considera relevante, sim, o facto de na pág. 25 de um recente caderno biográfico dedicado pelo jornal a Fernando Pessoa (distribuído só aos compradores que entregaram o talão da véspera) os norte-americanos Walt Whitman e Edgar Allan Poe tenham sido apresentados como “poetas ingleses” (estaria bem “poetas de língua inglesa”): “Uma gralha ou até mesmo uma ou outra ocasional ‘perturbação’ de concordância e/ou sintaxe são episódios linguísticos e culturais aborrecidos mas seguramente não ‘fatais’ relativamente aos conteúdos que se supõe serem por elas e através delas veiculados – os quais representam, esses sim, a essência verdadeiramente elementar do que está impresso”.

Mas também se entende a perturbação de José Oliveira, ao reclamar por a pág. 38 da edição de 7 de Julho, pertencente à secção de Economia, ter sido também integralmente reproduzida (com a mesma numeração) no lugar da pág. 28, de outra secção, privando os leitores de conhecerem o conteúdo da verdadeira pág. 28: “Quando eu esperava que na edição [seguinte] houvesse um ‘O PÚBLICO errou’ a reconhecer o erro e pedir desculpa aos leitores, exaustos com tanta anarquia, ...nada, silêncio absoluto. Portanto: total falta de respeito do jornal para com os seus leitores pagantes”.

Não é de facto agradável ler, na edição de ontem (19 de Julho), logo em subtítulo da manchete: “Lista foi fornecida à política [em vez de “polícia”] britânica”. Ou uma legenda incompleta na reportagem de Alexandra Lucas Coelho sobre o Afeganistão (pág. 8 do P2): “Como Cabul está entre montanhas, é por elas que a”.

NOTA: Não se publicará a crónica do provedor no próximo domingo.

Publicada em 20 de Julho de 2008

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR:

Mensagem de Isabel Coutinho a António-Pedro Vasconcelos

Na edição de quinta-feira, dia do debate sobre o Estado da Nação, vamos revelar a pergunta que uma lista de personalidades gostaria de fazer ao primeiro-ministro. O único problema é que precisamos de ter a pergunta aqui até amanhã de manhã. Será que tem disponibilidade para me enviar a pequena pergunta e os motivos que a levam a pensar ser fundamental?

A propósito do debate sobre o Estado da Nação, o PÚBLICO quer registar a pergunta que gostaria de fazer ao primeiro-ministro caso pudesse estar presente no plenário da Assembleia da República, na próxima quinta-feira. A pergunta terá de ser curta e directa, embora a possa antecipar com uma breve (400/500 caracteres) justificação dos motivos que o (a) levam a considerar como fundamental. O PÚBLICO agradece a sua colaboração nesta iniciativa.

Isabel Coutinho

Resposta de António-Pedro Vasconcelos a Isabel Coutinho

Mando-he uma pergunta, mas, mesmo depois de muito cortar no texto de introdução, não consigo resumir mais. Sobretudo porque a questão é demasiado genérica para dispensar o preâmbulo. Mas, sinceramente, acho que a rentrée vai ser de tamanha gravidade (não tenho qualquer dúvida que o mundo ocidental que nós conhecemos está à beira da implosão) que qualquer pergunta sectorial (sobre a cultura ou a educação, a agricultura ou as pescas) me pareceu fútil.

A-PV

Mensagem de António-Pedro Vasconcelos a Isabel Coutinho

Abri hoje o PÚBLICO e não queria acreditar. Quero pensar que não foi V. a responsável pela inaceitável mutilação que fizeram à mimha pergunta. Tenho a noção de que a introdução excedia um pouco o número de caracteres que me deu, e disso lhe dava conta. Mas reparei que outros tiveram direito a introduções igualmente longas e mesmo ficcionadas, como é o caso do Gonçalo M. Tavares.

Dei-lhe oportunidade de falarmos para o caso de ser necessário encurtar o texto. Disse-me que estava tudo bem. O problema é este: tal como saiu, a minha pergunta é de um atrasado mental. E não havia necessidade, como dizia o outro. Bastava deixar-me de fora, em vez de me obrigar a fazer figuras tristes.

Agradeço uma explicação ou melhor, uma reparação. Caso contrário, escrevo ao Provedor. Se este não der satisfação, logo verei o que faço. Mas não vou deixar passar este desagradável atentado. Dirá que estou a ferver em pouca água. Mas se deixamos de dar importância a estas "pequenas coisas", deixamos de dar importância ao que é importante.

A-PV

Resposta de Isabel Coutinho a António-Pedro Vasconcelos

Peço-lhe imensa desculpa por esta situação. O que lhe posso dizer é que de facto não fui eu que editei ou paginei as perguntas. Eu limitei-me a fazer o pedido e depois enviei as respostas para a direcção, como lhe disse ontem quando me telefonou.
Foi a direcção que editou o destaque e adaptou as perguntas ao espaço de que dispunha. Se achar necessário, terá que falar directamente com a direcção do jornal.
O que sei é que no PÚBLICO on-line as perguntas estão desde manhã todas na íntegra, o que faltou na edição em papel foi colocar uma chamada de atenção para o facto de as perguntas enviadas pelas personalidades estarem na íntegra na edição on-line.

Pode ir ver através deste morada http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1335040 ou ir ao PÚBLICO on-line, depois carregar em última hora, depois carregar em Política e depois em 34 perguntas a José Sócrates. Aí tem o contexto da sua pergunta e depois a pergunta. Durante o dia todo também tem estado um topo no PÚBLICO on-line que vai dar directamente a este link.

Isabel

Resposta de António-Pedro Vasconcelos a Isabel Coutinho

Nunca me passou pela cabeça que fosse V. a responsável pela mutilação. Mas a verdade é que há muita gente como eu que continua a preferir o papel. E eu não estou para passar impunemente por um imbecil. Vou mandar um email para o Provedor em que V. não estará em causa, mas a direcção do jornal. Não me move nada contra ninguém, mas exigo ser tratado com correcção. Não fui eu que pedi para fazer uma pergunta ao Sócrates. E tive a precaução de pedir que me ligasse se houvesse problema com o tamanho. A ter que cortar, cortava eu. Ainda por cima, o debate deu-me razão: as oposições vão atacar o governo (e eu não defendo o governo nem deixo de defender: constato) por ser demasiado rígido e por não ser suficientemente firme, como eu dizia. E isso, para mais com um PR fraco e mesmo pusilânime, vai acabar mal. E a minha responsabilidade como intelectual é tentar ver claro e avisar a navegação.
Mas isto são outros quinhentos. Mais uma vez, obrigado pelo esclarecimento, mas segue queixa para o provedor.

A-PV

Mensagem de António-Pedro Vasconcelos ao provedor

Reenvio-te a troca de correspondência com a Isabel Coutinho que, penso, dispensa mais comentários. Mas gostaria de ver este assunto comentado por ti, uma vez que entendo que se trata de um injustificável e inexplicado atentado aos meus direitos. No limite, aceitaria que me dissessem que a minha pergunta estava longa, que havia respostas a mais, tudo menos reduzi-la à sua expressão mais simples, que me faz passar por um idiota. A mutilação parece-me tanto mais injustificada e inadmissível quanto houve perguntas iguais ou maiores que foram publicadas na íntegra e quando eu próprio me disponibilizei para falar sobre o assunto na perspectiva óbvia de ser necessário reduzir a pergunta e que, mesmo depois de eu ter telefonado, me foi dito que "não havia qualquer problema" e que "estava tudo bem"!

Fico à espera de ver reposta alguma ética, mesmo se o mal é irreparável. Dir-me-aão (já me disseram) que o assunto não tem a importância que eu lhe estou a dar. Mas para mim é uma questão de princípio: se deixamos passar estas coisas, deixamos passar tudo.

A-PV

As explicações do director do PÚBLICO

Quando o PÚBLICO decidiu realizar o trabalho em que viria a ser incluída a contribuição de António-Pedro Vasconcelos partiu do princípio de que era mais interessante pedir a um conjunto muito alargado e muito diverso de personalidades portuguesas que formulassem perguntas ao primeiro-ministro do que entregar esse trabalho a jornalistas da casa especializados nas diferentes áreas.

Mas essa ideia implicava vários riscos, que decidimos assumir.

O primeiro era conseguir que um número suficiente e suficientemente diversificado de personalidades acedessem ao nosso convite. Essa aposta foi ganha, mas implicou envolvermos na recolha das perguntas 16 jornalistas.

O segundo era conseguir que os que convidávamos para formularem perguntas respeitassem o número de caracteres que lhes havia sido pedido. Isso não foi conseguido, e por calcularmos que seria impossível de conseguir imaginámos uma forma de paginação com alguma elasticidade e capaz de acomodar textos de diferentes dimensões.

O terceiro era conseguir fechar a horas, isto é, conseguir que todos enviassem as suas contribuições em tempo útil. Também aqui enfrentámos dificuldades naturais, sendo de referir que à hora de almoço da véspera da publicação apenas tinham chegado umas 20 contribuições, sendo que depois foram caindo as restantes até perfazerem um total de 34.

A meio da tarde foi-se tornando claro que seria impossível incluir, na íntegra, todos os textos, razão por que um membro da direcção foi encarregue de, em conjunto com a infografia, reduzir o tamanho de muitas perguntas, condensando-as ou cortando partes menos relevantes. O conjunto dos textos iniciais somavam mais de 23.500 caracteres; o publicado pouco ultrapassava os 15 mil caracteres. Dos 34 textos que recebemos, 21 tiveram de ser condensados. Um dos critérios seguidos foi o de limitar esses textos aos pedaços em que formulavam a pergunta, retirando as introduções de enquadramento. Foi exactamente isso que sucedeu com o texto de António-Pedro Vasconcelos, entre muitos outros.

Este trabalho de edição levou cerca de cinco horas, sob a pressão do fecho do jornal, e obrigou a várias adaptações para ir conseguindo “encaixar” as novas contribuições que iam chegando.

A partir do momento em que se verificou não ser possível publicar os textos na íntegra na infografia que ocupava as páginas 2 e 3 da edição do PÚBLICO editada no dia do debate do Estado da Nação, foi decidido preparar para a internet uma versão diferente, sem cortes, para que os leitores interessados pudessem conhecer a integralidade das diferentes contribuições.

Aqui foi cometido um erro, motivado pelos atrasos induzidos pelo tempo que foi necessário dedicar à edição dos textos: a referência a que os textos estariam na íntegra na internet acabou por não ser incluída na edição em papel, como estava previsto e tinha sido combinado.

De resto, a opção de reduzir os textos pareceu-nos absolutamente adequada: da mesma forma que um filme ganha ritmo se for limpo de cenas redundantes ou menos importantes, aquele trabalho ficaria virtualmente ilegível. A forma como foi apresentado e, ao mesmo tempo, complementado com a publicação na íntegra dos textos no on-line fez com que tivéssemos recebido muitos elogios de leitores.

Falta saber se o comportamento com António-Pedro Vasconcelos foi o adequado.

Em primeiro lugar é necessário esclarecer que a Isabel Coutinho, uma das 16 jornalistas envolvidas na recolha das perguntas, não tem qualquer responsabilidade na edição final.

No mail que enviou a A-PV referia claramente as regras: “A pergunta terá de ser curta e directa, embora a possa antecipar com uma breve (400/500 caracteres) justificação dos motivos”. O texto enviado por A-PV tinha cerca de 800 caracteres.
Por outro lado, este referiu-lhe que não tinha conseguido resumir mais, mesmo referindo no mail do dia seguinte que lhe falara sobre a hipótese de ter de encurtar o texto. A Isabel, à hora a que recebeu o texto e face ao número de respostas que até então tinham chegado, disse-lhe que estaria tudo bem. O problema, de facto, só se viria a colocar mais tarde, em cima do fecho, quando ela já não estava no jornal.

Como se pode ver comparando o que está disponível on-line e o que saiu no jornal, a intervenção do director que editou os textos variou muito de contribuição para contribuição, e o seu único critério não foi medir o tamanho dos textos, antes preocupar-se com a sua coerência. A dificuldade que ele enfrentou ao editar o texto de A-PV é que, ou cortava toda a introdução, ou tinha de retirar parte dessa introdução, o que lendo-a percebe-se ser muito difícil: nenhum pedaço daquele texto vive bem autonomamente. Optou assim por deixar apenas a pergunta – “Num mundo globalizado, numa Europa enfraquecida, o que acha que pode prometer ainda aos portugueses?” –, que lhe pareceu pertinente. Mais: foi exactamente isso que, nesse debate, acabou por se discutir, isto é, o que é que José Sócrates ainda podia prometer aos portugueses. Não lhe pareceu, de forma alguma, que a pergunta fizesse passar por “atrasado mental” o seu autor, ou que o fizesse passar por um idiota.

Em condições ideais, o PÚBLICO deveria ter consultado de novo as 21 personalidades cujos textos tiveram de ser adaptados, cortados ou condensados, mas as condições em que se processa o fecho de um jornal diário não o permitiriam nunca, sobretudo porque muitas das contribuições chegaram-nos muito tarde e, como já referi, os contactos haviam sido feitos por 16 jornalistas diferentes.

Compreendemos que A-PV possa sentir que o seu texto foi irreparavelmente truncado, mas agimos de absoluta boa fé: não só a sua pergunta não surge retirada do contexto (no sentido de significar algo diferente do pretendido pelo autor), como demos aos leitores a possibilidade de julgarem por eles próprios ao disponibilizarmos as versões integrais de todas as contribuições.

José Manuel Fernandes

Sem comentários: