domingo, 12 de julho de 2009

Vicissitudes de um cirurgião plástico

Alguém que dá uma identidade à repórter e outra ao provedor queixa-se de maus tratos ao seu amigo médico

A imprensa cor-de-rosa promove Mendia ignorando os processo judiciais de que é alvo por alegada negligência clínica

“Médico do jet-set tem quatro processos em tribunal”, titulava o PÚBLICO de 23 de Março último (pág. 3), no âmbito de um dossiê na secção Destaque dedicado à cirurgia estética, alertando para a falta de controlo da Ordem dos Médicos sobre a actividade clínica nesta área. O médico em questão era José Mendia, anto-intitulado “especialista em cirurgia plástica e reconstrutiva”. No artigo, era entrevistado pela jornalista Catarina Gomes (C.G.) a propósito dos quatro processos judiciais e das oito queixas na Ordem dos Médicos que diversos pacientes (ou seus familiares) apresentaram contra ele por supostas irregularidades em operações plásticas (incluindo a morte de uma mulher, objecto de participação do Ministério Público por negligência médica, de que já resultou em tribunal cível uma absolvição em primeira instância e uma condenação no Tribunal da Relação, aguardando-se o desfecho do recurso para o Supremo).

A jornalista informava que durante a entrevista o médico fora auxiliado por um amigo, que se manteve sempre ao seu lado. José Mendia não reagiu ao artigo, mas o amigo, que se identifica como Nuno Olim Marote Ferreira (N.F.), escreveu ao provedor contestando diversos tópicos do artigo. O provedor solicitou explicações a C.G., e de ambas as posições resultou este “contraditório”:

N.F.: “A entrevista mais parece um ataque pessoal ao Dr. José Mendia”

C.G.: “As afirmações que faço são sustentadas pela gravação da entrevista que fiz ao Dr. José Mendia, com a sua autorização”

N.F.: “Logo no inicio da entrevista se diz que o ‘Dr. José Mendia é o alvo de boa parte das queixas’. Parece que em jornalismo rigoroso se deve definir o que é ‘boa parte das queixas’. Segundo dados da Ordem dos Médicos, esta recebe cerca de 20 casos por ano na área da cirurgia estética. Assim, tendo o Dr. José Mendia quatro casos em julgamento [um referente a 1999, outro a 2005 e os restantes dois a 2007], não se percebe esta quantificação. (...) Apresentar a notícia deste modo mais parece um processo de desinformação”.

C.G.: “[Essa] frase (...) não consta do texto (...), mas sim na chamada à primeira página, redigida pelo director de fecho nesse dia (...). Em parte nenhuma dos textos assinados (...) se diz que o médico acumula ‘boa parte das queixas’. Antes se diz (...) que o médico em causa tem [na Ordem dos Médicos] oito queixas pendentes (...). Os textos interiores referem ainda quatro processos judiciais contra o médico, que estão devidamente datados e contextualizados”.

N.F.: “A notícia (...) tenta de um modo grosseiro ridicularizar um profissional com inscrição nº 30557 na Ordem dos Médicos. Saliento (...) que [C.G.] parece ter feito a entrevista já com o intuito de fazer um julgamento distorcido e tendencioso da actividade do Dr. José Mendia (...) Faz uma analogia muito pouco feliz quando mistura a vida privada com casos sérios decorrentes da actividade profissional do médico”.

C.G.: ‘José Mendia confessa (...): Acredito que vou reencontrar o amor. Viúvo desde 2004, o conhecido cirurgião plástico assume ser muito vaidoso e reafirma que não é homem para viver sozinho’, é apenas o último título de uma revista de sociedade (a Caras) onde o médico aparece a falar da sua vida privada. (...) É o próprio quem voluntariamente expõe a sua vida privada na esfera pública (...). É através da sua exposição mediática em revistas como a Lux e a Caras que faz publicidade à sua clínica, que, não por acaso, tem o seu nome. Quando lhe coloquei uma pergunta sobre a entrevista que deu à Caras admitiu que o seu único objectivo era ‘a promoção da clínica’. Não tenhamos dúvidas de que o facto de expor a sua vida privada e ser uma figura pública atrai clientes, como diz uma das queixosas (...) que decidiram recorrer a José Mendia: ‘Era uma pessoa tão famosa, tão conhecida’ (...). Este facto é de tal forma relevante que alguns artigos de revistas constam do processo judicial que consultei. Relevante é ainda o facto de em lado nenhum dos artigos sobre José Mendia nas revistas cor-de-rosa se falar dos processos que (...) tem pendentes, e por isso falo de ‘vida dupla’”.

N.F.: “[C.G.] faz questão em salientar que o médico estava visivelmente nervoso e se fazia acompanhar de um amigo, seu suposto auxiliar de memória. O facto de fazer esta alusão parece desde logo que tenta ridicularizar o Dr. José Mendia, não acrescentando valor nenhum aos factos que se queria noticiar ou analisar”.

C.G.: “Quando fui recebida pelo Dr. José Mendia na sua clínica, este estava acompanhado de um senhor a quem pedi que se identificasse, julgando tratar-se do seu advogado. O senhor, que se apresentou como ‘amigo’ do Dr. José Mendia e se identificou como António Amaral, afirmou mais do que escrevi, e que transcrevo: ‘Acompanho o Dr. José Mendia nestes processos desde 1999 como amigo, e, como deve imaginar, isto afecta uma pessoa, e eu tenho memória em relação a algumas coisas que o Dr. José Mendia, porque está obviamente afectado por todos estes processos em termos pessoais... Estou aqui para servir de grilinho de memória’. (...) Se quisesse ‘ridicularizar’ o Dr. José Mendia, ter-me-ia sido mais fácil citar a expressão usada pelo seu amigo, ‘grilinho de memória’, em vez da mais inócua ‘auxiliar de memória’. Não poderia esconder ao leitor que alguns dos factos foram dados pelo seu amigo e que, facto que omiti da notícia, disse desconhecer um dos processos contra ele e que nunca tinha ouvido falar de uma das doentes queixosas (...). A referência ao nervosismo serve para estabelecer a relação com o facto de, tal como refere o próprio amigo, o Dr. José Mendia se encontrar abalado por estes casos”.

N.F.: “Outra notória acção de desinformação e distorção da notícia foi referir completamente fora de contexto e sem encaixe apropriado supostas declarações do Dr. José Mendia, tais como a que foi usada como chavão no cabeçalho [antetítulo] da notícia [‘Pacientes são emocionalmente desequilibrados, diz José Mendia’]. Nunca e em momento algum nenhum médico se refere aos seus pacientes como ‘emocionalmente desequilibrados’”.

C.G.: “A citação usada no texto é ‘muitas vezes lidamos com uma população completamente desequilibrada emocionalmente’. O antetítulo não é da responsabilidade da jornalista, mas sim do director de fecho (...). De qualquer forma, na entrevista, o Dr. José Mendia também disse: ‘A gente muitas vezes lida com doentes completamente desequilibrados emocionalmente’.

N.F.: “Este comentário surgiu em comentário directo ao ataque por parte da paciente [D.], que tem prestado declarações desapropriadas. Salienta-se que o caso desta paciente decorre em julgamento, aguardando-se para início de Maio [passado] a leitura da sentença”.

C.G.: “O comentário do Dr. José Mendia que citei não veio na sequência de qualquer comentário de uma paciente, mas sim à questão que lhe coloquei sobre como reagia ao facto de ter sido processado por três doentes. As declarações pouco abonatórias do médico sobre D. foram bastante mais longe, tendo referido que seria ‘viciada em cirurgias’, que tomava antidepressivos e ainda, entre outras considerações que me abstenho de transcrever: ‘Esta mulher é completamente desequilibrada, coitada’. (...) Eis a sentença a que alude [N.F.], de acordo com notícia da Lusa publicada no PÚBLICO: [Título:] ‘Médico condenado por causa de cirurgia plástica’; [texto:] ‘O Tribunal Cível de Lisboa condenou o médico José Mendia a pagar uma indemnização de oito mil euros a uma cliente que o acusava de más práticas clínicas após ter efectuado um ‘lifting facial’. Os juízes deram como ‘parcialmente provados’ os factos da acusação (...). O clínico foi ainda condenado a pagar futuros tratamentos de lipoinjecção na zona cervical que a sua antiga cliente venha a fazer e ainda 300 euros pelo crime de violação do direito à imagem, ao tê-la apresentado numa revista como um caso de sucesso, sem a sua autorização. (...) José Mendia, que o Colégio da Especialidade de Cirurgia Plástica, Reconstrutiva e Estética da Oordem dos Médicos não reconhece como cirurgião plástico e reconstrutivo, tem vários processos disciplinares a decorrer na Ordem (...)’”.

N.F.: “No que se refere às habilitações do Dr. José Mendia, foram fornecidos (...) à jornalista pareceres do Dr. Marcelo Rebelo de Sousa e do Dr. Pedro Bleck que justificavam o pedido de equiparação de qualificações e inscrição no colégio. O Dr. José Mendia tem a especialidade de cirurgia plástica e reconstrutiva do Rio de Janeiro, serviço prof. Ivo Pitanguy. Sendo esta uma das mais consagradas escolas de cirurgia plástica do mundo, não parece correcto dizer-se sequer que o Dr. José Mendia não tem habilitações na área da cirurgia plástica”.

C.G.: “Apenas me foi fornecido um parecer e não dois (...). Há dezenas de notícias sobre os processos do Dr. José Mendia na imprensa, a questão do seu não-reconhecimento pela Ordem dos Médicos como cirurgião plástico arrasta-se há dez anos e o parecer que me foi fornecido tem 10 anos e tem por base um acordo cultural entre Brasil e Portugal de 1966. Como não havia dados novos nem do lado do Dr. José Mendia nem da Ordem dos Médicos, não entrei pelos pormenores desta contenda, apenas disse que ela existia (...).

N.F.: “Referente aos retoques [operações posteriores de ajustamento em relação à primeira], apresentou-se a frase ‘a gente não tem de dizer, as pessoas sabem a priori’ também (...) sem contextualizar. O facto de se assinar pré-consentimentos torna do conhecimento dos pacientes todos os riscos decorrentes das cirurgias bem como da necessidade de serem efectuados retoques. Esta informação está muita explícita nos pré-consentimentos.”

C.G.: “O consentimento pré-operatório diz que os doentes aceitam riscos, referindo-se problemas de cicatrização e hematomas. Nenhuma das três doentes com quem falei diz ter sido informada de que poderia precisar de nova operação para obter o resultado pretendido, nem estava disso ciente. Por isso coloquei a pergunta ao Dr. José Mendia e transcrevi a sua resposta”.

Remata a jornalista: “As acusações que me são feitas não têm qualquer fundamento e são pouco rigorosas”. O provedor corrobora esta conclusão, e do que leu acrescenta mais outra, preocupante: a cirurgia estética em Portugal está mesmo sem controlo da parte de quem tem esse dever.

Publicada em 12 de Julho de 2009

DOCUMENTAÇÂO COMPLEMENTAR:

Carta de Nuno Olim Marote Ferreira

Na passada edição de dia 23 de Março e sob o título “Ordem incapaz de controlar cirurgia estética” encontrei vários desvios que em muito comprometem o rigor jornalístico e a clareza de informação.

Sendo o PÚBLICO direccionado para um público com capacidade autónoma de analisar a informação, cabe ao jornalista apresentar essa mesma informação de uma forma clara.

A entrevista mais parece um ataque pessoal ao Dr. José Mendia depois de este e a pedido das jornalistas se ter disponibilizado a receber na sua clínica as jornalistas Catarina Gomes e Alexandra Campos.

Nesta entrevista discutia-se e analisava-se alguns casos em julgamento do Dr. José Mendia bem como o seu pedido de equiparação perante o colégio da especialidade de cirurgia plástica em Portugal.

Logo no inicio da referida entrevista se diz que o “Dr. José Mendia é o alvo de boa parte das queixas”. Parece que em jornalismo rigoroso se deve definir o que é ser “boa parte das queixas”. Segundo dados da Ordem dos Médicos esta recebe cerca de 20 casos por ano na área da cirurgia estética. Assim, tendo o Dr. Mendia quatro casos em julgamento não se percebe esta quantificação, uma vez que o caso da Ana Maria Sonnekalb se refere a 1999, o da [D.] a 2005 e os outros dois processos a 2007. Deste modo pode-se e deve-se fazer uma abordagem mais esclarecedora e menos metafórica, apresentando dados concretos. Apresentar a notícia deste modo mais parece um processo de desinformação.

Na parte em que só se faz referência exclusiva ao Dr. José Mendia a notícia revela-se ainda menos esclarecedora, tentando de um modo grosseiro ridicularizar um profissional com inscrição nº 30557 na Ordem dos Médicos. Saliento, e fazendo uma análise do texto da jornalista Catarina Gomes, que a mesma parece ter feito a entrevista já com o intuito de fazer um julgamento distorcido e tendencioso da actividade do Dr. Mendia.

Mistura e faz uma analogia muito pouco feliz quando mistura a vida privada com casos sérios decorrentes da actividade profissional do médico.

Quando nos propusemos a receber as jornalistas o objectivo era esclarecer os conteúdos das notícias que tinham saído na imprensa acerca dos casos em julgamento, bem como do pedido de equiparação das habilitações do Dr. Mendia e na sua inscrição no colégio da especialidade em Portugal.

Na notícia a jornalista faz questão em salientar que o médico estava visivelmente nervoso e se fazia acompanhar de um amigo, seu suposto auxiliar de memória. O facto de fazer esta alusão parece desde logo que tenta ridicularizar o Dr. José Mendia, não acrescentando valor nenhum aos factos que se queriam noticiar ou analisar.
Outra notória acção de desinformação e distorção da notícia foi o referir completamente fora de contexto e sem encaixe apropriado supostas declarações do Dr. Mendia tais como a que foi usada como chavão no cabeçalho da notícia. Nunca e em momento algum nenhum médico se refere aos seus pacientes como “emocionalmente desequilibrados”. Este comentário surgiu em comentário directo do ataque por parte da paciente [D.] que tem prestado declarações desapropriadas. Salienta-se o seu caso desta paciente decorre em julgamento, aguardando-se para inicio de Maio a leitura da sentença.

No que se refere às habilitações do Dr. Mendia foi fornecido por cortesia à jornalista pareceres do Dr. Marcelo Rebelo de Sousa e do Dr. Pedro Bleck que justificavam o pedido de equiparação de qualificações e inscrição no colégio. O Dr. José Mendia tem a especialidade de cirurgia plástica e reconstrutiva do Rio De Janeiro, serviço prof. Ivo Pitanguy. Sendo esta uma das mais consagradas escolas de cirurgia plástica do mundo não parece correcto dizer-se sequer que o Dr. Mendia não ter habilitações na área da cirurgia plástica.

Podia deste modo a jornalista ter aproveitado para analisar esta matéria tão interessante, que é o mecanismo do Colégio da Especialidade de Cirurgia Plástica. Mas a jornalista nada apresentou acerca deste tema.

Outro ponto importante de salientar foi o facto de se sublinhar que referente aos retoques se apresentou a frase “a gente não tem de dizer, as pessoas sabem a priori” também é dado sem contextualizar. O facto de se assinar pré-consentimentos torna do conhecimento dos pacientes de todos os riscos decorrentes das cirurgias bem como da necessidade de serem efectuados retoques. Esta informação está muita explícita nos pré-consentimentos.

Agradeço deste modo que se reponha a seriedade da noticia e da informação sem distorções. Não é correcto nem suposto haver preconceitos claros nas notícias bem como distorções da realidade por razões que nos ultrapassa.

Nuno Olim Marote Ferreira

Explicações da jornalista Catarina Gomes (e parcialmente da jornalista Alexandra Campos)

As afirmações que faço são sustentadas pela gravação da entrevista que fiz ao Dr José Mendia, com a sua autorização, e que posso disponibilizar de bom grado.
Em resposta à queixa apresentada contra o artigo de 23/03/09 intitulado: "Ordem incapaz de controlar cirurgia estética”, passo a esclarecer cada uma das questões levantadas:

1-“A entrevista mais parece um ataque pessoal ao Dr. José Mendia depois de este e a pedido das jornalistas se ter disponibilizado a receber na sua clínica as jornalistas Catarina Gomes e Alexandra Campos.”

R: Um esclarecimento: Por lapso, refere-se que as duas jornalistas estiveram presentes na entrevista. Haverá uma confusão com a fotojornalista porque eu era a única redactora presente. Apesar de ambas as jornalistas referidas assinarem o texto principal da contextualização.

2-“Logo no inicio da referida entrevista se diz que o “Dr. José Mendia é o alvo de boa parte das queixas”. Parece que em jornalismo rigoroso se deve definir o que é ser “boa parte das queixas”. Segundo dados da Ordem dos Médicos esta recebe cerca de 20 casos por ano na área da cirurgia estética. Assim, tendo o Dr. Mendia 4 casos em julgamento não se percebe esta quantificação, uma vez que o caso da Ana Maria Sonnekalb se refere a 1999, o da [D.] a 2005 e os outros 2 processos a 2007. Deste modo pode-se e deve-se fazer uma abordagem mais esclarecedora e menos metafórica, apresentando dados concretos. Apresentar a notícia deste modo mais parece um processo de desinformação.”

R: A frase a que alude o queixoso não consta do texto escrito pelas jornalistas mas sim na chamada à primeira página e estas não tiveram qualquer intervenção neste texto que foi redigido pelo director de fecho nesse dia, Manuel Carvalho, como é prática no jornal.

Em parte nenhuma dos textos assinados pelas autoras se diz que o médico acumula "boa parte das queixas". Antes se diz que a Ordem dos Médicos (OM) recebe uma estimativa de 20 queixas por ano na área da cirurgia plástica e que o médico em causa tem oito queixas pendentes (cujas datas a OM não forneceu). Os textos interiores referem ainda quatro processos judiciais contra o médico que estão devidamente datados e contextualizados.

Catarina Gomes e Alexandra Campos

3-“Na parte em que só se faz referência exclusiva ao Dr. José Mendia a notícia revela-se ainda menos esclarecedora, tentando de um modo grosseiro ridicularizar um profissional com inscrição nº30557 na Ordem dos médicos. Saliento e fazendo uma análise do texto da jornalista Catarina Gomes que a mesma parece ter feito a entrevista já com o intuito de fazer um julgamento distorcido e tendencioso da actividade do Dr. Mendia. Mistura e faz uma analogia muito pouco feliz quando mistura a vida privada com casos sérios decorrentes da actividade profissional do médico.”

R: “José Mendia, viúvo desde 2004, o conhecido cirurgião plástico, confessa aos 47 anos: Acredito que vou reencontrar o amor” é apenas o último título de uma revista de sociedade (...) onde o médico aparece a falar da sua vida privada. Todos os dados “privados” que ponho na notícia são retirados das revistas Caras e Lux, como se refere. Ou seja, é o próprio quem voluntariamente expõe a sua vida privada na esfera pública em muitíssimas circunstâncias (...).

Parece-me óbvio que a vida privada de Mendia é um dos aspectos mais relevantes deste artigo porque é através da sua exposição mediática em revistas como a Lux e a Caras que faz publicidade à sua clínica que, não por acaso, tem o seu nome. Quando lhe coloquei uma pergunta sobre a entrevista que deu à Caras admitiu que o seu único objectivo era "a promoção da clínica" (gravação).

Não tenhamos dúvidas de que o facto de expor a sua vida privada e ser uma figura pública atrai clientes, como diz uma das queixosas de um dos processos citados (designada como D.) que decidiu recorrer a José Mendia: “Era uma pessoa tão famosa, tão conhecida” (vide artigo). Este facto é de tal forma relevante que alguns artigos de revistas constam do processo judicial que consultei. Relevante é ainda o facto de em lado nenhum dos artigos sobre José Mendia nas revistas cor-de-rosa se falar dos processos que o médico tem pendentes e por isso falo de “vida dupla”.

4-“Quando nos propusemos a receber as jornalistas o objectivo era esclarecer os conteúdos das notícias que tinham saído na imprensa acerca dos casos em julgamento, bem como do pedido de equiparação das habilitações do Dr. Mendia e na sua inscrição no colégio da especialidade em Portugal.”

R: Ficou cristalinamente claro que a questão das habilitações era para a jornalista uma questão lateral, até porque é um processo que se arrasta desde 1999, e que o motivo da entrevista que aceitou dar eram os quatro processos em tribunal, nomeadamente aquele que se encontrava, nessa altura, em fase de julgamento. Foi aliás o advogado de defesa de um dos processos que me deu o contacto do Dr. Mendia.

5-“Na notícia a jornalista faz questão em salientar que o médico estava visivelmente nervoso e se fazia acompanhar de um amigo, seu suposto auxiliar de memória. O facto de fazer esta alusão parece desde logo que tenta ridicularizar o Dr. José Mendia, não acrescentando valor nenhum aos factos que se queriam noticiar ou analisar.”

R: Quando fui recebido pelo Dr. Mendia na sua clínica, este estava acompanhado de um senhor a quem pedi que se identificasse, julgando tratar-se do seu advogado. O senhor, que se apresentou como “amigo” do Dr. Mendia e se identificou como António Amaral, afirmou mais do que escrevi e que passo a transcrever (gravação): "Eu acompanho o Dr José Mendia nestes processos desde 1999 como amigo e, como deve imaginar, isto afecta uma pessoa e eu tenho memória em relação a algumas coisas que o Dr. José Mendia, porque está obviamente afectado por todos estes processos em termos pessoais... Eu estou aqui para servir de grilinho de memória" e, mais à frente, diz que está presente "para relembrar alguns factos".

Se quisesse “ridicularizar” o Dr. Mendia ter-me-ia sido mais fácil citar a expressão usada pelo seu amigo, “grilinho de memória”, em vez da mais inócua expressão “auxiliar de memória”. Não poderia esconder ao leitor que alguns dos factos foram dados pelo seu amigo e que, facto que omiti da notícia, disse desconhecer um dos processos contra ele e que nunca tinha ouvido falar de uma das doentes queixosas, como também atesta a gravação. A referência ao nervosismo serve para estabelecer a relação com o facto de, tal como refere o próprio amigo, o Dr. Mendia se encontrar abalado por estes casos.

6-“Outra notória acção de desinformação e distorção da notícia foi o referir completamente fora de contexto e sem encaixe apropriado supostas declarações do Dr. Mendia tais como a que foi usada como chavão no cabeçalho da notícia. Nunca e em momento algum nenhum médico se refere aos seus pacientes como ‘emocionalmente desequilibrados’”.

R: A citação usada no texto é “muitas vezes lidamos com uma população completamente desequilibrada emocionalmente”. O antetítulo não é da responsabilidade da jornalista mas sim do director de fecho a quem coube paginar o trabalho. De qualquer forma, na entrevista o Dr. Mendia também disse: "a gente muitas vezes lida com doentes completamente desequilibrados emocionalmente" (gravação).

7-“Este comentário surgiu em comentário directo do ataque por parte da paciente [D.] que tem prestado declarações desapropriadas. Salienta-se que o caso desta paciente decorre em julgamento, aguardando-se para início de Maio a leitura da sentença”.

R: O comentário feito pelo Dr. Mendia, que citei no número 6, não veio na sequência de qualquer comentário de uma paciente, mas sim à questão que lhe coloquei sobre como reagia ao facto de ter sido processado por três doentes. As declarações pouco abonatórias do médico sobre a doente em causa foram bastante mais longe, tendo referido que D. seria "viciada em cirurgias", que tomava antidepressivos e: "esta mulher é completamente desequilibrada, coitada", entre outras considerações que me abstenho de transcrever. Perante estas declarações, decidi confrontar a senhora visada com as mesmas, que respondeu: "Disse-lhe que tomava Xanax. Se toda a gente que toma Xanax fosse maluca, metade do mundo estava nessa situação." (vide artigo). É essa, aliás, uma das alegações no caso que estava a ser julgado no tribunal cível de Lisboa: o Dr Mendia diz que D. tinha problemas psiquiátricos e que as operações tiveram óptimos resultados.

A sentença a que alude a carta de acordo com notícia da Lusa publicada no Público:

Publicação: PÚBLICO , Edição: 6993 , Caderno: Caderno Principal Terça, 26 de Maio de 2009 Pág.7

Médico condenado por causa de cirurgia plástica

O Tribunal Cível de Lisboa condenou o médico José Mendia a pagar uma indemnização de oito mil euros a uma cliente que o acusava de más práticas clínicas após ter efectuado um "lifting facial". Os juízes deram como "parcialmente provados" os factos da acusação, tendo condenado Mendia por danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora.O clínico foi ainda condenado a pagar futuros tratamentos de lipoinjecção na zona cervical que a sua antiga cliente venha a fazer e ainda 300 euros pelo crime de violação do direito à imagem, ao tê-la apresentado numa revista como um caso de sucesso, sem a sua autorização. A queixosa, actualmente com 63 anos, pedia uma indemnização de 25 mil euros, por sequelas que disse ter ficado após as três operações plásticas a que foi sujeita.O médico José Mendia, a quem o Colégio da Especialidade de Cirurgia Plástica, Reconstrutiva e Estética da Ordem dos Médicos não reconhece como cirurgião plástico e reconstrutivo, tem vários processos disciplinares a decorrer na Ordem, por práticas associadas a esta especialidade. Lusa

8-“No que se refere às habilitações do Dr. Mendia foi fornecido por cortesia à jornalista pareceres do Dr. Marcelo Rebelo de Sousa e do Dr. Pedro Bleck que justificavam o pedido de equiparação de qualificações e inscrição no colégio. O Dr. José Mendia tem a especialidade de cirurgia plástica e reconstrutiva do Rio De Janeiro, serviço prof. Ivo Pitanguy. Sendo esta uma das mais consagradas escolas de cirurgia plástica do mundo não parece correcto dizer-se sequer que o Dr. Mendia não ter habilitações na área da cirurgia plástica.”

R: Apenas me foi fornecido um parecer e não dois, e não “por cortesia”, mas sim depois de eu ter pedido uma fotocópia após ter sido referido em conversa. Há dezenas de notícias sobre os processos do Dr José Mendia na imprensa, a questão do seu não reconhecimento pela OM como cirurgião plástico é uma questão que se arrasta há dez anos e o parecer que me foi fornecido tem 10 anos e tem por base um acordo cultural entre Brasil e Portugal de 1966. Como não havia dados novos nem do lado do Dr Mendia nem da Ordem dos Médicos não entrei pelos pormenores desta contenda, apenas disse que ela existia. O que se diz é que o médico, que não está inscrito em qualquer colégio de especialidade em Portugal e “explica que desde 1999 que tenta que a OM lhe reconheça as habilitações obtidas no Brasil, sem sucesso”.

9- “Outro ponto importante de salientar foi o facto de se sublinhar que referente aos retoques se apresentou a frase “ a gente não tem de dizer, as pessoas sabem a priori” também é dado sem contextualizar. O facto de se assinar pré-consentimentos torna do conhecimento dos pacientes de todos os riscos decorrentes das cirurgias bem como da necessidade de serem efectuados retoques. Esta informação está muita explícita nos pré-consentimentos.”

R: O consentimento pré-operatório diz que os doentes aceitam riscos, referindo-se problemas de cicatrização e hematomas. Nenhuma das três doentes com quem falei diz ter sido informada de que poderia precisar de nova operação para obter o resultado pretendido, nem estava disso ciente. Por isso coloquei a pergunta ao Dr Mendia e transcrevi a sua resposta.

Em suma, as acusações que me são feitas não têm qualquer fundamento e são pouco rigorosas.

Catarina Gomes

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