domingo, 12 de outubro de 2008

Da infalibilidade de certos jornalistas

Uma notícia “órfã” sobre a demissão de um dirigente do PCP (que afinal não é passado mas eventual futuro) volta a suscitar o problema das fontes

Anunciou o PÚBLICO em 1ª pág. no dia 3, com notícia desenvolvida na pág. 10: “Agostinho Lopes deixa comissão política do PCP” (no interior, o tempo verbal no título, a quatro colunas, era “deixou”). O texto, assinado por São José Almeida, era uma daquelas notícias “órfãs” referidas pelo provedor na crónica anterior. Dizia apenas que “Agostinho Lopes abandonou, a seu pedido, a comissão política do PCP, que integrava desde o XII Congresso, no Porto, em 1988”, sem invocar qualquer fonte (nem sequer o habitual bordão “o PÚBLICO sabe...”, que os jornalistas tanto apreciam) ou mencionar um esforço para ouvir o visado.

O PCP emitiu logo um comunicado procurando desmentir o jornal, com o título “A propósito das falsidades e especulações do PÚBLICO sobre Agostinho Lopes”. No dia seguinte, o jornal ignorou o desmentido mas publicou palavras de Jerónimo de Sousa com idêntico sentido (embora em tom menos categórico), atribuindo à notícia “carácter especulativo e pouco rigoroso”.

O leitor Tiago Redondo, intitulando-se militante comunista, escreveu ao provedor considerando “lamentável” a notícia, “que afinal se revelou ser integralmente falsa”: “Trata-se uma questão de enorme gravidade, não só porque envolve uma pessoa em concreto e as suas posições, (...) mas também porque a publicação destes artigos num tempo de discussão pré-congressual do PCP tem consequências objectivas”.

Não tendo visto mencionado pelo jornal o comunicado do partido, Tiago Redondo voltaria à carga: “A jornalista sentiu alguma necessidade de se justificar, ao escrever, numa caixa da pág. 8 [do dia 4]: ‘Refira-se que essas substituições e mudanças já estão em preparação, daí estar já consagrada a saída de Agostinho Lopes’. Porventura pretendendo dizer que a notícia do dia 3 afinal não era sobre algo que tinha acontecido, era sobre algo que virá a acontecer. Por outro lado, dizendo-nos também que, afinal, não fora o próprio que se demitira, mas que fora afastado. Em qualquer caso, a assumpção de inexactidão da notícia do dia 3 é clara. Duvido que, dúbio que seja, o conceito de ‘jornalismo interpretativo’, possa abrir portas à objectiva falsidade. (...) Teria havido vantagem em explicar aos leitores a fonte das suas informações. Nunca identificando-a pessoalmente, claro (a protecção das fontes é um princípio essencial que deve ser salvaguardado), mas pelo menos situando-nos em relação à sua origem: ‘fonte junto da Comissão Política’, ‘fonte interna do PCP’, ‘fonte do Movimento da Renovação Comunista, afastado da vida partidária há vários anos’, ou mesmo assumir: ‘especulação pessoal da jornalista’”.

Também António Rodrigues, do gabinete de imprensa do PCP escreveu ao provedor porque o jornal “ignorou absolutamente o esclarecimento do PCP e não mostrou qualquer interesse em confirmar a notícia junto do próprio (...), refugiando-se, de forma pouco séria, em quatro palavras alegadamente proferidas pelo secretário-geral do PCP, que terão sido extraídas de um desmentido que este fez na Assembleia da República”. António Rodrigues considera que se trata “de uma grosseira e descarada manipulação da realidade”.

Apreciados os factos, o provedor formou a convicção de que a notícia possui fundamento, embora errada na escala temporal: ou seja, Agostinho Lopes não deixou a Comissão Política, mas não deverá ser reconduzido no próximo Congresso (marcado para daqui a mês e meio). O problema é que as notícias não se fazem com base em convicções, mas sim ou na observação directa do jornalista ou na consulta de fontes credíveis que ele deve esforçar-se por identificar da forma mais aproximada possível (é uma reclamação legítima do público, conforme faz Tiago Redondo).

Por isso o provedor perguntou a São José Almeida se não acharia curial, por um lado, invocar pelo menos uma fonte de informação e, como é também de norma, confirmar a notícia junto do próprio Agostinho Lopes. Resposta da jornalista: “A existência de fonte anónima está implícita. Se o jornalista escreve é porque teve fonte, não sonhou nem inventou. Essa é a regra. Penso, aliás, que é relativamente ridículo usar formulações como ‘soube o PÚBLICO junto de fonte...’ Quanto a citar Agostinho Lopes, é certo que o podia ter feito; no entanto, considerei primordial ouvir a direcção do PCP [na notícia original só é ouvido António Rodrigues, que se limita a dizer: ‘Não há comentários a fazer’]”.

Já antes a jornalista havia explicado ao provedor: “Fiz a notícia com a segurança e a confiança nas fontes contactadas. (...) Sublinho que respeitei todas a regras (...). Quanto ao desmentido, creio que a direcção do PÚBLICO e os editores da secção optaram por referir as palavras de Jerónimo de Sousa (...), o que, na minha opinião, é não só legitimo como recomendável: afinal, é o líder do partido e a cara do PCP”. São José Almeida particulariza ainda que “não havia razão para duplicar o secretário-geral e o comunicado, e seria absurdo ignorar que o secretário-geral do PCP tinha falado sobre o assunto”.

Falar de um não implicaria ignorar o outro: parece de resto ao provedor que o PÚBLICO deveria ter por princípio publicar todas as reacções oficiais a notícias suas, mesmo que em simultâneo as tente rebater, se for caso disso. De alguma forma, o director do PÚBLICO reconhece-o aliás, ao ser questionado pelo provedor sobre a mesma matéria: “O texto do segundo dia, apesar de citar correctamente Jerónimo de Sousa, que desmentiu a informação nos mesmos termos que a nota do PCP, devia ter-se referido à existência desta (...). É uma falha que a direcção admite”.

A jornalista não responde directamente à interpelação de Tiago Redondo quanto a dar-se como passado algo que, afinal, é prospectivo, mas frisa “que o jornalismo político é também antecipação e análise”. José Manuel Fernandes, admite porém “um erro no título (...), pois pode levar a concluir que já ocorreu algo que só sucederá no próximo Congresso do PCP”.

Quanto à questão de fundo, justifica o director: “A experiência da direcção com a jornalista autora da notícia é que esta, quando toca a notícias sobre o PCP, tem fontes à prova de bala. Há muitos anos. Confiamos na informação e estamos convictos de que, no próximo Congresso, a eleição dos órgãos dirigentes nos dará razão. Neste caso, que eu saiba, a direcção não utilizou a possibilidade criada pelo Livro de Estilo de perguntar à jornalista que fontes tinha consultado, designadamente se tinha contactado o próprio ou militantes muito próximos. A notícia surgiu tarde e, face às (boas) experiências anteriores, não sentimos que isso fosse necessário”.

Ficamos assim informados de que existem no PÚBLICO dois tipos de jornalistas: os infalíveis, que estão dispensados de mencionar a origem das informações que publicam, e os outros, sujeitos à terrena condição de que errar é humano, e que portanto se presume deverem invocar as fontes em que sustentam o seu trabalho. Tendo estudado jornalismo in illo tempore, o provedor não aprendeu esta divisão, nem lhe consta que tenha sido entretanto introduzida nos manuais. Mas acha que ao longo da História os homens considerados infalíveis nem sempre produziram bons resultados. Não será o mesmo no jornalismo?


CAIXA:

Para que conste

Um furo num dique, não sendo logo tapado, dá inundação. Foi o caso da frase "fiquei com uma boa relação com o seu accionista (Paulo Azevedo) e vamos ver se isso não se altera", a qual, segundo o Expresso de há três semanas, o director do PÚBLICO teria dito à ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social) que José Sócrates lhe teria dito, num telefonema em que o primeiro-ministro tentava impedir que este jornal publicasse uma investigação acerca das dúvidas em torno do seu diploma de Engenharia. O assunto andou ao retardador: o chefe do Governo levou mais de duas semanas a desmentir que tivesse proferido tal coisa e José Manuel Fernandes outro tanto para se lembrar de que havia enviado à ERC uma versão da acta com aquele seu depoimento em que a frase já não constava [NOTA DO PROVEDOR NA VERSÃO ON-LINE DA CRÒNICA: só a segunda parte da frase desapareceu, já que o director, na acta definitiva, manteve a versão de que José Sócrates lhe falou no bom relacionamento que teria com o accionista Paulo Azevedo]. Aliás, na acta primitiva, e ao contrário do que dizia o Expresso (e o PÚBLICO repetia a seguir, mesmo depois de ouvir o seu director), José Manuel Fernandes não atribuía aquela frase a José Sócrates, apenas lhe imputava essa insinuação, ao invocar na conversa entre ambos uma relação com o accionista do jornal.

Também ao retardador, o provedor vem reconhecer ter incorrido num erro na análise que há duas semanas fez ao assunto. Assumiu, com efeito, que os esclarecimentos que recebera de José Manuel Fernandes representavam uma confirmação implícita da autenticidade da frase que o Expresso e o PÚBLICO diziam que ele atribuíra a José Sócrates, e que não desmentia. O provedor devia afinal ter confrontado directamente José Manuel Fernandes com a nuance existente entre uma frase que se atribui a uma pessoa e a interpretação que se faz do seu pensamento – coisas muito diferentes. (Isto não absolve José Sócrates do pecado da pressão ilegítima sobre a imprensa, dado o que sugere na insólita referência a um proprietário do jornal, mas essa é matéria estranha às competências do provedor).

O leitor Gabriel Silva, que já motivara a outra crónica, pergunta agora: “Não terá o provedor contribuído para ‘desinformação’ dos leitores, ao invés de ajudar a esclarecer?” O provedor admite-o, e portanto publica esta nota, para que conste.
E porque achou estranho José Manuel Fernandes concluir só muito mais tarde (o que ajudou à balbúrdia) que a acta disponibilizada pela ERC não era a que ele havia corrigido, solicitou esclarecimentos ao director, que respondeu: “De vez em quando pedem-me para rever textos transcritos a partir de gravações (tenho neste momento dois para rever) e não me lembrava de ter especificamente revisto aquele. Apesar disso, fiz por precaução uma busca no meu computador e não encontrei nada. (...) Só quando Azeredo Lopes [presidente da ERC] me falou numa troca de mails é que me ocorreu fazer a busca na base de dados no server do PÚBLICO. Foi então que encontrei a troca de mails e os dois textos, o provisório e o corrigido. Nunca me ocorreu, e dificilmente me ocorreria, que a ERC pudesse ter trocado os papéis, razão por que disse que o melhor era citar o Expresso, pois no caso o que valiam eram as actas. De resto, quando vi as actas libertadas pela ERC, achei estranhas algumas coisas na forma como estava transcrito o meu depoimento, (...) mas continuei a achar que devia ser a acta real”.

Publicada em 12 de Outubro de 2008

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR

Carta do leitor Tiago Redondo:

É lamentável a notícia publicada no PÚBLICO de 03-10-2008 pela jornalista São José Almeida sobre uma suposta demissão de Agostinho Lopes da Comissão Política do PCP, que afinal se revelou ser integralmente falsa.

Trata-se uma questão de enorme gravidade, não só porque envolve uma pessoa em concreto e as suas posições (e que certamente saberá falar por si próprio), mas também porque a publicação destes artigos num tempo de discussão pré-congressual do PCP tem consequências objectivas. E a jornalista em causa está com certeza ciente disso.

Como militante do PCP e leitor atento do PÚBLICO sinto-me decepcionado e vejo abalada a confiança que tenho depositado no vosso jornal. Creio poder arrogar-me o direito de dizer que muitos, mesmo muitos, leitores do PÚBLICO gostariam de ver, para além do óbvio e natural desmentido, este assunto discutido na sua próxima crónica.

Aliás, teria muito interesse discutir a opção preferencial (tantas vezes exagerada) que o jornalismo político tem pelos "informadores supostamente bem informados" (as tais fontes internas), esquecendo que esses informadores têm, também, a sua própria agenda e objectivos políticos.

No caso concreto penso que esta era uma informação que nunca deveria ter sido publicada sem que antes houvesse, de facto, uma confirmação por parte do próprio ou uma reacção oficial. E não creio que as declarações do assessor de imprensa - provavelmente apanhado de surpresa - se qualifiquem como tal.

Tiago Redondo

Nota do Gabinete de Imprensa do PCP:

A propósito das falsidades e especulações do «Público» sobre Agostinho Lopes

Face à falsidade da noticia e das especulações em torno dela produzidas pelo jornal PÚBLICO, que refere que “Agostinho Lopes deixou a Comissão Política do PCP”, e que as suas responsabilidades foram entregues a outro membro da Comissão Política, o Gabinete de Imprensa do PCP esclarece que:

1. Agostinho Lopes permanece na Comissão Política do PCP e mantém todas as responsabilidade de direcção no acompanhamento das questões da economia, agricultura, pescas e União Europeia, bem como as funções de deputado na Assembleia da República.

2. Apenas numa área, a da agricultura, participa também, há cerca de dois anos, João Frazão, da Comissão Política, sem que se tenha verificado alteração na responsabilidade da área que continua a ser assumida por Agostinho Lopes.

3. A futura composição dos órgãos de direcção do PCP, a sair do XVIII Congresso, será considerada na altura própria, com as decisões correspondentes, como é prática do PCP.

Nova carta do leitor Tiago Redondo:

Lamento importuná-lo de novo sobre este assunto, mas imagine a minha surpresa (e decepção) ao verificar, na edição do PÚBLICO de 04-10-2008, que não só não foi publicado nenhum desmentido sobre a notícia falsa sobre a demissão de Agostinho Lopes da Comissão Política como a mesma jornalista insiste com a sua inverdade, não fundamentada, sobre este assunto.

De facto, embora não haja nenhuma referência ao desmentido emitido pela Comissão Política, a jornalista sentiu alguma necessidade de se justificar, ao escrever, numa caixa da página 8 dessa edição: "Refira-se que essas substituições e mudanças já estão em preparação, daí estar já consagrada a saída de Agostinho Lopes." Porventura pretendendo dizer que a notícia do dia 3 afinal não era sobre algo que tinha acontecido, era sobre algo que virá a acontecer. Por outro lado, dizendo-nos também que, afinal não fora o próprio que se demitira, mas que afinal fora afastado. Em qualquer caso, a assumpção de inexactidão da notícia do dia 3 é clara. Duvido que, dúbio que seja, o conceito de "jornalismo interpretativo", possa abrir portas à objectiva falsidade.

Sem querer entrar na questão da futurologia política que esta afirmação comporta, penso que teria havido vantagem em explicar aos leitores a fonte das suas informações. Nunca identificando-a pessoalmente, claro (a protecção das fontes é um princípio essencial que deve ser salvaguardado, em qualquer caso), mas pelo menos situando-nos em relação à sua origem: "fonte junto da Comissão Política", "fonte interna do PCP", "fonte do Movimento da Renovação Comunista, afastado da vida partidária há vários anos", ou mesmo, assumir: "especulação pessoal da jornalista".

Já abordei, no meu mail anterior, a questão da responsabilidade de quem informa e da necessidade de ter presentes as consequências do que é publicado, e não pretendo maçá-lo mais com isto, mas, de facto, sem terem mais nenhuma explicação sobre os critérios e razões para esta actuação jornalística, muitos leitores não deixarão de ver nestas notícias uma determinada intencionalidade por parte do PÚBLICO em perturbar um debate em curso no PCP. O que seria inaceitável. Não gostaria de me contar nesse número, e por isso apelo para que me possa esclarecer.

Tiago Redondo

Explicação de São José Almeida:

Tenho a dizer somente que fiz a notícia com a segurança e a confiança nas fontes contactadas. É certo que é uma notícia com fontes anónimas, como, aliás, são a maioria das notícias sobre partidos em Portugal – mas isso tem a ver com a transparência da vida política e é um outro assunto. Sublinho que respeitei todas a regras. O PCP é citado na notícia, através do gabinete de imprensa e do assessor António Rodrigues. E, no dia em que foi questionado, apenas disseram que não tinham nada a comentar, como se pode ler na notícia. Quanto ao desmentido, creio que a direcção do PÚBLICO e os editores da secção optaram por referir as palavras de Jerónimo de Sousa, que é secretário-geral do PCP, a citar um comunicado do gabinete de imprensa, o que, na minha opinião, é não só legítimo como recomendável: afinal, Jerónimo de Sousa é o líder do partido e é a cara do PCP perante o país. Quanto à futurologia ou não futurologia, não comento as expressões – essa como outras -, agora friso que o jornalismo político é também antecipação e análise.

São José Almeida

Carta de António Rodrigues (gabinete de imprensa do PCP):

O jornal PÚBLICO divulgou na passada sexta-feira, com destaque na primeira página, uma notícia onde se afirmava que "Agostinho Lopes deixou a Comissão Política do PCP" o que, não sendo verdade, provocou as mais variadas especulações e foi objecto de um categórico desmentido da parte do PCP e a que o v/ jornal teve acesso.

A edição do PÚBLICO do dia seguinte ignorou absolutamente o esclarecimento do PCP e não mostrou qualquer interesse em confirmar a notícia junto do próprio, como o fizeram outros órgãos de comunicação social, designadamente o DN, refugiando-se, de forma pouco séria, em quatro palavras alegadamente proferidas pelo Secretário-Geral do PCP, que terão sido extraídas de um desmentido que este fez na Assembleia da República, quando questionado por jornalistas sobre o assunto e cujo sentido foi exactamente o que está contido na nota que o Gabinete de Imprensa do PCP divulgou.

Por tudo isto, e porque se trata de um violento atropelo ao chamado Livro de Estilo do PÚBLICO, e também de uma grosseira e descarada manipulação da realidade, dirigimos-nos ao Provedor do Leitor para lhe fazer sentir o nosso protesto e a nossa indignação, para lhe dar conta de todas as tentativas, infrutíferas, com vista a permitir que os leitores do PÚBLICO pudessem ter acesso à realidade dos factos e para lhe lançar o desafio de não permitir que este assunto “caia em saco roto”.

António Rodrigues
Gabinete de Imprensa do PCP


Troca de mails entre São José Almeida e o provedor:

Creio que no primeiro mail respondi a esta questão [suscitada pela carta de António Rodrigues]. Não havia razão para duplicar o secretário-geral e o comunicado e seria absurdo ignorar que o secretário-geral do PCP tinha falado sobre o assunto.

São José Almeida

Ainda sobre este assunto, gostaria de lhe perguntar se não acha curial que:

a) na notícia original fosse invocada pelo menos uma fonte (digo "invocada", não digo "identificada");
b) para a produção da mesma notícia se fizesse pelo menos uma tentativa de ouvir o visado.

O provedor

A existência de fonte anónima está implicita. Se o jornalista escreve é porque teve fonte, não sonhou nem inventou. Essa é a regra. Penso, aliás, que é relativamente ridículo usar formulações como "soube o PÚBLICO junto de fonte...". Quanto a citar Agostinho Lopes, é certo que o podia ter feito; no entanto, considerei primordial ouvir a direcção do PCP.

São José Almeida

Explicações do director do PÚBLICO:

Em primeiro lugar, a experiência da direcção com a jornalista autora da notícia é que esta, quando toca a notícias sobre o PCP, tem fontes à prova de bala. Há muitos anos. Confiamos na informação e estamos convictos de que, no próximo Congresso, a eleição dos órgãos dirigentes nos dará razão.

Neste caso, que eu saiba, a direcção não utilizou a possibilidade criada pelo Livro de Estilo de perguntar à jornalista que fontes tinha consultado, designadamente se tinha contactado o próprio ou militantes muito próximos. A notícia surgiu tarde e, face às (boas) experiências anteriores, não sentimos que isso fosse necessário.

O texto do segundo dia, apesar de citar correctamente Jerónimo de Sousa, que desmentiu a informação nos mesmos termos que a nota do PCP, devia ter-se referido à existência desta, mesmo que tivesse mais força citar o próprio secretário-geral do que uma nota de imprensa, como fizemos. É uma falha que a direcção admite, até pela relativa secundarização do desmentido. Porém, estando ele dado, insistir na sua repetição, como fez o PCP, pareceu-nos excessivo, sobretudo porque ao longo de todo o processo faltou o desmentido que seria realmente decisivo: o do próprio Agostinho Lopes. Ele, mais do que o PCP, é que sabe o que tenciona fazer.

Admito que possa ter havido um erro no título da primeira página, pois deste pode levar a concluir-se que já ocorreu algo que só sucederá no próximo Congresso do PCP.

José Manuel Fernandes

Carta do leitor Gabriel Silva:

Julgo haver matéria suficiente nos últimos dias para se continuar a analisar a questão das declarações de José Manuel Fernandes/Sócrates/ERC.

No entanto, e como ponto prévio, há que reconhecer ter existido desde o início um problema que convém resumir:

1. O Expresso escreve: "Também o director do PÚBLICO foi claro em considerar como 'pressão ilegítima a tentativa de evitar que as notícias saiam' e relatou uma parte da conversa com o PM para exemplificar o tipo de diálogo ocorrido: 'Fiquei com uma boa relação com o seu accionista (Paulo Azevedo) e vamos ver se isso não se altera', terá dito Sócrates ao director do jornal da Sonae."

2. O PÚBLICO (a 21/09) repete: "O director do PÚBLICO foi ainda mais longe, reportando-se à conversa com Sócrates, no decurso da qual o primeiro-ministro teria dito: 'Fiquei com uma boa relação com o seu accionista [Paulo Azevedo] e vamos ver se isso não se altera'."

3. Ora, sucede que o Expresso (e o PÚBLICO por repetição) não reproduz fielmente o que constava na acta (a apócrifa, mas, ainda assim, a base da transcrição), pois na mesma se diz: "(O primeiro-ministro) fez uma referência subtil ao facto de ter estabelecido uma boa relação com o eng. Paulo de Azevedo durante a
OPA, o que queria dizer: fiquei com uma boa relação com o seu accionista e vamos ver se isso não se altera. É uma interpretação subliminar dizer que sempre existiu uma boa relação com o accionista (e admitir que ela poderia ser posta em causa?)".

4. Em bom português, não é ali afirmado que o PM terá dito, mas sim "o que queria dizer", isto é, é uma interpretação (aliás, no sentido do que depois JMF escreveu na segunda acta).

5. Temos portanto o Expresso a abusivamente atribuir a JMF ter dito que o PM tinha dito....

Ora, venho questionar o seguinte:

No momento da crónica do Provedor, já estavam disponíveis (desde 24), as actas no site da ERC. No seu blogue o Provedor faz mesmo um link para as mesmas. Apesar disso, o Provedor repete, sem correção, o afirmado pelo Expresso e repetido pelo PÚBLICO, de que teria havido um frase e não uma interpretação.

A meu ver, o Provedor vai mesmo um pouco mais longe e afirma a certo ponto "Frase que o Director porém entendeu agora confirmar", seguindo-se uma exposição de JMF onde não apenas este não confirma como, na ausência das actas e na incerteza (por ter passado mais de um ano) remete, com várias cautelas explicativas, para o publicado pelo Expresso. Acresce ainda que a sua frase (acompanhada pela respectiva imagem) "para mais com uma frase que parece saída de O Padrinho" é obviamente um juízo de valor. Que não estaria mal indicado se a frase tivesse sido proferida, mas, pelo que se sabe e se podia saber, não foi.

Assim, pergunto: não terá o Provedor "esquecido-se" de ler as actas, quando já o poderia fazer? Não terá o Provedor ido um pouco longe de mais ao dizer que JMF "confirmava", quando este, objectivamente, não confirma? Não terá o Provedor contribuído para "desinformação" dos leitores, ao invés de ajudar a esclarecer?

Gabriel Silva

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