Há muito mais responsabilidade na escolha de uma fotografia para publicação do que por vezes julgam os jornalistas
O provedor regressa ao tema da fotografia.
“Pela primeira vez se dirige” M. Malaca ao provedor, apesar de já “ter ficado indignado com certas coisas publicadas” neste diário – só que a edição de 23 de Abril “ultrapassa tudo, e o [seu] sentimento é de nojo”. Quais as razões para tanta repulsa? “Quase metade da primeira página é preenchida com uma foto de uma triste personagem segurando um chapéu de chuva e ao lado direito uma janelinha na qual se chama a atenção para uma figura MAIOR da Cultura Universal e que deveria merecer mais respeito por parte do jornal, até pelos termos usados para noticiar o evento”. A “triste personagem” é Jorge Nuno Pinto da Costa, presidente do Futebol Clube do Porto, a entrar na véspera para o Tribunal de Gondomar, em mais um episódio da novela judicial que o envolveu, sob o título “Apito Dourado: Pinto da Costa e Carolina Salgado vão defrontar-se em tribunal”. A “figura maior da cultura universal” é o Nobel da Literatura José Saramago, numa imagem de arquivo ao lado do título “O escritor que subverteu a pontuação numa mega exposição em Lisboa”.
Já na anterior crónica o provedor abordara as orientações para escolha da foto maior de capa, mas vale a pena atender a uma explicação mais substanciada do director do PÚBLICO: “Só por excepção recorremos a fotos de arquivo, se bem que isso seja (...) mais fácil de escrever do que de concretizar se desejamos uma foto forte. As fotos devem ser do dia ou resultar de um trabalho publicado naquele dia. (...) A escolha das fotos de capa é uma das principais responsabilidades da direcção e da direcção de arte, podendo ocupar várias horas por dia”.
O princípio exposto por José Manuel Fernandes, aplicável à situação em análise, justifica-se num diário que dá primazia à actualidade. Ao contrário do rosto de Saramago, a foto de Pinto da Costa era do dia, com a vantagem de fornecer à primeira página uma solução gráficamente mais interessante e atractiva. Acresce que o jornal não está obrigado à ordenação das notícias segundo uma qualquer escala de relevo (sempre subjectiva) dos protagonistas. Estipula aliás o seu Estatuto Editorial que o “PÚBLICO estabelece as suas opções editoriais sem hierarquias prévias entre os diversos sectores de actividade, numa constante disponibilidade para o estímulo dos acontecimentos e situações que, quotidianamente, são noticiados e comentados”.
Problema mais sensível, ainda a ver com portuenses fotografados na capa, foi suscitado por Angelina Carvalho a propósito da reportagem “Tráfico de droga deslocalizou-se para o bairro social do Cerco”, publicada apenas na secção Local da edição Porto de 10 de Junho (com síntese na edição Lisboa mas sem as componentes questionadas).
Reclamou a leitora: “Na primeira página, no canto superior direito, aparece uma fotografia: em primeiro plano um jovem cigano e em segundo plano um senhor de boné e barba. Acontece que logo no início do texto se refere que entre os indivíduos que nunca saem do bairro há ‘um homem de barba e boné que vende prata’ (para preparar a heroína fumada). Por coincidência infeliz, a pessoa fotografada, deputado da Assembleia da Junta de Freguesia, membro de várias associações locais, com um trabalho comunitário reconhecido, esteve com a equipa de reportagem, a pedido desta, para estabelecer contactos (...). A sua fotografia foi tirada sem autorização, e, relacionada com o texto atrás referido, pode levar, para quem não o conhecer, a conotações pouco agradáveis. Dando de barato que foi um acaso, revela ainda assim pouco cuidado (...) e merece, da parte do jornal, um esclarecimento e pedido de desculpas”.
Tal pedido parece ter existido, mas de forma peculiar, de acordo com a explicação conjunta de Amílcar Correia, subdirector para a edição Porto, e Ana Cristina Pereira, autora da reportagem, defendendo apesar de tudo a opção do jornal: “Todas as pessoas fotografadas deram a sua autorização (...). Todas as fotografias foram tiradas durante o dia, pelo que nos pareceu evidente que nenhuma retrata o movimento nocturno de tráfico reportado no texto (...). O jornal foi informado de que uma das duas pessoas retratadas na fotografia (...) estava descontente. Achava que poderia haver alguma má interpretação (...). Decidiu-se telefonar às duas pessoas a pedir desculpa e republicar essa fotografia como ‘Foto da semana’, rubrica que sai ao sábado [só na edição Porto]. Na legenda torna-se a explicar que ‘de dia o Bairro do Cerco do Porto é quase pacato’. E afirma-se que nem esta nem as outras fotografias publicadas [na reportagem] representam o universo do tráfico de droga. Apanham momentos da vida do Cerco do Porto a meio da tarde. Há imagens dos rapazes que jogam à malha junto ao ringue, (...) de uma alcoólica que se passeia de garrafa na mão”.
Mas também acerca da foto da “alcoólica” protestou Angelina Carvalho: “[É] identificada com o seu próprio nome (Rosa) e [dela] se diz (...) que ‘a alcoólica Rosa passeia entre [os prédios]’. Não se trata de ‘Rosa, que é alcoólica’ mas da ‘alcoólica Rosa’. Ou seja, a sua identificação passou a ser, não o nome, mas a sua qualidade de alcoólica. A senhora em questão pode ter dado o consentimento para a sua fotografia (...) mas, como é evidente, dada a condição de alcoólica que a reportagem refere, as condições psíquicas, cognitivas e emocionais tornarão esse consentimento pouco fiável. Além disso, a utilização de alguém em estado de vulnerabilidade nada acrescenta ao conhecimento do que é tratado, revela crueldade para com aquela pessoa e significa que o jornal se sentiu protegido, (...) porque esse alguém não se pode defender, (...) não tem os meios, os instrumentos ou os dispositivos para o fazer. (...) Depois de se saber que a reportagem saiu, todo o bairro a lê e comenta, reforça-se a imagem de degradação daquela pessoa (...) e humilha-se ainda mais a família”.
Os jornalistas admitem neste caso o erro: “Não devíamos publicar rostos de pessoas embriagadas, como não devemos publicar rostos de pessoas que consumiram outras drogas. O fotógrafo pôs em linha sem pudor, talvez porque a senhora não só deu consentimento (...) como posou para a fotografia”. Defendem porém a menção à personagem: “Não parece que a referência à sua existência, no texto, seja ofensiva. (...) Toda a gente no Cerco conhece aquela senhora, sabe o seu nome, a sua história. Usamos apenas um nome próprio, prática comum na referência a pessoas que não queremos tornar identificável ao exterior”. (Mas é claro que uma foto – “escusada”, reconhecem os jornalistas – identifica mais uma pessoa perante a sociedade do que a publicação integral dos dados do seu bilhete de identidade).
Não ficam por aqui os problemas com fotos desta reportagem. Observa ainda Angelina Carvalho: “Porque conheço o bairro posso dizer que também a fotografia dos jovens legendada com ‘o clima de tensão tem vindo a agravar-se’ está incorrectamente referenciada. Basta olhar para essa fotografia para se perceber que neste grupo não há tensão. São jovens que têm fortes redes de sociabilidade e estavam a jogar quando aceitaram ser fotografados”.
Explicação dos jornalistas: “O trabalho engloba três textos: um sobre o movimento (nocturno) do tráfico de droga, um com opinião de especialistas acerca da transferência dos fluxos de tráfico (...) para o Cerco, outro com reacções dos moradores sobre o facto de o presidente da Câmara [Rui Rio] ter admitido a hipótese de ‘demolir um bloco se for aconselhável ao nível urbanístico’ (...). Todas as fotografias foram tiradas quando se estava a fazer a reportagem sobre a eventual demolição de algum bloco, e, de forma automática, as pessoas falavam sobre a tensão no bairro associada ao tráfico”.
Parecem razoáveis, aos olhos do provedor, as respostas e a admissão de faltas por parte dos responsáveis pela edição. Espera-se que alertem para pontos cruciais mas que os jornalistas tendem muitas vezes a menosprezar.
CAIXA:
Uma questão de sensibilidade
Duas reclamações recebidas em 20 de Maio no espaço de menos uma hora, ambas de endereços electrónicos da Universidade de Harvard, mostram que as imagens difundidas pelo PÚBLICO on-line afectam particularmente a sensibilidade de pelo menos um par de portugueses expatriados no Massachusetts (EUA). “Tenho vindo a notar que as fotos (...) estão a aumentar em agressividade”, escreveu Maria Sá. “A do braço de uma criança morta nos escombros do recente terramoto na China representa um desses exemplos. A que neste momento se encontra, do olhar de um zimbabueano em sofrimento, é, na minha opinião, tão chocante que não deveria invadir e ferir desta forma a sensibilidade de uma pessoa que vos tem como homepage. (...) Concordo que faz parte do trabalho de um jornalista dar a conhecer o drama humano, mas talvez seja possível criar uma página separada para fotos e/ou filmes deste nível emocional tão forte, para, pelo menos, preparar os leitores”. Ao que José Antão acrescentou: “Tenho vindo a notar (...) maior frequência na inclusão de fotos com conteúdos mais duros e susceptíveis de chocar (...). No ano passado, aquando da explosão numa refinaria na Nigéria, o PÚBLICO – sensatamente – questionou os leitores acerca da inclusão de uma imagem do acidente na primeira página da edição impressa. (...) Manifestei-me contra, visto ser muito mais violência gratuita do que jornalismo. O mesmo se pode aplicar a estes casos”. Segue-se idêntica sugestão, com remissão, a título de exemplo, para a página da BBC News.
As explicações do editor do PUBLICO.PT Sérgio B. Gomes: “Não existe (...) nenhuma mudança editorial ou intenção deliberada no sentido de mostrar na homepage fotografias ‘chocantes’, ‘agressivas’ ou ‘duras’. Os dois principais critérios que norteiam a selecção de fotografias para a secção ‘Foto do dia’ são a importância noticiosa (...) e a qualidade estética e técnica (...). O PÚBLICO on-line pondera sempre que está perante uma fotografia que dá apenas o horror pelo horror (...). Mas não tem pudor de publicar uma fotografia com inegável importância noticiosa só porque o seu conteúdo pode chocar alguns leitores. Haverá sempre imagens que chocam mais uns leitores do que outros. A realidade em que vivemos é muitas vezes chocante. O PÚBLICO on-line luta por não ser o espelho de um mundo asséptico, expurgado de imagens que mostram acontecimentos na sua faceta mais imediata e crua. A sugestão dos leitores que aponta para uma personalização da homepage de modo a atirar para outro local da página as imagens mais susceptíveis não nos parece plausível. Isso pressuporia criar uma página com diferentes ‘níveis de choque’”.
Em todo o caso, apenas por uma questão de bom senso e bom gosto, julga o provedor que seria de ponderar o processo seguido pela BBC na sua página noticiosa.
Publicada em 10 de Agosto de 2008
DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR
Carta de leitor sobre fotos de primeira página
Desde que o PÚBLICO nasceu e que o leio já me aconteceu ter ficado indignado com certas coisas publicadas no jornal, porém hoje ultrapassa tudo e o meu sentimento é de nojo. Quase metade da primeira página é preenchida com uma foto de uma triste personagem segurando um chapéu de chuva e ao lado direito uma janelinha na qual se chama a atenção para uma figura MAIOR da Cultura Universal e que deveria merecer mais respeito por parte do jornal, até pelos termos usados para noticiar o evento.
Depois daquele episódio bastante lamentável do Sr. António Barreto com a pseudo carta do Almirante Rosa Coutinho, não há dúvida de que o PÚBLICO nos está cada vez mais a tomar-nos por tolos.
Mas lendo o editorial do Director no mesmo número talvez se perceba melhor por que é que estas coisas acontecem.
É esta a indignação de um leitor que ao longo de muitos anos de leitura do PÚBLICO pela primeira vez se dirige ao Sr. Provedor e que nem sequer pretende ter razão, mas sinto-me chocado por uma primeira página que não vi imitada em mais nenhuma publicação.
M. Malaca
Explicações do director sobre os critérios de selecção de fotos para capa
De uma forma geral, prefere-se uma foto do dia boa, seja na primeira página, seja em qualquer das páginas mais informativas do jornal. Mas como há assuntos de que não há foto do dia, ou a foto do dia não é boa, recorre-se muitas vezes a fotos que queremos que sejam mais do que ilustrativas, sejam fotos que sustentem as páginas e tenham impacto gráfico quando são paginadas com grande dimensão. Há mesmo soluções (como no plano sobre os Jogos Olímpicos da edição de sexta-feira, 1 de Agosto) em que a fotografia mais importante das duas páginas é uma foto-legenda forte que não tem a ver directamente com o tema concreto do artigo de abertura.
Na primeira página, só por excepção recorremos a fotos de arquivo, se bem que isso seja, sobretudo nalguns períodos do ano, mais fácil de escrever do que de concretizar, se desejamos uma foto forte. As fotos devem ser do dia ou resultar de um trabalho publicado naquele dia. Por exemplo: na última semana, só nos dias 29 de Julho e 2 de Agosto recorremos a fotos de arquivo. Nos outros cinco dias, em quatro eram fotos do dia e a 28 de Julho uma foto realizada especialmente para um trabalhado, editado nesse dia, sobre a comunidade cigana.
A escolha das fotos de capa é uma das principais responsabilidades da direcção e da direcção de arte, podendo ocupar várias horas por dia e implicar encomendas especiais (exemplo: a fotografia de dia 1 de Agosto, feita num restaurante em que se estava a assistir à comunicação do Presidente).
José Manuel Fernandes
Carta de uma leitora sobre as fotos da reportagem acerca do Bairro do Cerco (Edição Porto)
O silêncio dos indefesos
Dirijo-me ao Provedor do Leitor por causa da reportagem do vosso jornal de 10 de Junho de 2008 “Tráfico de droga deslocalizou-se para o Bairro social do Cerco”.
Esta reportagem apresenta algumas questões que me parece que devem ser objecto de atenção por parte da direcção desse jornal e que me parece que resultam não só do texto mas também da forma como este interage com as fotos e legendas apresentadas.
1 – Aparece uma fotografia de uma senhora identificada com o seu próprio nome (Rosa) e de quem se diz, no texto ao lado, que “a alcoólica Rosa passeia entre eles [prédios]”. Não se trata de “Rosa, que é alcoólica…” mas da “alcoólica Rosa…”. Ou seja, a sua identificação passou a ser, não o nome, mas a sua qualidade de alcoólica.
A senhora em questão pode ter dado o seu consentimento para a sua fotografia ser utilizada mas, como é evidente, dada a condição de alcoólica que a reportagem refere, as condições psíquicas, cognitivas e emocionais tornarão esse consentimento pouco fiável. Além disso, a utilização de alguém em estado de vulnerabilidade nada acrescenta ao conhecimento do que é tratado, revela crueldade para com aquela pessoa e significa que o jornal se sentiu protegido face à exposição pública de alguém. Sente-se protegido porque esse alguém não se pode defender. É alguém que não tem os meios, os instrumentos ou os dispositivos para o fazer. Dirão que “aquilo em nada alterou a vida daquela pobre mulher”. Não tenho tanta certeza disso, uma vez que, depois de se saber que a reportagem saiu, todo o bairro a lê e comenta, reforça-se a imagem de degradação daquela pessoa que se expôs publicamente e humilha-se ainda mais a família.
Aquela mulher está indefesa perante a comunicação social, mesmo quando os mais elementares direitos estão em causa; o seu silêncio e passividade são garantidos quer pela identificação do grupo social de pertença quer pela sua condição de dependente, e o jornal sabe que está perante alguém indefeso que não representa qualquer perigo.
2 – Porque conheço o bairro, posso dizer que também a fotografia dos jovens legendada com “o clima de tensão tem vindo a agravar-se no bairro do Cerco” está incorrectamente referenciada. Aliás, basta olhar para essa fotografia para se perceber que neste grupo não há tensão. Eles são jovens que têm fortes redes de sociabilidade e estavam a jogar quando aceitaram ser fotografados. Fizeram-no também sem saber que iriam ser utilizados para exemplificar uma “forte tensão”. Também eles oferecem a garantia do seu silêncio pelo desconhecimento e incapacidade de defesa no terreno da comunicação social.
3 – Na primeira página do jornal, no canto superior direito, aparece uma fotografia: em primeiro plano um jovem cigano e em segundo plano um senhor de boné e barba.
Acontece que logo no início do texto se refere que entre os indivíduos que nunca saem do bairro há “um homem de barba e boné que vende prata” (para preparar a heroína fumada).
Por coincidência infeliz a pessoa fotografada, deputado da Assembleia da Junta de Freguesia, membro de várias associações locais, com um trabalho comunitário reconhecido, esteve com a equipa de reportagem, a pedido desta, para estabelecer contactos e apresentar as pessoas com quem falaram. A sua fotografia foi tirada sem autorização e, relacionada com o texto atrás referido, pode levar, para quem não o conhecer, a conotações pouco agradáveis. Dando de barato que foi um acaso, revela ainda assim pouco cuidado na escolha dos materiais e merece, da parte do jornal, um esclarecimento e pedido de desculpas.
Não deixo de reconhecer que a abordagem à problemática da deslocalização de problemas de um bairro para outro e das contradições e tensões que daí decorrem está efectuada com sensibilidade e perspicácia.
Angelina Carvalho
Explicações do subdirector para a Edição Porto e da autora da reportagem
O trabalho engloba três textos: um sobre o movimento (nocturno) do tráfico de droga, um com opinião de especialistas acerca da transferência dos fluxos de tráfico do Bairro São João de Deus para o Cerco, outro com reacções dos moradores sobre o facto de o presidente da Câmara [Rui Rio] ter admitido a hipótese de “demolir um bloco se for aconselhável ao nível urbanístico para criar um jardim ou abrir uma rua”.
Todas as pessoas fotografadas deram a sua autorização para serem fotografadas. Todas as fotografias foram tiradas durante o dia, pelo que nos pareceu evidente que nenhuma retrata o movimento nocturno de tráfico reportado no texto principal. Todas as fotografias foram tiradas quando se estava a fazer a reportagem sobre a eventual demolição de algum bloco e, de forma automática, as pessoas falavam sobre a tensão no bairro associada ao tráfico.
O jornal foi informado de que uma das duas pessoas retratadas na fotografia publicada no canto superior direito da primeira página estava descontente. Achava que poderia haver alguma má interpretação, isto é, que poderia ser conotada com o tráfico.
O assunto foi debatido e concluiu-se que fazer um “O PÚBLICO errou” não resolveria o problema. Decidiu-se telefonar às duas pessoas a pedir desculpa e republicar essa fotografia como “Foto da semana”, uma rubrica que sai ao sábado [só na Edição Porto]]. Na legenda torna-se a explicar que “de dia o Bairro do Cerco do Porto é quase pacato”. E afirma-se que nem esta nem as outras fotografias publicadas na [reportagem] representam o universo do tráfico de droga. Apanham momentos da vida do Cerco do Porto a meio da tarde. Há imagens dos rapazes que jogam à malha junto ao ringue, do presidente do clube de pesca que se cruza com o rapaz que mora com a esposa numa carrinha, de uma alcoólica que se passeia de garrafa na mão.
Sobre o uso de uma fotografia da senhora Rosa: esta fotografia não devia ter saído. Não devíamos publicar rostos de pessoas embriagadas, como não devemos publicar rostos de pessoas que consumiram outras drogas.
O fotógrafo pôs em linha sem pudor, talvez porque a senhora não só deu consentimento para ser fotografada como posou para a fotografia. A leitora considera que a referência a esta pessoa não acrescenta nada ao conhecimento do que é tratado. Não parece que a referência à sua existência, no texto, seja ofensiva. Ela faz parte da imagem do Cerco. Há roupa a secar nas paredes dos prédios, bandeiras de Portugal a esvoaçar, aquela senhora a passear de garrafa na mão, grávidas e mães adolescentes entretidas num carro preto... Toda a gente no Cerco conhece aquela senhora, sabe o seu nome, a sua história. Usamos apenas um nome próprio, prática comum na referência a pessoas que não queremos tornar identificável ao exterior. A foto sim, era escusada.
Amílcar Correia/Ana Cristina Pereira
Protestos de dois leitores sobre as fotografias do PUBLICO.PT
Sou assinante do PÚBLICO há vários anos (ultimamente so da versão on-line porque resido fora do Pais) e é com grande pena que escrevo estas linhas. Tenho vindo a notar que as fotos (quase sempre de grande qualidade, por sinal) seleccionadas para a página digital do PÚBLICO estão a aumentar em agressividade. A do braço de uma crianca morta nos escombros do recente terramoto na China representa um desses exemplos. A que neste momento se encontra, do olhar de um zimbabueano em sofrimento, é, na minha opinião, tao chocante que não deveria invadir e ferir desta forma a sensibilidade de uma pessoa que vos tem como homepage. Não creio que seja uma pessoa particularmente sensível, e concordo que faz parte do trabalho de um jornalista dar a conhecer o drama humano, mas talvez seja possível criar uma página separada para fotos e/ou filmes deste nível emocional tão forte para, pelo menos, preparar os leitores para o que se segue.
Maria Sá
Tenho vindo a notar nos últimos tempos uma maior frequência na inclusão de fotos com conteúdos mais duros e susceptíveis de chocar algumas (ou muitas) pessoas no vosso site.
Acredito que tais materiais devem estar acessíveis para toda a gente, e é bastante importante que essa forma de jornalismo se mantenha no site. No entanto, parece-me desnecessário e inapropriado que fotos desta natureza sejam incluídas em grande formato na vossa página inicial, onde qualquer pessoa que procura apenas notícias é obrigatoriamente confrontada com estas visões.
No ano passado, aquando da explosão numa refinaria na Nigéria, o PÚBLICO - sensatamente - questionou os leitores acerca da inclusão de uma imagem deste acidente na primeira página da edição impressa. Eu vi essa imagem e, como tantas outras pessoas, manifestei-me contra, visto ser muito mais violência gratuita do que jornalismo. O mesmo se pode aplicar a estes casos que se vêm verificando com as fotos do site.
Sugiro que haja um nivel de protecção, que permita aos leitores aceder a estes documentos seguindo um link, em vez de aparecerem automaticamente quando se abre a página, ou que usem um sistema de personalização para o site, em que os leitores possam programar as suas preferências e incluir apenas os materiais que mais lhes interessem (vide a pagina da BBC, por exemplo).
José Antão
Resposta de um editor do PUBLICO.PT
Não existe no PÚBLICO on-line nenhuma mudança editorial ou intenção deliberada no sentido de mostrar na homepage fotografias “chocantes”, “agressivas” ou “duras”. Os dois principais critérios que norteiam a selecção de fotografias para a secção “Foto do dia” são a importância noticiosa de um assunto e a qualidade estética e técnica das imagens. O PÚBLICO on-line pondera sempre que está perante uma fotografia que dá apenas o horror pelo horror e que não acrescenta nada à notícia. Mas não tem pudor de publicar uma fotografia com inegável importância noticiosa só porque o seu conteúdo pode chocar alguns leitores. Haverá sempre imagens que chocam mais uns leitores do que outros. A realidade em que vivemos é muitas vezes chocante. O PÚBLICO on-line luta por não ser o espelho de um mundo asséptico, expurgado de imagens que mostram acontecimentos na sua faceta mais imediata e crua. A sugestão dos leitores que aponta para uma personalização da homepage de modo a atirar para outro local da página as imagens mais susceptíveis não nos parece plausível. Isso pressuporia criar uma página com diferentes “níveis de choque”.
Sérgio B. Gomes
domingo, 10 de agosto de 2008
Imagem, texto e contexto
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