domingo, 26 de outubro de 2008

O provedor arquiva aqui um caso que teve em mãos mas sobre o qual não julgou necessário pronunciar-se, após a resposta dada pelo jornalista à interpelação do leitor:

Carta do leitor Miguel Carvalho:

"Os mais pobres sofrem mais com a inflação." diz a 1ª pág. do PÚBLICO de 21 de Abril em letras gordas. Ainda na capa, "As famílias portuguesas com rendimentos mais baixos são as que mais estão a sentir os efeitos da inflação, conclui um relatório do INE."

Lá dentro, na secção de Economia (pág. 38), temos: "Cálculos feitos pelo PÚBLICO...". O facto de os dados usados serem baseados num relatório do INE não dá o direito ao PÚBLICO de dizer que as conclusões são do INE. Para lá desta inverdade, há ainda a questão de saber se o INE teria tantas certezas como o PÚBLICO parece ter.

Antes de mais um fenómeno paranormal nos resultados de Sérgio Aníbal, que lhe deveria ter saltado à vista. TODAS as classes de rendimento sofreram, segundo ele, inflações iguais ou acima da inflação! Ou seja teremos a média (feita sobre os rendimentos) acima da média. Algo como a média de 10, 9, 8, 7, 6 e 5 ser... 5! O que já mostra que as suas contas estão certamente erradas.

Apesar de ter que reconhecer que Sérgio Aníbal se deu ao trabalho de fazer algo que provavelmente poucos fariam, não se pode tirar as conclusões que ele tira. Mais uma vez, e bem, ele próprio reconhece isso, dizendo: "A análise feita pelo PÚBLICO não leva em conta esse nível de desagregação da despesa familiar..." Mas logo a seguir estraga tudo mostrando bem o seu facciosismo, quando diz: "Ainda poderia acentuar as disparidades do impacto da inflação sobre os diferentes tipos de famílias". Dou-lhe razão, mas não há razão nenhuma para acreditar que seja para cima ou para baixo. Por que será que não escreveu o oposto, que poderia diminuir e até inverter as disparidades do impacto da inflação? Não dava jeito. Como exemplo, posso indicar os legumes que desceram 15%, o que mostra o quão difícil é tirar o tipo de conclusões que Sérgio Aníbal quer tirar, com os poucos dados disponíveis que existem.

Outro aspecto que mostra o quão forçadas são as suas conclusões é o facto de ele chegar ao valor de 3,1% de inflação para as famílias ricas e 3,6% para as pobres. A diferença é ridiculamente baixa e insignificante, dados os problemas de agregação. Mais, esta pequeníssima diferença que foi medida em Março (0,5 pp) pode pura e simplesmente inverter-se em Abril, já que a inflação dentro de cada classe de produtos é altamente volátil (com variações de mais de 1 pp de mês para mês em termos anuais).

Por último, o texto atribui a culpa aos "bens essenciais", que têm subido acima da inflação. É preciso ter muito cuidado com o nível de agregação quando falamos em "bens essenciais" Primeiro - e como já disse - termos alimentação a subir pode dever-se aos caviares e às patas negras, logo é complicado chamar "bem essencial" à classe alimentação. Segundo, a este nível grande parte das classes são bens essenciais! Descontando cinco das 12 classes, temos Alimentação, Vestuário, Habitação, Produtos correntes para a Habitação, Saúde, Transportes, Educação, que julgo serem todos "bens essenciais". Pois bem, três delas estão abaixo da inflação. É sempre fácil pegar na que subiu mais destas sete (estatisticamente haverá uma acima da inflação, em 99,99999% dos casos) e em tom sensacionalista clamar bem alto que os "bens essenciais" sobem acima da inflação.

Miguel Carvalho

Resposta de Sérgio Aníbal:

"Os mais pobres sofrem mais com a inflação." diz a 1ª pág. do PÚBLICO de hoje em letras gordas. Ainda na capa "As famílias portuguesas com rendimentos mais baixos são as que mais estão a sentir os efeitos da inflação, conclui um relatório do INE." Lá dentro, na Secção de Economia, temos "Cálculos feitos pelo PÚBLICO...". O facto de os dados usados serem baseados num relatório do INE não dá o direito ao Público de dizer que as conclusões são do INE. Para lá desta inverdade, há ainda a questão de saber se o INE teria tantas certezas como o Público parece ter.

O leitor tem toda a razão. Na 1ª pág. nunca deveria ter sido escrito que as conclusões surgem num relatório do INE, é falso. No meu texto isso nunca é afirmado, os cálculos são meus, utilizando dados do INE.

Antes de mais um fenómeno paranormal nos resultados de Sérgio Aníbal, que lhe deveria ter saltado à vista. TODAS as classes de rendimento sofreram, segundo ele, inflações iguais ou acima da inflação! Ou seja teremos a média (feita sobre os rendimentos) acima da média. Algo com a média de 10, 9, 8, 7, 6 e 5 ser... 5! O que já mostra que as suas contas estão certamente erradas.

Não há qualquer fenómeno paranormal. Como é explicado no texto, o cálculo da inflação por classes de rendimento que é feito utiliza os pesos na despesa familiar obtidos no inquérito aos orçamentos das famílias 2005/2006. O INE utiliza ainda os pesos obtidos no inquérito de 2000. Por isso, como penso que é referido no texto, e como escrevi num anterior artigo meu, o valor da inflação global usando os orçamentos 2005/2006 é superior à taxa de inflação oficial declarada pelo INE.

Apesar de ter que reconhecer que Sérgio Aníbal se deu ao trabalho de fazer algo que provavelmente poucos fariam, não se pode tirar as conclusões que ele tira. Mais uma vez e bem, ele próprio reconhece isso dizendo: "A análise feita pelo PÚBLICO não leva em conta esse nível de desagregação da despesa familiar..." Mas logo a seguir
estraga tudo mostrando bem o seu facciosismo, quando diz: "Ainda poderia acentuar as disparidades do impacto da inflação sobre os diferentes tipos de famílias". Dou-lhe razão, mas não há razão nenhuma para acreditar que seja para cima ou para baixo. Por que será que não escreveu o oposto, que poderia diminuir e até inverter as disparidades do impacto da inflação? Não dava jeito. Como exemplo posso indicar os legumes, que desceram 15%, o que mostra o quão difícil é tirar o tipo de conclusões que o Sérgio quer tirar, com os poucos dados disponíveis que existem.


Eu estou convicto (foi por isso que escrevi e não por facciosismo, como diz o leitor mostrando como assume que qualquer jornalista está, por princípio, sempre pronto a ldrabar) que, mesmo desagregando, as famílias mais pobres poderiam sair mais prejudicadas. O leitor dá o exemplo dos legumes, mas a verdade é que as maiores subidas (pão, arroz, leite, ovos, massas) são tudo bens a que com toda a probabilidade as famílias mais pobres dão uma maior importância no seu orçamento. De qualquer forma, compreendo a crítica, deveria estar mais claro que é apenas uma convicção do jornalista. Esta questão tem, no entanto, pouca importância na conclusão principal do texto.

Outro aspecto que mostra o quão forçadas são as suas conclusões é o facto de ele chegar ao valor de 3,1% de inflação para as famílias ricas e 3,6% para as pobres. A diferença é ridiculamente baixa e insignificante dados os problemas de agregação. Mais, esta pequeníssima diferença que foi medida em Março (0.5 pp) pode pura e
simplesmente inverter-se em Abril, já que a inflação dentro de cada classe de produtos é altamente volátil (com variações de mais de 1 pp de mês para mês em termos anuais).


Não considero a diferença ridiculamente baixa e insignificante.

Por último, o texto atribui a culpa aos "bens essenciais" que têm subido acima da inflação. É preciso ter muito cuidado com o nível de agregação quando falamos em "bens essenciais". Primeiro - e como já disse - termos alimentação a subir pode dever-se aos caviares e às patas negras, logo é complicado chamar "bem essencial" à classe alimentação. Segundo, a este nível grande parte das classes são bens essenciais! Descontando cinco das 12 classes, temos Alimentação, Vestuário, Habitação, Produtos correntes para a Habitação, Saúde, Transportes, Educação, que julgo serem todos "bens essenciais". Pois bem, três delas estão abaixo da inflação. É sempre fácil pegar na que subiu mais destas sete (estatisticamente haverá uma acima da inflação, em 99,99999% dos casos) e em tom sensacionalista clamar bem alto que os "bens essenciais" sobem acima da inflação.

O objectivo principal do texto foi o de comparar qual a inflação registada para uma distribuição da despesa de uma família de baixo rendimento e de outra de elevado rendimento. Os números mostram que ela é maior para os mais pobres, precisamente porque estas famílias gastam proporcionalmente mais em alimentação e habitação, classes em que os preços têm subido mais. Há sempre limitações neste tipo de cálculos, mas penso que as conclusões são correctas e não contêm qualquer tipo de sensacionalismo, que nunca foi o objectivo do texto quando decidimos realizá-lo.

Sérgio Aníbal

Chover no molhado

Por que razão é “ridículo” usar a fórmula “junto de fonte próxima...”, se de facto é disso que se trata?


Será frustrante para quem lê permanecer na ignorância acerca de onde emana a informação: se de pessoas de carne e osso, se do tarot da astróloga Maya (colaboradora do jornal) ou se em “escrita automática” resultante de uma comunicação espiritual em mesa de pé-de-galo.


O provedor regressa ao delicado tema das fontes, prometendo desde já não querer fazer disso cruzada. Cruzam-se porém ocorrências à volta do assunto, impedindo o seu esgotamento. Tal como há duas semanas, acontece que mais uma vez as matérias em análise são da responsabilidade da jornalista São José Almeida. Mera coincidência: o provedor, que tem por São José Almeida a elevada consideração que dedica a toda a redacção do PÚBLICO, reitera que esta é sobretudo uma prática arreigada no jornalismo português, não especificamente neste ou naquele profissional ou órgão de informação.

Atentemos à manchete da passada quarta-feira, 22 de Outubro: “Cavaco promulgou Lei do Divórcio para evitar guerra com o Governo”. O provedor leu a notícia curioso por saber qual a sua origem. Seria uma declaração do Presidente ao jornal (como outra recente)? Seriam fontes de Belém a revelarem as reais motivações presidenciais? Ou outra fonte bem informada capaz de dar credibilidade à manchete? Não se referia, porém, qualquer fonte, nem sequer se usando a (insatisfatória) fórmula “o PÚBLICO soube”. Julga o provedor que será frustrante para quem lê permanecer na ignorância acerca de onde emana a informação: se de pessoas de carne e osso, se do tarot da astróloga Maya (colaboradora do jornal) ou se em “escrita automática” resultante de uma comunicação espiritual em mesa de pé-de-galo.

Apenas se adiantava que “a preocupação do Presidente em não prolongar uma guerra estéril, que acabaria com a sua derrota explícita, foi confirmada ontem pela reacção do PS [à promulgação]”, mas, não navegando o partido governamental propriamente em águas cavaquistas, o provedor ficou sem perceber como uma atitude dos socialistas poderia confirmar uma intenção de Cavaco. Pensou assim que, afinal, o texto poderia não ser uma notícia, mas sim um artigo de análise política – o que seria inteiramente legítimo, faltando contudo identificá-lo como tal perante os leitores.

Foi essa a questão colocada pelo provedor a São José Almeida, que esclareceu: “A noticia é baseada em fontes, e por isso é noticia, não análise minha. A fórmula de a notícia ser omissa quanto à fonte é permitida pelo Livro de Estilo do PÚBLICO. O jornalista e o jornal assumem a informação. Aliás, essa prática é a do PÚBLICO desde a sua fundação. Ridículo seria usar fórmulas como ‘junto de fonte próxima...’.” O provedor só não percebe por que razão seria ridículo usar tal fórmula, se de facto foi disso que se tratou (o que não se infere forçosamente da resposta da jornalista). O leitor ficaria muito melhor informado sobre a natureza da informação e sobre o próprio carácter noticioso do artigo. Quanto ao resto, não valerá a pena comentar, pois já antes foi objecto de análise.

O segundo caso relaciona-se com a notícia “Ex-autarca de Setúbal e Palmela deixa o PCP”, publicada na pág. 6 da edição de 30 de Setembro e baseada em “informações recolhidas pelo PÚBLICO”. A questão aqui tem também a ver com o contexto em que a notícia é apresentada, segundo reclamação (a ler na íntegra no blogue do provedor) de Paulo Anjos, assessor de imprensa da Câmara Municipal de Setúbal (CMS):
“O problema surge quando a jornalista escreve: ‘A decisão de afastar [Carlos de] Sousa da CMS foi tomada pelo PCP depois de ter sido público o resultado de uma investigação da Inspecção-Geral da Administração do Território (IGAT). Esse inquérito relacionava Carlos de Sousa com a prática criminal de reformas antecipadas de funcionários da autarquia. Quando, em 2001, o PCP decidiu retirar Carlos de Sousa da presidência da CM de Palmela e candidatá-lo a Setúbal (...), a CMS está tecnicamente falida. É então aprovado um programa de recuperação financeira que passava pela redução de despesas com pessoal. É posto em prática um esquema de os funcionários serem reformados compulsivamente, após processo disciplinar, o qual era instaurado por excesso de faltas’.”

Alega Paulo Anjos: “Nunca o PCP (...) associou a saída de Carlos de Sousa (...) à questão do inquérito das aposentações compulsivas. É normal que a jornalista tenha fontes que lhe digam o contrário, mas na notícia em causa não é claro se as tem ou se se limitou a reproduzir o que se lembra do caso. (...) Se a jornalista tivesse pesquisado no seu próprio jornal teria ficado a saber (...) que o processo no Ministério Público originado pelo inquérito da IGAT (...) foi arquivado em Setembro de 2007. Referir esta informação era o mínimo que poderia ter feito para não pôr em causa, mais uma vez, a reputação do autarca Carlos de Sousa e dos que com ele trabalharam. São José Almeida preferiu a via mais espalhafatosa para dar maior visibilidade à notícia”.

Para este leitor há ainda “o pior”: “O pior é mesmo [São José Almeida] ter dado ouvidos a uma especulação sobre a possibilidade de Carlos de Sousa poder ser candidato independente à CMS, apesar de afirmar que ‘apurou’ que o antigo presidente não ‘tenciona voltar à actividade autárquica’. É que, mesmo que (...) o desejasse, tal seria, do ponto de vista legal, impossível. De acordo com a lei da limitação de mandatos dos presidentes dos órgãos executivos das autarquias locais, (...) ‘no caso de renúncia ao mandato, os titulares (...) não podem candidatar-se nas eleições imediatas nem nas que se realizem no quadriénio imediatamente subsequente à renúncia’. Nesta mesma lei é imposto um limite ao número de mandatos consecutivos, disposição que também afectaria Carlos de Sousa.”

Conclui assim Paulo Anjos: “Mesmo com a informação de que Carlos de Sousa não tenciona candidatar-se, a jornalista preferiu dar ouvidos a fontes que se revelam pouco fiáveis. Se o fossem, não teriam ensaiado esta manobra de lançar a confusão para ver o que dá. Do ponto de vista jornalístico, restam-me algumas dúvidas:

- Deve o jornal dar ouvidos a especulações sem qualquer fundamento, sem cuidar de cruzar a informação e confirmá-la sem margem para dúvidas, e ainda assim publicá-las?

- Deve o jornal publicar notícias em que não há a preocupação de fazer um enquadramento minimamente correcto dos antecedentes? (...).

- A saída de Carlos de Sousa do PCP é, sem qualquer dúvida, uma notícia relevante. Mas será que é necessário apimentar a coisa com meia dúzia de factos extraordinários, mas incorrectos, para chamar a atenção do leitor incauto?”

Parecendo-lhe haver pertinência na reclamação, o provedor solicitou um comentário a São José Almeida, que respondeu: “Penso que não devo dizer muito sobre a carta em apreço. Ela fala por si. É obvio que me baseei nas notícias publicadas à época para contextualizar a informação. Assim como escrevi sobre informações reais de um movimento real de eventual apoio a uma recandidatura de Carlos de Sousa. A questão de a lei não permitir a candidatura não impede que haja pessoas que o desejem. Os jornais informam sobre o que acontece e não apenas sobre o que idealmente, segundo a lei, deveria acontecer. Poderia ter posto a informação de que pela lei quem renuncia não se pode candidatar a seguir; não me pareceu relevante valorizar isso, no pouquíssimo espaço que tinha, quando estava na posse de informações de que tal candidatura não existiria mesmo que legalmente fosse autorizada, por indisponibilidade do próprio Carlos de Sousa” Num segundo contacto com o provedor, São José Almeida complementou ainda: “Pode ter sido uma opção errada ou não ter sido a melhor opção, mas pareceu-me correcto privilegiar a actualidade e o que era o objecto da noticia, o senhor Carlos de Sousa.”

Sobre a questão das fontes, o provedor julga não dever adiantar mais ao que já expôs. Quanto ao resto, há que reconhecer que a notícia se encontra amputada de dois elementos de enquadramento fulcrais para a sua correcta compreensão por parte do leitor: por um lado, que a recandidatura de Carlos de Sousa é impossível à face da lei (sendo assim insólito haver um movimento nesse sentido); por outro, que a suspeita de “prática criminal” impendendo sobre o ex-presidente da CMS já não existia, em virtude do arquivamento do respectivo processo (questão essencial na medida em que afecta a reputação do visado).

Caixa:

Promoções vs. jornalismo?

O leitor Manuel Martins preferia ver matéria jornalística nas páginas que o PÚBLICO dedica à promoção dos produtos associados: “Que um jornal tenha produtos associados que precise de promover para melhor os vender, é um direito legítimo que lhe assiste. Mas que o PÚBLICO – como aconteceu por exemplo na edição de 21 de Outubro – ocupe quatro páginas completas (além de mais alguns pequenos anúncios ‘tapa-buracos’ noutras páginas) com essas promoções (por exemplo de livros que têm a sua chancela), já me parece um pouco exagerado. Não seria mais correcto que algumas dessas quatro páginas fossem preenchidas com notícias?”

O provedor perguntou ao director do PÚBLICO se essas páginas “roubam” espaço inicialmente destinado a conteúdos editoriais. José Manuel Fernandes explica que “há um número ideal de páginas editoriais estabelecido para cada edição, cada caderno e cada suplemento; é o número de páginas de referência, que é discutido entre a direcção editorial e a administração”. Só depois é que “a esse número de páginas são acrescentadas as páginas de publicidade e as páginas de promoções”. Então, o número de páginas a imprimir é afinado, pois a rotativa só dá ‘saltos’ de oito em oito páginas”. Em conclusão: “Significa isto que o espaço reservado para a promoção de produtos associados ao jornal não é ‘ganho’ à custa do espaço editorial, o que não impede que por vezes tenhamos de fazer compromissos devido às limitações impostas pelas características da rotativa. Nalguns dias com mais noticiário é a área das promoções que cede espaço, noutros é o contrário”.

Para quem se interessa pelo tema, ainda uma informação adicional: “Este tipo de modelo (...) é semelhante ao adoptado por jornais como El País e La Reppublica, tendo sido estabelecido no tempo em que aqueles dois diários tiveram uma participação no capital do PÚBLICO e estavam representados nos órgãos de gestão e supervisão”.

Publicada em 26 de Outubro de 2008

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR:

Carta de Paulo Anjos:

Em primeiro lugar, quero dar-lhe conta de que sou, desde 2002, assessor de imprensa da Câmara Municipal de Setúbal. Forneço, à partida, esta informação a título de declaração de interesses na matéria que me leva a escrever-lhe. Acrescento que não fui mandatado por quem quer que seja para apresentar esta queixa, se não por mim próprio e pela vontade de não deixar passar em claro algo que me parece profundamente errado sob vários pontos de vista, em especial do ponto de vista jornalístico.

Publicou o PÚBLICO, na edição de 30 de Setembro, uma notícia assinada por São José Almeida na qual se relata que Carlos de Sousa abandonou a militância no PCP, facto implicitamente confirmado pelo próprio quando se afirma na notícia que Carlos de Sousa "não aceitou falar do assunto".

Até aqui, nada a assinalar.

O problema surge quando a jornalista escreve que "a decisão de afastar Sousa da Câmara de Setúbal foi tomada pelo PCP depois de ter sido público o resultado de uma investigação da Inspecção-Geral da Administração do Território (IGAT). Esse inquérito relacionava Carlos Sousa com a prática criminal de reformas antecipadas de funcionários da autarquia. Quando, em 2001, o PCP decidiu retirar Carlos Sousa da presidência da Câmara de Palmela e candidatá-lo a Setúbal, recuperando o município que perdera para o PS nos anos 80, a câmara está tecnicamente falida. É então aprovado um programa de recuperação financeira que passava pela redução de despesas com pessoal. É posto em prática um esquema de os funcionários serem reformados compulsivamente, após processo disciplinar, o qual era instaurado por excesso de faltas".

Em primeiro lugar, há que reconhecer que nunca o PCP - que eu saiba e, neste caso, posso dizer que prestei muita atenção - associou a saída de Carlos de Sousa, oficial ou oficiosamente, à questão do inquérito das aposentações compulsivas. É normal que a jornalista tenha fontes que lhe digam o contrário, mas na notícia em causa não é claro se as tem ou se se limitou a reproduzir o que se lembra do caso. Se é este o caso, é claro que se lembra de pouco e pouco se esforçou para procurar saber o que aconteceu.

Em resumo, a questão das aposentações compulsivas, associada ao contrato de reequilibrio financeiro que a Câmara Municpal assinou em 2004 com o Governo, segundo o qual a autarquia tinha a obrigação de reduzir em dez por cento por ano os seus efectivos, criou as condições para que se lançasse a acusação de existir um conluio entre o presidente da Câmara e os trabalhadores que foram alvo dos processos disciplinares com vista à aplicação da pena já referida. Há, ainda, que situar o caso no contexto das medidas que se anunciavam do aumento da idade de reforma. Ou seja, as aposentações interessavam a todos, na interpretação menos benévola do caso. A questão central sempre esteve concentrada no alegado conluio entre presidente e trabalhadores. Esta era a acusação que era preciso provar, porque, do ponto de vista dos procedimentos, os processos das aposentações não apresentavam grande mácula. Como se verá, tal acusação não teve pernas para andar.

Se a jornalista tivesse pesquisado no seu próprio jornal, teria ficado a saber - mesmo que se assuma que a razão que levou o PCP a afastar o autarca foi a das aposentações - que o processo no Ministério Público originado pelo inquérito da IGAT às aposentações compulsivas foi arquivado em Setembro de 2007. Referir esta informação era o mínimo que poderia ter feito para não pôr em causa, mais uma vez, a reputação do autarca Carlos de Sousa e dos que com ele trabalharam.

São José Almeida preferiu a via mais espalhafatosa para dar maior visibilidade à notícia, o que não deixa de ser criticável.

Mas isto nem é o pior, O pior é mesmo ter dado ouvidos a uma especulação sobre a possibilidade de Carlos de Sousa poder ser candidato independente à Câmara Municipal de Setúbal, apesar de afirmar que "apurou" que o antigo presidente não "tenciona voltar à actividade autárquica". É que, mesmo que o ex-presidente da CM Setúbal o desejasse, tal seria, do ponto de vista legal, impossível.

De acordo com a lei da limitação de mandatos dos presidentes dos órgãos executivos das autarquias locais, disponível no site da Comissão Nacional de Eleições (http://www.cne.pt/dl/legis_lei_46_2005.pdf), "no caso de renúncia ao mandato, os titulares dos órgãos referidos nos números anteriores não podem candidatar-se nas eleições imediatas nem nas que se realizem no quadriénio imediatamente subsequente à renúncia". Nesta mesma lei é imposto um limite ao número de mandatos consecutivos, disposição que também afectaria Carlos de Sousa.

Constata-se, pois, que, mesmo com a informação de que Carlos de Sousa não tenciona candidatar-se, a jornalista preferiu dar ouvidos a fontes que se revelam pouco fiáveis. Se o fossem, não teriam ensaiado esta manobra de lançar a confusão para ver o que dá.

Do ponto de vista jornalísitico, restam-me algumas dúvidas:

- Deve o jornal dar ouvidos a especulações sem qualquer fundamento, sem cuidar de cruzar a informação e confirmá-la sem margem para dúvidas, e ainda assim publicá-las?

- Deve o jornal publicar notícias em que não há a preocupação de fazer um enquadramento minimamente correcto dos antecedentes? Neste caso, parece-me que o minimo que a jornalista poderia ter feito seria referir que o Ministério Público arquivou as acusações da IGAT no caso das aposentações compulsivas, ainda que pudesse continuar a argumentar, bem ou mal, que essa foi a razão do afastamento de Carlos de Sousa pelo PCP.

- A saída de Carlos de Sousa do PCP é, sem qualquer dúvida, uma notícia relevante. Mas será que é necessário apimentar a coisa com meia dúzia de factos extraordinários, mas incorrectos, para chamar a atenção do leitor incauto?

Paulo Anjos

Explicações do director do PÚBLICO sobre as promoções de produtos associados:

O princípio geral é o seguinte:

1. Há um número ideal de páginas editoriais estabelecido para cada edição, cada caderno e cada suplemento. É o número de páginas de referência, que é discutido entre a direcção editorial e a administração.

2. Todos os dias (ou todas as semanas, no caso dos suplementos), a esse número de páginas são acrescentadas as páginas de publicidade e as páginas de promoções. Depois o número de páginas a imprimir é afinado, pois a rotativa só dá “saltos” de oito em oito páginas. Todas as semanas se verifica se os objectivos a cumprir pelas áreas editorial, comercial e de marketing estão a ser cumpridos, pois há dias em que se imprimem mais páginas do que o ideal, outros em que se imprimem menos.

3. Significa isto que o espaço reservado para a promoção de produtos associados ao jornal – produtos que sempre procurámos seleccionar de acordo com os padrões de qualidade do PÚBLICO, num processo em que a área editorial também participa, pois consideramos que representam um valor acrescentado para os leitores – não é “ganho” à custa do espaço editorial, o que não impede que por vezes tenhamos de fazer compromissos, devido às limitações impostas pelas características da rotativa. Nalguns dias com mais noticiário é a área das promoções que cede espaço, noutros é o contrário que se passa.

4. Este tipo de modelo para definir o número total de páginas do jornal e o espaço editorial diário é semelhante ao adoptado por jornais como El País e La Reppublica, tendo sido estabelecido no tempo em que aqueles dois diários tiveram uma participação no capital do PÚBLICO e estavam representados nos órgãos de gestão e supervisão.

José Manuel Fernandes

domingo, 19 de outubro de 2008

Mais salpicos de uma "pressão ilegítima"

Muito estranho que o Provedor aceite, sem mais, o argumento de José Manuel Fernandes – os textos que lhe pedem para rever – como justificação para não se recordar de que também tinha revisto o que a ERC lhe sugeriu que revisse, uma vez escrito com base em notas tomadas por quem o ouviu.

E mais: que aceite que JMF tivesse que laboriosamente procurar o texto revisto na base de dados no server do PÚBLICO.

E isto pelo seguinte: era o tema em causa tão banal para JMF para que as coisas se tivessem passado assim? Um assunto desta natureza não impõe, a uma normal pessoa, um arquivo mínimo de tais documentos, mesmo que em suporte electrónico, especialmente quando, no caso, JMF admite poder esquecer-se de assunto que mereceu longa conversa telefónica com Sócrates? Aliás, se lermos a acta, podemos duvidar da boa memória de JMF? Mais: respeitando o assunto também ao PÚBLICO – JMF é seu director –, também o jornal prescinde de arquivo adequado em matéria desta sensibilidade?

Aceito que possa perdoar a JMF a rasteira que lhe pregou. Mas as suas obrigações perante quem o lê, como Provedor, estão acima dos bons sentimentos.
Eu, confesso, não me habituei a isto, ao longo do tempo em que o leio com prazer. Por isso… lamento.

Armando Moura Pinto

Minudências maiores

Os leitores reclamam contra falhas que abalam a confiança por eles concedida ao jornal. É o seu direito

"Há a legenda: ‘A gorila Mouila, das terras baixas ocidentais australianas, segura a sua cria’. Não deveria ter maior destaque a descoberta duma população de gorilas na Oceânia?"

Não se deve ignorar as minudências de um jornal, que reflectem o seu rigor e a consideração que tem pelos leitores. Leitores que por vezes se sentem traídos pelas falhas soltas ocorridas aqui e ali, abalando a confiança que concederam ao periódico. E por isso reclamam. Eis alguns dos mais recentes protestos relativos ao PÚBLICO:

Reparou o leitor Albano Nogueira Guedes em 26 de Setembro: “Hoje, na primeira página, é feita uma chamada de atenção ao ‘colapso financeiro’ escrevendo-se no título: ‘Reunião na Casa Branca acaba sem acordo’. Porém, na coluna ‘Sobe e desce’ (pág. 44), uma seta em sentido ascendente diz que se ‘conseguiu ontem um acordo de princípio’. Em que ficamos: ‘não houve acordo’ ou ‘conseguiu-se acordo’? Naturalmente que estas contradições causam embaraço e dúvida a quem, como eu, compra diariamente o jornal e começa a duvidar se tudo o que lê está correcto. Não se trata de erros ‘de informática’, mas sim de falta de cuidado na revisão”.

Outra incongruência foi detectada por José Oliveira, na edição de 27 de Agosto: “No canto inferior direito da primeira pág., chamada com o título ‘Criminalidade - Cinco assaltos à mão armada na Grande Lisboa’. Vai-se a ler o curto texto e, mesmo sendo burro em matemática como sou, consigo concluir que: dois postos de abastecimento de combustíveis, uma estação dos CTT e três bancos dão um total de seis estabelecimentos”.

Os erros de natureza enciclopédica irritam particularmente os leitores, o que é natural, dado que se trata de matéria em que um jornal de referência deveria ser inatacável. Pedro Freira de Almeida observou o seguinte em 28 de Agosto: “Na edição on-line de hoje, há uma foto interessante com a seguinte legenda: ‘A gorila Mouila, das terras baixas ocidentais australianas, segura a sua nova cria, Mahale, no jardim zoológico de Taronga, em Sydney’. ‘Das terras baixas ocidentais australianas”?! Não deveria ter maior destaque a descoberta duma população de gorilas na Oceânia?” Certamente que sim.

Outro caso, comunicado pelo leitor João M. em 26 de Setembro: “No mapa do 3º poster temático da Enciclopédia do Estudante publicado hoje nas páginas centrais do PÚBLICO, a Argélia está identificada como Mali!”

Mantendo-nos na cartografia, Miguel Direito, ao mesmo tempo que elogia o trabalho de Rita Siza na cobertura da campanha eleitoral nos EUA, alerta sobre a edição de 13 de Setembro: “Só é pena que o mapa dos EUA (pág. 3) tenha saído com três gralhas incompreensíveis: na verdade, o Oklahoma, o Tenesse e a Virgínia Ocidental são estados totalmente republicanos, red states, pelo que não se percebe que tenham sido pintados a azul democrata... A credibilidade é o vosso maior capital, não o percam nos pormenores”.

Também relacionado com o escrutínio presidencial norte-americano, o leitor C. M. Carvalho fez algumas contas após ler a notícia intitulada “Filha adolescente de Sarah Palin está grávida”, no PUBLICO.PT de 1 de Setembro: “No segundo parágrafo lê-se: ‘...[d]o seu [de Sarah Palin] último filho, agora com sete meses’; e no penúltimo: ‘... foi mãe em Maio de um bebé’. Em que ficamos?” Seria de facto difícil, apesar da sua posição “pró-vida”, que a candidata republicana a vice-presidente tivesse dado à luz em Fevereiro e de novo em Maio.

Recuando na História, Francisco Miranda Duarte comenta a legenda da pág. 2 do P2 8 de Setembro: “Referem o filme Olympia, realizado por Leni Riefenstahl, como um documentário sobre as ‘Olimpíadas de Munique’. O filme é, obviamente, um documentário sobre os Jogos Olímpicos (e não Olimpíadas [Nota do provedor: Olimpíada é o período de quatro anos entre duas edições dos Jogos Olímpicos]) de Berlim (e não de Munique). Tenho a noção de que este tipo de imprecisões tem vindo a aparecer com cada vez mais frequência no PÚBLICO, o que é uma pena, dado tratar-se indiscutivelmente do diário de referência em Portugal”.

E, regressando à geografia (agora doméstica), não deixou o leitor Júlio de Oliveira Saramago de assinalar: “No suplemento ‘Economia’ de 2 de Maio, na notícia intitulada ‘Os dólares alentejanos’ (págs. 4-5), lê-se em subtítulo: ‘No recatado concelho de Relíquias, Odemira’. Creio que não são precisos comentários, a não ser, talvez, que haverá mais um distrito em Portugal, o de Odemira”. Será que o redactor, impressionado com a dimensão do concelho de Odemira (o maior do país em área), o tenho de facto confundido com um distrito?

Acerca da notícia “Portugal sem qualquer direito ao espólio da nau quinhentista afundada ao largo da Namíbia”, publicada na pág. 14, de 10 de Outubro, segundo o autor com base em informação disponibilizada pelo Ministério da Cultura, um leitor enviou tal quantidade de rectificações que se tornou em fonte privilegiada do PÚBLICO para futuros textos sobre o mesmo tema. Mas já antes, a propósito do título de 1ª pág. “Caravela com 500 anos em risco de ser submersa na Namíbia”, outro leitor, não identificado, criticara: “Grave que a direcção do PÚBLICO faça manchete com uma caravela portuguesa que corre o risco de ser soterrada na Namíbia quando depois se vê que o texto fala de uma nau. É confundir um automóvel ligeiro com um camião, um F-16 com um avião comercial. É desvirtuar completamente o rigor e a qualidade da informação histórica”. E outro, também anónimo, refere que, uma vez que se “noticiou recentemente que na nau da Namíbia foram encontradas moedas de meados do século XVI, isso exclui a nau de Bartolomeu Dias, que encaixam no vosso artigo”. Com efeito, o português que dobrou o Cabo das Tormentas morreu aí perto, de naufrágio, mas em 1500, o último ano do século XV.

E depois há ainda os tratos de polé dados à língua portuguesa, talvez o que mais ofende os leitores. Vários deles reclamaram com veemência junto do provedor ao lerem em destaque, na pág. 54 da “Pública” de 5 de Outubro, a frase: “Se pudessem casar com pessoas do mesmo sexo, Paulo Côrte-Real e Elisabete Pereira fariam-no”. “Desta vez, parece-me um pouco excessivo”, comenta Pedro Guedes de Oliveira. “Não lêem ou não sabem?” Um anónimo afirma: “Temos que concordar com a dimensão distinta desta bacorada, pela simplicidade que exibe”. E a professora Isabel Semedo ironiza: ”Suponho que a responsabilidade (ou mesmo a culpa!) não seja da própria autora do texto, nem do editor, nem do revisor, muito menos do director... Deve ser mesmo dos professores!”

Vejamos outro caso, na pág. 16 da edição de 27 de Setembro, também alvo da reclamação de vários leitores, como Lídia Martins: “Temos esta jóia como título: ‘Caso Esmeralda – Pai processa Estado, se não reaver filha’. Como conjugam alguns jornalistas o verbo haver? E como não conseguem raciocinar e concluir que reaver é um composto de haver?” Poderá não soar tão bem a quem escreveu, mas a formulação correcta é, de facto, “reouver”. “Dispenso-me de comentários, mas como quem está em idade de aprender parece-me que já não lê jornais...!”, suspira Abílio Nunes.

Merece também menção o “camião com muito mau feitio”, segundo Jorge Cardoso, ao ler na pág. 14 do PÚBLICO de 23 de Setembro a notícia "Dirigentes paquistaneses escaparam a atentado": “Pouco antes de um camião com uma bomba de 600 kg se fazer explodir à entrada do estacionamento do hotel...”

Por seu turno, Carlos Cardoso chama a atenção: “Na pág. 12 do suplemento ‘Economia’ de 19 de Setembro, (...) a autora do artigo escreve com grande fluência e em estilo agradável, mostrando óptimo domínio da língua portuguesa, e nada deixaria antever o uso de uma palavra totalmente disparatada: ‘torrefador’! Se a autora quer significar a entidade que torrou o café (empresa, fábrica), terá de usar a palavra ‘torrefactor’. Se quer significar a máquina onde o café é torrado, o termo é ‘torrador’, também utilizado para designar o operário encarregado da torrefacção”.

E que dizer do título “Os furacões mais intensos estão a tornar-se cada vez mais fortes”, no PÚBLICO de 4 de Setembro? Trata-se do “uso discutível de palavras com ‘intensidades’ semelhantes”, sublinha Sílvia Alves, que preconiza outras hipóteses: “’Os furacões mais fortes estão a ganhar mais força’, e por aí adiante. O desenvolvimento da notícia também não melhora”.

Por fim, uma sugestão apresentada por Augusto Küttner de Magalhães acerca do título “Investigadores descobrem mecanismo que promove leucemias infantis”, na pág. 13 da edição de 2 de Outubro. É certo que, em linguagem científica, o verbo estará correcto. Mas, a bem do esclarecimento do público, o leitor apresenta alternativas: “Investigadores descobrem mecanismo que desenvolve leucemias infantis”; “...que acciona leucemias infantis”; “...que adianta leucemias infantis”. Talvez. O certo é que o esclarecimento do público, sem haver lugar a ambiguidades, deve ser uma preocupação constante do bom jornalismo.

CAIXA:

Porque a vida é um jogo

Já não é a primeira vez que o leitor Jorge Rino reclama quanto à apresentação das palavras cruzadas: “Houve erro grosseiro no problema 6737 (versão com casas pretas) do PÚBLICO de 10 de Setembro” (a grelha não corresponde ao enunciado). Também as falhas na secção de bridge têm suscitado protestos, como o de J. Pessoa e Costa em 14 deste mês: “O problema de hoje é igual ao de ontem e já foi publicado pelo menos mais duas vezes. O mesmo aconteceu já com outros problemas. Esta situação seria ridícula se não representasse uma falta de respeito clara para com o leitor”. Quanto ao soduku (de que o PÚBLICO foi pioneiro na imprensa portuguesa), questiona Carlos Cardoso: “Começa a tornar-se bastante frustrante que todos os dias um dos dois problemas seja ‘fácil’ e o outro a maior parte das vezes ‘médio’. Difícil ou muito difícil haverá uns três ou quatro por semana num total de 14. Será que devo concluir que o leitor tipo do PÚBLICO tem fraca capacidade de raciocínio?” O provedor acha que não, e por isso apela para que seja dada a devida consideração aos leitores para quem um jogo faz parte da vida.

(Publicada em 19 de Outubro de 2008)

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Leitor descontente

A trapalhada sobre as declarações do primeiro-ministro mancha José Manuel Fernandes e principalmente o Provedor, porque foi leviano e pouco sério. Deu cobertura á desenfreada campanha do jornalismo de causa contra José Sócrates e fez pior, com a imagem do padrinho. Hoje é este o alvo, amanhã, quem sabe? Por isso o PÚBLICO deixou de ser o que era. Até voltar não receberão nem mais um tostão deste leitor da primeira hora. Não comprarei o jornal até deixar de sujar as mãos.

Amilcar Gomes da Silva

NOTA DO PROVEDOR: O provedor já admitiu o erro, mas continua a entender, de acordo com os elementos de que dispõe, que a pressão de Sócrates sobre o jornal não foi legítima, conforme afirmou na última crónica.

ACTUALIZAÇÃO:

Réplica do leitor

Pior a emenda, que o soneto. Então para si o importante é a sua convicção de que Sócrates fez pressão ilegítima sobre o jornal? Mas e os factos? O próprio "pressionado" emenda a mão, corrigindo a frase que não existiu, mas deixou correu o marfim desse equívoco, porque se ajustava na sua estratégia de queimar em lume brando. O telefonema foi de JMF para o PM e então é este que o quer pressionar? A honestidade e o rigor são para os outros. Director de jornal está acima e Provedor também. Na honorabilidade de JMF já ninguém acredita, agora não havia razão para destruir a sua.

Deixo de comprar o jornal, porque no meu conceito de liberdade de imprensa os leitores têm direitos e esse é o último a ser usado, quando um jornal deixa de ser sério, de ser uma referência noticiosa e opinativa e passa a ser de uma causa sectária e até persecutória. Nem o Avante! foi tão longe. Mas deixemos a vida correr e mais cedo que tarde vamos ver quem ganha, se a causa se os leitores.

Amilcar Gomes da Silva

Explicação do provedor:

Ao contrário do que afirma o leitor, o telefonema foi do primeiro-ministro para JMF (embora sugerido por JMF, «insistentemente» segundo o PM). De notar que há muito JMF pretendia falar com José Sócrates, mas nunca tinha tido resposta.

Quanto ao conteúdo da conversa, sabemos que o PM não insinuou uma degradação da sua relação com o accionista do PÚBLICO Paulo Azevedo, mas não desmente que nesse mesmo contacto telefónico tenha invocado o seu bom relacionamento com ele, ponto que JMF continua a manter.

A Constituição da República Portuguesa estabelece que "o Estado assegura a liberdade de imprensa e a independência dos órgãos de comunicação social perante o poder político e o poder económico" (Art. 38º, 4.). Se um alto agente do Estado invoca o seu relacionamento com um accionista de um jornal (embora não saibamos com que intenção), podemos considerar estar-se perante uma pressão ilegítima, à luz da Constituição. Pelo menos, essa dúvida persiste.

domingo, 12 de outubro de 2008

Complacência?

Com referência ao “para que conste” da coluna do Provedor de hoje, 12 Outubro, não posso deixar de estranhar uma certa complacência com que trata o comportamento do director do PÚBLICO. Com efeito, na sua anterior coluna em que referia este assunto, o modo como descreveu o seu contacto com José Manuel Fernandes pareceu deixar clara uma confirmação, por parte deste, das afirmações de José Sócrates, como haviam sido reproduzidas. Mais tarde, porém, é o próprio J.M.F. quem, em editorial, iliba o PM, embora descubra uma nova e gravíssima pressão, ao cancelar um almoço entre ambos.

O cirúrgico esquecimento do director do PÚBLICO, que hoje é referido, parece-me estar a ser branqueado de modo muito incomodativo. Aliás, não posso também deixar de estranhar que, na sua coluna de hoje, o Provedor volte a referir uma “pressão ilegítima sobre a imprensa dado o que (José Sócrates) sugere na insólita referência a um proprietário do jornal”. Tem a certeza de que a referência é insólita? Não terá surgido como resposta a uma (hipotética) interpelação do director do PÚBLICO, do tipo “mas o Sr. PM até conhece Paulo Azevedo!”, ao que J.S. tenha respondido: “É verdade, até ‘fiquei com uma boa relação com o seu accionista’”? Não se terá J.M.F. também esquecido de alguma contextualização? Valem de muito, neste conflito em que ele é uma parte claramente interessada, as reflexões que faz no editorial, sobre a estranheza que sentiu perante a afirmação de J.S.?

Pedro Guedes de Oliveira

Da infalibilidade de certos jornalistas

Uma notícia “órfã” sobre a demissão de um dirigente do PCP (que afinal não é passado mas eventual futuro) volta a suscitar o problema das fontes

Anunciou o PÚBLICO em 1ª pág. no dia 3, com notícia desenvolvida na pág. 10: “Agostinho Lopes deixa comissão política do PCP” (no interior, o tempo verbal no título, a quatro colunas, era “deixou”). O texto, assinado por São José Almeida, era uma daquelas notícias “órfãs” referidas pelo provedor na crónica anterior. Dizia apenas que “Agostinho Lopes abandonou, a seu pedido, a comissão política do PCP, que integrava desde o XII Congresso, no Porto, em 1988”, sem invocar qualquer fonte (nem sequer o habitual bordão “o PÚBLICO sabe...”, que os jornalistas tanto apreciam) ou mencionar um esforço para ouvir o visado.

O PCP emitiu logo um comunicado procurando desmentir o jornal, com o título “A propósito das falsidades e especulações do PÚBLICO sobre Agostinho Lopes”. No dia seguinte, o jornal ignorou o desmentido mas publicou palavras de Jerónimo de Sousa com idêntico sentido (embora em tom menos categórico), atribuindo à notícia “carácter especulativo e pouco rigoroso”.

O leitor Tiago Redondo, intitulando-se militante comunista, escreveu ao provedor considerando “lamentável” a notícia, “que afinal se revelou ser integralmente falsa”: “Trata-se uma questão de enorme gravidade, não só porque envolve uma pessoa em concreto e as suas posições, (...) mas também porque a publicação destes artigos num tempo de discussão pré-congressual do PCP tem consequências objectivas”.

Não tendo visto mencionado pelo jornal o comunicado do partido, Tiago Redondo voltaria à carga: “A jornalista sentiu alguma necessidade de se justificar, ao escrever, numa caixa da pág. 8 [do dia 4]: ‘Refira-se que essas substituições e mudanças já estão em preparação, daí estar já consagrada a saída de Agostinho Lopes’. Porventura pretendendo dizer que a notícia do dia 3 afinal não era sobre algo que tinha acontecido, era sobre algo que virá a acontecer. Por outro lado, dizendo-nos também que, afinal, não fora o próprio que se demitira, mas que fora afastado. Em qualquer caso, a assumpção de inexactidão da notícia do dia 3 é clara. Duvido que, dúbio que seja, o conceito de ‘jornalismo interpretativo’, possa abrir portas à objectiva falsidade. (...) Teria havido vantagem em explicar aos leitores a fonte das suas informações. Nunca identificando-a pessoalmente, claro (a protecção das fontes é um princípio essencial que deve ser salvaguardado), mas pelo menos situando-nos em relação à sua origem: ‘fonte junto da Comissão Política’, ‘fonte interna do PCP’, ‘fonte do Movimento da Renovação Comunista, afastado da vida partidária há vários anos’, ou mesmo assumir: ‘especulação pessoal da jornalista’”.

Também António Rodrigues, do gabinete de imprensa do PCP escreveu ao provedor porque o jornal “ignorou absolutamente o esclarecimento do PCP e não mostrou qualquer interesse em confirmar a notícia junto do próprio (...), refugiando-se, de forma pouco séria, em quatro palavras alegadamente proferidas pelo secretário-geral do PCP, que terão sido extraídas de um desmentido que este fez na Assembleia da República”. António Rodrigues considera que se trata “de uma grosseira e descarada manipulação da realidade”.

Apreciados os factos, o provedor formou a convicção de que a notícia possui fundamento, embora errada na escala temporal: ou seja, Agostinho Lopes não deixou a Comissão Política, mas não deverá ser reconduzido no próximo Congresso (marcado para daqui a mês e meio). O problema é que as notícias não se fazem com base em convicções, mas sim ou na observação directa do jornalista ou na consulta de fontes credíveis que ele deve esforçar-se por identificar da forma mais aproximada possível (é uma reclamação legítima do público, conforme faz Tiago Redondo).

Por isso o provedor perguntou a São José Almeida se não acharia curial, por um lado, invocar pelo menos uma fonte de informação e, como é também de norma, confirmar a notícia junto do próprio Agostinho Lopes. Resposta da jornalista: “A existência de fonte anónima está implícita. Se o jornalista escreve é porque teve fonte, não sonhou nem inventou. Essa é a regra. Penso, aliás, que é relativamente ridículo usar formulações como ‘soube o PÚBLICO junto de fonte...’ Quanto a citar Agostinho Lopes, é certo que o podia ter feito; no entanto, considerei primordial ouvir a direcção do PCP [na notícia original só é ouvido António Rodrigues, que se limita a dizer: ‘Não há comentários a fazer’]”.

Já antes a jornalista havia explicado ao provedor: “Fiz a notícia com a segurança e a confiança nas fontes contactadas. (...) Sublinho que respeitei todas a regras (...). Quanto ao desmentido, creio que a direcção do PÚBLICO e os editores da secção optaram por referir as palavras de Jerónimo de Sousa (...), o que, na minha opinião, é não só legitimo como recomendável: afinal, é o líder do partido e a cara do PCP”. São José Almeida particulariza ainda que “não havia razão para duplicar o secretário-geral e o comunicado, e seria absurdo ignorar que o secretário-geral do PCP tinha falado sobre o assunto”.

Falar de um não implicaria ignorar o outro: parece de resto ao provedor que o PÚBLICO deveria ter por princípio publicar todas as reacções oficiais a notícias suas, mesmo que em simultâneo as tente rebater, se for caso disso. De alguma forma, o director do PÚBLICO reconhece-o aliás, ao ser questionado pelo provedor sobre a mesma matéria: “O texto do segundo dia, apesar de citar correctamente Jerónimo de Sousa, que desmentiu a informação nos mesmos termos que a nota do PCP, devia ter-se referido à existência desta (...). É uma falha que a direcção admite”.

A jornalista não responde directamente à interpelação de Tiago Redondo quanto a dar-se como passado algo que, afinal, é prospectivo, mas frisa “que o jornalismo político é também antecipação e análise”. José Manuel Fernandes, admite porém “um erro no título (...), pois pode levar a concluir que já ocorreu algo que só sucederá no próximo Congresso do PCP”.

Quanto à questão de fundo, justifica o director: “A experiência da direcção com a jornalista autora da notícia é que esta, quando toca a notícias sobre o PCP, tem fontes à prova de bala. Há muitos anos. Confiamos na informação e estamos convictos de que, no próximo Congresso, a eleição dos órgãos dirigentes nos dará razão. Neste caso, que eu saiba, a direcção não utilizou a possibilidade criada pelo Livro de Estilo de perguntar à jornalista que fontes tinha consultado, designadamente se tinha contactado o próprio ou militantes muito próximos. A notícia surgiu tarde e, face às (boas) experiências anteriores, não sentimos que isso fosse necessário”.

Ficamos assim informados de que existem no PÚBLICO dois tipos de jornalistas: os infalíveis, que estão dispensados de mencionar a origem das informações que publicam, e os outros, sujeitos à terrena condição de que errar é humano, e que portanto se presume deverem invocar as fontes em que sustentam o seu trabalho. Tendo estudado jornalismo in illo tempore, o provedor não aprendeu esta divisão, nem lhe consta que tenha sido entretanto introduzida nos manuais. Mas acha que ao longo da História os homens considerados infalíveis nem sempre produziram bons resultados. Não será o mesmo no jornalismo?


CAIXA:

Para que conste

Um furo num dique, não sendo logo tapado, dá inundação. Foi o caso da frase "fiquei com uma boa relação com o seu accionista (Paulo Azevedo) e vamos ver se isso não se altera", a qual, segundo o Expresso de há três semanas, o director do PÚBLICO teria dito à ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social) que José Sócrates lhe teria dito, num telefonema em que o primeiro-ministro tentava impedir que este jornal publicasse uma investigação acerca das dúvidas em torno do seu diploma de Engenharia. O assunto andou ao retardador: o chefe do Governo levou mais de duas semanas a desmentir que tivesse proferido tal coisa e José Manuel Fernandes outro tanto para se lembrar de que havia enviado à ERC uma versão da acta com aquele seu depoimento em que a frase já não constava [NOTA DO PROVEDOR NA VERSÃO ON-LINE DA CRÒNICA: só a segunda parte da frase desapareceu, já que o director, na acta definitiva, manteve a versão de que José Sócrates lhe falou no bom relacionamento que teria com o accionista Paulo Azevedo]. Aliás, na acta primitiva, e ao contrário do que dizia o Expresso (e o PÚBLICO repetia a seguir, mesmo depois de ouvir o seu director), José Manuel Fernandes não atribuía aquela frase a José Sócrates, apenas lhe imputava essa insinuação, ao invocar na conversa entre ambos uma relação com o accionista do jornal.

Também ao retardador, o provedor vem reconhecer ter incorrido num erro na análise que há duas semanas fez ao assunto. Assumiu, com efeito, que os esclarecimentos que recebera de José Manuel Fernandes representavam uma confirmação implícita da autenticidade da frase que o Expresso e o PÚBLICO diziam que ele atribuíra a José Sócrates, e que não desmentia. O provedor devia afinal ter confrontado directamente José Manuel Fernandes com a nuance existente entre uma frase que se atribui a uma pessoa e a interpretação que se faz do seu pensamento – coisas muito diferentes. (Isto não absolve José Sócrates do pecado da pressão ilegítima sobre a imprensa, dado o que sugere na insólita referência a um proprietário do jornal, mas essa é matéria estranha às competências do provedor).

O leitor Gabriel Silva, que já motivara a outra crónica, pergunta agora: “Não terá o provedor contribuído para ‘desinformação’ dos leitores, ao invés de ajudar a esclarecer?” O provedor admite-o, e portanto publica esta nota, para que conste.
E porque achou estranho José Manuel Fernandes concluir só muito mais tarde (o que ajudou à balbúrdia) que a acta disponibilizada pela ERC não era a que ele havia corrigido, solicitou esclarecimentos ao director, que respondeu: “De vez em quando pedem-me para rever textos transcritos a partir de gravações (tenho neste momento dois para rever) e não me lembrava de ter especificamente revisto aquele. Apesar disso, fiz por precaução uma busca no meu computador e não encontrei nada. (...) Só quando Azeredo Lopes [presidente da ERC] me falou numa troca de mails é que me ocorreu fazer a busca na base de dados no server do PÚBLICO. Foi então que encontrei a troca de mails e os dois textos, o provisório e o corrigido. Nunca me ocorreu, e dificilmente me ocorreria, que a ERC pudesse ter trocado os papéis, razão por que disse que o melhor era citar o Expresso, pois no caso o que valiam eram as actas. De resto, quando vi as actas libertadas pela ERC, achei estranhas algumas coisas na forma como estava transcrito o meu depoimento, (...) mas continuei a achar que devia ser a acta real”.

Publicada em 12 de Outubro de 2008

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR

Carta do leitor Tiago Redondo:

É lamentável a notícia publicada no PÚBLICO de 03-10-2008 pela jornalista São José Almeida sobre uma suposta demissão de Agostinho Lopes da Comissão Política do PCP, que afinal se revelou ser integralmente falsa.

Trata-se uma questão de enorme gravidade, não só porque envolve uma pessoa em concreto e as suas posições (e que certamente saberá falar por si próprio), mas também porque a publicação destes artigos num tempo de discussão pré-congressual do PCP tem consequências objectivas. E a jornalista em causa está com certeza ciente disso.

Como militante do PCP e leitor atento do PÚBLICO sinto-me decepcionado e vejo abalada a confiança que tenho depositado no vosso jornal. Creio poder arrogar-me o direito de dizer que muitos, mesmo muitos, leitores do PÚBLICO gostariam de ver, para além do óbvio e natural desmentido, este assunto discutido na sua próxima crónica.

Aliás, teria muito interesse discutir a opção preferencial (tantas vezes exagerada) que o jornalismo político tem pelos "informadores supostamente bem informados" (as tais fontes internas), esquecendo que esses informadores têm, também, a sua própria agenda e objectivos políticos.

No caso concreto penso que esta era uma informação que nunca deveria ter sido publicada sem que antes houvesse, de facto, uma confirmação por parte do próprio ou uma reacção oficial. E não creio que as declarações do assessor de imprensa - provavelmente apanhado de surpresa - se qualifiquem como tal.

Tiago Redondo

Nota do Gabinete de Imprensa do PCP:

A propósito das falsidades e especulações do «Público» sobre Agostinho Lopes

Face à falsidade da noticia e das especulações em torno dela produzidas pelo jornal PÚBLICO, que refere que “Agostinho Lopes deixou a Comissão Política do PCP”, e que as suas responsabilidades foram entregues a outro membro da Comissão Política, o Gabinete de Imprensa do PCP esclarece que:

1. Agostinho Lopes permanece na Comissão Política do PCP e mantém todas as responsabilidade de direcção no acompanhamento das questões da economia, agricultura, pescas e União Europeia, bem como as funções de deputado na Assembleia da República.

2. Apenas numa área, a da agricultura, participa também, há cerca de dois anos, João Frazão, da Comissão Política, sem que se tenha verificado alteração na responsabilidade da área que continua a ser assumida por Agostinho Lopes.

3. A futura composição dos órgãos de direcção do PCP, a sair do XVIII Congresso, será considerada na altura própria, com as decisões correspondentes, como é prática do PCP.

Nova carta do leitor Tiago Redondo:

Lamento importuná-lo de novo sobre este assunto, mas imagine a minha surpresa (e decepção) ao verificar, na edição do PÚBLICO de 04-10-2008, que não só não foi publicado nenhum desmentido sobre a notícia falsa sobre a demissão de Agostinho Lopes da Comissão Política como a mesma jornalista insiste com a sua inverdade, não fundamentada, sobre este assunto.

De facto, embora não haja nenhuma referência ao desmentido emitido pela Comissão Política, a jornalista sentiu alguma necessidade de se justificar, ao escrever, numa caixa da página 8 dessa edição: "Refira-se que essas substituições e mudanças já estão em preparação, daí estar já consagrada a saída de Agostinho Lopes." Porventura pretendendo dizer que a notícia do dia 3 afinal não era sobre algo que tinha acontecido, era sobre algo que virá a acontecer. Por outro lado, dizendo-nos também que, afinal não fora o próprio que se demitira, mas que afinal fora afastado. Em qualquer caso, a assumpção de inexactidão da notícia do dia 3 é clara. Duvido que, dúbio que seja, o conceito de "jornalismo interpretativo", possa abrir portas à objectiva falsidade.

Sem querer entrar na questão da futurologia política que esta afirmação comporta, penso que teria havido vantagem em explicar aos leitores a fonte das suas informações. Nunca identificando-a pessoalmente, claro (a protecção das fontes é um princípio essencial que deve ser salvaguardado, em qualquer caso), mas pelo menos situando-nos em relação à sua origem: "fonte junto da Comissão Política", "fonte interna do PCP", "fonte do Movimento da Renovação Comunista, afastado da vida partidária há vários anos", ou mesmo, assumir: "especulação pessoal da jornalista".

Já abordei, no meu mail anterior, a questão da responsabilidade de quem informa e da necessidade de ter presentes as consequências do que é publicado, e não pretendo maçá-lo mais com isto, mas, de facto, sem terem mais nenhuma explicação sobre os critérios e razões para esta actuação jornalística, muitos leitores não deixarão de ver nestas notícias uma determinada intencionalidade por parte do PÚBLICO em perturbar um debate em curso no PCP. O que seria inaceitável. Não gostaria de me contar nesse número, e por isso apelo para que me possa esclarecer.

Tiago Redondo

Explicação de São José Almeida:

Tenho a dizer somente que fiz a notícia com a segurança e a confiança nas fontes contactadas. É certo que é uma notícia com fontes anónimas, como, aliás, são a maioria das notícias sobre partidos em Portugal – mas isso tem a ver com a transparência da vida política e é um outro assunto. Sublinho que respeitei todas a regras. O PCP é citado na notícia, através do gabinete de imprensa e do assessor António Rodrigues. E, no dia em que foi questionado, apenas disseram que não tinham nada a comentar, como se pode ler na notícia. Quanto ao desmentido, creio que a direcção do PÚBLICO e os editores da secção optaram por referir as palavras de Jerónimo de Sousa, que é secretário-geral do PCP, a citar um comunicado do gabinete de imprensa, o que, na minha opinião, é não só legítimo como recomendável: afinal, Jerónimo de Sousa é o líder do partido e é a cara do PCP perante o país. Quanto à futurologia ou não futurologia, não comento as expressões – essa como outras -, agora friso que o jornalismo político é também antecipação e análise.

São José Almeida

Carta de António Rodrigues (gabinete de imprensa do PCP):

O jornal PÚBLICO divulgou na passada sexta-feira, com destaque na primeira página, uma notícia onde se afirmava que "Agostinho Lopes deixou a Comissão Política do PCP" o que, não sendo verdade, provocou as mais variadas especulações e foi objecto de um categórico desmentido da parte do PCP e a que o v/ jornal teve acesso.

A edição do PÚBLICO do dia seguinte ignorou absolutamente o esclarecimento do PCP e não mostrou qualquer interesse em confirmar a notícia junto do próprio, como o fizeram outros órgãos de comunicação social, designadamente o DN, refugiando-se, de forma pouco séria, em quatro palavras alegadamente proferidas pelo Secretário-Geral do PCP, que terão sido extraídas de um desmentido que este fez na Assembleia da República, quando questionado por jornalistas sobre o assunto e cujo sentido foi exactamente o que está contido na nota que o Gabinete de Imprensa do PCP divulgou.

Por tudo isto, e porque se trata de um violento atropelo ao chamado Livro de Estilo do PÚBLICO, e também de uma grosseira e descarada manipulação da realidade, dirigimos-nos ao Provedor do Leitor para lhe fazer sentir o nosso protesto e a nossa indignação, para lhe dar conta de todas as tentativas, infrutíferas, com vista a permitir que os leitores do PÚBLICO pudessem ter acesso à realidade dos factos e para lhe lançar o desafio de não permitir que este assunto “caia em saco roto”.

António Rodrigues
Gabinete de Imprensa do PCP


Troca de mails entre São José Almeida e o provedor:

Creio que no primeiro mail respondi a esta questão [suscitada pela carta de António Rodrigues]. Não havia razão para duplicar o secretário-geral e o comunicado e seria absurdo ignorar que o secretário-geral do PCP tinha falado sobre o assunto.

São José Almeida

Ainda sobre este assunto, gostaria de lhe perguntar se não acha curial que:

a) na notícia original fosse invocada pelo menos uma fonte (digo "invocada", não digo "identificada");
b) para a produção da mesma notícia se fizesse pelo menos uma tentativa de ouvir o visado.

O provedor

A existência de fonte anónima está implicita. Se o jornalista escreve é porque teve fonte, não sonhou nem inventou. Essa é a regra. Penso, aliás, que é relativamente ridículo usar formulações como "soube o PÚBLICO junto de fonte...". Quanto a citar Agostinho Lopes, é certo que o podia ter feito; no entanto, considerei primordial ouvir a direcção do PCP.

São José Almeida

Explicações do director do PÚBLICO:

Em primeiro lugar, a experiência da direcção com a jornalista autora da notícia é que esta, quando toca a notícias sobre o PCP, tem fontes à prova de bala. Há muitos anos. Confiamos na informação e estamos convictos de que, no próximo Congresso, a eleição dos órgãos dirigentes nos dará razão.

Neste caso, que eu saiba, a direcção não utilizou a possibilidade criada pelo Livro de Estilo de perguntar à jornalista que fontes tinha consultado, designadamente se tinha contactado o próprio ou militantes muito próximos. A notícia surgiu tarde e, face às (boas) experiências anteriores, não sentimos que isso fosse necessário.

O texto do segundo dia, apesar de citar correctamente Jerónimo de Sousa, que desmentiu a informação nos mesmos termos que a nota do PCP, devia ter-se referido à existência desta, mesmo que tivesse mais força citar o próprio secretário-geral do que uma nota de imprensa, como fizemos. É uma falha que a direcção admite, até pela relativa secundarização do desmentido. Porém, estando ele dado, insistir na sua repetição, como fez o PCP, pareceu-nos excessivo, sobretudo porque ao longo de todo o processo faltou o desmentido que seria realmente decisivo: o do próprio Agostinho Lopes. Ele, mais do que o PCP, é que sabe o que tenciona fazer.

Admito que possa ter havido um erro no título da primeira página, pois deste pode levar a concluir-se que já ocorreu algo que só sucederá no próximo Congresso do PCP.

José Manuel Fernandes

Carta do leitor Gabriel Silva:

Julgo haver matéria suficiente nos últimos dias para se continuar a analisar a questão das declarações de José Manuel Fernandes/Sócrates/ERC.

No entanto, e como ponto prévio, há que reconhecer ter existido desde o início um problema que convém resumir:

1. O Expresso escreve: "Também o director do PÚBLICO foi claro em considerar como 'pressão ilegítima a tentativa de evitar que as notícias saiam' e relatou uma parte da conversa com o PM para exemplificar o tipo de diálogo ocorrido: 'Fiquei com uma boa relação com o seu accionista (Paulo Azevedo) e vamos ver se isso não se altera', terá dito Sócrates ao director do jornal da Sonae."

2. O PÚBLICO (a 21/09) repete: "O director do PÚBLICO foi ainda mais longe, reportando-se à conversa com Sócrates, no decurso da qual o primeiro-ministro teria dito: 'Fiquei com uma boa relação com o seu accionista [Paulo Azevedo] e vamos ver se isso não se altera'."

3. Ora, sucede que o Expresso (e o PÚBLICO por repetição) não reproduz fielmente o que constava na acta (a apócrifa, mas, ainda assim, a base da transcrição), pois na mesma se diz: "(O primeiro-ministro) fez uma referência subtil ao facto de ter estabelecido uma boa relação com o eng. Paulo de Azevedo durante a
OPA, o que queria dizer: fiquei com uma boa relação com o seu accionista e vamos ver se isso não se altera. É uma interpretação subliminar dizer que sempre existiu uma boa relação com o accionista (e admitir que ela poderia ser posta em causa?)".

4. Em bom português, não é ali afirmado que o PM terá dito, mas sim "o que queria dizer", isto é, é uma interpretação (aliás, no sentido do que depois JMF escreveu na segunda acta).

5. Temos portanto o Expresso a abusivamente atribuir a JMF ter dito que o PM tinha dito....

Ora, venho questionar o seguinte:

No momento da crónica do Provedor, já estavam disponíveis (desde 24), as actas no site da ERC. No seu blogue o Provedor faz mesmo um link para as mesmas. Apesar disso, o Provedor repete, sem correção, o afirmado pelo Expresso e repetido pelo PÚBLICO, de que teria havido um frase e não uma interpretação.

A meu ver, o Provedor vai mesmo um pouco mais longe e afirma a certo ponto "Frase que o Director porém entendeu agora confirmar", seguindo-se uma exposição de JMF onde não apenas este não confirma como, na ausência das actas e na incerteza (por ter passado mais de um ano) remete, com várias cautelas explicativas, para o publicado pelo Expresso. Acresce ainda que a sua frase (acompanhada pela respectiva imagem) "para mais com uma frase que parece saída de O Padrinho" é obviamente um juízo de valor. Que não estaria mal indicado se a frase tivesse sido proferida, mas, pelo que se sabe e se podia saber, não foi.

Assim, pergunto: não terá o Provedor "esquecido-se" de ler as actas, quando já o poderia fazer? Não terá o Provedor ido um pouco longe de mais ao dizer que JMF "confirmava", quando este, objectivamente, não confirma? Não terá o Provedor contribuído para "desinformação" dos leitores, ao invés de ajudar a esclarecer?

Gabriel Silva

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Uma farmácia a 300 km

Estou com gripe, e embora isso não lhes interesse nada, parto deste princípio para uma grande descoberta! Ora, como lhes disse, estando eu com gripe, precisei de uma farmácia, era tarde, e por essa razão fui consultar no PÚBLICO/Edição Porto o guia das farmácias de serviço para o Grande Porto. Eis senão quando, o guia que o jornal me oferece é o de Lisboa! Isso mesmo, de Lisboa e arredores. Pensei: "Também tu, PÚBLICO?" Mas como um dos grandes conselhos da Humanidade é para pensarmos duas vezes, foi o que fiz. E afinal concluí que o PÚBLICO não é um grande jornal… é apenas o menos mau.

Ou então o meu estava estragado!

Refiro que a dita edição é a de sábado dia 4 Outubro de 2008, e guardei-a - não vão dizer que estou maluco!

J. Augusto Silva

sábado, 4 de outubro de 2008

A propósito das 1.400.000 armas

Na pág. 3 do PÚBLICO de 17 de Julho 2008, um artigo de José Bento Amaro tem a ilustrá-lo uma imagem de meia página que contém uma *inverdade* que pela sua gravidade deve merecer correcção e pedido de desculpas aos leitores.

O título da imagem é "Os bairros mais problemáticos da região de Lisboa e da Margem sul do Tejo". Neles são identificados mais de uma dezenas de bairros em diversos concelhos. Em relação ao concelho de Sintra, pode ler-se: "CACÉM (toda a cidade)"

Toda a cidade? TODA a Cidade? TODA? Um imenso aglomerado de bairros problemáticos?

A fonte da imagem não é suficientemente elucidativa (PSP;PÚBLICO). O critério ou critérios adoptados para as respectivas identificações como *problemáticos* não são também especificados. No corpo da notícia o Cacém não é referido. Mas tamanho fenómeno (TODA A CIDADE É PROBLEMÁTICA) deveria merecer pelo menos uma parágrafo.

Habito no Cacém há umas dezenas de anos. Tenho assim assistido às transformações profundas (boas e más) que ocorrem e ocorreram na agora cidade. A classificação encontrada por José Bento Amaro só pode vir de alguém profundamente ignorante desta realidade suburbana. Faria bem em informar-se para informar.

Elsa Fontainha

O caso das notícias órfãs

De novo, a prática informativa ao estilo “sei que é assim e o público só tem que acreditar”

Duas notícias de natureza policial levam o provedor a reincidir num tema. O leitor Amílcar Gomes da Silva fala em “falta de rigor e respeito pelos leitores” a propósito do título “Investigadores da PSP ameaçam abandonar serviço em desacordo com subsídio de risco”, na pág. 5 da edição de 25 de Junho: “Perante tão afirmativo e grave título ninguém resiste a ler o artigo. Com espanto, lê-se: ‘Os 1600 polícias da PSP que trabalham na área de investigação criminal ponderam pedir a transferência para outros serviços’. Mas não se encontra qualquer resquício que seja de como o autor consegue provar tal afirmação. A única fonte (onde está o contraditório?), o dirigente sindical Paulo Rodrigues, diz apenas: ‘Confirmo que estamos a receber muitas reclamações de associados que trabalham na investigação criminal’. Qualquer jornalista, honesto e rigoroso, qualidades mínimas para a profissão, só pode escrever que a Associação Sindical dos Profissionais da Polícia, na pessoa do seu presidente (e certamente também muitos polícias), quer que o subsídio de risco seja um dado valor e que por não sê-lo está a receber muitas reclamações. Escrever que 1600 polícias de investigação criminal ‘ponderam pedir a transferência’, só por transmissão de pensamento. Ou será que o jornalista ouviu-os a todos, acha que muitos é sinónimo de todos, teve acesso a algum inquérito individual com essas respostas ou é a sua convicção? Isto não é jornalismo, é pura agit-prop. É criação de factos políticos para determinar uma agenda política. Com ‘notícias’ destas pode o jornal ser credível?”

Também sem citar qualquer fonte, o mesmo jornalista, José Bento Amaro, escreveu a notícia que fez a manchete de 17 de Julho: “Há 1,4 milhões de armas ilegais em Portugal”. O que motivou o mesmo leitor a recorrer, desta vez, à arma da ironia: “Venho, encarecidamente, solicitar a rectificação da notícia. Posso garantir que em Portugal não existem 1.400.000, mas sim 1.400.002 armas ilegais. O avô da minha mulher, que foi sargento na I Guerra Mundial e era caçador, deixou em herança duas armas. Um revolver Browning (quase miniatura) e uma caçadeira. (...) Das ditas armas (...) nunca foi encontrado qualquer documento, nem as declarámos, porque para nós são autênticas antiguidades. Portanto, estão manifestamente ilegais. Como não fomos perguntados pelo pressuroso jornalista, afiançadamente não foram contabilizadas, e, a bem do rigor e do jornalismo de excelência, agradeço que corrijam a notícia”.

No caso, o jornalista não necessitaria de inquirir individualmente, porque na notícia atribuiu aquele número a uma estimativa policial. A questão é que nenhuma fonte, da polícia ou fora dela, identificada ou não, surge a afirmá-lo.

O provedor solicitou atempadamente esclarecimentos a José Bento Amaro, não tendo porém recebido resposta. Mas não pode deixar de lembrar mais uma vez que existe um problema nesta tendência de produzir notícias sem mencionar a sua origem (e que não é apenas do PÚBLICO, mas do jornalismo português em geral). O método contraria as elementares regras ditadas pelas boas práticas jornalísticas. Ao retirar-se ao público o conhecimento da fonte da notícia, ele fica impossibilitado de avaliar a sua consistência.

A tendência, que o provedor julga poder situar na forma despreocupada como se fazia jornalismo no imediato pós-25 de Abril, e que ficou como uma “conquista da revolução”, manifesta-se predominantemente no noticiário político. Tal é o caso da manchete “Obras públicas azedam relação entre Cavaco e José Sócrates”, de 6 de Julho, afirmação que no corpo da notícia não é sustentada em qualquer fonte, embora abundem as expressões “o PÚBLICO sabe que...”, “o PÚBLICO confirmou esta informação...” ou “o PÚBLICO apurou que...” O PÚBLICO pode saber muita coisa, o leitor é que fica a saber muito pouca.

Desta vez, o autor da notícia, Luciano Alvarez, teve a amabilidade de enviar ao provedor as suas fundamentações: “A notícia foi feita com base em informações de fontes que considero absolutamente credíveis, algumas delas independentes entre si e conhecedoras do tema em análise: as relações políticas e institucionais entre o Presidente da República e o primeiro-ministro. Porém, (...) aceitaram conversar comigo desde que não fossem citadas, nem sequer identificada a sua procedência. Claro que acho desejável a identificação de, pelo menos, a procedência da fonte, mas face à delicadeza do tema compreendi o pedido (...). Tendo em conta que as fontes eram, repito, absolutamente credíveis, e após conversa com o meu director, decidi assumir a informação que tinha, facto que só me responsabilizava mais a mim e ao meu jornal, uma vez que se a informação deste tema bastante delicado não fosse absolutamente correcta, como eu tinha a certeza que era, só eu e o meu jornal seríamos responsáveis por eventuais incorrecções. A informação (...) não só não foi questionada por ninguém, como, com o avançar dos dias e dos meses, viria a confirmar-se em absoluto”.

O provedor não sabe se as evidentes razões da deterioração do relacionamento entre Presidente e Governo radicam aqui ou em ocorrências mais recentes (Estatuto dos Açores, Lei do Divórcio), mas também não pretende contestar o que alega Luciano Alvarez a esse respeito: o que está em causa não é a veracidade das informações publicadas, mas sim a forma como se publicam, no estilo “eu sei que isto é assim e o público só tem que acreditar”.

Ao provedor também não parece que se tratasse de algo da transcendência do início da III Guerra Mundial, para obrigar a sigilo tão rigoroso e absoluto. Mas, se o jornalista avança agora essa explicação, não se vê por que razão não o poderia já ter feito na notícia – sempre era melhor que nada, embora insuficiente.

Tendo o assunto passado pelo director, o provedor ouviu também José Manuel Fernandes. Para além de considerações sobre técnica jornalística que, por falta de espaço, se remetem para o blogue do provedor, José Manuel Fernandes, revelando que o autor lhe indicou “quais eram as suas fontes” e que as considerou “fiáveis (algo que os factos, de resto, mais do que comprovaram)”, invoca, à semelhança do que faz Luciano Alvarez, uma disposição do Livro de Estilo admitindo esta prática: “Quando o jornalista está em condições de assumir a informação – isto é, quando a confirmou junto de várias fontes independentes entre si, embora todas tenham exigido o anonimato –, deverá noticiá-la no PÚBLICO sem necessidade de recorrer às habituais, retóricas e desacreditadas fórmulas do género ‘fonte digna de crédito’, ‘fonte segura’ ou ‘fonte próxima de’. As fontes, a sê-lo, devem estar sempre bem colocadas para falar sobre o assunto. (...) Um jornal bem informado não precisa de justificar permanentemente as suas notícias. Assume-as e responsabiliza-se por elas” (ponto 72 dos “Princípios e Normas de Conduta Profissional”). E conclui o director: “Enquanto o Livro de Estilo estiver em vigor é a nossa cartilha, mesmo que o possamos ldiscutir”.

O provedor já aqui discutiu (e questionou) esta norma bastante original, e acrescenta agora que lamenta ter ela resultado de uma revisão da “cartilha” em substituição de outra que entendia por mais adequada: ‘O sigilo deverá ser admitido apenas em último recurso e só quando não há outra forma de obter a informação ou a sua confirmação. O sigilo deve ser sempre justificado, de modo a não ser pretexto fácil de desresponsabilização do autor ou da fonte de informação. (...) Nesses casos, e só nesses casos, pode utilizar-se a fórmula ‘uma fonte do organismo X que solicitou o anonimato’”.

Uma última nota do director: “Nenhum jornal português trabalha com esta transparência no que respeita às regras que segue; e é mais fácil atribuir a fonte a uma entidade difusa não identificável do que assumi-la, mesmo podendo eu admitir que é preferível fazê-lo em certas circunstâncias para acrescentar credibilidade à informação. Mas se seguirmos a regra de que as fontes anónimas não servem para proteger o jornalista se este escrever algo errado, assumir a informação é mais exigente para quem escreve e assina, pois é o seu nome profissional, a sua credibilidade pessoal, que estão directamente em causa: o jornalista tenderá a ter mais cuidado antes de escrever. Foi este o caminho que escolhemos (...). Quando sentirmos que há melhores argumentos a favor de teses contrárias, alteraremos as nossas regras”. O provedor não perde pois a esperança num mundo melhor (pelo menos no PÚBLICO).


CAIXA:

Alarme genérico

A manchete de 3 de Agosto terá causado alarme generalizado: “Descida dos genéricos pode tornar mais caros muitos medicamentos”. O leitor Ricardo Charters d’Azevedo achou não ser bem assim: “A manchete (...) é finalmente desmentida, pois os cálculos não estão feitos e até pode ficar mais barato... segundo se noticia. Deu-se simplesmente voz a quem não concorda com os genéricos e procura inculcar a ideia de que a sua existência faz com que paguemos mais...” Na realidade, o título resultava apenas de uma especulação do presidente da Associação Nacional de Farmácias, João Cordeiro, desde sempre um feroz opositor dos genéricos. As explicações da autora da notícia, Alexandra Campos: “O comentário não tem fundamento, porque inicialmente, quando a redução do preço dos genéricos foi anunciada, havia mesmo o risco de alguns fármacos passarem a ficar mais caros para os doentes. E isto acontecia porque, ao descer o preço de referência (o do genérico mais caro do grupo dos medicamentos com a mesma substância activa), como a comparticipação do Estado é calculada com base neste indicador, os doentes passariam a pagar mais sempre que comprassem medicamentos de marca. Esse risco era de tal forma real que o Governo se viu obrigado, alguns dias depois, a mudar a forma de cálculo dos preços para evitar que alguns medicamentos ficassem mais caros. O problema foi esclarecido e ultrapassado (...) quando o Ministério da Saúde explicou que vai continuar a comparticipar os fármacos com base no preço actual dos genéricos, para evitar que os doentes paguem mais sempre que o médico receite medicamentos de marca”. Com esse resultado, terá feito sentido o alarme.

Publicada em 5 de Outubro de 2008

DOCUMENTAÇÂO COMPLEMENTAR

Carta do provedor ao jornalista Luciano Alvarez:

Como provedor do leitor do PÚBLICO, tenho-me debruçado sobre o problema da falta de referência a fontes das notícias, e é nesse sentido que gostava de o questionar sobre uma notícia da sua autoria. É uma notícia já um pouco antiga, mas o período de férias do Verão acabou por atrasar todo este processo de diálogo do provedor com os jornalistas. Penso porém que ainda vale a pena voltar a ela.

Trata-se da manchete de 6 de Julho: "Obras públicas azedam relação entre Cavaco e José Sócrates".

Acontece que em momento algum do texto se menciona qualquer fonte que tenha declarado o que se diz no título, apesar de todo o artigo ser bastante afirmativo no que respeita à questão de fundo. Do ponto de vista do leitor, é importante ter a percepção de que a informação está escorada em fontes credíveis, que lhe dão a solidez para se transformar em notícia e até ser manchete, mas tal nunca transparece do texto. Claro que poderemos estar perante fontes confidenciais, cujo anonimato tem de ser respeitado, mas também isso não é dito, limitando-se o texto às vagas referências "o PÚBLICO confirmou" ou "o PÚBLICO sabe".

Gostaria assim de lhe perguntar se considera adequada esta formulação do ponto de vista da técnica de construção da notícia.

Joaquim Vieira

Resposta de Luciano Alvarez:

A notícia que refere foi feita com base em informações de fontes que eu considero absolutamente credíveis, algumas delas independentes entre si e conhecedoras do tema em análise: as relações políticas e institucionais entre o Presidente da República e o primeiro-ministro.

Porém, as fontes por mim ouvidas e fundamentais para a elaboração da notícia aceitaram a conversar comigo desde que não fossem citadas, nem sequer identificada a sua procedência. Claro que acho desejável a identificação de, pelo menos, a procedência da fonte, mas face à delicadeza do tema compreendi o pedido feito pelas fontes.

Tendo em conta que as fontes eram, repito, absolutamente credíveis e após conversa com o meu director decidi assumir a informação que tinha, facto que só me responsabilizava mais a mim e ao meu jornal, uma vez que se a informação deste tema bastante delicado não fosse absolutamente correcta, como eu tinha a certeza que era, só eu e o meu jornal seriamos responsáveis por eventuais incorrecções.

A informação avançada pelo PÚBLICO a 6 de Julho ("Obras públicas azedam relação entre Cavaco e José Sócrates") não só não foi questionada por ninguém, como, com o avançar dos dias e dos meses, se viria a confirmar em absoluto.

A propósito cito o Livro de Estilo do PÚBLICO (página 33):

Princípios e Normas de Conduta Profissional

Ponto 72 - Quando o jornalista está em condições de assumir a informação – isto é, quando a confirmou junto de várias fontes independentes entre si, embora todas tenham exigido o anonimato – deverá noticiá-la no PÚBLICO sem necessidade de recorrer às habituais, retóricas e desacreditadas fórmulas do género “fonte digna de crédito”, “fonte segura” ou “fonte próxima de”. As fontes, a sê-lo, devem estar sempre bem colocadas para falar sobre o assunto. “Segundo as nossas fontes” é outra expressão banida das páginas do PÚBLICO. Um jornal bem informado não precisa de justificar permanentemente as suas notícias. Assume-as e responsabiliza-se por elas.

Luciano Alvarez

Resposta complementar do director do PÚBLICO:

Li a resposta do Luciano antes de ele ta enviar.

Discuti com ele a notícia entes de ele a publicar.

Sei que não concordas com o que está estabelecido no Livro de Estilo (e que resulta de uma evolução do primeiro Livro de Estilo, como a tua anterior polémica - ver também aqui - com o Vicente e o Zé Mário mostrou), e que resultou de um grande debate no interior da redacção.

Mas já não estou tão seguro que tenhas razão sobre o que dizes sobre a imprensa americana e inglesa. Quando estalou o escândalo Jason Blair, no New York Times, eles apertaram as regras no que se refere à citação de fontes anónimas. O caso do jornalista da BBC que noticiou o “apimentar” dos relatórios sobre o Iraque também suscitou uma polémica importante, tendo a comissão de inquérito da Câmara dos Lordes acabado por condenar o comportamento do jornalista por este, para proteger a fonte (que se suicidou, como te recordarás), a ter identificado de modo errado.

Com toda a franqueza, acho que este tema é infindável e muito dificilmente se chegará a um ponto em que todos possamos estar de acordo. Ainda ontem, por exemplo, li uma extraordinária reconstituição das negociações entre republicanos e democratas durante no último fim de semana no Wall Street Journal, uma peça para que contribuíram dez jornalistas (dez!) em que a regra foi a de contar o que se passou sem atribuir a fontes a não ser quando estas apareciam identificadas e as citações entre aspas.

E, quando foi a polémica do Jason Blair, o fundador do USA Today (que entretanto se tornou no jornal de maior circulação nos Estados Unidos), escreveu num artigo intitulado "Evil of journalism: Anonymous sources": "In 1982, when we founded USA TODAY, we effectively banned all anonymous sources. As competition for readers and viewers and listeners and prizes from peers has become greater, more and more publishers and editors and broadcast managers have relaxed their rules. More and more reporters have taken advantage of that environment. It's so simple. Most anonymous sources often tell more than they know. Reporters who are allowed to use such sources sometimes write more than they hear. Editors too often let them get away with it. Result: Fiction gets mixed with fact. The only way to win the war against this evil is for journalists at all levels to ban all anonymous sources. Until or unless we do, the public won't trust us, and we put the First Amendment in jeopardy."

Na altura, para evitar problemas como este, procurámos balancear o Livro de Estilo com normas como as introduzidas em 2004 no NYT, nomeadamente esta, citada num texto do seu provedor: “A fundamental part of the effort to tighten up the explanations for allowing anonymity was The New York Times's 2004 move to require that at least one editor be told the identity of any confidential source.

Contudo isso não evitou todos os problemas e, na mesma coluna do mesmo, um leitor interrogava-se sobre a legitimidade da seguinte passagem de uma notícia publicada dias antes a propósito na nomeação do novo embaixador americano para as Nações Unidas: “Most of the reforms sought by the United States are well on their way to completion,' said a senior administration official, speaking anonymously to avoid undercutting the rationale for the Bolton appointment." A questão do leitor era a seguinte: "How absurd that The Times considers this an acceptable reason to use an anonymous source," he wrote. "It is the quote itself which undercuts the rationale for the appointment, whether the official is willing to own up to it or not."

No nosso Livro de Estilo evitamos este tipo de problemas estabelecendo que não se podem atribuir a fontes anónimas opiniões ou mesmo valorações de decisões.
Serve tudo isto para indicar que: a) o Luciano me indicou quais eram as suas fontes; b) considerei que eram fiáveis (algo que os factos, de resto, mais do que comprovaram); c) enquanto o Livro de Estilo estiver em vigor é a nossa cartilha, mesmo que o possamos discutir; d) se na anterior revisão do Livro de Estilo foram tidas em consideração várias recomendações de anteriores provedores, as tuas opiniões e recomendações deverão ser também tidas em conta na próxima revisão, que neste momento não tem data prevista apesar de a direcção e o conselho de redacção já terem recolhido várias sugestões que visam o seu aperfeiçoamento.

Por último, uma nota: nenhum jornal português trabalha com esta transparência no que respeita às regras que segue; e é mais fácil atribuir a fonte a uma entidade difusa não identificável do que assumi-la, mesmo podendo eu admitir que é preferível fazê-lo em certas circunstâncias para acrescentar credibilidade à informação. Mas se seguirmos a regra que as fontes anónimas não servem para proteger o jornalista se este escrever algo errado, a regra de assumir a informação é mais exigente para quem escreve e assina, pois é o seu nome profissional, a sua credibilidade pessoal, que estão directamente em causa, então o jornalista tenderá a ter mais cuidado antes de escrever. Foi este o caminho que escolhemos e são estas as regras que estão em vigor. Quando sentirmos que há melhores argumentos a favor de teses contrárias, alteraremos as nossas regras. Nesse sentido, aceitamos e apreciamos a tua opinião.

José Manuel Fernandes