domingo, 28 de dezembro de 2008

Um jornal analisado à lupa

Dada a hipersensibilidade da sociedade portuguesa ao tema, multiplicam-se críticas pela cobertura do conflito da educação


Para o director, a mobilização dos professores mostra que estes “empurram” os sindicatos, não o contrário


Com o extremar de posições no conflito entre o governo e os professores (ou os sindicatos de professores, como – ver-se-á mais à frente – haja quem prefira dizer), tudo o que se publica sobre a matéria acaba lido à lupa.

A leitora Catarina Cachapuz, por exemplo, contesta que o PÚBLICO escreva, na entrada do artigo "Professores que estão perto da reforma não vão ser avaliados", na pág. 5 da edição de 18 deste mês, que “as férias começam amanhã [sexta-feira antes do Natal]”: “Tal afirmação é errónea e pode levar a opinião pública a pensar que esta classe profissional entrará de férias. De facto, é verdade que as aulas terminam hoje (dia 18) e que a partir de amanhã os alunos estarão de férias. Os professores continuarão nas escolas a trabalhar na avaliação dos alunos relativa ao 1º período lectivo. Na escola onde lecciono (Secundária c/3 Aurélia de Sousa, no Porto), este processo inicia-se no dia 18 às 18h45 e só termina a 23. De referir que, para evitar que a 24 de Dezembro ainda seja necessário estar a trabalhar, vamos efectuar reuniões de conselho de turma de avaliação no sábado [20] durante todo o dia. Estes factos podem ser confirmados junto de qualquer escola”.

Contrariando o jornalismo canónico, a frase consta da entrada mas não do corpo da notícia, pelo que não se sabe se o editor pretendia referir-se ao descanso dos alunos (as “férias escolares”) ou dos professores – embora, por associação, se possa entender tratar-se do corpo docente. De qualquer modo, a reacção da leitora não deixa de reflectir a hipersensibilidade com que se encara hoje o tema do ensino nos órgãos de informação.

O mesmo se passa com a reclamação de Jorge Gonçalves perante a manchete de 21 de Novembro, “Ministra recua, Professores não”, sobre as propostas governamentais de simplificação do modelo de avaliação dos docentes: “A manchete tem um erro grosseiro. Dou de barato a parte ‘Ministra recua’. É interpretação do jornal sobre as medidas anunciadas pela ministra da Educação, interpretação de que aliás discordo. Mas nem é essa liberdade interpretativa (que roça a intromissão editorial do jornal no próprio debate político) que me choca mais. É a parte seguinte: ‘Professores não’. Deveria antes ler-se aí ‘Sindicatos não’. O PÚBLICO ‘fala’ pelos professores? Representa-os? Presume que a posição dos sindicatos é comum a todos os professores? Ou acha que ‘sindicatos’ e ‘professores’ significam o mesmo? Certamente não acha, por isso esta manchete é particularmente criticável – embora não surpreendente no PÚBLICO, que na actualidade faz mais política do que notícias”.

“O leitor levanta dois problemas em relação a essa manchete”, responde o director do PÚBLICO, a quem o provedor solicitou uma explicação. “Curiosamente, outros leitores têm levantado problemas de sentido diferente, ou mesmo oposto. A manchete parece ter funcionado como a história do copo meio cheio e do copo meio vazio. Quando a escolhi – e fui eu que a escolhi – pareceu-me uma descrição factual do que se estava a passar (a ministra alterara algumas das regras que antes dissera inalteráveis), mas os professores continuavam intransigentes. O resultado foi que alguns apoiantes da ministra viram no termo ‘recua’ uma conotação negativa e alguns professores viram na formulação do título um sinal de que estaríamos a acusá-los de intransigência”.

Prossegue José Manuel Fernandes: “Face ao clima político do momento, antevi ambas as leituras, mas considerei que isso não impedia que o título estivesse correcto, provavelmente podendo resultar mais desfavorável aos professores: havia muitos comentários contra a sua intransigência e a ministra abrira uma porta (...). Já quanto a utilizar o termo ‘professores’ e não ‘sindicatos’, desde início que as indicações dos nossos jornalistas apontavam para uma luta onde tinham sido os professores a ‘empurrar’ os sindicatos, e não a banal luta sindical como as que juntam umas centenas de pessoas à frente do ministério. As duas manifestações e os níveis de adesão à greve são tão fora do comum que ultrapassaram muito a capacidade habitual de mobilização dos sindicatos e abarcaram muitos, mas mesmo muitos, professores não sindicalizados. Mas mesmo que não fosse essa a leitura o título não deixaria de estar correcto, a não ser que demonstrássemos que a plataforma sindical não representava os professores. Se representa – e é o que se espera que aconteça se respeitamos o movimento sindical, concordemos ou não com as suas reivindicações –, escrever ‘sindicatos’ ou ‘professores’ é tão diferente como, por exemplo, escrever ‘PS’ ou ‘socialistas’”.

E remata: “Duas coisas são porém certas: nem o PÚBLICO representa os professores, nem faz política. Mas faz as leituras da realidade que tenta que sejam o mais possível correctas e equilibradas, assim como abre espaço para opiniões diferentes sobre essa mesma realidade”.

O provedor considera estas explicações adequadas ao estatuto editorial do jornal, nada encontrando de objectável na manchete e parecendo-lhe a reclamação, de novo, fruto do radicalismo que se apossou da opinião pública acerca do conflito da educação.

Recuando mais dois meses, temos outra reclamação relacionada com este grande tema nacional de 2008, do leitor Henrique Pereira: “Ontem, 10 de Setembro, no PÚBLICO [em manchete], 85 professores diziam o que ‘vão fazer para melhorar a escola’. O PÚBLICO omite se são professores de escolas públicas ou privadas. Hoje, 11 de Setembro, no PÚBLICO [págs. 8/9 do P2], 76 crianças ‘dizem o que esperam da escola dos crescidos’. Curiosamente, uma significativa maioria das crianças [59, segundo a contagem do provedor] frequentam o ensino privado. Como explicam a diferença de critérios de identificação? Por que razão a amostra das crianças é tão desequilibrada?”

O provedor considera a observação pertinente. Embora os trabalhos tenham sido elaborados por jornalistas diferentes para diferentes áreas do jornal, o conceito é idêntico (somatório de fotos de cada depoente, com a sua frase ao lado), pelo que o critério de identificação também o deveria ser. Não que venha daí grande mal, mas na perspectiva do leitor seria mais interessante saber onde leccionava cada um dos professores contactados, o que aliás podia até certo ponto ajudar a compreender melhor o seu depoimento.

Quanto à distribuição dos alunos, sabendo-se que quatro em cada cinco jovens portugueses do pré-primário ao secundário estão no ensino público, não há dúvida acerca do grande desequilíbro da amostra. Embora longe do rigor da ciência estatística, seria interessante que se tivesse procurado uma distribuição das crianças proporcional à estratificação do universo que era suposto representar-se.

Ainda antes do agravamento do conflito já se manifestavam susceptibilidades, como a do leitor Ricardo Sardo, sobre a manchete de 8 de Abril, relativa às novas normas do concurso para professor titular: “A Fenprof acusava este diploma de ser totalmente inconstitucional. Decisão do TC [Tribunal Constitucional]: com excepção de uma única norma, o diploma (...) está conforme com a Constituição. Primeira página do jornal: ‘Concurso para professor titular com norma inconstitucional’. Diz-nos o Código Deontológico dos Jornalistas Portugueses (...): ‘1. O jornalista deve relatar os factos com rigor e exactidão e interpretá-los com honestidade. (...) A distinção entre notícia e opinião deve ficar bem clara aos olhos do público’. Qualquer pessoa interpreta a decisão do TC como tendo sido favorável ao Ministério da Educação e desfavorável às pretensões da Fenprof. A que deu mais importância o jornalista? Ao único ponto desfavorável ao Ministério”.

Deve esclarecer-se que o TC não actuou com base numa participação da Fenprof contra a totalidade do diploma em questão, mas sim a partir do pedido de verificação de constitucionalidade de três dos seus artigos apresentado por um grupo de deputados. É do ponto de vista noticioso mais relevante que o Governo, ao qual compete respeitar a Constituição, tenha violado a lei fundamental em um terço das normas contestadas do que a tenha cumprido nos outros dois terços. À lupa do provedor, parece assim correcta a opção da manchete.


CAIXA:

Jornalismo e pedagogia

O jornalismo deveria possuir como uma das suas obrigações éticas a pedagogia da língua em que se exprime. Ou seja, no nosso caso, cada órgão de informação tinha o dever de se constituir como reduto de bom português. Coisa que quem lê jornais sabe nem sempre acontecer, até quando a matéria se relaciona com educação. Repare-se nesta passagem do artigo “Estar sempre muito à frente”, sobre um dos docentes que este ano foram distinguidos com o Prémio Nacional de Professores, publicado na pág. 7do P2 de 20 de Dezembro: “Fala sempre na segunda pessoa do plural – o ‘nosso’ trabalho, ‘nós aqui na biblioteca’”. A frase foi retomada ipsis verbis, com o erro que os leitores já terão detectado, para destaque. Os protestos não tardaram. O leitor Armando Mouta Pinto limitou-se a chamar a atenção, já que o destaque chamou a atenção dele. Quanto a Jorge Falé, foi muito mais acerbo: “É lastimável o modo como o jornal trata a língua portuguesa. (...) Sai um texto assinado por quem ignora a diferença entre as várias pessoas do discurso. Não contente com tal disparate, o jornal, revelando uma revisão deficientíssima, dá destaque à brutalidade linguística. (...) Ocorre perguntar: que tipo de provas de selecção prestam estes profissionais? Quem admite o pessoal não se apercebe das incapacidades destas pessoas? A não ser que o objectivo seja afastar os leitores – aí sim, estão de parabéns”. E, em retrospectiva: “A 11 de Dezembro, saiu um texto péssimo, a nível de estudante do primeiro ano de linguística, que falava da história da língua portuguesa [secção Iniciativas, pg. 46]. É tal a pobreza franciscana da redacção, tão rudimentar a sintaxe, que se espera não corresponda ao nível do projecto que pretende divulgar”. Neste caso, o leitor entra na hipérbole, já que uma revisão atenta faria o artigo cumprir a sua função. O que nem sempre se pratica no PÚBLICO, expondo-se assim uma das suas fragilidades.

Publicada em 28 de Dezembro de 2008

domingo, 21 de dezembro de 2008

Gente de lá, problemas de cá

O jornalista do PÚBLICO deve exercer um olhar crítico sempre que se atropelam direitos e regras de cidadania


O leitor queixa-se de se ter omitido que “as eleições foram transparentes” em Angola





Apesar da diferença de continentes, há leitores que reagem de sensibilidade à flor da pele perante as notícias dos acontecimentos mais remotos, como se estivessem no meio deles.

A cobertura jornalística do conflito israelo-árabe, por exemplo, nunca agradará a todos. Haverá sempre quem veja aqui ou ali o parcial favorecimento de uma das partes. Uma vez por outra, o provedor recebe queixas por esse motivo, mas de tal modo imbuídas de fanatismo que nem merecem análise. É o caso do leitor José Leitão, que recentemente lamentou a pequena notícia não assinada “Israel abateu 4 militantes do Hamas”, na pág. 17 da edição de 13 de Novembro, não por causa do seu conteúdo, irrepreensível de equilíbrio, mas do título: “Abateu? Os militantes do Hamas são bandidos (todos?), aviões, árvores? Semântica só utilizada para os ’maus’?” (Esclareça-se que qualquer dicionário português admite o termo “abater” como “matar, assassinar”).

Também Francisco Furtado se queixou da série de reportagens que o enviado do PÚBLICO à Bolívia, Nuno Amaral, redigiu em meados de Setembro acerca do conflito entre as províncias autonomistas que não apoiam as políticas de Evo Morales e as forças favoráveis ao presidente: “Os artigos (...) são mais comunicados de imprensa da oposição autonomista do que exercícios de jornalismo. Essas peças são declarações textuais dos movimentos que tomaram instalações públicas e que assassinaram e espancaram os populares pró-Evo (na legalidade, diga-se de passagem) que ousaram levantar a cabeça nessas áreas. Que isso faça parte da reportagem até percebo, agora que um repórter cubra apenas um lado da história e, pior, que o jornal não procure equilibrar esses artigos com outros já é mais grave”.

Estando o jornalista a escrever de Santa Cruz, o epicentro do movimento rebelde, seria natural que as suas reportagens reflectissem maioritariamente as posições aí dominantes, tanto mais que os apoiantes de Morales receavam manifestar-se. Quanto à necessidade de equilíbrio com o “outro lado da história”, é coisa que deve ser vista a prazo e não numa observação pontual do jornal: no caso, o PÚBLICO, tendo já feito um esforço meritório para colocar um repórter no epicentro no conflito, não teria certamente os meios para, ao mesmo tempo, dispor de outro em território “unionista”.

Reclamação mais substanciada foi enviada por Luís Marvão acerca de uma notícia sobre o recente escrutínio eleitoral em Angola publicada em 9 de Setembro na pág. 13 e elaborada por Ana Dias Cordeiro (A.D.C.) em Lisboa (já que, como é sabido, o PÚBLICO foi um dos órgãos de informação portugueses aos quais as autoridades de Luanda recusaram visto para a cobertura local do acontecimento). Escreveu o leitor: “Habituei-me a vê-lo [ao jornal] como um diário de referência, cuja actividade se rege por critérios de rigor e isenção (...). Lamentavelmente, a cobertura que A.D.C. tem feito das eleições angolanas ameaça constituir-se em excepção à regra. Veja-se, por exemplo, o modo como é noticiada a posição da missão de observadores da União Europeia: a jornalista encima o artigo noticioso com o título ‘Missão de Observação da EU opta por não declarar as legislativas livres e justas’, destacando os não ditos da chefe daquela missão, Luisa Morgantini, e omitindo que esta última considerou que, passo a citar, ‘as eleições foram transparentes’. E que ‘as pessoas puderam votar em total liberdade e não vimos nenhum sinal de violência durante o processo’. Dessa forma, A.D.C. altera deliberadamente o sentido do comunicado dos observadores europeus, que, embora não isento de críticas (mas como poderíamos esperar um imaculado processo eleitoral, num país que só há pouco mais de cinco anos conhece a paz?), faz apreciação positiva das eleições angolanas. A.D.C. empola as críticas ao processo, procurando escamotear ou diluir o que de positivo os observadores disseram. É, em suma, um convite ao logro”.

A pedido do provedor, A.D.C. explicou como elaborou a notícia: “O texto baseou-se essencialmente no relatório preliminar que a missão da UE colocou no seu site, à hora da conferência de imprensa em Luanda para a sua divulgação (...). Também foram ouvidos o nº 2 da missão, José António Gabriel Pérez, e um politólogo angolano, Nelson Pestana, ligado a um partido da oposição. Foi inquirida a possibilidade de Luísa Morgantini conceder uma entrevista telefónica. Mas (...) a chefe da missão não estava disponível. (...) Refere-se a conferência de imprensa na parte em que Morgantini optou por não qualificar as eleições de ‘livres e justas’, por ser uma posição pouco comum e reveladora da própria indefinição espelhada no relatório. No documento, a transparência é assinalada nalguns pontos, mas noutros é posta em causa. Por exemplo: ‘A contagem [dos votos] foi conduzida de forma pacífica e transparente’. Mas também: o facto de as acreditações a observadores terem sido dadas de forma ‘tardia e parcial’ ‘afectou a transparência do processo’. O documento (...) salienta situações ‘contrárias às leis eleitorais angolanas e às normas eleitorais internacionais’. Critica a cobertura jornalística dos media do Estado, ‘tendenciosa’ e favorável ao partido no poder, o ‘uso indevido dos recursos do Estado por parte do MPLA’ e ‘a distribuição de ofertas do Governo’ a líderes tradicionais. Sobre a votação em si e o facto de em algumas assembleias de voto, pela ausência de listas e cadernos eleitorais, não ter sido possível fazer o controlo de quem votou nem que cada eleitor votou apenas uma vez, considera: ‘Este aspecto remove uma das principais garantias contra a fraude previstas na Lei Eleitoral (...)’.”

Remata o leitor: “Sabemos que as autoridades angolanas não tiveram um comportamento decente com o PÚBLICO e outros órgãos informação portugueses, mas isso não isenta os jornalistas destes periódicos do dever de imparcialidade e rigor no tratamento dos factos (...). Ou não há mundo (informativo) para além do jornalismo oficioso ao serviço dos poderes de Luanda e do alinhamento com as forças da oposição? A não ser que o PÚBLICO afirme, no seu estatuto editorial, o ponto de vista da oposição ao regime de Luanda. Seria, ao menos, uma clarificação”.

Isso não consta de facto do estatuto editorial, onde porém se escreve que “o jornalista do PÚBLICO não está obrigado à neutralidade quando estão em causa valores fundamentais da vida em sociedade, designadamente os relativos aos direitos humanos” ou perante “conflitos entre liberdade e escravidão, compaixão e crueldade, tolerância e intolerância, democracia e ditadura, livre informação e censura, paz e guerra”.

O mínimo que se pode dizer do regime angolano é que está muito longe de se constituir como modelo de vida democrática (as anteriores legislativas tinham-se realizado há 16 anos), pelo que, à luz do que preconiza o estatuto editorial, o jornalismo independente praticado no PÚBLICO deve exercer um olhar crítico sobre o que se passa naquele país, questionando em particular os atropelos aos direitos e regras de cidadania.

Aliás, noticiou este diário no passado dia 13 (pág. 20): “As eleições legislativas de Setembro em Angola careceram de ‘transparência’ e foram marcadas por sérias falhas organizacionais, concluíram os observadores da UE no relatório que ontem publicaram”. Fez bem o PÚBLICO em salientar esses aspectos.

CAIXA:

Como ler as audiências de TV

O leitor Pedro Rodrigues mostra-se desiludido com a crónica diária “A minha TV”, de Jorge Mourinha, falando, em extensa carta, de “uma coluna onde tudo transpira superficialidade, sem qualquer tentativa de análise ao fenómeno televisivo (...), escrita ao correr da pena, para encher o espaço, sem a preocupação mínima de uma reflexão prévia”. Ao provedor não compete pronunciar-se sobre esses aspectos, mas já lhe importam, como defensor dos interesses dos leitores, as “dificuldades de convivência com a língua portuguesa, mormente a pontuação e a concordância verbal” ou os “textos cuja ideia nem sequer se percebe” (e o leitor junta vários recortes com exemplos do que diz). Nota-se que Jorge Mourinha escreve despreocupadamente ao ritmo da coloquialidade, e seria de facto aconselhável, pelo menos, uma revisão prévia dos seus textos, para que a pontuação correcta pudesse dar sentido ao pensamento.

Mas outra coisa nesta coluna preocupa o provedor: é que o autor costuma aferir o sucesso público dos programas televisivos, não através da sua “quota de mercado” (ou share, percentagem de telespectadores com a TV ligada que viram o programa), mas sim através da “audiência média” (ou rating, percentagem dos que viram o programa no universo de todos os potenciais telespectadores). É natural que cerca das 21h00-21h30, o período do dia em que mais portugueses, por hábito social, vêem TV, um programa tenha mais rating do que a outra hora, mas isso não significa que o seu sucesso seja maior, sobretudo se o seu share foi menor do que o dos programas de outros canais emitidos ao mesmo tempo.

Assim, não fazem sentido a frase com que Jorge Mourinha abre a sua crónica da passada sexta-feira – “Será que existe uma ‘maldição’ do horário nobre do dia da semana a partir das dez da noite?” – nem os exemplos que apresenta a seguir, baseados na comparação da ratings (se a RTP1 mudou Os Contemporâneos das 22h00 para as 21h00, é natural que o seu rating tenha subido de 5,0 para 9,4, sem que o sucesso seja forçosamente maior, sobretudo quando não nos são fornecidos números de share). A única “maldição” das 22h00 é que a essa hora já grande parte dos portugueses está a desligar o aparelho porque tem de se levantar cedo para trabalhar no dia seguinte. Basta consultar qualquer folha diária de audiências para o perceber – e um crítico de TV competente tem de saber ler folhas de audièncias.

Publicada em 21 de Dezembro de 2008

DOCUMENTAÇÃO SUPLEMENTAR:

Carta do leitor José Leitão

Ultimamente têm aparecido na página internacional algumas pequenas notícias, não assinadas, sobre o conflito israelo-palestiniano, com títulos desajustados(inqualificáveis?) às notícias editadas. Dia 13 de Setembro: "Israel abateu 4 militantes do Hamas". Abateu? Os militantes do Hamas são bandidos(todos?), aviôes, árvores? Semântica só utilizada para os "maus"? Porque é que as fontes citadas são, quase sempre, de Israel. Nâo há outras fontes?

Dia 17 de Setembro: "Olmert ameaça lançar...", é o título. No articulado, a certa altura, o "jornalista" diz que Olmert acusa os dirigentes do Hamas de terem "feito em cacos" a trégua que.... Continua o "jornalista": O Hamas contra-ataca em tom de propaganda... São uns marotos os do Hamas, pois segundo o "jornalista" não respondem, fazem propaganda...

Nem mesmos os jornais israelitas escrevem como tem vindo a escrever o PÚBLICO nestes "inofensivos" artigos não assinados. Acabem com isto, por favor. O PÚBLICO é um jotrnal sério, creio. Por isso é o meu jornal.

José Leitão

Carta do leitor Francisco Furtado

Venho por este meio expressar a minha crítica à cobertura que o vosso jornal tem feito da crise na Bolívia. Os artigos enviados pelo vosso correspondente em Santa Cruz [Nuno Amaral], são mais comunicados de imprensa da oposição autonomista do que exercícios de jornalismo. Essas peças são declarações textuais dos movimentos que tomaram instalações públicas, assassinaram e espancaram os populares pró-Evo (na legalidade, diga-se de passagem) que ousaram levantar a cabeça nessas áreas. Que isso faça parte da reportagem até percebo, agora que um repórter cubra apenas um lado da história e, pior, que o jornal não procure equilibrar esses artigos com outros já é mais grave.

Francisco Furtado

Carta do leitor Luís Marvão

Escrevo-lhe por força do artigo "Eleições em Angola - Contagem entra hoje na recta final" da autoria de Ana Dias Cordeiro, in PÚBLICO - edição impressa, 09/09/08.

Sou leitor do PÚBLICO desde a primeira hora, e habituei-me a vê-lo como um diário de referência, cuja actividade se rege por critérios de rigor e isenção no tratamento dos acontecimentos do país e do mundo. Dito de outro modo, a fidelidade ao relato dos factos, mesmo reconhecendo que estes nem sempre são de leitura fácil, é o que espero encontrar nas páginas do PÚBLICO.

Lamentavelmente, a cobertura que a jornalista Ana Dias Cordeiro tem feito das eleições angolanas ameaça constituir-se em excepção à regra. Veja-se, por exemplo, o modo como é noticiada a posição da missão de observadores da União Europeia: a jornalista encima o artigo noticioso com o título "Missão de Observação da EU opta por não declarar as legislativas 'livres e justas'", destacando os não ditos da chefe daquela missão, Luisa Morgantini, e omitindo que esta última considerou que, passo a citar, "as eleições foram transparentes". E que "as pessoas puderam votar em total liberdade e não vimos nenhum sinal de violência durante o processo". Dessa forma, a jornalista Ana Dias Cordeiro altera deliberadamente o sentido do comunicado dos observadores europeus, que embora não isento de críticas (mas como poderíamos esperar um imaculado processo eleitoral, num país que só há pouco mais de cinco anos conhece a paz?), faz apreciação positiva das eleições angolanas. Ana Dias Cordeiro empola as críticas ao processo, procurando escamotear ou diluir o que de positivo os observadores disseram. É, em suma, um convite ao logro.

Mais à frente, procura ensombrar os resultados com o espectro da abstenção, como se este fenómeno assaz disseminado nas nossas democracias fosse de leitura linear ou unidimensional, algo que qualquer manual de ciência política esclarecerá que não (com efeito, sugerir que os abstencionistas angolanos seriam simpatizantes da oposição é, no mínimo, extrapolação indevida).

Sabemos que as autoridades angolanos não tiveram um comportamento decente com o PÚBLICO e outros órgãos de informação portugueses, mas isso não isenta os jornalistas destes periódicos do devere de imparcialidade e rigor no tratamento dos factos (no caso em apreço, a jornalista Ana Dias Cordeiro). Ou não há mundo (informativo) para além do jornalismo oficioso ao serviço dos poderes de Luanda e do alinhamento com as forças da oposição? A não ser que o PÚBLICO afirme, no seu estatuto editorial, o ponto de vista da oposição ao regime de Luanda. Seria, ao menos, uma clarificação.

Luís Marvão

Explicações da jornalista Ana Dias Cordeiro

O texto baseou-se essencialmente no relatório preliminar que a missão de observadores da União Europeia às eleições em Angola colocou no seu site, à hora da conferência de imprensa em Luanda para a sua divulgação, onde o PÚBLICO não esteve presente. Também foram ouvidos o “número dois” da missão, José António Gabriel Pérez, e um politólogo angolano, Nelson Pestana, ligado a um partido da oposição. Foi inquirida a possibilidade de Luisa Morgantini conceder uma entrevista telefónica. Mas, no momento em que o contacto foi feito, a chefe da missão não estava disponível. Nestas condições, foi uma opção não relatar a conferência de imprensa, a partir das agências, mas sim salientar o que de mais questionável continha o relatório.

Mesmo assim, refere-se a conferência de imprensa, na parte em que Morgantini optou por não qualificar as eleições de “livres e justas”, por ser uma posição pouco comum e reveladora da própria indefinição espelhada no relatório. No documento, a transparência é assinalada nalguns pontos, mas noutros é posta em causa. Por exemplo: “A contagem [dos votos] foi conduzida de forma pacífica e transparente”. Mas também: o facto de as acreditações terem sido dadas de forma “tardia e parcial” a observadores “afectou a transparência do processo”.

O documento elogia alguns aspectos do processo, mas ao mesmo tempo salienta situações “contrárias às leis eleitorais angolanas e às normas eleitorais internacionais”. Critica a cobertura jornalística dos media do Estado “tendenciosa” e favorável ao partido no poder, o "uso indevido dos recursos do Estado por parte do MPLA” e “a distribuição de ofertas do Governo” a líderes tradicionais.

Sobre a votação em si e o facto de em algumas assembleias de voto, pela ausência de listas e cadernos eleitorais, não ter sido possível fazer o controlo de quem votou nem que cada eleitor votou apenas uma vez, o relatório considera: “Este aspecto remove uma das principais garantias contra a fraude previstas na Lei Eleitoral na medida em que não há registo de como muitas pessoas votaram nas assembleias de voto.” (Este ponto é importante, porque com base nele e noutros, como o não acesso de observadores e representantes de partidos políticos à introdução dos resultados no sistema informático nacional, a missão de observadores, no seu relatório final, divulgado este mês, considera que houve “falta de transparência” no apuramento dos resultados das eleições em Angola).

Entre os aspectos positivos, o relatório salienta, por outro lado, o ambiente calmo e sereno em que decorreram as eleições e refere que, na ausência de sondagens, os resultados (ou seja a vitória esmagadora do MPLA) reflectiam aquilo que era a paisagem política em Angola. Além disso, congratula-se pelo claro “compromisso democrático” de todos os intervenientes. Tudo isso foi salientado pelo PÚBLICO, que ainda referiu que a missão da UE não corroborou as denúncias da oposição de estar instalado um “clima de medo” para não se votar no MPLA e num texto à parte deu conta dos elogios ao processo “livre” do presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, do primeiro-ministro, José Sócrates, e do presidente Cavaco Silva.

Sobre a não participação de eleitores em zonas urbanas onde o sentido do voto era de possível protesto contra o Governo, e onde problemas logísticos levaram muitas pessoas a não poder votar, foi citado o politólogo Nelson Pestana. Essa preocupação de pessoas em musseques não terem podido votar já antes tinha sido adiantada por outros observadores e analistas ao longo do processo, e não apenas em entrevistas ao PÚBLICO.

Em vários outros textos, foram citados analistas próximos de Governo e de alguns partidos da oposição, tanto uns como outros atribuindo a pesada derrota da UNITA à fraca campanha e acção do principal partido da oposição, e também ao receio que ainda existiria entre as populações que viveram nas áreas da UNITA durante a guerra.

Ana Dias Cordeiro

domingo, 14 de dezembro de 2008

Quem, como, onde, quando, porquê?


Quem, como, onde, quando e porquê? São estas as cinco regras elementares do jornalismo que vejo sistematicamente negligenciadas em grande entrevistas televisivas (onde apenas uma vez por programa é identificado o nome do especialista convidado a intervir sobre determinado assunto) e reportagens, entrevistas ou perfis de imprensa. Nas págs. 8-9 do suplemento P2 do PÚBLICO de 28 Setembro, no destaque dado por Teresa de Sousa a um senhor de bicicleta, a regra principal (quem era?) foi liminarmente empurrada para segundo plano: embora se tratasse de um perfil sério, não percebíamos nunca quem era o "ciclista" visado. Só ao 11º parágrafo, décimo-primeiro, meus senhores, Teresa de Sousa mencionava alguém chamado "David Cameron", líder do Partido Conservador Britânico. Que por acaso também anda de bicicleta.

Parte da culpa não é de Teresa de Sousa, mas da editoria. Percebe-se que, na opção do título mais sensacionalista ("Ele vai ter de provar que também é líder em termos de crise"), o nome de David Cameron possa ter sido sacrificado. O mesmo terá acontecido no lead de abertura, um súmula de frases constantes no próprio texto. Seja como for, a partir da primeira frase, a responsabilidade é de Teresa de Sousa, que, apesar da sua experiência, caiu na armadilha de pressupor que os seus leitores conheciam bem David Cameron (quem não conhece, bolas?), escrevendo um texto com frases como "o jovem de 39 anos", ou "o Tony Blair do Partido Conservador" sem nunca mencionar o nome do "ciclista" em questão. Note-se que, até ao final do extenso perfil, só quatro vezes é referido o nome de David Cameron. A penúltima frase é elucidativa: "Quem é afinal David Cameron?".

Miguel Somsen

Há almoços gourmet grátis


Venho saudá-lo pelo seu artigo de hoje [14 de Dezembro] sobre a inauguração do supermercado do Corte Inglês. Eu fiquei exactamente com a mesma dúvida (notícia paga), e a sua investigação ajudou-me ao esclarecimento da situação. Assim, reforço que, mesmo sem reclamações de leitores, apresente casos destes, porque há sempre leitores como eu que reparam mas não reclamam e, sem o seu artigo, ficariam com a dúvida.

Miguel Águas

Journalismo gourmet

Com o predomínio de agentes de comunicação e relações públicas, alerta-se para a manutenção dos padrões do bom jornalismo


A notícia da abertura do supermercado é justificada por os clientes terem o perfil do leitor do jornal

O PÚBLICO da passada quarta-feira vinha “embrulhado” numa sobrecapa anunciando, nas suas quatro páginas, a inauguração de um supermercado da rede Supercor (El Corte Inglés) no Parque das Nações, em Lisboa. A página da frente tinha a indicação de “Publicidade” – nada a apontar quanto a isso. Mas na secção “Local” da Edição Lisboa desse dia, na pág. 17, uma notícia a três colunas incidia sobre a mesma ocorrência comercial, com o título “Supercor do Parque das Nações aposta em produtos biológicos e gourmet”. A notícia baseava-se num press-release da empresa e mantinha o mesmo carácter promocional, mencionando a “vasta área de produtos gourmet”, o “especial destaque às zonas de peixaria, charcutaria, talho e vegetais”, a “criação de 107 postos de trabalho”, o “período de formação que teve início há três meses e envolveu uma equipa de 12 formadores e especialistas internos”, os “serviços de envio ao domicílio, pedidos por telefone, encomenda de produtos perecíveis, cozedura de mariscos no momento e atendimento personalizado” e a “zona de pratos já confeccionados, confirmando-se assim a lógica actual de aposta em refeições já preparadas para levar”. O texto, apenas temperado pela referência a um estabelecimento idêntico aberto na estação de Santa Apolónia por uma rede concorrente (Pingo Doce), terminava com uma porta-voz do El Corte Inglés declarando, pelas palavras de quem redigiu a notícia, a “intenção de continuar a investir no formato de proximidade do Supercor”.

O leitor mais cínico seria até levado a pensar que, com tal notícia, o El Corte Inglés poderia ter poupado o dinheiro da publicidade exterior, mas a verdade é que o provedor não recebeu nenhuma reclamação sobre o assunto. Entendeu porém tomar a iniciativa de esclarecer o que se passou, sobretudo por lhe parecer crucial, num jornal com o estatuto editorial do PÚBLICO, que não subsistam suspeitas de uma ligação – proibida – entre matéria editorial e matéria publicitária.

Solicitou assim uma explicação ao director do PÚBLICO, que respondeu: “Não houve qualquer relação causal entre o anúncio (que também saiu noutros jornais) e a notícia. E a razão é simples: só eu e mais duas pessoas da direcção editorial conhecíamos o conteúdo do anúncio, que vem sempre para aprovação e para nos assegurarmos de que a arte final contém a menção ‘publicidade’. Na empresa, o tema só passou pelo director comercial e pelo chefe do departamento de produção, para inserir a menção de publicidade conforme as indicações da direcção editorial. Da mesma forma, ninguém da direcção editorial sabia que aquela notícia ia sair e o editor de fecho, que reviu a página e viu a notícia, não sabia do anúncio. Ou seja, a existência do anúncio não teve qualquer influência na decisão de dar aquela notícia”.

Tranquilizado a este respeito, o provedor ficou porém na dúvida quanto à lógica da notícia. Tanto mais que, segundo o próprio texto, a abertura deste tipo de supermercados pelo grupo em causa não é novidade: trata-se da quarta unidade do género que instala em Portugal (e porventura – mas isso o provedor não confirmou – a primeira a ter honras de tal cobertura jornalística do PÚBLICO).

“Foi essa decisão correcta?”, questionou o próprio José Manuel Fernandes, para responder: “Ela foi tomada pelo editor do ‘Local Lisboa’ após receber um comunicado de imprensa do El Corte Inglés. Pareceu-lhe adequado dar a notícia, já que os supermercados daquele grupo são frequentados por clientes com um perfil social e económico semelhante ao dos leitores-tipo do PÚBLICO, logo era uma notícia que interessava aos nossos leitores. Mais: na mesma peça também se referia a abertura de uma loja do Pingo Doce em Santa Apolónia, pois esta inaugurava um novo conceito da marca. Por outro lado, da mesma forma que o editor não se sentiu condicionado por publicar uma notícia sobre dois supermercados de cadeias concorrentes à que pertence ao accionista do PÚBLICO, se soubesse da existência do anúncio isso devia ser-lhe indiferente no acto de tomar a decisão. Só o valor noticioso do evento (que pode ser discutível, como o de todas as notícias, mas à luz apenas de critérios jornalísticos) devia ter tomado em consideração. Foi isso que aconteceu”.

O provedor não quer (nem deve) interferir na liberdade de escolha dos editores quanto aos objectos de notícia, mas, nesta época em que as agências de comunicação e os departamentos de relações públicas das grandes instituições e sociedades aspiram cada vez mais (e com êxito cada vez maior) a conformar as opções editoriais dos órgãos de informação, não pode deixar de alertar para a necessidade de manter sempre, nas matérias publicadas, a linguagem e o tipo de escrutínio que são apanágio do bom jornalismo.

Luiz Filipe F. R. Thomaz (L.F.T.), director do Instituto de Estudos Orientais (IEO) da Universidade Católica, reclamou ao provedor por no artigo “Mais de uma centena de alunos do superior aprendem Chinês”, assinado por Bárbara Wong (B.W.) e publicado na pág. 9 da edição de 20 de Outubro, “sobre o ensino do chinês e da civilização chinesa no nosso país” e onde se nomeiam “os estabelecimentos que ministram tais disciplinas”, não haver menção ao seu departamento: “Lamentavelmente, da enumeração não consta o nosso Instituto, que, para mais, é, tanto quanto sabemos, o único que ministra esse ensino a nível de mestrado”.

Para o queixoso, a lacuna fará tanto menos sentido quanto a existência do IEO já fora comunicada a B.W.: “Em 2006, passara-se exactamente a mesma coisa, tendo a citada jornalista argumentado que a sua omissão de devera a ignorância e prometido que de futuro levaria em linha de conta as informações que então lhe fornecemos”. Com efeito, na correspondência electrónica trocada entre os responsáveis do IEO e B.W. há cerca de dois anos, de que L.F.T. enviou cópia ao provedor, a jornalista escreveu: “Peço desculpa pela falha. De facto estive na internet à procura de todos os cursos de chinês e fui descobrindo-os e tentando falar com os responsáveis. Desconhecia as vossas iniciativas”.

Mas o reclamante recusa fazer um processo de intenções: “Embora esteja crente de que esta nova omissão de deveu a negligência e não a qualquer intuito discriminatório em relação a este Instituto, há que reconhecer que ela redunda em prejuízo dele, pois vem a equivaler na prática a uma espécie de propaganda negativa que nada fizemos por merecer”.

Solicitada pelo provedor, B.W. justificou: “O texto era sobre licenciaturas em Estudos Orientais; para tal recorri às listagens do Concurso Nacional de Acesso (ao ensino superior), feitas pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Nessas só aparecem os cursos da Universidade do Minho e do Instituto Politécnico de Leiria (...). Do que me lembrava, da troca de e-mails em 2006 com o responsável do IEO, é que as formações que leccionavam eram cursos livres e pós-graduações. Portanto, a sua oferta não se enquadrava no que procurava, que eram as licenciaturas, e, de facto, só existem estas duas, uma vez que o curso do IEO é um mestrado”.

Formalmente, a jornalista tem razão, embora, com tão escassa formação de chinês em Portugal, não fosse despropositado mencionar o IEO, até para corresponder ao título da notícia, que apenas se refere aos alunos do ensino superior em aprendizagem desta matéria.

Aliás, o texto procurava informar ainda da existência de outro tipo de cursos: “Além das licenciaturas, as universidades do Minho, de Lisboa, a Nova de Lisboa, a Técnica de Lisboa, a de Coimbra, a do Porto, e o Instituto de Engenharia de Coimbra oferecem cursos livres”. E pelo menos aqui os cursos livres que também o IEO promove ficaram de fora.

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Atenção às letras

A ortografia ocupa lugar especial nas preocupações dos leitores: “Foi com desagrado que constatei erros de ortografia bastante graves no artigo de 8 de Dezembro [Edição Porto] ‘Último Clubbing do ano ao som dos The Faint e dos portuenses Sizo’”, escreve a leitora Marta Nunes Leão. “Na frase ‘A expontaneidade e entrega em palco também contribuiram para que a inclusão do grupo no programa do Clubbing não destoasse, embora grande parte do entusiasmo se podesse, também, explicar...’, é possível encontrar três erros ortográficos: ‘expontaneidade’ não se escreve com ‘x’ mas com ‘s’; ‘contribuiram’ está sem acento no segundo ‘i’ e ‘pudesse’ não é escrito com ‘o’ mas com ‘u’. Onde está o trabalho de revisão dos artigos deste jornal de referência?!”

José João D. Carvalho foi ainda mais atento: “Tem sido rara a ocasião em que leio um artigo do PÚBLICO sem encontrar uma falha ou erro ortográfico (...). Ontem [10 de Dezembro] fiquei envergonhado quando um colega alemão, que está a aprender português, me pediu que lhe clarificasse duas passagens em artigos vossos [no PUBLICO.PT]. Na notícia ‘Nova manifestação de milhares de pessoas em Atenas’, aparece a seguinte frase: ‘As duas grandes centrais sindicais do país, a Confederação General dos Trabalhadores Gregos...’. Não diríamos Confederação Geral de Trabalhadores? (...) Na notícia ‘Grécia: Adolescente foi morto por ricochete de bala disparada pela polícia’, escreve-se: ‘Fazia aparte de um grupo de cerca de 30 pessoas...’. Perguntava-me o meu colega o que queria dizer a expressão, pois não fazia sentido; ao que tive de responder que era um erro de impressão. Hoje deparo outra vez com uma dúvida, pois não sei se se trata de um erro ou se o entrevistado quereria mesmo dizer ‘enfardar’ em vez de ‘enfadar’: ‘Grilo, novamente: É muito mais fácil, daqui por 20 anos, as pessoas enfardarem-se com o Bergman do que com o Oliveira’ [‘Não existem cinco cineastas que sejam assim tão livres’, 11 de Dezembro, pg. 4]”.

O provedor, que se enfarda de Ingmar Bergman sem se enfadar dele, compreende a perplexidade do leitor, o qual lança ainda um alerta muito pertinente: “Vejo por vezes também uma tentativa de utilização de palavras menos comuns que em nada, em minha opinião, enriquecem o texto das notícias. (...) Por vezes o keep it simple [manter a simplicidade], com uma boa estrutura de texto e linguagem corrente mas apropriada, resulta numa notícia mais elegante e sóbria”.

Publicada em 14 de Dezembro de 2008