domingo, 27 de setembro de 2009

Assuntos internos

Derivações das duas crónicas anteriores, quanto ao e-mail do provedor e à quantidade de fontes jornalísticas



O grande problema foi o facto de o jornal ter ficado refém da fonte de Belém




Na sexta-feira 18 de Setembro, José Manuel Fernandes reenviou ao provedor uma troca de correspondência electrónica interna com a seguinte indicação: “Uma vez que há registo de forwards [reencaminhamentos] de mails com o mesmo título deste mail enviados para ti nos minutos seguintes ao último mail que recebi do Tolentino [da Nóbrega, correspondente do PÚBLICO no Funchal], e nenhum depois da minha resposta, entendi que era melhor tomares conhecimento de tudo”. Por detrás desta abertura, havia a muito desagradável revelação de que se fizera levantamento de comunicações entre um jornalista do PÚBLICO e o provedor. A circunstância levou o provedor, na crónica anterior (“A questão principal”), a considerar “que a sua correspondência electrónica, assim como a de jornalistas deste diário, fora vasculhada sem aviso prévio pelos responsáveis do PÚBLICO”, explicando o que entendia como tal: “Detecção de envios e reenvios de e-mails entre membros da equipa do jornal (e presume-se que também de e para o exterior)”.

José Manuel Fernandes desmentiria o provedor num post scriptum ao editorial da passada terça-feira: “Ao contrário do que afirmou o provedor do leitor, ninguém nesta empresa lhe ‘vasculhou’ a correspondência”. Porém, no dia seguinte, numa reunião do Conselho de Redacção do PÚBLICO, e segundo a respectiva acta, o director, interpelado sobre a questão, explicaria que "se olhou para o registo das entradas e saídas de mails". O provedor não encontrou diferença entre estas palavras e o que afirmou ter acontecido (“detecção de envios e reenvios de e-mails”), pelo que não alcançou então o sentido do desmentido.

A pesquisa, destinada a averiguar se houve fuga interna de informação que permitiu ao Diário de Notícias fazer manchete, naquela mesma sexta-feira, com um e-mail trocado em Maio de 2008 entre dois jornalistas do PÚBLICO, terá incidido no correio electrónico de todos aqueles que, nessa semana, no âmbito de uma discussão a propósito da crónica do provedor publicada há 15 dias (“Subitamente neste Verão”), receberam na redacção o reencaminhamento da mensagem em causa. Foi monitorada a correspondência electrónica dos seis membros da direcção editorial, assim como de dois outros jornalistas envolvidos no caso. José Manuel Fernandes explicou ao Conselho de Redacção, segundo a acta já citada, que “pediu aos informáticos (...) para averiguarem se, entre as oito pessoas incluídas no destinatário da mensagem em causa, alguma tinha feito forward de qualquer mensagem com o mesmo título da primeira mensagem em que surge o mail de Maio de 2008”. Tendo-se apurado que o provedor também recebera uma mensagem contendo presumivelmente o explosivo e-mail, ele passou, da mesma forma, à condição automática de suspeito. Mas, ao Conselho de Redacção, José Manuel Fernandes afirmou não saber se o provedor iria ser ouvido, esclarecendo que a decisão cabia à comissão de inquérito (o provedor está ao dispor).

A administração da empresa proprietária do PÚBLICO defende a legalidade da operação, e o provedor nunca disse o contrário. Mas esse procedimento ignora a especificidade de uma empresa jornalística, onde se trabalha na base do sigilo profissional. Por isso, se não é ilegal, será pelo menos ilegítimo, pois ao verificar-se o registo de entradas e saídas de mails de jornalistas pode-se a violar a confidencialidade de fontes de informação suas.

Entretanto, já ontem, sábado, José Manuel Fernandes garantiu ao provedor que tal pesquisa se limitou a incidir apenas em e-mails com o mesmo título da mensagem inicial. Não sendo perito em informática e não tendo meios para verificar o método seguido, o provedor considera que, se foi esse o caso, terão ficado bastante diminuídos os efeitos negativos que a acção pudesse vir a ter. Reafirma porém ser uma surpresa no mínimo desconfortável perceber de súbito que alguém registou movimentações no seu correio electrónico (mesmo que, ao que lhe foi assegurado, apenas recebimento de mensagens).

Ainda sobre o tema das duas crónicas mencionadas – que analisavam as manchetes de 18 e 19 de Agosto dando conta de que a Presidência da República se considerava espiolhada por outro órgão de soberania –, a jornalista que assinava a primeira notícia, São José Almeida, escreveu ao provedor logo após a publicação da crónica inicial exprimindo “perplexidade” por aí se concluir que existira uma só única fonte para os dois artigos. “Como chega à conclusão de que a notícia que escrevi tem apenas uma fonte de informação?”, inquiriu. “Que dados tem sobre o assunto que eu, autora da notícia, não tenho? Desde quando o facto de apenas ser citada uma fonte oficiosa, identificada através do seu estatuto oficial de membro da Casa Civil do Presidente da República e por isso com todo o peso inerente a essa condição, o leva a concluir que há só uma fonte? Onde foi buscar tal ideia? Como é que consegue saber mais da minha vida do que eu, uma vez que sabe que apenas falei com uma pessoa – o que é mentira?”

Julga o provedor que os acontecimentos subsequentes viriam reforçar a sua conclusão de que só existiu uma fonte. Aliás, o texto invoca apenas um solitário “membro da Casa Civil da Presidência da República”, e a própria São José Almeida, numa das respostas dadas ao provedor, escreveu que "a notícia é feita precisamente com as declarações de um membro da Casa Civil do Presidente da República". Ora, está hoje razoavelmente estabelecido que uma única fonte forneceu ao PÚBLICO a matéria da primeira notícia – e também da segunda (onde não se citam fontes, mas se recorre à ambígua fórmula "ao que o PÚBLICO sabe"). Se o jornal possuía outras fontes, não se percebe por que não as mencionou. E se o PÚBLICO falou, por hipótese, com a empregada da limpeza do Palácio de Belém, só para poder dizer que consultou mais do que uma fonte, o facto não é relevante de acordo com as regras jornalísticas, pois a confirmação de informações por duas ou mais fontes implica que estas sejam independentes entre si.

De resto, nunca pareceu ao provedor que, neste caso, o valor da manchete se reforçasse com o recurso a mais fontes. A notícia deve ser tomada pelo seu valor facial: não revela o que há, mas sim o que alguém diz que há (na circunstância, uma suspeita de Belém quanto a estar sob vigilância). Ora, se esse alguém já declarara tal convicção ao PÚBLICO, com toda a carga política implícita, seriam despiciendas outras fontes da PR, a dizer precisamente o mesmo. Aliás, quem o podia desmentir nunca o fez – pelo contrário, tanto do presidente Cavaco Silva como dos seus homens continuam a ser emitidos sinais de que se mantém essa mesma supeita.

O grande problema, conforme o provedor apontou, foi o facto de o PÚBLICO ter ficado refém dessa fonte (ou fontes, a crer em São José Almeida), tolhido na sua amplitude de movimentos para investigar uma matéria de elevado interesse político e enormes implicações nacionais. O resto é (será) História.

CAIXA:

Uma diferença de milhão

”O artigo ‘Mais de 9,4 milhões de eleitores podem votar este domingo’ [PUBLICO.PT de ontem] debita candidamente, e de forma que só posso imaginar que esteja largamente descontextualizada, números publicados no Diário da República [DR], para informar que haveria cerca de 9,4 milhões de eleitores prontos a votar no dia 27”, constata o leitor Sérgio Carvalho, para depois fazer contas elementares: “Se descontarmos os 72 mil eleitores registados na Europa e os 94 mil registados no resto do mundo, isso dá mais de 9,25 milhões de eleitores dentro das fronteiras nacionais. Por outras palavras, os 10 milhões de habitantes do país contariam com menos de 750 mil jovens (apenas 7,5% da população) abaixo dos 18 anos” (o provedor calcula que essa percentagem actual seja o dobro, ou até um pouco mais). Continua o queixoso: “Bem sei que esta geração tem dificuldade com números, mas, que diabo, não lhe passará pela cabeça a mais pequena dúvida sobre o absurdo destas pseudo-estatísticas? Não lhe ocorreria que deverá haver aqui alguma condição adicional, como por exemplo tratar-se de totais de recenseamento (i.e., incluindo os falecidos) ou algo do género?”

É um facto que a informação consta do DR, tido como fonte indesmentível, mas também o é a incongruência apontada pelo leitor, pelo que o texto careceria de investigação mais apurada. Nem seria preciso ir muito longe: há escassos dias foi divulgado um estudo de dois politólogos, José Bourdain e Luís Humberto Teixeira, que aponta para a existência, nas legislativas que hoje decorrem, de quase um milhão de “eleitores fantasmas” registados nos cadernos eleitorais, devido ao não-abatimento dos mortos e a duplas inscrições.

É apenas mais um caso na difícil relação entre jornalistas e números, já aqui amplamente mencionada. Eis outro, comunicado pelo leitor João Brandão: “Em 27 de Junho, na secção de Economia (e estes deveriam saber um pouco mais) não se fica a saber as cotações das moedas. Na pág. 16, está a tabela ‘Divisas’ e na pág. 17 outra intitulada ‘Mercado Monetário Cambial’: na primeira, Euro/dólar 1.407; na segunda, um euro vale 1,3007 dólares dos EUA; na primeira, Euro/libra 0.8519; na segunda, um euro vale 0,6676 Libras esterlina; na primeira, Euro/iene 133,78; na segunda: um euro vale 158,0600 ienes. Não bate a bota com a perdigota. São números, e quem os publica fica obnubilado e não pensa no que escreve. Simplesmente ignora-os.

E outro ainda, do leitor Rui Farinas: “Na pág. 21 do PÚBLICO de 6 [de Agosto] (edição do Porto, secção Local) pode ler-se um título de notícia dizendo que em determinado local ‘se produzirão X megawatts de energia por dia’. Não haverá ninguém no PÚBLICO que explique que watts (e seus múltiplos) são unidade de potência, e que a unidade de energia é o watt.hora e seus múltiplos? E que no corpo da notícia continuam as asneiras quando se fala em produções de megawatts por hora?”

Publicada em 27 de Setembro de 2009

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR:

Explicações da jornalista São José Almeida sobre as manchetes de 18 e 19 de Agosto

O PÚBLICO confrontou a Presidência da República com as informações que tinha. Tanto que a noticia é feita precisamente com as declarações de um membro da Casa Civil do Presidente da República.

O Livro de Estilo do PÚBLICO permite que, na posse de uma informação relevante, o jornalista a use assumindo o anonimato das fontes. Mas neste caso concreto, havia um membro da Casa Civil que falava nessa condição, embora sem nome, pelo que era uma informação no mínimo oficiosa.

Por sua vez, o Presidente e os serviços da Presidência da República não desmentiram a notícia.

A noticia foi confirmada por outros orgãos de informação, como a SIC, o Diário de Notícias e o i.

O Presidente da República quando falou sobre o assunto, pela primeira vez, na sexta dia 29 de Agosto, não desmentiu a noticia. Antes falou em "matérias com conotações político-partidárias", "factos e acontecimentos".

São José Almeida

Carta de São José Almeida, após a crónica do provedor "Subitamente neste Verão" (13 de Setembro)

Venho manifestar a minha perplexidade com o que li no domingo sobre notícias por mim escrita a 18 e 19 de Agosto e peço-lhe a publicação deste mail na edição em papel do PÚBLICO para defesa do meu bom nome. E se me permitir fazer-lhe algumas perguntas, uma vez que nada do que eu lhe respondi ao pouco que me perguntou permite tirar tais conclusões, nem sequer as respostas que o director lhe deu e que praticamente não usou.

Como chega à conclusão de que a notícia que escrevi tem apenas uma fonte de informação? Que dados tem sobre o assunto que eu, autora da notícia, não tenho? Desde quando o facto de apenas ser citada uma fonte oficiosa, identificada através do seu estatuto oficial de membro da Casa Civil do Presidente da República e por isso com todo o peso inerente a essa condição, o leva a concluir que há só uma fonte? Onde foi buscar tal ideia? Como é que consegue saber mais da minha vida do que eu, uma vez que sabe que apenas falei com uma pessoa – o que é mentira? Foi por acaso o Francisco Louçã que lhe revelou as fontes das notícias do PÚBLICO?

Causam-me alguma perplexidade as conclusões a que o Provedor vai chegando, sobretudo quando sou a pessoa – creio que a única além dos próprios - que melhor sabe exactamente quem são todas as fontes da notícia. É obvio que não as revelarei, por mais que sejam disparadas atoardas sobre a notícia em causa.

Causa-me também perplexidade que perante a gravidade do assunto noticiado – que, repito, não foi desmentido – haja a tendência sistemática para desvalorizar o assunto e crucificar o jornal que o publicou. É extraordinário que tendo sido a notícia confirmada por outros órgãos de informação, sendo este um assunto que, como o director lhe explicou, estava a ser investigado há meses e só foi escrito no momento em que obtive uma confirmação oficial com declarações de um membro da Casa Civil do Presidente da República, não tendo a notícia sido desmentida por ninguém, o senhor escreva o que escreveu e no tom em que o fez.

Reafirmo a veracidade e a gravidade dos factos relatados. Recuso-me, por mais que seja pressionada, a revelar as minhas fontes. Estranho que, perante uma notícia sobre um assunto de gravidade absoluta para a saúde do regime democrático, haja tanta persistência em desvalorizar a notícia e em criticar o jornal.

Peço-lhe que publique este mail na íntegra na edição em papel, pois considero que tenho direito à defesa do meu bom nome. Envio este mail com conhecimento do director do jornal.

São José Almeida

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

O compromisso do provedor

Devido aos desenvolvimentos jornalísticos e políticos decorrentes da investigação que levou às suas duas últimas crónicas, Subitamente neste Verão e A questão principal, o provedor tem sido solicitado por inúmeros órgãos de informação a pronunciar-se sobre o curso dos acontecimentos. Entende, porém, não dever produzir quaisquer comentários sobre os casos relativos ao PÚBLICO fora da sua área de intervenção pública, que é a crónica semanal na edição em papel e este blogue. O compromisso do provedor é para com os leitores do PÚBLICO, e só a eles transmitirá o que tem a dizer acerca do exercício das suas funções.

domingo, 20 de setembro de 2009

Sobre a questão principal

[Actualizado em 22/09/09]

Como leitor assí­duo do jornal, apenas tenho a lamentar o seu [do provedor] comportamento nos últimos tempos.

Dá a ideia de que, querendo fazer o papel de defensor da isenção do jornal, premeia quem claramente tem tido uma política de silenciamento da opinião livre na nossa democracia.

Bem sabemos da polémica dos ultimos dias, e eu sou o primeiro a criticar a ligeireza do director José Manuel Fernandes em incluir o SIS como responsavel do sucedido.

Ainda assim, concordará que não é muito normal a reacção do senhor primeiro-ministro, criticando acintosamente o director do jornal e por via disso o próprio jornal.

E lamento que não tenha referido e criticado esse tom no seu artigo de hoje.

Será que se vai prestar a ser mais uma "voz do dono"?

Não queira... o PÚBLICO não merece.

Só mais uma nota: porquê escandalizar-se com o vasculhar dos seus mails? Tem alguma coisa a esconder? Se não, não se preocupe... Acho que é normal, depois do caso passado, toda a gente ter os mails vasculhados, até para se saber quem foi o "bufo"...

Preocupe-se, isso sim, com o estado da nossa democracia e com o clima de suspeição que se vive neste país e contra o qual o jornal PÚBLICO tem sido, graças a Deus, um resistente.

Jorge Ramos
P.S. Espero que este mail não chegue às mãos do Governo...

Parabéns pela isenção, frontalidade e independência demonstradas ao longo de todo este processo conturbado das escutas da Presidência. Sou leitor do PÚBLICO há alguns anos, mas ultimamente tenho notado alguma inclinação ideológica por parte da linha editorial. Quero agradecer por tentar manter o PÚBLICO um jornal de confiança. Obrigado

Moreira Couto

Sendo leitor do PÚBLICO desde o nº1, apraz-me verificar que nesta fase negra do jornal e da sua linha editorial se mantém activo e publicado um Provedor, a meu ver lúcido e imparcial, defendendo princípios éticos, de verdade e deontológicos. Em suma, defendendo os direitos dos leitores e, como tal, do próprio jornal, que até há pouco era tido como exemplo de credibilidade.

Agradecendo a sua coragem e isenção, espero que a Administração da SONAE tenha a coragem de reconhecer que o tempo de José Manuel Fernandes já se esgotou, sob pena de matar o próprio projecto do jornal.

Da minha parte, terei grande dificuldade em voltar a comprar o "meu" PÚBLICO enquanto se mantiver esta direcção.

M.C.P.

Desejo felicitá-lo pela coragem que mais uma vez demonstrou no tratamento do estranho caso das "escutas" em Belém. Ainda me recordo da sua independência e honestidade intelectual no Expresso, que o levou, inclusivé, a ser "corrido". É isso, meu caro: neste país paga-se caro ter ética e ser vertical.

Sobre o caso das "escutas", e se me permite, gostaria de aqui deixar algumas considerações.

Primeiro (e considerando que tudo o que veio nos jornais intervenientes nesta história é verdade), lamentar profundamente o comportamento do Presidente da República. Desde o contacto do seu assessor com o PÚBLICO, até às suas últimas palavras - "eu também não sou ingénuo" -, transparece uma atitude pouco esperada, e muito censurável, do Presidente.

Esta atitude, ao alimentar uma novela pouco transparente e de objectivos muito duvidosos, é sumamente reprovável no mais alto magistrado da Nação. Com este seu comportamento, Cavaco Silva não presta um bom serviço ao país e vê a sua credebilidade perigosamente posta em causa. Se não existir uma boa explicação da sua parte para este caso, perderei o meu respeito pela sua pessoa.

Em relação ao PÚBLICO, e depois do que escreveu este domingo na sua coluna, pouco mais haverá a dizer. Apenas que, também aqui, é lamentável que um orgão de comunicação respeitável se digne entrar nestes jogos sujos da forma como o jornal o fez. Que crédito lhe daremos daqui para a frente? A atitude do director do jornal para consigo é reveladora dos objectivos que o norteiam (a ele, director) e dos métodos baixos que está disposto a utilizar para os obter. Felizmente, os leitores têm um provedor com a sua integridade.

Em relação ao DN, reprovando, naturalmente e a frio, a sua conduta ao revelar da forma que o fez o conteúdo do e-mail, não deixo de pensar que alguém teria de o fazer para se perceber em toda a sua extensão a cabala que Belém urdiu para "queimar" um governo que não será do seu inteiro agrado e abrir as portas a outro cenário com as próximas eleições. Assim, e perante comportamentos tão anómalos doutros que deviam dar o exemplo de lisura e seriedade, a decisão do DN até será a menos censurável.

E como vai terminar isto, meu caro? José Manuel Fernandes vai pedir a demissão e Cavaco tem a humildade de pedir desculpa aos portugueses? Tudo muito triste, não é verdade?

Obrigado pelo que tem feito pela independência e credibilidade da comunicação social em Portugal.

António Marquês

Quando há muito pouco tempo me referi ao seu trabalho, como Provedor do Público, “como um comentador dos comentadores”, parece que acertei. Ou seja, no momento, como espantosamente no PÚBLICO – que considero o meu jornal diário desde o primeiro dia - “agarrou” um tema um pouco escaldante - escutas PR –, que poderia – como aconteceu – ferir susceptibilidades internas, já foi apelidado de mentiroso e não só pelo Director do PÚBLICO. Penso que algo está a correr menos bem, e, tendo sido JMF um bom director do PÚBLICO, já o PÚBLICO teve mais directores e por certo outros ainda terá...

Augusto Küttner de Magalhãaes

Isto não vale de muito, mas, às vezes, conforta saber-se que o nosso trabalho é apreciado. Gostava então de lhe manifestar um enorme apreço pela sua inteligência, integridade e, nos tempos que vão correndo, coragem! Com os jornais todos em mãos de quem não gosta que se lhes mexa nos interesses, aqui sim se sente uma grande asfixia democrática. Se a J.M.F. lhe sobrasse alguma vergonha, restar-lhe-ia demitir-se.

Pedro Guedes de Oliveira

No seguimento dos seus últimos dois artigos de domingo, venho inquiri-lo sobre o seguinte: para além das regras deontológicas da profissão, não caberá também ao director de um órgão de contra-poder de referência que se pretende isento assumir as suas responsabilidades políticas (já que as tem) e apresentar a sua demissão, tal como qualquer outro detentor de cargo 'Público'? É confrangedor ver como José Manuel Fernandes tem tentado salvar a face e inaceitável a suspeição que lançou sobre as escutas ao seu jornal, arrastando atrás de si a credibilidade do projecto que dirige.

Na qualidade de assinante do jornal, i.e., "de quem lá põe dinheiro", venho pedir a demissão desta direcção. Ao provedor peço-lhe que prossiga com o seu trabalho.

Carlos Almeida

Há alguns anos que não escrevia para o provedor do PÚBLICO. Este acto, assíduo no passado, foi esmorecendo num paralelo a uma diminuição de uma rotina pessoal de dar primazia à compra do PÚBLICO, em detrimento de outros jornais. Quando, por ocasião da última remodelação do PÚBLICO, verifiquei que o seu director permanecia, perdi vontade de continuar a comprar o PÚBLICO. Entendo que as mudanças de líder são fundamentais para transformações. Na ausência de uma mudança de lider, senti que os "belicões" à desejada imparcialidade do "meu" jornal iriam continuar. Com efeito, a fim de evitar irritações (que são mais intensas quando se gosta do objecto), decidi afastar-me do PÚBLICO.

Hoje, em face da crise que o jornal atravessa, vislumbro possibilidades de mudança que me animam. As crises são, a par dos males que provocam, oportunidades. O seu artigo de opinião de hoje (domingo) reconcilia-me com o PÚBLICO. Permite-me acreditar que o PÚBLICO tem condições para ser aquilo que começou por ser, quando nasceu - um jornal que, na sua diversidade interna, rege-se acima de tudo pelos valores da imparcialidade, do bom jornalismo, da ética e deontologia jornalísticas. O Joaquim Vieira, através do seu artigo de hoje, personifica o que é o bom jornalismo e revela coragem. O seu artigo dá-me esperanças de me reconciliar com aquilo que, durante anos, achei que era o meu jornal.

Espero que esta crise abra portas para uma mudança e que se retome traços interessantes que antes existiam no jornal. Um jornal com equilíbrio entre notícias/textos em torno da actualidade nacional e em torno da actualidade internacional (permitindo-nos perceber o que se passa no mundo); um jornal não apenas circunscrito a Lisboa, mas com notícias sobre as várias regiões do país (vejo os Açores muito longe do jornal e mesmo da Madeira, que apesar de ter o Tolentino, não é tão coberta); um jornal que denuncia, mas com base em jornalismo de investigação e não em suspeitas (é muito comum no jornalismo português actual as suspeitas serem a notícia e não o "fio de um novelo" para a investigação). Um jornal abangente que não se resume ao tratamento do "mundo político", mas que abrange outras áreas de interesse para o leitor, desde a saúde à ciência, passando pelo ambiente e por temas de sociedade.

Não me queria prolongar muito e sobretudo perder-me no que me moveu a escrever-lhe: felicitar-lhe pelo profissionalismo, pela coragem e pelo excelente contributo que deu ao jornalismo português e à luta pela preservação do PÚBLICO como o jornal de referência do país.

Delta Sousa e Silva

Agradeço-lhe o texto deste domingo, 2009/09/20. "A questão principal" esclarece o comportamento editorial de José Manuel Fernandes (JMF) nesta questão do PR/PM.

Não quero tirar nenhuma centralidade ao tema político PR/PM: desde a veracidade da existência de escutas, até à existência de "plantação" de uma notícia/acusação pelo presidente.

No entanto, como expôs no seu artigo, a direcção do jornal deu seguimento a tal "notícia" sem bases. Não parece ser apenas mau jornalismo, mas também actuação política premeditada.

Para mais, lê-se no seu texto: "Na sexta-feira, o provedor tomou conhecimento de que a sua correspondência electrónica, assim como a de jornalistas deste diário fora vasculhada sem aviso prévio pelos responsáveis do PÚBLICO".

Faço notar que na página de entrada no site do PÚBLICO vem destacada "A FRASE": “Nunca pensei que um jornal em Portugal publicasse e-mails internos de outro. (...) Estamos perante um comportamento pidesco.” Vicente Jorge Silva, Correio da Manhã, 19-09-2009.

Até que ponto JMF pode ir na hipocrisia de defender valores de "verdade jornalística", ou qualquer outro "valor democrático", depois de vasculhar emails alheios! Creio que mesmo sendo um e-mail de trabalho isto é uma ilegalidade(confirmei com o informático do meu trabalho).

Também me parece que anda um clima pidesco no ar -- todas estas notícias são escritas em torno de possíveis escutas e de correspondência vasculhada.

Isto, por si só, fez-me decidir deixar de comprar de vez o PÚBLICO enquanto JMF for da direcção. Assim agradecia que expressasse o meu pedido para a demissão da actual direcção do PÚBLICO.

Pedro Jorge

Há anos que não se assistia em Portugal a um escândalo político/financeiro/jornalístico desta garvidade e dimensão. Um PR militante de um partido que, sem provas, ataca um Governo do partido rival e sugere a um jornal de referência que publique sobre isso falsidades. O jornal publica, o dono do jornal aplaude e o director do jornal enreda-se numa imensidão de contradições e de falta de ética. Que espera José Manuel Fernandes para abandonar o cargo salvando o que resta da sua dignidade?

J.R.S.

Sou leitor assíduo do PÚBLICO e fiquei indignado com a vossa página no jornal de hoje, domingo 20, não só porque o registo expressivo é pouco claro e elucidativo mas, sobretudo, pelo conteúdo: dá a entender que o PÚBLICO, pelo facto de escrever sobre uma suspeita, como foram as notícia de Agosto, estava a fazer um golpe baixo a Sócrates e a proteger Cavaco. Se o senhor prestasse atenção ao que os socialistas mais chegados a Sócrates afirmaram do chefe de Estado, após a apreciação da inconstitucionalidade do Estatuto dos Açores, o senhor provedor deixaria de ser tão ingénuo e pensaria duas vezes antes de pôr a mão no fogo. Sócrates e os seus sequazes, pela manutenção no poder, são capazes disso e muito mais. O povo está farto de tanta diletância, tanta vaidade, pose e incompetência e de tantos jornalistas/assessores sem coluna vertebral que acreditam na cock and bull story de Sócrates.

Lídia Lispor

É censurável sob todos os pontos de vista o comportamento dessa figura inqualificável que dirige o jornal. Dizer na SIC o que disse, para além de outras declarações a outros orgãos de comunicação, terminando por dizer que o mail, o tal mail, foi reencaminhado no dia em que foi contactado por outros orgãos de comunicação, só pode ser dito daquela maneira por um jornalista na esteira da Manuel Moura Guedes. De facto, se o mail foi reencaminhado, só tem que ser averiguado por quem e por quem dentro do jornal... Talvez os serviços secretos se tenham aí introduzido através da... banda larga! É preciso desfaçatez para que esse jornalista, que não dignificou o cargo que ocupa, colabore em fantochadas destas e que tenha consentido, anuído mesmo, a um mail cujo texto é um hino à estupidez e à intriguice como arma de arremesso político. Depois dizer que a revelação servia os interesses do governo e do primeiro-ministro é confessar que ele estava interessado em esconder para o prejudicar... Pobre criatura essa. Pelo menos, eu como cidadão reformado, não inscrito nem militante de nenhum partido, no limiar dos 65 anos, quero viver num País livre de Manuelas M. Guedes, quer usem saias ou calças!

Parabens pelos seus textos críticos e recomendações num jornal que só leio aos fins-de-semana, mas que, se não arredar caminho, não irá longe. Ainda bem que consta que esse Director vai fazer companhia à sua admiradora e só espero que o jornal seja mesmo isento, democrático, pluralista, fonte de bons jornalistas, mas nunca de sabujices como tudo o que sai retratado no mail!

José Ventura

Não posso deixar de lhe agradecer a sua crónica 'A questão principal', por mostrar que afinal não estamos todos loucos. Confesso que tendo já alguma dificuldade em acompanhar a pouco séria campanha da asfixia democrática (no continente mas não na Madeira!) vejo surgir uma nova campanha, menos fundamentada ainda, mas agora pela mão dum jornal prestigiado, mais precisamente pela mão do seu director (menos prestigiado é certo!), atirando irresponsavelmente e, vá-se lá saber com que intenções, o PR contra o primeiro-ministro. Não pode o PR deixar de, e com urgência, esclarecer publicamente estas notícias e demitir o seu incompetente assessor.

Por outro lado, parece-me que também era oportuno lembrar ao senhor engenheiro Belmiro de Azevedo (são cada vez mais os envolvidos nisto) que se a liberdade de imprensa é um bem inestimável a honestidade e a lisura de procedimento ainda é bem maior.

João Oliveira

Foi com bastante mágoa que tive notícia, através da sua crónica de hoje, do "clima de nervosismo" que se instalou na redacção do PÚBLICO. Estamos tão habituados a ver os políticos amiudadas vezes acusados de se excitarem em tempos de campanha eleitoral, e eis que constatamos que os media podem ser atacados da mesma paranóia viral - e isto para não mencionar outros orgãos de soberania!

Recapitulemos: o insucesso da OPA; a viragem do PÚBLICO; a recente entrevista do Sr. Belmiro de Azevedo. Esta última explicitou, para fraco entendedor, aquilo que qualquer entendedor mediano já tinha intuído: que há, como nunca houve, na ainda curta vida do jornal, uma sintonia total entre a propriedade e a direcção do jornal. É como se o produto tivesse acertado o passo com a estratégia de forma tão feliz que mesmo o bom do Schumpeter já deve estar convencido de que, enfim, há prejuízos que vêm por bem.

Mais espinhosas se afiguram as perspectivas para os leitores e para o Provedor. Os primeiros porque aceitaram o paradigma do jornal de referência, mas já ninguém sabe dizer com rigor (ou sem ele) que espécie de referência é que a actual direcção do jornal ambiciona; o segundo parece tão apegado a valores caducos que ainda agora, neste ano da graça de 2009, se dá ao luxo de exibir citações do Livro de Estilo, o mesmo que a OPA meteu na gaveta!

O PÚBLICO, enquanto produto, tem dois problemas: os leitores e o Provedor. E não se pode exterminá-los?

Vasco Almeida

O Provedor no seu melhor, e a actuar devidamente, sinto-o e felicito-o. E sinto que algo está por esclarecer. Não entendo o qu~e, mas este não está a ser o J.M.F. de há 10 anos, não só por isto, como até pelo conteúdo de alguns editoriais, de há um ano a esta parte – poucos e ainda bem -, e não só. Porquê?

Augusto Küttner de Magalhães

Sou uma cidadã idosa, reformada e pobre, mas atenta à comunicação social. Fui leitora do PÚBLICO, mas o comportamento do Director, do crítico de televisão Cintra e muitos comentadores levou-me a reparar no primeiro-ministro, o que me levou a simpatizar com ele e a admirar a sua persistência e força de vontade, semelhantes às minhas, quando era útil à sociedade, e a que os fracos chamavam arrogância. Não sou do PS nem de qualquer outro partido, a maior parte das vezes sou abstencionista, mas, desta vez, vou votar no Sócrates, e jamais votarei em Cavaco, que acho ser pessoa indigna e vingativa. Desejo para si as maiores felicidades, pois a tarefa que está a desempenhar não é nada fácil, como não é a de Bettencourt Resendes. Depois do desaparecimento de Cáceres Monteiro, restam os dois para exemplo dos mais novos, pois são autênticos "moicanos".

Lídia Sousa

A questão principal

O caso das escutas de Belém suscita a mais preocupante das perguntas: terá este jornal uma agenda política oculta?

Na primeira ocasião (em Que-
rença) Ca-
vaco não foi confrontado com a per-
gunta que devia ser feita, sobre a sua res-
ponsabilida-
de política no caso


Na sequência da última crónica do provedor, instalou-se no PÚBLICO um clima de nervosismo. Na segunda-feira, o director, José Manuel Fernandes, acusou o provedor de mentiroso e disse-lhe que não voltaria a responder a qualquer outra questão sua. No mesmo dia, José Manuel Fernandes admoestou por escrito o jornalista Tolentino de Nóbrega, correspondente do PÚBLICO no Funchal, pela resposta escrita dada ao provedor sobre a matéria da crónica e considerou uma “anormalidade” ter falado com ele ao telefone. Na sexta-feira, o provedor tomou conhecimento de que a sua correspondência electrónica, assim como a de jornalistas deste diário, fora vasculhada sem aviso prévio pelos responsáveis do PÚBLICO (certamente com a ajuda de técnicos informáticos), tendo estes procedido à detecção de envios e reenvios de e-mails entre membros da equipa do jornal (e presume-se que também de e para o exterior). Num momento em que tanto se fala, justa ou injustamente, de asfixia democrática no país, conviria que essa asfixia não se traduzisse numa caça às bruxas no PÚBLICO, que sempre foi conhecido como um espaço de liberdade.

A onda de nervosismo, na verdade, acabou por extravasar para o próprio mundo político, depois de o Diário de Notícias ter publicado anteontem um e-mail de um jornalista do PÚBLICO para outro onde se revelava a identidade da presumível fonte de informação que teria dado origem às manchetes de 18 e 19 de Agosto, objecto de análise do provedor. A fuga de informação envolvia correspondência trocada entre membros da equipa do jornal a propósito da crónica do provedor. O provedor, porém, não denuncia fontes de informação confidenciais dos jornalistas – sendo aliás suposto ignorar quem elas são –, e acha muito estranho, inexplicável mesmo, que outros jornalistas o façam. Mas, como quem subscreve estas linhas não é provedor do DN, sim do PÚBLICO, nada mais se adianta aqui sobre a matéria, retomando-se a análise suspensa há oito dias.

Em causa estavam as notícias dando conta de que a Presidência da República estaria a ser alvo de vigilância e escutas por parte do Governo ou do PS. O único dado minimamente objectivo que a fonte de Belém, que transmitiu a informação ao PÚBLICO, adiantara para substanciar acusação tão grave no plano do funcionamento do nosso sistema democrático fora o comportamento “suspeito” de um adjunto do primeiro-ministro que fizera parte da comitiva oficial da visita de Cavaco Silva à Madeira, há ano e meio. As explicações eram grotescas – o adjunto sentara-se onde não devia e falara com jornalistas –, mas aceites como válidas pelos jornalistas do PÚBLICO, que não citavam qualquer fonte nessa passagem da notícia (embora tivessem usado o condicional).

A investigação do provedor iniciou-se na sequência de uma participação do próprio adjunto de José Sócrates, Rui Paulo Figueiredo, queixando-se de não ter sido ouvido para a elaboração da notícia, apesar de Tolentino de Nóbrega ter recolhido cerca de seis meses antes a sua versão dos factos. O provedor apurou que na realidade Tolentino de Nóbrega, por solicitação de um dos autores da notícia, o editor Luciano Alvarez, já compulsara no Funchal, logo após a visita de Cavaco Silva, e enviara para a redacção informações que convergiriam com aquilo que Rui Paulo Figueiredo lhe viria a afirmar um ano depois (e que o correspondente entendeu não ter necessidade de comunicar a Lisboa, convencido de que o assunto morrera). Esses dados, contudo, não haviam sido utilizados na notícia (foi por tê-lo dito na crónica que o provedor recebeu de José Manuel Fernandes o epíteto de mentiroso, não tendo recebido entretanto as explicações que logo lhe pediu). O provedor inquirira José Manuel Fernandes e Luciano Alvarez sobre as razões dessa omissão mas não obtivera resposta.

Quanto ao facto de não se ter contactado o visado para a produção da notícia, como preconiza o Livro de Estilo do PÚBLICO (“qualquer informação desfavorável a uma pessoa ou entidade obriga a que se oiça sempre ‘o outro lado’ em pé de igualdade e com franqueza e lealdade”), respondeu Luciano Alvarez ao provedor: “Ao fim do dia da elaboração da notícia, eu próprio liguei para Presidência do Conselho de Ministros, para tentar uma reacção de Rui Paulo Figueiredo, mas ninguém atendeu. Cometi um erro, pois deveria ter, de facto, ligado para São Bento, pois sabia bem que era aí que Rui Paulo Figueiredo habitualmente trabalhava, já que uma vez lhe tinha telefonado para São Bento para elaboração de outra notícia”.

Numa matéria desta consequência, em que se tornaria crucial ouvir o principal protagonista, o provedor regista a aparente escassa vontade de encontrar Rui Paulo Figueiredo, telefonando-se ao fim do dia (em que presumivelmente já não estaria a trabalhar) e para o local que o jornalista sabia ser errado. A atitude faz lembrar os métodos seguidos num antigo semanário dirigido por um dos actuais líderes políticos (que por ironia tinha por objectivo destruir politicamente Cavaco Silva, então primeiro-ministro), mas não se coaduna com a seriedade e o rigor de que deve revestir-se uma boa investigação jornalística. Se o jornal já possuía a informação há ano e meio, porquê telefonar à figura central pouco antes do envio da edição para a tipografia? É um facto que Rui Paulo Figueiredo, segundo afirmou ao provedor, estava então de férias, mas isso não desculpa a insignificância do esforço feito para o localizar.

Também José Manuel Fernandes reconheceu ao provedor “o erro de tentar encontrar Rui Paulo Figueiredo na Presidência do Conselho de Ministros e não directamente na residência oficial do primeiro-ministro”, acrescentando porém: “Tudo o mais seguiu todas as regras, e só lamentamos que os recados deixados a Rui Paulo Figueiredo não se tenham traduzido numa resposta aos nossos jornalistas, que teria sido noticiada de imediato, antes no envio de uma queixa ao Provedor – a resposta não impediria que se queixasse na mesma, mas impediu-nos de noticiar a sua posição e de lhe fazer mais perguntas”.

O provedor considera porém que nem “tudo o mais seguiu todas as regras”. As notícias do PÚBLICO abalaram os meios políticos nacionais, e o próprio primeiro-ministro as comentou considerando o seu conteúdo “disparates de Verão”. O assunto era pois suficientemente grave para o PÚBLICO, como o jornal que lançou a história, confrontar a sua fonte em Belém com uma alternativa: ou produzia meios de prova mais concretos acerca da suposta vigilância de que a Presidência da República era vítima (que nunca surgiram) ou teria de se concluir que tudo não passava de um golpe de baixa política destinado a pôr São Bento em xeque. Não tendo havido qualquer remodelação entre os assessores do Presidente da República nem um desmentido de Belém, era aliás legítimo deduzir que o próprio Cavaco Silva dava cobertura ao que um dos seus colaboradores dissera ao PÚBLICO. Mais significativo ainda, o PÚBLICO teria indícios de que essa fonte não actuava por iniciativa própria, mas sim a mando do próprio Presidente – e essa era uma hipótese que, pelo menos jornalisticamente, não poderia ser descartada. Afinal de contas, o jornal até podia ter um Watergate debaixo do nariz, mas não no sentido que os seus responsáveis calculavam.

No prosseguimento da cobertura do caso, o passo seguinte do PÚBLICO deveria, logicamente, consistir em confrontar o próprio Presidente da República com as suas responsabilidades políticas na matéria. Tendo o provedor inquirido das razões dessa inacção, respondeu José Manuel Fernandes: “O PÚBLICO tratou de obter um comentário do próprio Presidente, mas isso só foi possível quando este, no dia 28 [de Agosto], compareceu num evento em Querença previamente agendado, ao qual enviámos o nosso correspondente no Algarve. Refira-se que, quando percebemos que não conseguiríamos falar directamente com o Presidente para a sua residência de férias, verificámos a sua agenda para perceber quando ia aparecer em público, tendo notado que a notícia saíra da Casa Civil exactamente antes de um período relativamente longo em que o Presidente não tinha agenda pública”.

Em Querença, Cacaco Silva limitou-se porém a invocar “os problemas do país” e a apelar para “não tentarem desviar as atenções desses problemas”, tendo faltado a pergunta essencial: como pode o Presidente fazer declarações altruístas sobre a situação nacional e ao mesmo tempo caucionar (se não mesmo instigar) ataques abaixo da cintura lançados de Belém sobre São Bento? E, como qualquer jornalista político sabe, havia muitas maneiras de confrontar a Presidência da República com a questão e comunicar ao público a resposta (ou falta dela), não apenas andando atrás do inquilino de Belém.

Do comportamento do PÚBLICO, o provedor conclui que resultou uma atitude objectiva de protecção da Presidência da República, fonte das notícias, quanto aos efeitos políticos que as manchetes de 18 e 19 de Agosto acabaram por vir a ter. E isto, independentemente da acumulação de graves erros jornalísticos praticados em todo este processo (entre eles, além dos já antes referidos, permitir que o guião da investigação do PÚBLICO fosse ditado pela fonte de Belém), leva à questão mais preocupante, que não pode deixar de se colocar: haverá uma agenda política oculta na actuação deste jornal?

Noutras crónicas, o provedor suscitou já diversas observações sobre procedimentos de que resulta sempre o benefício de determinada área política em detrimento de outra – não importando quais são elas, pois o contrário seria igualmente preocupante. Julga o provedor que não é essa a matriz do PÚBLICO, não corresponde ao seu estatuto editorial e não faz parte do contrato existente com os leitores. É pois sobre isso que a direcção deveria dar sinais claros e inequívocos. Não por palavras (pois a coisa mais fácil é pronunciar eloquentes declarações de isenção), mas sim por actos.

Publicada em 20 de Setembro de 2009

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Não se passa nada

O PÚBLICO é hoje capa no Sol e no Diário de Notícias, mas pelo site do jornal não se passa nada. Para saber o que se passa no jornal que compro desde o primeiro número, tenho que comprar a concorrência!

Carlos Reis

ACTUALIZAÇÂO:

Efectivamente é no minimo estranho que notícias que envolvem o PÚBLICO sejam veiculadas por outros jornais, tais como o Sol e o DN, e não pelo próprio. No caso ainda para mais dois jornais que nem leio. Mas de repente tudo o que seja noticiário aborda estes temas.

Qual o motivo, para não ser o nosso PÚBLICO a referir alguns comentários sobre as hipotéticas escutas efectuadas por alguém do staff do primeiro-ministro ao Presidente da República, o que foi divulgado pelo PÚBLICO em Agosto e que está a ser, e muito bem, motivo de crónicas do Provedor?

Qual o motivo de não ser o PÚBLICO a informar os seus leitores que vai mudar de Director? Ou a desmenti-lo de imediato caso não seja verdade?

O PÚBLICO tem de ocupar o seu lugar de qualidade e referência diariamente, em tudo.

Augusto Küttner de Magalhães

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Sobre a crónica "Notícia e interpretação"

O editor de Desporto deu as suas explicações, que o provedor considera convincentes, mas eu gostaria que ana-
lisasse o seguinte:

Não é natural e óbvio que o clubismo de quem apresenta as suas reclamações seja mais evidente do que os "isentos" jornalistas que trabalham nessa casa? Eles até se assumem, reclamam frontalmente! Quantos jornalistas de desporto assumem frontalmente o seu clubismo? Será que na sua formação recebem uma vacina anti-clubismo, com duração e eficácia ad eternum? Será que Jorge Miguel Matias foi ou é capaz de seleccionar uma equipa de colaboradores 100% isenta, objectiva, que só relata factos? Será que, num estilo yankee, tão querido do director José Manuel Fernandes, forem submetidos ao detector de mentiras a propósito do seu
clubismo, estarão todos virgens ou inocentes? Será que um jornalista adepto ou simpatizante do FC PORTO é capaz de ver, relatar ou opinar de forma isenta sobre um jogo do que é conhecido por "glorioso"? Quantas vezes?

Se Jorge Miguel Matias está tão seguro - até pode dar garantias sobre a isenção dos seus colaboradores -, por que não convida ou faculta a esses seus colaboradores a possibilidade de assinarem todos os artigos e simultaneamente mencionarem as suas posições em relacção ao "maldito" clubismo - ISENTO; ANTI-CLUBISMO; SIMPATIZANTE de ... ; ADEPTO de ...; ADEPTO/ACCIONISTA de ...; ANTI ...?

Com esta iniciativa ficariamos todos melhor: os isentos jornalistas ficariam mais tranquilos na sua consciência porque facultariam factos importantes para percebermos as suas opiniôes/interpretações (gostei muito das suas considerações sobre o Livro de Estilo - mas vá acompanhando a prática ). Os infelizes reclamantes, vitímas dessa doença terrível que é o clubismo, ficariam melhor posicionados para perceberem essas opiniões/interpretações, até porque "não é possível separar a informação sem opinião".

O PÚBLICO, sobre a direcção desse autêntico farol do jornalismo português, teria uma iniciativa inédita, que contribuiria de forma significativa para um jornalismo desportivo mais credível e verdadeiro.

Vamos ser sérios a assumir de uma vez para sempre quem somos e ao que andamos.

O provedor já sabe que eu sou adepto do FC PORTO. Atingido pela grave doença, que só não atinge jornalistas, aos 3 anos, ainda vivo e já lá vão 60. Ao que ando? Neste momento a caminho da reforma, se lá chegar, tento sobreviver e acima de tudo continuar a lutar pelas minhas convicções.

O clubismo que temos é em grande parte construído pelo falso, corrupto e pouco qualificado jornalismo desportivo que se continua a publicar. Associar o clubismo apenas a uma doença que afecta a psique nacional e aos comentadores da TV que perdem as estribeiras não é rigoroso, nem correcto. Basta observar o enorme contributo que, a nível mundial, os clubes desportivos, os seus adeptos/associados pagadores e
consequentemente o clubismo têm facultado à humanidade nos mais diversos domínios (incluindo o jornalismo).

Jorge Moreira

Lá que usou, usou


"Ferreira Leite usou carro oficial apenas em viagens de e para a sede do Governo Regional" - este é o título da notícia a que o PUBLICO.PT deu destaque principal.

O termo "apenas" configura, a meu ver, a emissão de uma opinião/comentário, que não deveria caber no sector supostamente noticioso/informativo do sítio, mas antes no sector de opinião que o mesmo portal contém.

Infelizmente, já não é a primeira vez que detecto tais "falhas" no PÚBLICO, sempre com "tendência" favorável para o mesmo quadrante político.

Em jeito de conclusão, gostaria de realçar que, em minha opinião, os jornais portugueses deveriam assumir, um pouco como noutros países, e principalmente em períodos eleitorais, as suas preferências políticas.

Neste momento temos grupos económicos, com fortes interesses políticos, a dirigir/financiar jornais, e com o assumir dessas inclinações o sector tornar-se-ia muito mais transparente. De outra forma, as pessoas continuarão a assumir como certas as tendências políticas que detectam, de uma forma mais ou menos discreta, nos meios de comunicação social.

Vasco Machado

domingo, 13 de setembro de 2009

Subitamente neste Verão

Apesar de recolhido pelo jornal, faltou o contraditório a uma notícia que agitou o mundo político

Omitiu-se a versão enviada pelo correspon-
dente no Funchal sobre a visita de Cavaco à Madeira


O curso habitual da política nacional foi perturbado no transacto 18 de Agosto com a manchete do PÚBLICO: “Presidência suspeita estar a ser vigiada pelo Governo”. A notícia, assinada por São José Almeida, citava um membro não identificado da Casa Civil do Presidente da República para informar que “o clima psicológico que se vive no Palácio de Belém é de consternação [,] e a dúvida que se instalou foi a de saber se os serviços da Presidência da República estão sob escuta e se os assessores de Cavaco Silva estão a ser vigiados”. Tudo isto para reagir a declarações de dirigentes socialistas criticando a participação de assessores presidenciais na elaboração do programa eleitoral do PSD (participação que aliás a fonte de Belém não desmentia).

No dia seguinte, em nova manchete, o PÚBLICO reincidia, alegando que “a origem das suspeitas [da Presidência da República] remonta a uma viagem [presidencial] à Madeira, há um ano e meio, na qual um adjunto [do primeiro-ministro] teve comportamentos que levaram colaboradores de Cavaco Silva a apertar o circuito da informação para evitar fugas”. Segundo a nova notícia, elaborada por São José Almeida e pelo editor Luciano Alvarez, esse adjunto de José Sócrates, Rui Paulo Figueiredo, teria sido incluído na comitiva presidencial “sem nenhuma explicação natural”, e os autores descreviam o seu comportamento no arquipélago como de um penetra, que abusivamente “ter-se-á sentado, sem ser convidado, na mesa de outros membros da comitiva, violando as regras protocolares”, e até “multiplicado os contactos e as trocas de informação com alguns jornalistas do continente que se deslocaram à Madeira”. Rui Paulo Figueiredo não foi ouvido para a redacção do texto: o PÚBLICO, dizia a notícia, tentara “sem êxito” contactá-lo de véspera na Presidência do Conselho de Ministros.

A segunda manchete motivou o envio ao provedor de uma reclamação de Rui Paulo Figueiredo com os seguintes tópicos (recomenda-se a leitura da documentação integral do caso no blogue do provedor): “Foi com enorme surpresa e consternação que li esta ‘notícia’. (...) Não só pelo seu conteúdo, que reputo de fantasioso e totalmente falso, mas também pelo facto de não ter sido citado o meu desmentido (...), em obediência às mais elementares regras deontológicas de audição e publicação do contraditório. De facto, em tempo, fui abordado pelo jornalista do PÚBLICO Tolentino de Nóbrega [correspondente no Funchal] sobre este tema (...). Tive oportunidade de negar completamente tudo aquilo com que fui confrontado. E de lhe referir que ele, como testemunha de toda a visita (...), poderia comprovar facilmente o que eu lhe estava a afirmar. Esclareci-o que estive oficialmente na visita e que o meu nome constava no livro oficial da visita elaborado pela Presidência da República. E que o motivo da minha presença justificava-se (...) pelo facto de, entre outras funções, acompanhar temas relacionados com as Regiões Autónomas. Aliás, já não era a primeira vez que, nesse âmbito, me deslocava à Região Autónoma da Madeira assessorando membros do Governo da República (...). Estive presente somente nos actos para os quais a minha presença estava prevista no referido programa. (...) Referi-lhe que, ao longo dos seis dias que durou a visita do Presidente da República (...), me desloquei nas viaturas que me foram indicadas, me sentei nas mesas que me foram destinadas e com as companhias, das mais diversificadas, que estavam previstas pela organização de cada evento. (...) Não perceb[o] a que se referem quando invocam contactos com jornalistas do Continente. Tive apenas conversas de circunstância com alguns, do Continente e da ilha, enquanto esperávamos que alguns eventos terminassem. Como aconteceu com o próprio Tolentino de Nóbrega (...). Fiquei igualmente estupefacto com a afirmação de ‘que o PÚBLICO tentou, sem êxito, contacta[r-me] na Presidência do Conselho de Ministros’. Não só porque não tenho indicação nenhuma dessa nova tentativa de contacto como pelo facto de ter sido ignorado o contacto efectuado por Tolentino de Nóbrega. Já não falando no facto de o meu local de trabalho ser S. Bento e não a Presidência do Conselho de Ministros”.

Este caso não só se reveste de enormes implicações, por estar em causa a relação entre dois órgãos de soberania, como suscita diversas questões relacionadas com a prática jornalística, o que levou o provedor a aprofundar a sua investigação muito para lá da queixa do adjunto governamental, abrangendo todo o procedimento do PÚBLICO no processo.

O provedor pôde concluir que o contacto inicial de um membro da Presidência da República com o jornal para se queixar da “espionagem” de S. Bento sobre Belém, e até da possibilidade de escutas telefónicas, se deu há cerca de 17 meses, pouco após a visita de Cavaco Silva à Madeira. Mas ao longo deste quase ano e meio a mesma fonte não apresentou qualquer indício palpável da existência dessas escutas, pelo que a possibilidade de termos aqui um Watergate luso, como chegou a ser aventado entre as inúmeras reacções que a notícia desencadeou, é no mínimo um insulto a Bob Woodward e Carl Bernstein, os jornalistas que denunciaram o caso original.

Salvo melhor prova, tudo não passa de um indício, sim, mas de paranóia, oriunda do Palácio de Belém. Só que tal manifestação é em si já notícia, porque revela a intenção deliberada de alguém próximo do Presidente da República minar a relação institucional (ou a “cooperação estratégica”) com o governo.

O que dá toda a razão de ser à manchete inicial publicada pelo jornal. O provedor apenas estranhou a demora: se o elemento da Casa Civil falou ao PÚBLICO há quase ano e meio, porquê só agora, quando nada mais foi entretanto adiantado? Respondeu o director, José Manuel Fernandes: “Há ano e meio que o PÚBLICO, através de vários jornalistas e de contactos estabelecidos por mim próprio, procurava recolher elementos para sustentar as informações dispersas que chegavam ao jornal relativas à existência de uma tensão entre Belém e São Bento que tinha ultrapassado o patamar da divergência política normal para se situar no da desconfiança sobre os métodos seguidos pelo gabinete do primeiro-ministro. (...) Nunca estivemos em condições de o noticiar, pois consideramos que não devemos utilizar fontes anónimas quando os visados desmentem em on as informações e não possuímos provas materiais. (...) Na véspera da saída da primeira notícia, um membro da Casa Civil do Presidente da República confirmou formalmente ao PÚBLICO uma das várias informações de que há muito tínhamos conhecimento. (...) Como jornalistas a nossa opção só podia ser uma: no dia em que uma fonte autorizada da Casa Civil do Presidente da República assume que no Palácio de Belém se suspeita de que o Governo montou um sistema para vigiar os movimentos do Presidente, essa informação tem uma tal importância e gravidade que só podia ter o destaque que teve. Pessoalmente acompanhei este processo e, como o Livro de Estilo prevê, (...) inteirei-me da fiabilidade das fontes e dei luz verde à publicação da notícia”.

Pelo que o provedor percebeu, só há uma fonte, que é sempre o mesmo colaborador presidencial que tomou a iniciativa de falar ao PÚBLICO em 2008, mas este milagre da multiplicação das fontes é uma velha pecha do jornalismo político português, e não vale a pena perder agora mais tempo com ela. Vale sim a pena dizer que essa fonte falou não só das escutas como da história de adjunto de Sócrates na Madeira, na tentativa de corroborar a tal operação de espionagem.

Claro que uma acusação dessa natureza deveria ser comprovada, e foi o que acertadamente começou por fazer Luciano Alvarez, ao pedir na altura a Tolentino de Nóbrega que confirmasse in loco a atitude do abelhudo Rui Paulo Figueiredo retratado pela fonte da Casa Civil. Interpelado pelo provedor, relatou Tolentino de Nóbrega: “No final de Abril de 2008, alguns dias após a visita do Presidente da República à Madeira (...) fui contactado pelo editor Luciano Alvarez no sentido de apurar localmente dados para confirmar ou desmentir a suspeita de que o Presidente da República teria sido espiado pelo gabinete do primeiro-ministro. O suposto espião seria um adjunto do primeiro-ministro que na visita se teria introduzido indevidamente na comitiva, nomeadamente em actos e em almoços e jantares oficiais, em mesas de assessores de Belém, para as quais não estaria convidado. Após difíceis diligências (...), concluí que: os preparativos da visita, rodeada de exageradas medidas de segurança, foram controladissimos pela Casa Civil da Presidência da República; (...) Rui Paulo Figueiredo integrava a comitiva oficial do Presidente da República, constando o seu nome na lista de convidados para os diferentes actos oficiais e da comitiva restrita presente às audiência do Presidente da República com representantes das associações empresariais locais (...); Rui Paulo Figueiredo integrava igualmente a lista de convidados para os almoços e jantares oficiais, distribuídos pelas mesas sob prévia indicação dos serviços da Presidência da República (...) Destas minhas conclusões dei conhecimento a Luciano Alvarez, que, face aos dados apurados, deixou cair o assunto das suspeitas”.

O contacto que Tolentino de Nóbrega teve com Rui Paulo Figueiredo ocorreu um ano depois: “Dada a sua presença no Funchal quando da visita do primeiro-ministro à Madeira (15 de Maio de 2009), confrontei-o pessoalmente com a situação, na tentativa de validar ou não as informações anteriormente por mim colhidas. As respostas dadas nada acrescentaram ao que eu próprio apurara um ano antes, e de que dera conhecimento a Luciano Alvarez no início de Maio de 2008. Desde então nunca mais abordámos este assunto nos contactos quase diários que mantemos”.

Em conversa telefónica, Tolentino de Nóbrega adiantou ao provedor não ter comunicado à redacção o resultado do seu contacto com Rui Paulo Figueiredo não só por reiterar as informações que já antes enviara mas também por pensar que, ao fim de 12 meses, o tema fora abandonado pelo PÚBLICO.

Solicitados pelo provedor a explicar por que razão os dados recolhidos há ano e meio por Tolentino de Nóbrega, e que de algum modo contrariavam a versão do assessor de Belém, não entraram na notícia sobre o “espião” de S. Bento, nem José Manuel Fernandes nem Luciano Alvarez responderam (São José Almeida disse que a parte sobre Rui Paulo Figueiredo não foi da sua responsabilidade, mas sim de Luciano Alvarez).

Como o leitor já terá intuído chegado a este ponto, estamos perante um caso que se reveste de grande complexidade e gravidade, pelo que ao provedor não é possível esgotar a sua análise numa única crónica. Voltaremos ao assunto no próximo domingo.

Publicada em 13 de Setembro de 2009

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR:

Carta de Rui Paulo Figueiredo, adjunto jurídico do primeiro-ministro

No dia 19.08.2009, o jornal PÚBLICO publicou uma “notícia”, assinada por São José Almeida e Luciano Alvarez, intitulada “Casa Civil da Presidência da República suspeita que está a ser vigiada há ano e meio; Belém preferiu não comentar, Sócrates falou em "disparates", em que sou “visado”.

Notícia que teve ampla repercussão em todos os outros órgãos de comunicação social. Com todas as consequências, que me dispenso de caracterizar, daí inerentes.

Foi com enorme surpresa e consternação que li esta “notícia”. Enquanto “alvo” e também enquanto leitor do PÚBLICO.

Não só pelo seu conteúdo, que reputo de fantasioso e totalmente falso, mas também pelo facto de não ter sido citado o meu desmentido ao conteúdo deste texto, em obediência às mais elementares regras deontológicas de audição e publicação do contraditório.

De facto, em tempo, fui abordado pelo jornalista do PÚBLICO Tolentino de Nóbrega sobre este tema quando me contactou na tentativa de procurar confirmar uma eventual ida do Primeiro Ministro à Região Autónoma da Madeira.

As perguntas que me fez versaram os temas abordados neste texto:

a) “… Gabinete do primeiro-ministro ter incluído na comitiva presidencial um adjunto de José Sócrates, Rui Paulo Figueiredo, sem nenhuma explicação natural.”;

b) Ser “… militante do PS e autor de um livro crítico sobre os anos em que o actual Presidente foi primeiro-ministro - Aníbal Cavaco Silva e o PSD (1985-1995).”;

c) Ter-me “ … sentado, sem ser convidado, na mesa de outros membros da comitiva, violando as regras protocolares.”;

d) Ter “ … multiplicado os contactos e as trocas de informação com alguns jornalistas do continente que se deslocaram à Madeira.”; e,

e) Ter tido “ … presença inesperada nalguns locais …”.

Na conversa, embora breve, que tive com o jornalista Tolentino de Nóbrega tive oportunidade de negar completamente tudo aquilo com que fui confrontado. E de lhe referir que ele, como testemunha de toda a visita, uma vez que a acompanhou em representação do Público, poderia comprovar facilmente o que eu lhe estava a afirmar.
Esclareci-o que estive oficialmente na visita e que o meu nome constava no livro oficial da visita elaborado pela Presidência da República.

E que o motivo da minha presença justificava-se, como o próprio Tolentino de Nóbrega sabia, pelo facto de, entre outras funções, acompanhar temas relacionados com as Regiões Autónomas. Aliás, já não era a primeira vez que, nesse âmbito, me deslocava à Região Autónoma da Madeira assessorando membros do Governo da República, como o Ministro da Presidência e o Secretário de Estado Adjunto do Primeiro Ministro. Como na imprensa da Região foi público e notório.

Do mesmo modo, tive oportunidade de lhe afirmar que, em obediência a esse programa oficial da visita, estive presente somente nos actos para os quais a minha presença estava prevista no referido programa. Como seria facilmente comprovado pela consulta desse programa.

Analogamente, referi-lhe que, ao longo dos seis dias que durou a visita do Presidente da República à Região Autónoma da Madeira, me desloquei nas viaturas que me foram indicadas, me sentei nas mesas que me foram destinadas e com as companhias, das mais diversificadas, que estavam previstas pela organização de cada evento.

Aproveito, por último, para mencionar não perceber a que se referem quando invocam contactos com jornalistas do Continente. Tive apenas conversas de circunstância com alguns, do Continente e da ilha, enquanto esperávamos que alguns eventos terminassem. Como aconteceu com o próprio Tolentino de Nóbrega no Parque Temático da Madeira.

Face ao exposto, não entendo como o meu desmentido e as minhas explicações não foram publicados no dia 19.08.09, tendo em conta o contacto tido com o jornalista Tolentino de Nóbrega – que em tempo me contactou sobre o assunto e que acompanhou toda a visita.

Terá sido para se evitar a publicação das minhas declarações? Não posso crer que seja essa a prática do jornal PÚBLICO.

Apesar de no dia em causa estar de férias, fiquei igualmente estupefacto com a afirmação de ” … que o PÚBLICO tentou, sem êxito, contactar[-me] ontem na Presidência do Conselho de Ministros”. Não só porque não tenho indicação nenhuma dessa nova tentativa de contacto, como pelo facto de ter sido ignorado o contacto efectuado pelo jornalista Tolentino de Nóbrega. Já não falando no facto de o meu local de trabalho ser S. Bento e não a Presidência do Conselho de Ministros.

Assim sendo, gostaria que o Provedor dos Leitores do Público se pudesse pronunciar sobre esta situação, no prazo mais célere possível, face ao enorme impacto da “notícia”, que me parece atentatória dos mais elementares princípios deontológicos que julgo ser seu dever salvaguardar e tendo em conta o próprio estatuto editorial e Livro de Estilo do jornal PÚBLICO.

Não posso deixar de informar que dirigi uma missiva, sobre este tema, ao jornalista Tolentino de Nóbrega e pondero desencadear outro tipo de diligências, face à forma como o meu nome se viu envolvido numa notícia com base em fontes anónimas e pela omissão da minha defesa.

Rui Paulo Figueiredo

Explicações do jornalista Tolentino de Nóbrega

1- No final de Abril de 2008, alguns dias após a visita do Presidente da República à Madeira (entre 14 e 20 desse mês) fui contactado pelo editor Luciano Alvarez no sentido de apurar localmente dados para confirmar ou desmentir a suspeita de que o Presidente da República teria sido espiado pelo gabinete do Primeiro-Ministro. O suposto espião seria um adjunto do Primeiro-Ministro que na visita se teria introduzido indevidamente na comitiva, nomeadamente em actos e em almoços e jantares oficiais, em mesas de assessores de Belém, para as quais não estaria convidado.

2- Após difíceis diligências (dada a natureza da investigação sobre uma tema que exigia a máxima discrição), incluindo contactos com entidades regionais e gabinete do Representante da República na Madeira, responsável pela organização local da visita, concluí que:
2.1. os preparativos da visita, rodeada de exageradas medidas de segurança, foram controladíssimos pela Casa Civil da Presidência da República;
2.2. o referido adjunto jurídico (Rui Paulo Figueiredo) integrava a comitiva oficial do Presidente da República, constando o seu nome na lista de convidados para os diferentes actos oficiais e da comitiva restrita presente às audiência do Presidente da República com representantes das associações empresariais locais, conforme verifiquei pessoalmente em documentos da Assessoria dos Assuntos Políticos da Presidência da República a que tive acesso;
2.3. o adjunto jurídico Rui Paulo Figueiredo integrava igualmente a lista de convidados para os almoços e jantares oficiais, distribuídos pelas mesas sob previa indicação dos serviços da Presidência da República.

3- Nos poucos contactos que tive com Rui Paulo Figueiredo tentei confirmar as informações dadas por um assessor de Belém, segundo o qual com esta visita o Presidente da República pretendia abrir caminho a uma deslocação do Primeiro-Ministro à Madeira, para uma cimeira com o governo regional, assunto sobre a qual fiz notícia (PÚBLICO 17/04/08). Também escrevi uma pequena nota sobre a inclusão de membros do governo da República e de um assessor do Primeiro-Ministro na comitiva presidencial (idem, 18/04/08).

4- Destas minhas conclusões dei conhecimento ao editor Luciano Alvarez, que, face aos dados apurados, deixou cair o assunto das suspeitas.

5- Quanto à carta de Rui Paulo Figueiredo ao Provedor do Leitor, idêntica a uma que me enviou, devo acrescentar que, dada a sua presença no Funchal quando da visita do Primeiro-Ministro à Madeira (15/05/09), confrontei-o pessoalmente com a situação, na tentativa de validar ou não as informações anteriormente por mim colhidas. As respostas dadas nada acrescentaram ao que eu próprio apurara um ano antes e de que dera conhecimento ao editor Luciano Alvarez no início de Maio de 2008. Desde então nunca mais abordámos este assunto nos contactos quase diários que mantemos.

Tolentino de Nóbrega

Explicações da jornalista São José Almeida

O PÚBLICO confrontou a Presidência da República com as informações que tinha. Tanto que a noticia é feita precisamente com as declarações de um membro da Casa Civil do Presidente da República.

O Livro de Estilo do PÚBLICO permite que, na posse de uma informação relevante, o jornalista a use assumindo o anonimato das fontes. Mas, neste caso concreto, havia um membro da Casa Civil que falava nessa condição, embora sem nome, pelo que era uma informação no mínimo oficiosa.

Por sua vez, o Presidente e os serviços da Presidência da República não desmentiram a notícia.

A noticia foi confirmada por outros orgãos de informação, como a SIC, o Diário de Notícias e o i.

O Presidente da República quando falou sobre o assunto, pela primeira vez, na sexta dia 29 de Agosto, não desmentiu a noticia. Antes falou em "matérias com conotações político-partidárias", "factos e acontecimentos".

A noticia inicial, no primeiro dia (18 de Agosto), é de facto minha. No dia 19, trabalhei em conjunto com o Luciano Alvarez. As informações referentes ao autor da carta [Rui Paulo Figueiredo], foram tratadas e escritas pelo Luciano, que é co-autor da noticia comigo. Não detenho assim conhecimento de como se processou o tratamento dessa informação, pelo que não posso responder sobre o assunto.

São José Almeida

Explicações de Luciano Alvarez, editor da secção Portugal do PÚBLICO

Há cerca de ano e meio que o PÚBLICO tem informações de que a presença de Rui Paulo Figueiredo causou desconforto e levantou desconfianças junto de alguns elementos da comitiva do Presidente da República na sua visita à Madeira. O facto de não termos podido, na altura, comprovar essas informações cruzando várias fontes levou-nos a nada publicar. Contudo, nunca abandonámos a investigação sobre esta matéria. Investigação que estava a ser feita por vários jornalistas do PÚBLICO, a maioria em Lisboa, um na Madeira, o nosso correspondente Tolentino de Nóbrega.

Mais tarde, no âmbito da elaboração de outra notícia, o mesmo Tolentino de Nóbrega falou com Rui Paulo Figueiredo e questionou-o sobre a visita à Madeira. Como da conversa não resultaram novos dados que nos permitissem fazer a notícia sobre as referidas desconfianças, Tolentino de Nóbrega não me deu sequer conta da conversa que tinha tido com Rui Paulo Figueiredo.

Contudo, na sequência da notícia do PÚBLICO (18/08/09) em que um membro da Casa Civil da Presidência da República levantava suspeitas de que assessores do Presidente da República estariam a ser vigiados, o PÚBLICO conseguiu por fim fazer o cruzamento de fontes e confirmar a desconfiança que algumas atitudes de Rui Paulo Figueiredo tinham causado a várias pessoas, nomeadamente a membros da Casa Civil do Presidente da República, mas não só, como se comprovou nos dias seguintes.

De facto, no dia seguinte à nossa notícia que referia Rui Paulo Figueiredo, a 20/08/09, as informações que editámos foram confirmadas on, conforme foi noticiado em vários órgãos de comunicação social, por Alberto João Jardim, que disse ter considerado "estranho" o facto de, aquando da visita de uma semana do Presidente da República à Madeira, a comitiva do ministro da Presidência, Pedro Silva Pereira, que acompanhou Cavaco Silva, incluir um adjunto do primeiro-ministro, "uma pessoa que tem um nome que consta das listas da Maçonaria publicadas".

"Nunca desconfiei de nada", disse, adiantando ter considerado "estranho" que o referido adjunto tivesse permanecido na região mesmo quando o ministro da Presidência regressou a Lisboa.

"Ele ficou por aí e foi indo a tudo, não acuso o senhor, embora tenha prática de sociedades ditas secretas, não me passa pela cabeça que andasse a espiar o que eu dizia, porque o que digo é para todos ouvirem, não é segredo", afirmou ainda.

Recordo que a notícia do PÚBLICO referia o desconforto dos assessores do Presidente perante as deambulações de Rui Paulo Figueiredo.

Sobre contactos com Rui Paulo Figueiredo:

Ao fim do dia 18/08/08, dia da elaboração da notícia, eu próprio liguei para Presidência do Conselho de Ministros, na Rua Gomes Teixeira, para tentar uma reacção de Rui Paulo Figueiredo, mas ninguém atendeu. Cometi um erro, pois deveria ter, de facto, ligado para São Bento, pois sabia bem que era aí que Rui Paulo Figueiredo habitualmente trabalhava, já que uma vez lhe tinha telefonado para São Bento para elaboração de outra notícia. Admito esse erro.

Ainda assim, no dia seguinte, durante uma conversa com um assessor do PS, Ricardo Pires, a referida notícia do PÚBLICO veio à conversa e o assessor revelou conhecer bem Rui Paulo Figueiredo. Como continuava a tentar falar com ele, pedi ao referido assessor o favor de entrar em contacto com Rui Paulo Figueiredo para que soubesse que o PÚBLICO queria falar com ele. O referido assessor ficou de o fazer e eu disse-lhe que, devido às horas de fecho do jornal, me informasse entre as 20h30 e as 21h00. Por volta das 20h30, Ricardo Pires informou-me que não o tinha conseguido contactar e não abordámos mais o assunto. Rui Paulo Figueiredo também não tentou contactar-me.

Nos dias seguintes, vários jornais revelaram que também não tinham conseguido entrar em contacto com Rui Paulo Figueiredo.

Luciano Alvarez

Explicações do director do PÚBLICO

De forma o mais sintética possível, sem repetir o que está dito pelos três jornalistas do PÚBLICO que já responderam:

1. Há ano e meio que o PÚBLICO, através de vários jornalistas e de contactos estabelecidos por mim próprio, procurava recolher elementos para sustentar as informações dispersas que chegavam ao jornal relativas à existência de uma tensão entre Belém e São Bento que tinha ultrapassado o patamar da divergência política normal para se situar no da desconfiança sobre os métodos seguidos pelo gabinete do primeiro-ministro.

2. Apesar dos muitos elementos recolhidos pelo PÚBLICO - muito mais do que os noticiados até ao momento -, nunca estivemos em condições de os noticiar, pois consideramos que não devemos utilizar fontes anónimas quando os visados desmentem em on as informações e não possuímos provas materiais. Isso não significa que deixemos de confiar nas nossas fontes, mas que só podemos avançar com as notícias se estas também as assumirem. Mesmo estando convictos da falsidade de alguns "desmentidos".

3. Na véspera da saída da primeira notícia, um membro da Casa Civil do Presidente da República confirmou formalmente ao PÚBLICO uma das várias informações de que há muito tínhamos conhecimento. Pense-se o que se pensar sobre o que levou esse membro da Casa Civil a confirmar essa informação, como jornalistas a nossa opção só podia ser uma: no dia em que uma fonte autorizada da Casa Civil do Presidente da República assume que no Palácio de Belém se suspeita de que o Governo montou um sistema para vigiar os movimentos do Presidente, essa informação tem uma tal importância e gravidade que só podia ter o destaque que teve.

4. Pessoalmente acompanhei este processo e, como o Livro de Estilo prevê, na sequência de práticas introduzidas em jornais como The New York Times e The Washington Post após casos como o de Jason Blair, inteirei-me da fiabilidade das fontes e dei luz verde à publicação da notícia.

5. No dia seguinte outros órgãos de informação confirmaram a notícia do PÚBLICO (SIC, Diário de Notícias e i).

6. Também no dia seguinte o PÚBLICO contactou o gabinete do primeiro-ministro para obter uma reacção, algo que conseguiu quando ficou claro que a nossa notícia não seria desmentida por Belém.

7. O PÚBLICO tratou de obter um comentário do próprio Presidente, mas isso só foi possível quando este, no dia 28, compareceu num evento em Querença previamente agendado ao qual enviámos o nosso correspondente no Algarve. Refira-se que, quando percebemos que não conseguiríamos falar directamente com o Presidente para a sua residência de férias, verificámos a sua agenda para perceber quando ia aparecer em público, tendo notado que a notícia saíra da Casa Civil exactamente antes de um período relativamente longo em que o Presidente não tinha agenda pública. Durante esse intervalo de tempo apareceu, de surpresa, na praia Maria Luísa, aquando do desastre que aí ocorreu, mas antes de o nosso jornalista ter chegado ao local. Nessa altura não encontrei registo de que tivesse feito qualquer declaração pública sobre o caso.

8. No dia seguinte à primeira notícia, o PÚBLICO insistiu junto da Casa Civil para poder noticiar a história relativa a Rui Paulo Figueiredo, uma das várias que conhecíamos e que já nos levara a tentar reconstituí-la nos termos relatados pelo Luciano Alvarez e pelo Tolentino de Nóbrega. No processo foi cometido o erro de tentar encontrar Rui Paulo Figueiredo na Presidência do Conselho de Ministros e não directamente na residência oficial do primeiro-ministro. Tudo o mais seguiu todas as regras, e só lamentamos que os recados deixados a Rui Paulo Figueiredo não se tenham traduzido numa resposta aos nossos jornalistas, que teria sido noticiada de imediato, antes no envio de uma queixa ao Provedor - a resposta não impediria que se queixasse na mesma, mas impediu-nos de noticiar a sua posição e de lhe fazer mais perguntas.

9. No mesmo dia o PÚBLICO voltou a contactar diferentes fontes - as que conseguiu encontrar, pois estávamos a meio de Agosto -, de forma a obter autorização para noticiar outros elementos que considerámos relevantes para enquadrar a génese da desconfiança assumida pela Casa Civil do Presidente da República. Não conseguimos porém ir muito mais longe do que já sabíamos e era insuficiente para, sem que outras fontes assumissem a informação, nós noticiarmos com o grau de confiança e fiabilidade exigível.

10. Para o PÚBLICO este não é um episódio encerrado e muito menos um sillygate, razão pela qual os nossos jornalistas continuam a trabalhar para reunirem a documentação e/ou os testemunhos que nos faltam para sustentar as outras informações que possuímos mas que ainda não estão em condições de serem reveladas pois não passaram por todos os crivos da prova e contra-prova.

José Manuel Fernandes

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Notícia e interpretação

Levantar questões quando os factos o permitem é apanágio de um jornalismo que procura evitar o conformismo e a resignação

É um dado objectivo que o FCP só conseguiu vencer após as duas substitui-
ções no V. Setúbal (Lisandro e Raul Meireles celebram um dos golos)


Os protestos mais arrebatados recebidos pelo provedor costumam incidir na área do desporto. Em regra, os leitores reclamam contra um suposto tratamento desfavorável dos seus clubes como se disso dependesse o futuro da humanidade. O clubismo é uma conhecida doença que afecta a psique nacional, e não raro vemos na TV pessoas sensatas, equilibradas, racionais e bem educadas a perderem as estribeiras para defender as cores da sua equipa, sem hesitarem em recorrer aos argumentos mais destemperados.

O provedor compreeende pois a nota prévia de Jorge Miguel Matias, editor de Desporto deste jornal, à explicação sobre o caso aqui abordado: “Apesar de a maior parte dos comentários acusar os jornalistas da editoria de Desporto do PÚBLICO de clubismo, seja ele de que cor for, garanto que é muito maior o clubismo de quem nos acusa do que daqueles que trabalham nesta casa. Prova disso, aliás, é o facto de suceder, com alguma regularidade, um mesmo texto ser encarado como de um benfiquismo doentio por uns ou de um sportinguismo demente por outros. E sublinho: um mesmo texto”. (O ideal para o provedor seria não haver clubismo da parte de quem no jornal escreve sobre desporto, não que fosse apenas menor do que o dos reclamantes, mas adiante...).

O que não obsta à apreciação das queixas recebidas, como se de quaisquer outras se tratasse. O assunto já tem meses, mas, como já regressaram os jogos semanais da Liga, mantém-se actual. O desafio FC Porto-Vitória de Setúbal do anterior campeonato, disputado em 26 de Abril, foi coberto pelo jornalista Luís Octávio Costa com uma reportagem no PUBLICO.PT e na edição em papel do dia seguinte cujo título era “O estranho caso do minuto 58” e que começava assim: “Minuto 58 do FC Porto-Vitória de Setúbal. De uma assentada, Leandro Lima e Bruno Gama foram substituídos por dois colegas de equipa. Coincidência ou não, Leandro Lima e Bruno Gama, jogadores emprestados pelo FC Porto ao Setúbal, estavam a ser os dois jogadores mais perigosos dos sadinos. Coincidência ou não, o jogo que estava empatado ganhou outra vida quatro minutos depois com o primeiro de dois golos de Lisandro (2-0). O tiro no pé de Carlos Cardoso deu uma segunda vida ao campeão nacional. Alguém quer explicar a substituição? Pontaria de Carlos Cardoso, que na véspera até vaticinara uma ‘gracinha’? Sorte de Jesualdo Ferreira, que via o placard a andar para trás?”

Os protestos não se fizeram esperar. “Objectivamente é uma insinuação torpe, mais um vil envenenamento do futebol e da sociedade portuguesa (que paga a mediocridade e o ‘triunfo’ fácil em que vivemos)”, escreveu o leitor Joaquim Pinto da Silva. “Um jornalista não pode lançar na lama o nome de um treinador (do Vitória) e do seu clube só porque na sua análise considera que os dois jogadores substituídos estavam a ser os melhores (ainda por cima, profissionais do clube adverso) e que isso foi feito para facilitar a vida à equipa vitoriosa. Não há nem verdade nem opinião naquela forma de escrever. Há desonestidade intelectual, maldade, inveja e facciosismo gritantes. Um jornal que queira ser referência não pode ter jornalistas destes”.

“Ao ler o resumo do jogo, em vez de encontrar um relato sobre o acontecido, encontrei uma série de especulações, a começar no titulo e a desenvolver-se no conteúdo”, opinou, por seu turno, Nuno Leal, a partir de Angola. “‘Coincidência ou não’ não é coisa que um jornalista escreva, é coisa para um jornaleiro! Ou o jornalista tem provas e cabe-lhe denunciar, ou não tem e cabe-lhe relatar, pelo menos na minha modesta opinião. E a minha modesta opinião – parcial, eu sei, que sou portuense e portista – é que o treinador tirou esses dois jogadores porque quis defender ainda mais o resultado, sabendo que na última meia-hora o FC Porto iria intensificar o ataque. É uma opção válida. Se tivesse resultado, que escreveria o jornaleiro, perdão, jornalista? (...) Quando quero ler esse tipo de coisas compro o Jogo, a Bola ou o Record. No PÚBLICO habituei-me a ler boas análises aos jogos, coisa que aqui apenas acontece em dois curtos parágrafos”.

João Oliveira disse-se “chocado” com o relato, onde julgou detectar um “teor faccioso”, e um leitor anónimo perguntou: “Luís Octávio Costa escreveu uma notícia ou um artigo de opinião sobre o jogo? Se se trata de notícia, o título e o tendenciosismo do texto seguem os critérios do PÚBLICO no que respeita a isenção e objectividade da informação sobre eventos de qualquer natureza? Esses critérios não se aplicam em notícias de desporto? Por que motivos? Se se trata de artigo de opinião, por que não vem referenciado como tal? E, assim sendo, qual o motivo por que não existe uma notícia sobre o mesmo tema?”

Por último, Albino Costa anunciou até um gesto radical: “Comunico que a partir de hoje contam com pelo menos um leitor/cliente. O artigo publicado sobre o jogo do FCP-Setúbal (...) foi a gota de água num copo já a transbordar. Espero que a minha atitude se multiplique, caso não haja retractação”.

Solicitado pelo provedor, Jorge Miguel Matias respondeu pela matéria publicada: “Discordo da interpretação dada pelos leitores. [Luís Octávio Costa], na crónica, limita-se a constatar factos. O resultado estava 0-0; os dois melhores jogadores do V. Setúbal foram substituídos (o que não deixa de ser estranho, pois não é normal os melhores serem substituídos, mas sim os que estão a ter piores desempenhos) e, de seguida, o FC Porto marcou. Quem faz as interpretações posteriores são os leitores. No texto são relatados os factos.

Os próprios jogadores em causa foram questionados em relação à sua substituição no final da partida por diversos jornalistas e, eles mesmos, confessaram a sua estranheza com o facto, dizendo que não tinham percebido a opção técnica (as declarações foram públicas e transcritas por diversos órgãos de comunicação social)”.

O provedor não acha que Luís Octávio Costa se tenha limitado a relatar factos. Também questiona muito directamente a opção do director do V. Setúbal, mas levantar questões e colocar dúvidas quando os factos o podem permitir é apanágio de um jornalismo que procura evitar o conformismo e a resignação, como corresponde à matriz editorial do PÚBLICO. No caso vertante, é aceitável que o jornalista tenha sublinhado o sucedido no minuto 58, já que é um dado objectivo (não relevando pois do domínio da opinião) que a vitória portista apenas foi conseguida após as duas substituições na equipa adversária. Luís Octávio Costa não emite opinião, mas procura lançar pistas que permitam interpretar o que poderá ter acontecido. Ora, a interpretação, que vai para além do relato seco dos factos, impregnando o jornalismo de maior vivacidade, é admitida e até estimulada pelo Livro de Estilo do PÚBLICO: “A notícia não se reduz, no PÚBLICO, ao [já inexistente] telex de agência (...). A notícia não dispensa o enquadramento básico dos factos no contexto em que eles ocorrem (...). E esse enquadramento pressupõe, naturalmente, a capacidade de interpretar aquilo que é mais relevante e significativo para uma apresentação rigorosa e sugestiva dos factos, [o que] implica um juízo de valor que é da responsabilidade do jornalista e do jornal, devendo ser feito com critérios de imparcialidade e neutralidade. (...) Na reportagem (...) a interpretação dos factos encontra uma expressão mais desenvolvida. (...) Interpretar não é julgar, mas explicar o porquê e o como das situações”.

Em conclusão, Luís Octávio Costa explorou a margem de interpretação que o Livro de Estilo lhe concede. Nas cartas dos leitores, apenas parece pertinente a chamada de atenção, feita por Nuno Leal, para a necessidade de se admitir a hipótese de o treinador do V. Setúbal, com as duas substituições, tentar defender um empate no estádio do FC Porto, táctica que fracassou mas seria compreensível. Mas mesmo isso Luís Octávio Costa, interpelado a esse respeito pelo provedor, diz que fez: “Claro que admito. Por isso, no final do jogo, e apesar da pressão para enviar o texto para a redacção minutos depois, desci à sala de imprensa para ouvir os dois treinadores sobre a substituição dupla. A resposta, que também está no texto, foi a seguinte. ‘Com a saída dos dois jogadores, o FC Porto passou a ter mais espaço e mais linhas’, respondeu Jesualdo’. Já não atacavam com a mesma intensidade, justificou Carlos Cardoso’.

CAIXA:

Discriminação horária

“Queria mostrar o meu desagrado pela maneira como o PÚBLICO trata a conquista do oitavo campeonato consecutivo de hóquei em patins pelo FC do Porto”, escreveu Hélder Alves em 7 de Agosto. “Será assim uma notícia tão menor que mereça ter o destaque medíocre que o jornal lhe dá? (...) Poderia pensar-se que as notícias eram tantas que assim se justificaria o sucedido... Mas além do grande destaque para a vitória do Benfica no basquetebol é dado destaque a notícias como ‘Benfica venceu em Ovar e está a uma vitória do título’, notícia já recessa, ou como ‘Sérgio Ramos renova pelo Benfica’, certamente mais importante que um clube ganhar oito campeonatos consecutivos. (...) Isenção, equidistância e profissionalismo precisam-se!”

Responde Jorge Miguel Matias: “A explicação para, por norma, existirem poucas notícias no jornal sobre o hóquei em patins é simples. Infelizmente, a esmagadora maioria dos jogos são nocturnos e começam muitas vezes para lá das 21h. (...) E como a informação demora a ser disponibilizada seja pela Federação, seja pelos próprios clubes, seja pela Lusa (agência à qual recorremos para conhecer os resultados), na maior parte dos casos só muito tarde (demasiado tarde quando em confronto com a hora de fecho do jornal) é possível saber o desfecho dos jogos. (...) É difícil, se não mesmo impossível, esperar até tão tarde. E basta olhar para os outros jornais deste género para perceber que a informação sobre hóquei em patins é muito rara”.

Publicada em 6 de Setembro 2009

DOCUMENTAÇÂO COMPLEMENTAR:

Cartas de leitores sobre a reportagem de Luís Octávio Costa:

Já algum tempo que o PÚBLICO vem a perder qualidade, optando por um jornalismo que em nada dignifica a imprensa e o país, na minha modesta opinião. Pelo que comunico que a partir de hoje contam com pelo menos um leitor/cliente. O artigo hoje publicado sobre o jogo do FCP-Setúbal, "escrito" pelo sr. Luís Octávio Costa, foi a gota de água num copo já a transbordar. Esperando que a minha atitude se multiplique, caso não haja retractação,

Albino Costa

Solicito a sua intervenção em relação ao artigo de Luís Octávio Costa sobre o jogo Porto-Setúbal). Objectivamente é uma insinuação torpe, mais um vil envenenamento do futebol e da sociedade portuguesas (que paga a mediocridade e o "triunfo" fácil em que vivemos). Um jornalista não pode lançar na lama o nome de um treinador (do Vitória) e do seu clube só porque na sua análise considera que os dois jogadores substituídos estavam a ser os melhores (ainda por cima, profissionais do clube adverso) e que isso foi feito para facilitar a vida à equipa vitoriosa. Nao há nem verdade nem opinião naquela forma de escrever. Há desonestidade intelectual, maldade, inveja e facciosismo gritantes. Um jornal que queira ser referência não pode ter jornalistas destes.

Joaquim Pinto da Silva

Apesar de estar a trabalhar em Angola há mais de dois anos, o PÚBLICO continua a ser a minha leitura de referência e o meu modelo de qualidade para o jornalismo. No entanto, para além de achar que o caso "Fripor" anda muito mal relatado nas primeiras páginas (concordo em absoluto com Pacheco Pereira na sua análise ao "situacionismo" e acho que o PÚBLICO está com "medo"), agora deparo com uma não-noticia. Ao ler o resumo do jogo do FC Porto, em vez de encontrar um relato sobre o acontecido, encontrei uma série de especulações, a começar no titulo, "o estranho caso" e a desenvolver-se no conteúdo. "Coincidência ou não" não é coisa que um jornalista escreva, é coisa para um jornaleiro! Ou o jornalista tem provas e cabe-lhe denunciar, ou não tem e cabe-lhe relatar, pelo menos na minha modesta opinião. E a minha modesta opinião - parcial, eu sei, que sou portuense e portista - é que o treinador tirou esses dois jogadoes porque quis defender ainda mais o resultado, sabendo que na última meia-hora o FC Porto iria intensificar o ataque. É uma opção válida. Se tivesse resultado, que escreveria o jornaleiro, perdão, jornalista? Não estou habituado, leitor que sou desde o nº1 do PÚBLICO, a ver este tipo de jornalismo aqui. Quando quero ler esse tipo de coisas, compro O Jogo, A Bola ou o Record. No PÚBLICO habituei-me a ler boas análises aos jogos, coisa que aqui apenas acontece em dois curtos parágrafos. O resto são histórias de encher a caixa e especulações...

Nuno Leal

Sou um assíduo leitor, na vossa nova secção de desporto, entre outras, das crónicas da Liga Portuguesa de Futebol. Fico chocado com o teor faccioso da vossa ultima cronica da vitória do FC Porto sobre o Vitória de Setúbal. Numa altura em que o País esta como está, e já se duvida de tudo, continuar a tentar retirar credibilidade e seriedade às notícias é terrível. Admiro imenso o vosso jornal pela sua imparcialidade e seriedade, e prezo para que a vossa nova secção de desporto continue nas mesmas linhas o que é a imagem do vosso jornal.

João Oliveira

O "jornalista" Luís Octávio Costa escreveu uma notícia ou um artigo de opinião sobre o jogo FC Porto-Vitória de Setúbal? Se se trata de uma notícia, o título e o tendenciosismo do texto seguem os critérios do PÚBLICO no que respeita a isenção e objectividade da informação sobre eventos de qualquer natureza? Esses critérios não se aplicam em notícias de desporto? Por que motivos?

Se se trata de um artigo de opinião, por que não vem referenciado como tal? E, assim sendo, qual o motivo por que não existe uma notícia sobre o mesmo tema e apenas é publicado um artigo de opinião?

Leitor anónimo

Carta do leitor Hélder Alves

Queria mostrar o meu desagrado pela maneira como o PÚBLICO trata a conquista do oitavo campeonato consecutivo de hóquei em patins pelo FC Porto... Será assim uma notícia tão menor que mereça ter o destaque medíocre que o jornal lhe dá? Na página principal do Desporto, aparece nas "Outras Notícias", e quando se abre o separador das "Modalidades", onde o destaque poderia ser feito com outra amplitude, pasme-se, a notícia aparece novamente em "Outras Notícias"!

Poderia pensar-se que as notícias eram tantas que assim se justificaria o sucedido... Mas além do grande destaque para a vitória do Benfica no basquetebol é dado destaque a notícias como "Benfica venceu em Ovar e está a uma vitória do título", notícia já recessa, ou como "Sérgio Ramos renova pelo Benfica", certamente mais importante que um clube ganhar oito campeonatos consecutivos...

Fico na dúvida se estou a ler o PÚBLICO ou o Record!

Isenção, equidistância e profissionalismo precisam-se!

Hélder Alves