Projecções eleitorais e artigos de análise política fazem parte do trabalho especulativo a que os jornalistas recorrem com legitimidade
Ao discursar sobre ética política, Je-
rónimo re-
feria-se ou não ao en-
contro entre Carvalho da Silva e Costa ocorrido horas antes?
Qualquer período eleitoral, acirrando a disputa política, coloca os nervos à flor da pele, e os media são então alvo de todas atenções, escrutinando-se desvios editoriais, apoios encapotados, campanhas subliminares ou simples erros jornalísticos.
O leitor John Pallister escreveu ao provedor queixando-se do título que o PUBLICO.PT colocou online às 20h00 de 27 de Setembro, dia das legislativas: “Incomoda-me que uma notícia sobre projecções dos resultados das eleições tenha um título que não só não inclui a palavra ‘projecções’ como sugere que está a relatar um facto: ‘PS vence sem maioria absoluta’. É apenas uma questão de honestidade intelectual os factos serem apresentados como factos e o resto como não factos”.
Note-se que o parágrafo inicial da notícia em causa dizia o seguinte: “O Partido Socialista venceu as eleições legislativas, embora sem conseguir a maioria absoluta, revelam as projecções apresentadas pelos vários canais de televisão”.
O provedor já em tempos analisou nesta coluna o problema das projecções eleitorais transformadas pelos jornalistas em matéria de facto, afirmando que os órgãos de informação deviam ter a consciência do risco que assumem e da probabilidade de falhanço em que incorrem (como provam clamorosamente alguns episódios históricos, nem todos antigos). Quando as previsões acertam, todos são felizes, mas quando erram é uma tragédia grega.
No caso em apreço, contudo, o provedor entende que as projecções àquela hora difundidas por três diferentes estações de TV com base em estudos de três diferentes institutos de sondagens, convergindo todas no mesmo sentido quando à questão essencial, não deixavam margem para dúvidas não só acerca do partido vencedor do escrutínio, tal a distância que o separava do segundo mais votado, mas também sobre a sua perda da maioria absoluta. Aliás, o texto começava logo por esclarecer que se falava com base nas projecções acabadas de divulgar, citando a fonte da notícia e salvaguardando qualquer remoto imprevisto. No caso, portanto, o risco estava devidamente ponderado e valia a pena corrê-lo.
No dia 27, as únicas dúvidas que as projecções suscitavam diziam respeito aos partidos que ficariam classificados nos três lugares abaixo, mas sobre isso o PUBLICO.PT limitou-se, avisadamente, a reproduzir os diversos números anunciados nas televisões (que aliás não eram unânimes na ordenação das forças políticas). Nada a objectar, por conseguinte.
Saltando para as autárquicas, um dos seus episódios mais bizarros foi o apoio desapoiado (ou vice-versa) do comunista Carvalho da Silva, secretário-geral da CGTP, à candidatura do socialista António Costa à presidência do município lisboeta, através de um intencional encontro ocasional (ou vice-versa) ocorrido no Chiado. Pelas implicações que a saudação teve nas hostes à esquerda, o PÚBLICO dedicou-lhe na edição de 9 de Outubro (pág. 10) um texto assinado pelas jornalistas Leonete Botelho e Maria Lopes sob o título “Carvalho da Silva dá passo de afastamento do PCP”, o que motivou de António Rodrigues, responsável do Gabinete de Imprensa dos comunistas, uma carta de “protesto e (...) indignação face a esta grosseira e descarada manipulação até porque se trata também de um atropelo ao chamado Livro de Estilo do PÚBLICO”.
E qual seria a gravidade do caso? Explica António Rodrigues: “Não querendo abordar outros aspectos de uma peça especulativa com contornos e objectivos definidos, não podemos deixar passar em claro a manipulação que é feita da intervenção do secretário-geral do PCP num almoço-convívio da CDU realizado em Benavente. Afirma-se na peça que, ‘coincidência ou não, Jerónimo de Sousa escolheu a ética na política para tema do seu discurso à hora do almoço, pouco depois de se saber do encontro Carvalho/Costa’. Ora acontece que a ética política não foi o tema central da intervenção de Jerónimo de Sousa, coisa que nenhum jornalista do PÚBLICO teve a possibilidade de registar pois não estiveram presentes na referida iniciativa, bem como não há nenhum texto ou peça elaborada pelos diversos jornalistas presentes que faça ou induza a tal leitura. Face à presença no almoço de uma delegação de militantes e activistas do PCP e da CDU de Salvaterra de Magos, o secretário-geral do PCP fez referência às questões da ética na política mas a propósito de factos passados e conhecidos no relacionamento entre a CDU e a presidente da Câmara de Salvaterra. Aliás, a referida alusão foi de tal modo clara e inequívoca que, no final da iniciativa, os jornalistas presentes (...) questionaram Jerónimo de Sousa exactamente nesse sentido. É no mínimo surpreendente que, não tendo estado presente na referida iniciativa, qualquer jornalista se permita analisar e comentar uma intervenção que não ouviu, deturpando o seu conteúdo e o contexto em que foi feita”.
O provedor solicitou uma reacção a Leonete Botelho e Maria Lopes, que replicaram:
“A peça (...) refere-se a uma análise, tal como está identificada no topo da página (...) e no âmbito do que está descrito no Livro de Estilo: um género jornalístico diferente da notícia, em que a ênfase é colocada na interpretação dos factos (...). O objectivo da análise jornalística é procurar explicar o significado de factos noticiados, fornecendo aos leitores elementos de background e opiniões de fontes que ajudem a compreender o contexto dos acontecimentos.
(...) Os factos ocorrem em plena campanha eleitoral para as autárquicas, a meio da manhã, e nesse mesmo dia o secretário-geral do PCP participou num almoço em Benavente onde discorreu sobre a ética na política, referindo-se especificamente ao caso da Câmara de Salvaterra de Magos, que já nas anteriores autárquicas tinha sido conquistada pelo Bloco de Esquerda com uma candidata que já fora presidente da mesma autarquia pelo PCP. Acontece que estes factos ocorrem em Benavente, e não em Salvaterra de Magos. Acresce que, logo nesse dia, ao contrário do que fazia nos outros dias da campanha para as autárquicas, Jerónimo de Sousa recusou-se a fazer comentários aos jornalistas ao final da manhã (...). A sua primeira intervenção política após ter conhecimento do encontro Carcalho da Silva/António Costa é esse discurso. Durante as campanhas eleitorais, a regra do discurso dos protagonistas políticos é haver uma estrutura-tipo que vão repetindo em todos os comícios e intervenções, na qual introduzem temas de actualidade ou adaptações consoante o local onde se encontram. Jerónimo de Sousa não é excepção. (...) O facto de abordar uma questão diferente permite dizer que a ética na política foi o tema novo do seu discurso nesse dia. E, não se encontrando em Salvaterra de Magos, é perfeitamente legítimo pensar que não terá sido coincidência fazê-lo num dia como aquele.
Não se compreende a questão da ausência de jornalistas do PÚBLICO nesse almoço, levantada pelo PCP como impeditiva de se escrever sobre ele. Seria uma grave limitação à liberdade de imprensa e uma entorse a todo o sistema de comunicação a nível mundial impedir um órgão de comunicação de noticiar factos a que não assistiu. Não haveria aldeia global se assim fosse. Além disso, o PÚBLICO ouviu três pessoas – entre jornalistas e assistência – que transmitiram a imagem de que a equipa dirigente do PCP sentia grande desconforto com o episódio da manhã (...).
Considerando insultuosas várias passagens da carta de António Rodrigues, seria importante que o queixoso não deixasse acusações no ar e especificasse o significado da afirmação de que [o artigo] se trata de ‘uma peça especulativa com contornos e objectivos definidos’.”
Salientando que o texto em questão, como de resto António Rodrigues reconheceu, é anunciado como “análise”, o provedor considera correcta a interpretação que as duas jornalistas fazem do Livro de Estilo do PÚBLICO e legítima a especulação que desenvolvem no seu trabalho, de acordo aliás com a argumentação que agora apresentam.
CAIXA:
Rigor científico
Critica Manuel Magalhães Sant'Ana, investigador do Instituto de Biologia Molecular e Celular, do Porto, acerca do artigo “Carne sem dor existencial”, de Ana Gerschenfeld, publicado na coluna “No futuro” do P2 de 4 de Setembro: “A jornalista incorre num erro que considero grave ao afirmar que o filósofo Adam Shriver escreveu na revista New Scientist, o que é falso. O referido filósofo escreveu na revista Neuroethics um artigo intitulado ‘Knocking Out Pain in Livestock: Can Technology Succeed Where Morality has Stalled?’, e é o jornalista de ciência Ewen Callaway quem, na New Scientist, se refere ao texto anterior. Este erro pode revelar duas coisas, qual delas a mais condenável: (1) ou a jornalista leu o artigo da New Scientist na diagonal – o suficiente para fazer um texto (...) que não passa de tradução ao estilo copy/paste – e não percebeu que estava a ler uma cópia e não o original ou (2) a jornalista considera que ler uma crítica a um artigo científico equivale a ler o artigo científico, já que (...) interrogo-me se de facto consultou o artigo original”.
Esclarece Ana Gerschenfeld: “De facto, a New Scientist faz uma citação de Adam Shriver e não do artigo da Neuroethics (...). Não sei qual o contexto da afirmação de Adam Shriver reproduzida pela New Scientist: pode ter sido uma conversa de um jornalista com o filósofo ou uma conferência de imprensa, por exemplo (...). Embora a New Scientist não seja uma revista científica de primeira publicação, é absolutamente lícito citá-la neste contexto, pois trata-se de uma revista de grande qualidade e rigor reconhecido. Mas existe de facto uma falha no meu texto: ao escrever ‘afirma na New Scientist’ dei a impressão de que Adam Shriver tinha publicado o seu artigo nessa revista. Fi-lo para não escrever o habitual ‘disse à New Scientist’, pois, como disse, não conhecia o contexto dessa declaração e não estava certa de que tivesse sido feita à New Scientist. Deveria ter utilizado a expressão ‘citado pela New Scientist’ e identificado a publicação original – como aliás costumo fazer noutros textos semelhantes”.
Publicada em 25 de Outubro de 2009
DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR:
Reclamação de António Rodrigues, da Gabinete de Imprensa do PCP
O jornal PÚBLICO publicou no dia 9 aquilo que designa por "análise radiografada do 'encontro casual' do Chiado» entre Carvalho da Silva e António Costa.
Não querendo abordar outros aspectos de uma peça especulativa com contornos e objectivos definidos, não podemos deixar passar em claro a manipulação que é feita da intervenção do secretário-geral do PCP num almoço-convívio da CDU realizado em Benavente.
Afirma-se na referida peça que, "coincidência ou não, Jerónimo de Sousa escolheu a ética na política para tema do seu discurso à hora do almoço, pouco depois de se saber do encontro Carvalho/Costa". Ora acontece que a ética política não foi o tema central da intervenção de Jerónimo de Sousa, coisa que nenhum jornalista do PÚBLICO teve a possibilidade de registar, pois não estiveram presentes na referida iniciativa, bem como não há nenhum texto ou peça elaborada pelos diversos jornalistas presentes que faça ou induza a tal leitura.
De facto, face à presença no almoço de uma delegação de militantes e activistas do PCP e da CDU de Salvaterra de Magos, o secretário-geral do PCP fez referência às questões da ética na política mas a propósito de factos passados e conhecidos no relacionamento entre a CDU e a presidente da Câmara de Salvaterra. Aliás, a referida alusão foi de tal modo clara e inequívoca que, no final da iniciativa, os jornalistas presentes (RTP, SIC, TVI, RDP e LUSA, entre outros) questionaram Jerónimo de Sousa exactamente nesse sentido.
Assim, é no mínimo surpreendente que, não tendo estado presente na referida iniciativa, qualquer jornalista se permita analisar e comentar uma intervenção que não ouviu, deturpando o seu conteúdo e o contexto em que foi feita.
Dirigimo-nos, por isso, ao Provedor do Leitor para lhe fazer sentir o nosso protesto e a nossa indignação face a esta grosseira e descarada manipulação até porque se trata também de um atropelo ao chamado Livro de Estilo do PÚBLICO.
António Rodrigues
Gabinete de Imprensa do PCP
Explicações das jornalistas Leonete Botelho e Maria Lopes
Surpreende-nos a carta enviada pelo Gabinete de Imprensa do PCP por inúmeras razões:
1. A peça jornalística em causa refere-se a uma análise, tal como está identificada no topo da página em que foi publicada e no âmbito do que está descrito no Livro de Estilo do PÚBLICO: um género jornalístico diferente da notícia, em que a ênfase é colocada na interpretação dos factos – o encontro de Carvalho da Silva com António Costa em que o dirigente da CGTP e militante comunista declarou publicamente o seu apoio ao candidato à Câmara Municipal de Lisboa, quando o PCP tinha o seu próprio candidato à autarquia.
O objectivo da análise jornalística é procurar explicar o significado de factos noticiados, fornecendo aos leitores elementos de background e opiniões de fontes que ajudem a compreender o contexto dos acontecimentos. Neste caso, foram feitas citações do próprio Carvalho da Silva sobre o assunto e outras anteriores, feitas num momento em que o sindicalista divergiu, na acção, do partido do qual é militante.
Foram ainda ouvidas pessoas que conhecem por dentro o pensamento e acção do PCP, antigos militantes e antigos sindicalistas que pediram para não serem identificados, assim como foram citados os estatutos do PCP na parte que se refere aos deveres dos militantes, que se referem à ética exigida pelo partido aos seus membros.
2. Os factos ocorrem em plena campanha eleitoral para as autárquicas, a meio da manhã, e nesse mesmo dia à hora do almoço o secretário-geral do PCP participou num almoço em Benavente onde discorreu sobre a ética na política, referindo-se especificamente ao caso da Câmara de Salvaterra de Magos, que já nas anteriores autárquicas tinha sido conquistada pelo Bloco de Esquerda com uma candidata que já fora presidente da mesma autarquia pelo PCP.
Acontece que estes factos ocorrem em Benavente, e não em Salvaterra de Magos. Acresce que, logo nesse dia, ao contrário do que fazia nos outros dias da campanha para as autárquicas, Jerónimo de Sousa recusou-se a fazer comentários aos jornalistas ao final da manhã, antes de entrar para o referido almoço. A sua primeira intervenção política após ter conhecimento do encontro Carvalho da Silva e António Costa é esse discurso.
Durante as campanhas eleitorais, a regra do discurso dos protagonistas políticos é haver uma estrutura-tipo que estes vão repetindo em todos os comícios e intervenções, na qual introduzem temas de actualidade ou adaptações consoante o local onde se encontram. Jerónimo de Sousa não é excepção. Os seus discursos nas duas campanhas eleitorais tiveram todos como base idêntica os problemas do mundo laboral e a crítica às políticas "de direita" levadas a cabo pelo PS. O facto de abordar uma questão diferente permite dizer que a ética na política foi o tema novo do seu discurso nesse dia. E, não se encontrando em Salvaterra de Magos, é perfeitamente legítimo pensar que não terá sido coincidência fazê-lo num dia como aquele.
3. Não se compreende a questão da ausência de jornalistas do PÚBLICO nesse almoço, levantada pelo PCP como impeditiva de se escrever sobre ele. Seria uma grave limitação à liberdade de imprensa e uma entorse a todo o sistema de comunicação a nível mundial impedir um órgão de comunicação de noticiar factos a que não assistiu. Não haveria aldeia global se assim fosse. Além disso, o PÚBLICO ouviu três pessoas – entre jornalistas e assistência – que transmitiram a imagem de que a equipa dirigente do PCP sentia um grande desconforto com o episódio da manhã - o “encontro casual” em que Carvalho da Silva manifestara a António Costa o seu apoio eleitoral.
4. Acresce que o subscritor da carta já falara com a jornalista Maria Lopes sobre o assunto precisamente nos mesmos moldes em que agora descreve o caso na missiva. O assessor de imprensa do PCP contou mesmo que já “questionara os outros jornalistas sobre o assunto e nenhum fez a interpretação” que Maria Lopes tinha feito. Maria Lopes respondeu-lhe que falara com três pessoas que tinham estado em Benavente, incluindo dois jornalistas – que obviamente não identificou -, e que ouvira peças de rádio sobre o assunto.
5. Considerando insultuosas várias passagens da carta de António Rodrigues, seria importante que o queixoso não deixasse acusações no ar e especificasse o significado da afirmação de que esta se trata de “uma peça especulativa com contornos e objectivos definidos”.
Maria Lopes e Leonete Botelho
Reclamação do leitor Manuel Magalhães Sant'Ana
Venho por este fazer uma crítica a um pequeno artigo da autoria da jornalista Ana Gerschenfeld publicado no P2 de dia 4 de Setembro de 2009 (pág. 3). Antes de mais, começo por lamentar, como vosso leitor, a fraca atenção que o PÚBLICO dá à secção de Ciência. Os textos sobre ciência são muitas vezes leituras simplistas (e por vezes erróneas) de artigos científicos e que pouco acrescentam para a sua compreensão. Na rubrica a que me refiro, por exemplo, a jornalista incorre num erro que considero grave ao afirmar que o filósofo Adam Shriver escreveu na revista New Scientist, o que é falso. O referido filósofo escreveu na revista Neuroethics um artigo intitulado "Knocking Out Pain in Livestock: Can Technology Succeed Where Morality has Stalled?", e é o jornalista de ciência Ewen Callaway quem, na New Scientist, se refere ao texto anterior. Este erro pode revelar duas coisas, qual delas a mais condenável: (1) ou a jornalista leu o artigo da New Scientist na diagonal - o suficiente para fazer um texto de menos de 200 palavras que não passa de uma tradução ao estilo copy/paste - e não percebeu que estava a ler uma cópia e não o original ou (2) a jornalista considera que ler uma crítica a um artigo científico equivale a ler o artigo científico, já que, pelo que é dado a ler, interrogo-me se a jornalista de facto consultou o artigo original.
Manuel Magalhães Sant'Ana
Laboratory Animal Science
Instituto de Biologia Molecular e Celular - IBMC
Porto
Explicações da jornalista Ana Gerschenfeld
A única publicação que refiro no meu texto é a revista britânica New Scientist, porque foi daí que retirei a citação que faço e não do artigo da Neuroethics, como pressupõe o leitor - neste artigo não existe tal frase. De facto, a New Scientist faz uma citação de Adam Shriver e não do artigo da Neuroethics - ainda que este seja, naturalmente, o tema e a razão da citação. Não sei qual o contexto da afirmação de Shriver reproduzida pela New Scientist: pode ter sido uma conversa de um jornalista com o filósofo ou uma conferência de imprensa, por exemplo, ainda que isso não seja referido. Embora a New Scientist não seja uma revista científica de primeira publicação, penso que é absolutamente lícito citá-la neste contexto, pois trata-se de uma revista de grande qualidade e rigor reconhecido.
Mas existe de facto uma falha no meu texto: ao escrever "afirma na New Scientist" dei a impressão de que Shriver tinha publicado o seu artigo nessa revista. Fi-lo para não escrever o habitual "disse à New Scientist" pois, como disse, não conhecia o contexto dessa declaração e não estava certa de que tivesse sido feita à New Scientist. Deveria ter utilizado a expressão “citado pela New Scientist” e ter identificado a revista da publicação original - como aliás costumo fazer noutros textos semelhantes.
Ana Gerschenfeld
domingo, 25 de outubro de 2009
Rescaldo eleitoral
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Secção: Crónicas
domingo, 18 de outubro de 2009
Prós e contras de duas notícias
Só deve prevalecer um critério para a publicação da notícia: o interesse que tem para o público do respectivo órgão de informação
A notícia culminou com o autêntico haraquiri político em directo que foi a comunicação do Presidente
O provedor recebeu um convite no passado dia 9, uma sexta-feira, para participar no programa Prós e Contras, da RTP1, segunda-feira seguinte. A emissão – foi-lhe explicado – destinava-se a discutir as relações do jornalismo com a sociedade, a política e o desenvolvimento. Habituado a intervir sobre questões no âmbito da comunicação, o provedor aceitou, mas no dia do programa soube que a intenção (não declarada no convite) era debater a produção das notícias sobre as suspeitas da Presidência da República de que estaria sob vigilância por parte do Governo, as quais alvoroçaram a política nacional nos últimos dois meses. As notícias tiveram origem no PÚBLICO e mereceram uma análise crítica do provedor. Essa crítica motivou uma troca de correspondência interna de que houve fuga para o exterior, com a consequente publicação pelo Diário de Notícias de um email enviado por um para outro jornalista do PÚBLICO onde entre outras coisas se revelava o nome de um membro da Casa Civil de Belém como suposta foste de informação das notícias em causa.
Fiel ao princípio de apenas abordar os casos do PÚBLICO nesta página e no seu blogue, o provedor comunicou previamente à apresentadora do programa, Fátima Campos Ferreira, que não poderia pronunciar-se sobre a atitude do jornal no caso, mas apenas sobre questões genéricas do jornalismo, como aliás lhe fora solicitado. Claro que as televisões – e o serviço público não é excepção – ambicionam sangue, e, após uma primeira parte para disfarçar (que terá sido uma maçada para os telespectadores), entrou-se no que de facto interessava aos promotores do programa: uma luta de galos entre os directores do PÚBLICO, José Manuel Fernandes, e do DN, João Marcelino, acicatada por directores de outros órgãos de informação. Ao longo desta segunda parte – de onde, na opinião do provedor, não saiu dignificado o jornalismo português –, Fátima Campos Ferreira. anunciou que o provedor não queria pronunciar-se sobre o assunto, pelo que não lhe concedeu a palavra. Se o tivesse feito, haveria algumas considerações que o provedor, sem prejuízo do seu compromisso para com os leitores do PÚBLICO, gostaria de enunciar, aproveitando para o fazer agora.
No essencial discutia-se se eram dignas de publicação tanto a notícia do PÚBLICO sobre as suspeitas de Belém como a do DN dando a conhecer a mensagem trocada entre os dois jornalistas da concorrência. Claro que notícia é todo o facto novo, relevante ou não, que alguém decida difundir para um grupo de pessoas, mas a questão que se colocava era se aquelas notícias em particular se enquadravam do estatuto editorial dos respectivos jornais e se haviam obedecido às regras e deontologia jornalísticas.
O provedor não vai reiterar a argumentação já expendida acerca do que considera os erros grosseiros cometidos pelo PÚBLICO no processo. Mas entende ter total justificação a manchete inicial, “Presidência suspeita estar a ser vigiada pelo Governo”, de 18 de Agosto. A notícia estava devidamente fundamentada numa fonte fidedigna da Casa Civil da Presidência da República, identificada no texto como tal, e não era sobre a existência da vigilância governamental (que nunca se comprovou) mas sobre a suspeita nesse sentido formulada por Belém. Perguntava-se no Prós e Contras: essa mera convicção de alguém na Presidência da República, mesmo sendo fonte qualificada (como no caso), era noticiável? Sem dúvida: não se tratava das suspeitas de cidadãos privados mas sim de um estado de espírito indiciador do nível de degradação das relações entre dois órgãos de soberania cuja missão seria cooperar e não alimentar guerrilhas institucionais – e portanto uma informação de inegável interesse nacional.
Basta aliás avaliar as consequências que a notícia (jamais desmentida por Belém) desencadeou, culminando com o autêntico haraquiri político em directo que foi a comunicação autojustificativa do presidente Cavaco Silva (C.S.) em 29 de Setembro, inteiramente dedicada ao tema, para a caucionar.
Quanto à revelação pelo DN, em 18 de Setembro, do email dos jornalistas do PÚBLICO, perguntava-se também na emissão televisiva se era legítima (dado violar correspondência privada), se não deveria ser acompanhada da revelação de como o email chegou ao jornal e se não haveria grave falta deontológica por se identificar a fonte confidencial de um jornalista.
Mais uma vez, segundo o entendimento do provedor, o critério básico que deve prevalecer – atendendo aos princípios editoriais do DN, não muito distintos dos do PÚBLICO – é o do interesse público da notícia. E haveremos de convir que a manchete do DN – alvo de tentativas iniciais de desmentido, mas com uma incoerência que só serviria de comprovativo à sua autenticidade – causou considerável abalo no mundo político, então em plena campanha eleitoral para as legislativas, com reacções de todos os sectores, ajustamentos da agenda e do discurso políticos, eventuais efeitos no resultado das eleições e até a necessidade sentida pelo Presidente de vir a público explicar-se. Como é que não havia ali matéria de notícia? Havia – e muita.
Os jornalistas, em regra produtores de notícias, não podem eximir-se à circunstância de serem também objecto de notícia – foi o caso. Habituados a justificar com a prevalência do interesse público a violação, muitas vezes por eles praticada, da correspondência privada de outros cidadãos, não deveriam queixar-se quando, em nome desse mesmo princípio, são alvo de idêntica devassa. É a vida.
Por certo, a forma como o email foi parar ao DN seria uma história interessante, mas não faria sentido o jornal fazer depender da sua publicação a notícia acerca do conteúdo desse email, pois estaria a sonegar uma história muito mais interessante do ponto de vista do seu relevo público. Se a fonte exigiu o sigilo, o DN limitou-se a cumprir a sua obrigação, pois essa seria a condição sine qua non para que pudesse trazer ao conhecimento dos leitores uma informação de interesse nacional.
Mas, tal como no caso do PÚBLICO, também a notícia do DN foi afectada por vários erros. O provedor já esclareceu aqui que exerce funções no PÚBLICO, não no DN, mas dirá o que diria na RTP intervindo no âmbito exterior a essas funções. Entre esses erros figura a forma acintosa e inexacta dada à manchete: “Assessor do Presidente encomendou caso das escutas”. Parte considerável das notícias que todos os dias o público recebe devem-se à iniciativa de fontes de informação junto dos media, mas isso não significa que essas notícias sejam “encomendas”, já que passam pela prévia mediação dos jornalistas, que avaliam o seu interesse. Assim sucedeu com a notícia original do PÚBLICO. Considerá-la encomendada por Belém é o mesmo que dizer que muitas das notícias publicadas pelo DN não passam de encomendas dos seus informadores.
Outro problema consistiu na denúncia da fonte do PÚBLICO. Os jornalistas do DN fizeram-no com plena consciência da ilegitimidade, dado saberem (como atrás vimos) que o sigilo profissional enforma a sua actividade, tal como sucede com os médicos, os advogados ou os padres. Poder-se-á argumentar que a preservação do sigilo competiria ao próprio jornalista que contactou a fonte, o qual, quando escreveu o seu nome no email, já estaria a violar a confidencialidade. Mas, por imperativo ético, deveria haver um mínimo de decência profissional de outros jornalistas para manter essa salvaguarda: não vemos médicos a revelarem a ficha clínica de pacientes de outros médicos, advogados a denunciarem segredos dos constituintes de outros advogados ou padres a divulgarem as confissões recolhidas por outros padres.
E se a nova doutrina produzida no centenário matutino advoga o contrário, será que também se aplica a quem trabalha na mesma redacção ou no mesmo grupo empresarial? Poderão, por exemplo, os jornalistas da TSF denunciar as fontes dos do DN e vice-versa? Onde está a fronteira? Parece que se instala antes a lei da selva no jornalismo, que acabará por sair prejudicado, pois as fontes confidenciais perderão a confiança nos jornalistas e deixarão de lhes transmitir informação.
Nada disto altera porém o essencial: as duas notícias tiveram mais prós do que contras – e marcaram o jornalismo português por muitos anos.
CAIXA:
O umbigo dos arquitectos
A Secção Norte da Ordem dos Arquitectos, através da presidente, Teresa Novais, e do vice-presidente, Luís Tavares Pereira, do seu Conselho Directivo Regional, expressou ao provedor “surpresa e indignação” pela forma que a Edição Norte do PÚBLICO de 26 de Setembro, na secção Local, deu à notícia “Arquitecto preso por deixar assaltante cego e em coma”, a qual “coloca despropositadamente o ênfase da mensagem na profissão do autor da agressão, denegrindo o bom nome da profissão arquitecto”. Sustenta a reclamação: “Um crime de agressão e abandono de vítima pelo agressor é noticiado com a identificação em cabeçalho do agressor em função da sua profissão de arquitecto e repetindo-o continuadamente em cada um dos três parágrafos que compõem a notícia. A relevância para a notícia da profissão de arquitecto, não estando este no exercício da profissão, parece-nos um aproveitamento desproporcionado da associação entre uma profissão de prestígio cívico e um acto ignóbil (...), que, ao ser enfatizada desta maneira, constitui um atentado ao bom nome da profissão de arquitecto, atingindo toda a classe desnecessariamente. (...) Está em causa (...) a gratuitidade e prejuízo com que a excessiva ênfase na profissão estende uma fina manta de negatividade sobre toda a classe”. Solicita-se por isso ao PÚBLICO, “em nome de todos os arquitectos, um pedido de desculpas”.
O provedor julga injustificada esta reacção corporativa. O facto de no centro dos acontecimentos se encontrar, de forma um tanto ou quanto inesperada, um arquitecto pode dar interesse acrescido à notícia. E os leitores do PÚBLICO não são tão estúpidos a ponto de pensarem, a partir daqui, que todos os arquitectos são violentos e agridem, com razão ou sem ela, quem se atravesse à sua frente.
Publicada em 18 de Outubro de 2009
DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR:
Carta do Conselho Directivo Regional Norte da Ordem dos Arquitectos
A Ordem dos Arquitectos – Secção Regional Norte (OASRN) vem por este meio manifestar a sua surpresa e indignação pela forma dada à notícia da agressão e abandono da vítima na edição Local Porto de 26 de Setembro 2009 do PÚBLICO, com o título “Arquitecto preso por deixar assaltante cego e em coma”, que coloca despropositadamente o ênfase da mensagem na profissão do autor da agressão, denegrindo o bom nome da profissão arquitecto.
1. Na notícia em epígrafe, um crime de agressão e abandono de vítima pelo agressor é noticiado com a identificação em cabeçalho do agressor em função da sua profissão de arquitecto e repetindo-o continuadamente em cada um dos três parágrafos que compõem a notícia.
2. A relevância para a notícia da profissão de arquitecto, não estando este no exercício da sua profissão, parece-nos um aproveitamento desproporcionado da associação entre uma profissão de prestígio cívico e um acto ignóbil de agressão e abandono de vítima, que, ao ser enfatizada desta maneira, constitui um atentado ao bom nome da profissão de arquitecto, atingido toda a classe desnecessariamente
3. O que está em causa não é, evidentemente, a informação da sua profissão, associada a um processo de reconhecimento do género, idade, residência ou profissão, mas a gratuitidade e prejuízo com que a excessiva ênfase na profissão estende uma fina manta de negatividade sobre toda a classe profissional dos arquitectos, sem qualquer justificação.
4. Por essa razão, a OASRN, em nome de todos os arquitectos, solicita ao PÚBLICO um pedido de desculpas e solicita a publicação desta nota para esclarecimento público.
5. Aproveitamos esta oportunidade para, relativamente a notícias efectivamente referentes à construção ou inauguração de novos edifícios, a referência aos devidos autores subscritores das obras mencionadas seja incluída no texto, em que, para o bem e para o mal, a identificação do arquitecto ou ateliê constitui um facto de relevância e responsabilização dos arquitectos perante a opinião pública.
Teresa Novais, Presidente
Luís Tavares Pereira, Vice-presidente
Conselho Directivo Regional Norte da Ordem dos Arquitectos
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Secção: Crónicas
quinta-feira, 15 de outubro de 2009
O mestre e a prima
A “praga preposicional” há muito que me incomoda.
Mas não concordo que essas calinadas se devam ao “uso de preposições, como se não houvesse o cuidado de recorrer à mais adequada, mas sim à que melhor soa aos ouvidos do redactor”.
Parece-me mais um efeito, diria eu, de “contaminação”, uma perversão do princípio da analogia: o escriba toma uma palavra por um sinónimo (ou um quase-sinónimo) mais comum mas menos “erudito” e pespega-lhe com a preposição que devia acompanhar a primeira.
Alguns exemplos pescados em jornais, TV e rádio:
- A palavra "chorar" contamina o menos plebeu "carpir"; e vá de escrever, muito literária e pretenciosamente, “não sei por quem carpia tão dilaceradamente Dona Pomba” (asneira debitada por Catalina Pestana no Sol);
- na página de Economia do PÚBLICO, escreve um douto profissional “discordo completamente com o que disse Axel Weber” (seja quem for o Axel Weber de quem o plumitivo, envenenado pelo antónimo "concordar", discorda);
- no Diário de Notícias, a propósito de “o alfaiate português do Príncipe Carlos” – os assuntos que eles vão desencantar… -, comete o jornalista: “A acreditar pela encomenda (…)”. A asneira é, evidentemente, a confusão com a frase “a julgar por”;
- DN, PÚBLICO, televisões a granel e tutti quanti: "aguardar por", “contaminado” por "esperar por".
Podia continuar ad nauseam nas preposições, mas prefiro acabar com outras pérolas, como “linhas de crédito específicas à habitação” e uma que é pandémica na chamada comunicação social, o arrepiante e erradíssimo se em “alastrar-se”, vítima da falsa semelhança com “espalhar-se” ou a impagável Manuela Moura Guedes no saudoso Jornal Nacional da TVI a esganiçar-se aos gritos: “O bastonário aponta que há advogados (…)".
Pois é; é confundir a obra-prima do Mestre com a prima do mestre-de-obras.
António Dias
NOTA DO PROVEDOR: Os dicionários já admitem "alastrar-se" como canónico.
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segunda-feira, 12 de outubro de 2009
Certo ou errado?
Será que é o próprio provedor do leitor que escreve (11 de Outubro, na pág. 35) "E depois há coisas que se lê neste jornal e não se acredita"?
Não se acredita mesmo!
Mercedes Olazabal
NOTA DO PROVEDOR: O provedor, antes de escrever, reflectiu muito sobre essa frase (que já não é a primeira vez que usa) e acredita que é admissível. Está porém aberto a interpretações contrárias.
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Ei, anda alguém a ler isto?
A linguagem jornalística está dominada por uma série de vícios que nada nem ninguém consegue já eliminar
Estará o investigador Jorge Pacheco apostado em ajudar o cancro a derrotar a espécie humana?
O mais frustrante da actividade do provedor é perceber que as suas chamadas de atenção caem em saco roto. Não tanto no que respeita a recomendações sobre a prática jornalística, pois a redacção do PÚBLICO é livre de discordar do que aqui se diz, mas sim quanto ao respeito pela língua portuguesa e à salvaguarda dos seus normativos – o que devia passar por consensual e universalmente aceite.
A crónica anterior (“Em defesa da pátria”) foi já dedicada a questões linguísticas, entre elas o frequente problema da errada tradução literal de termos ingleses. Pois logo nesta semana dois leitores alertavam o provedor para uma calinada do género. Numa notícia sobre as exigências de última hora do presidente checo, Vaclav Klaus, para assinar o Tratado de Lisboa, saída no PÚBLICO.PT na quinta-feira e repetida anteontem na pág. 18 da edição em papel, dizia-se que o primeiro-ministro sueco, Frederik Reinfeldt, na qualidade de presidente em exercício da União Europeia, teria declarado: “Pelo que percebi, ele pediu [que fossem incluídas] numa nota de rodapé duas sentenças relacionadas com a carta dos direitos fundamentais”. Comentou Rui Miguel Neiva: “A não ser que o presidente checo esteja a pensar condenar alguém, suponho que o que ele quer incluir são duas frases (‘sentences’ em inglês) e não duas sentenças. Sinceramente já começam a cansar estes erros tão básicos. Quando estamos a falar de palavras mais desconhecidas ainda se pode compreender a transliteração do inglês, agora nestes casos penso que é de uma falta de profissionalismo inimaginável”. E acrescentou Nuno Curado: “Tendo em conta que o primeiro-ministro sueco se estava a referir a duas frases e não a duas sentenças judiciais, acho que se trata de um erro muito grave. Mesmo tendo em conta a contenção de custos que o PÚBLICO tem tido, há um mínimo aceitável nas revisões que se fazem num jornal de suposta referência”.
Na crónica anterior também se criticava uma liberalidade jornalística cada vez maior quanto ao uso de preposições, como se não houvesse o cuidado de recorrer à mais adequada, mas sim à que melhor soa aos ouvidos do redactor. O leitor Rodrigo Valle Teixeira criticou o título da pág. 5 de 5 de Setembro "Cientistas portugueses usam teoria dos jogos para redefinir o combate do cancro", sublinhando que “a batalha não é do cancro, é contra o cancro”. E não se tratou de mera distracção, já que o mesmo erro apareceu no texto (“A equipa descobriu que o sucesso do combate deste cancro...”) e na legenda da foto (“O estudo de Jorge Pacheco dá novas pistas para o combate do cancro”). Ou então teremos um bizarro grupo de cientistas apostados em ajudar o cancro a derrotar a espécie humana.
A sensação – um pouco impotente – que se tem é que a linguagem jornalística está dominada por uma série de vícios que nada nem ninguém consegue já eliminar. Um dos mais frequentes, e contra o qual o provedor desde cedo declarou guerra, é aquele que nesta coluna foi baptizado como “praga de Catual”: a passagem por artes mágicas da partícula “que” a sujeito singular quando faz as vezes de plural, o que obrigaria o predicado (verbo) correspondente a respeitar o plural. É o caso apontado por Francisco Luís: “Ouso perguntar se está correcta a frase que leio no editorial do esclarecidíssimo director [José Manuel Fernandes] do jornal (18 de Agosto, penúltimo parágrafo): ‘A Califórnia é um dos estados que está a mudar a sua legislação’. Porque está em moda esta – julgo! – errada forma gramatical, gostaria de saber se o correcto não seria, ou será: ‘A Califórnia é um dos estados que estão a mudar a sua legislação’.” Seria, com efeito. E não é que horas depois escrevia de novo o mesmo leitor? “Nem de propósito!”, comentava. “Leio o PÚBLICO e deparo na pág. 6 [de 20 de Agosto] com ‘um dos raros socialistas que esteve ao lado de Cavaco na polémica do Estatuto dos Açores’. Esteve ou estiveram?”
A praga alastrou de facto, e é cada cavadela sua minhoca. Eis exemplos colhidos pelo provedor da mais recente leitura do jornal: “uma das muitas caras que em frente à Casa Branca comentava a atribuição do Nobel da Paz” (ontem, pág. 6); “Severiano Teixeira é um dos ministros que tutela as contrapartidas” (legenda de foto, 3 de Outubro, pág. 3); “Sócrates é dos que mais tem feito pela pobreza” (provavelmente, tal como quanto ao cancro, será “contra a pobreza” – 26 Set., pág. 17); “um dos países que já asseguraram que sustentará esta ambição portuguesa” (o primeiro verbo ainda manteve a correcção, mas o segundo falhou-a – 22 Set., pág. 8); “era um dos poucos cubanos ainda vivos que ostentava o título de ‘comandante da revolução’” (13 Set., pág. 16); “um dos artistas que passa de um lado para o outro com um trabalho completamente ímpar” (6 Set., pág. 7); “um dos poucos políticos que se preocupava com os seus eleitores” (28 Ago., pág. 13); “um dos primeiros políticos de âmbito e gabarito internacional que, logo a seguir ao 25 de Abril, fez questão de vir a Lisboa e ver com os seus próprios olhos o que se estava a passar” (27 Ago., pág. 6); “um dos banhistas que saiu da água” (23 Ago., pág. 7); “uma das romarias que aposta forte na música” (16 Ago., pág. 5); “um dos portugueses que já faz do póquer profissão” (legenda, Pública, 9 Ago., pág. 19); “Salário mínimo português foi dos que mais cresceu na zona euro durante a crise” (título a toda largura da pág. 15, 5 Ago.); “um dos que mais sobe na zona euro” (5 Ago., pág. 15); “A memória das nossas pretensões anteriores é das que mais magoa” (29 Jul., pág. 31); “Uma das possibilidades que ontem era avançada” (27 Jun., pág. 14); “nem sequer era um tópico da actualidade mas antes um daqueles que é reciclado regularmente” (P2, 24 Jun., pág. 10); “Uma das situações que mais me tem intrigado” (P2, 20 Jun., pág. 18); “um dos homens que agora tentou fugir de Caxias” (18 Jun., pág. 37); “Um dos juízes de Braga que condenou o ucraniano” (12 Jun., pág. 11); “Uma das páginas do PÚBLICO que fez a comunidade gay delirar” (legenda, Inimigo Público, 11 Jun., pág. 3); “um dos nomes do contingente nórdico de autores de ‘policiais’ que está a ser descoberto” (Ípsilon, 5 Jun., pág. 43); “é um dos dispositivos que poderá mudar os dados” (3 Jun., pág. 16); “uma das autoras que contribuiu com artigos sobre o caso” (P2, 3 Jun., pág. 5): “é um dos magistrados ligados ao Freeport que terá manifestado suspeitas” (14 Fev., pág. 9).
Será fútil esta reiterada colheita do provedor? A expectativa era que, com a denúncia repetida do erro, os jornalistas se corrigissem, mas na verdade não há melhoras, e a praga campeia por aí. O provedor duvida até que os membros da equipa do PÚBLICO leiam esta página, já para não falar em reflectirem sobre o que nela se diz.
Situação idêntica surge com a aqui já designada “síndrome da bica”, como se o jornalista deixasse uma frase a meio para ir tomar um café e a terminasse no regresso sem ligar ao que antes escrevera. Resultado: discordância entre sujeito e predicado, no género ou na quantidade. Deve dizer-se que estas ocorrências fazem a delícia de alguns leitores, como A.F. Neiva Correia: “Li no PÚBLICO de 4 de Março o artigo que fazia manchete [‘Deficiente perde benefícios fiscais por falsa dívida de 1,97 euros’] e fiquei elucidado sobre o nível, ou a falta dele, dos que escrevem nesse jornal. Vamos aos factos: ‘Todo esta situação foi confirmado ao PÚBLICO por fonte oficial’. Desculpe? ‘Todo a situação confirmado’? Mas há mais: ‘dois despachos da DGCI determinam que fossem anuladas os benefícios fiscais’. ‘Anuladas os benefícios’? Em que planeta vive este jornalista? Ainda na mesma edição, pág. 31: ‘a fiabilidade global das demonstrações financeiras (...) poderão ser questionadas’. A ‘fiabilidade poderão’?”
Últimas ocorrências (entre certamente muitas outras, já que a leitura que o provedor faz do jornal está longe de ser exaustiva): “A nossa incapacidade de debatermos o regicídio, a noite sangrenta ou, no pós 25 de Abril de 1974, a descolonização resultam em grande parte dessa atávica associação” (8 Out., pág. 37); “O secretário-geral do PS, assim como outros dirigentes do partido, já disseram quarta-feira que consideravam o caso encerrado” (3 Out., pág. 7); “Tentámos contactar Manuela Moura Guedes, mas não obteve resposta até ao fecho desta edição” (idem, ibidem); “os mal-entendidos entre a essência do projecto europeu e os seus destinatários não parou de crescer” (entrada de artigo, P2, 1 Out., pág. 5); “Louçã manteve o mesmo tom acusador e inquiridor que o caracterizam nestes debates” (9 Set., pág. 9); “o fim dos benefícios fiscais fazem parte de um modelo diferente de organização económico-social” (idem, ibidem); "O regresso das acções terroristas da ETA trouxeram ontem à rua" (21 Jun., pág. 40); “Os refrescos e as sanduíches são exclusivos e deliciosos, mas, crucialmente, também são baratas” (29 Abr., pág. 35); “Se a viabilização deste projecto parece ser certo” (16 Abr., pág. 4).
E depois há coisas que se lê neste jornal e não se acredita: “o caso social mais urgente da persecução de obras públicas” (trata-se não de perseguir as obras públicas mas da sua prossecução – entrada de artigo, 3 Set., pág. 4); “levou a que um fogo provocado por uma avaria eléctrica se espalha-se por todo o aparelho” (P2, 2 Set., pág. 2); “A mãe, bailarina, prevera nos astros” (P2, 2 Set., pág. 4); “as comemorações do centenário da República, que serão comemorados no próximo ano” (11 Ago., pág. 6); “Há 1h00 da manhã de ontem” (20 Jul., pág. 8); “Embora o avô de Lobo Antunes lê-se pouco” (P2 6 Jul., pág. 4); “duvido que LFV aceita-se um debate” (P2, 20 Jun., pág. 2).
Por último, o desabafo enviado ao provedor há uma semana pelo leitor José A. Ribeiro da Cunha: “No dia em que escreve ‘em defesa da pátria’, encontro esta pérola na pág. 4 do PÚBLICO: «’Obrigada Irlanda’, afirmou Durão Barroso».”
A luta continua.
Publicada em 11 de Outubro de 2009
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sexta-feira, 9 de outubro de 2009
A "toupeira"
Depois de ter visto um porco a andar de bicicleta, só mesmo um e-mail com pernas me espantaria!
Como é que um e-mail, uma, duas ou três páginas A4, se desloca do arquivo do PÚBLICO para a redacção de dois ou três órgãos de informação concorrentes? Como? Só mesmo se as ditas páginas tiverem pernas, presumo!
Mais de 30 anos depois de Abril, custa-me aceitar que ainda andem por aí uns quantos coitados, que antes designávamos de bufos do Regime. Tendo em conta os elementos conhecidos, estou em crer que andamos todos enganados, pois não existe outro nome para classificar alguém que subtrai correspondência da sua empresa em beneficio de outra, seja qual for o teor da mesma.
Gostaria de saber se o PÚBLICO vai deixar cair este detalhe de carácter pidesco, parte essencial de toda uma história à volta de um e-mail, pois, que se saiba, nunca os bufos fizeram nada sem disso terem tirado benefícios pessoais, e nesse caso teremos de admitir que alguém encomendou esta história!
Estranho não deixa de ser o facto de muitos dos meus correligionários de esquerda não terem sequer valorizado esta parte da história. Será que por si só a conquista do poder justifica tudo e mais alguma coisa?
E, se sobre o teor do referido e-mail já muito foi dito, e muito se pretende ainda dizer, pois enquanto andarem a lamber esta e outras histórias ninguém se lembrará de falar do presente e do futuro do país, das coisas que realmente interessam e que podem contribuir para ultrapassar as desigualdades sociais existentes e com tendência para se agravarem…
Sinceramente espero que o PÚBLICO se livre desta toupeira e doutras se as houver, pois elas debilitam as raízes duma informação idónea.
Francisco José Pinheiro Gonçalves
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A "trapalhada"
Como sabe, achei que o tema das “escutas ao PR” era colateral, mas tomou as dimenões excessivas - isso já todos entendemos, mas não percebemos onde começou, para que começou, qual o motivo de o PÚBLICO se ter envolvido em toda esta trapalhada! Muitos saíram menos bem, na forma, mesmo que não no conteúdo, até o Presidente da República.
Mas também teve repercussões no próprio PÚBLICO, se bem que se José Manuel Fernandes já estava a querer sair em Julho talvez (talvez, penso) até nem devesse dar cobertura a que toda esta trapalhada tivesse inicio em meados de Agosto passado.
Hoje, já em Outubro, passadas as eleições legislativas, fiquei por entender para que serviu tudo isto, e tenho pena, unicamente no aspecto de que percebi que o PÚBLICO também “entra” por áreas que nunca deveriam ser as suas.
Gostaria que quisesse, como Provedor, tentar explicar-nos mais detalhes de tudo, o final de tudo, e qual será o papel de José Manuel Fernandes no dia 1 de Novembro no PÚBLICO.
Presumo que muitos leitores ainda não entederam/entendemos...
Augusto Küttner de Magalhães
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domingo, 4 de outubro de 2009
Em defesa da pátria
Se, como escreveu Pessoa, “a minha pátria é a língua portuguesa”, preservar a língua é lutar pela pátria
Ao contrário do que disse o PÚBLICO, o jornalista não “assaltou” Bush com os
sapatos
Mais do que um território, um conjunto de tradições ou um traço genético, a língua pode ser factor de identidade de uma comunidade nacional. Tome-se como se quiser, é isso que diz o aforismo de Pessoa: “A minha pátria é a língua portuguesa”. E o futuro da língua está hoje nas mãos dos media: é a imprensa e os meios electrónicos de comunicação quem define a forma como se fala e falará. Daí a responsabilidade dos jornalistas, que pode ser encarada de muitas maneiras mas que, para um jornal com o estatuto editorial do PÚBLICO, deveria ser no sentido de defender de modo coerente a correcção do português – o que implica apurados cuidados da parte de quem escreve.
O provedor já noutras crónicas tem sublinhado este aspecto, com o levantamento de inúmeros erros, muitos deles sistemáticos, que poderiam ser corrigidos com melhor formação ou até com um pouco mais de atenção ao que se verte para o teclado. A extinção progressiva - ditada pela contenção de custos – dos revisores de texto, a quem incumbia a tarefa de zelar pelo respeito das regras, só tem ajudado a tornar as coisas piores. Os alertas lançados nesta coluna destinam-se apenas a fazer ver como muitos erros podiam ser evitados se os jornalistas tivessem um pouco mais de sensibilidade para o problema.
Veja-se o caso dos estrangeirismos, cada vez mais frequentes, porque cada vez mais, abdicando da investigação própria (também devido à poupança), se traduz notícias e informações já publicadas noutras línguas (sobretudo em inglês e na internet). Entre muitos outros, eis dois exemplos detectados pelo leitor Rodrigo Valle Teixeira na edição de 5 de Setembro: na pág. 5, no artigo "Cientistas portugueses usam teoria dos jogos para redefinir o combate do cancro", “no segundo parágrafo, a frase ‘Se tudo corre bem, há um balanço entre esta dinâmica...’ deveria ser "Se tudo corre bem, há um equilíbrio entre esta dinâmica...’; na pág. 14, no artigo "Cinco pessoas morreram em protestos em Xianjiang", “onde se lê ‘com o tráfico cortado’ deveria ser ‘com o tráfego cortado’”. Comenta o leitor que no primeiro caso “parece uma tradução literal errada do inglês ‘balance’”, e quanto ao segundo: “Imagino que as autoridades chinesas tenham cortado o trânsito automóvel, e não o tráfico de substâncias ilegais”.
Ainda a propósito do Oriente, a legenda de uma foto da reportagem “Bebés roubados na China alimentam negócio das adopções”, na pág. 4 do P2 de 28 de Setembro, fala em “oficiais do planeamento familiar”, quando o texto, correctamente, menciona “funcionários do planeamento familiar”. Não consta, na verdade, que o planeamento familiar naquele país seja efectuado pelo exército, mas sim por funcionários (“officers” em inglês) governamentais.
Mais para ocidente, noticiou o PÚBLICO de 13 de Setembro, na pág. 15, sobre o jornalista iraquiano que atirara os sapatos a George Bush durante uma conferência de imprensa em Bagdade, que fora “condenado a três anos de cadeia por assalto a um chefe de Estado estrangeiro”. Tradução errada do inglês “assault”, que não significa “assalto” (a uma pessoa) mas sim “agressão”.
E a 10 do mesmo mês escrevia-se na pág. 14 sobre um “candidato incumbente”, expressão inexistente nos dicionários de português, em que não há equivalente para “incumbent” (do inglês, um eleito recandidato). Em contrapartida, existe uma palavra portuguesa para significar a expressão inglesa “statute of limitations”, que é “prescrição” (legal), mas o jornalista-tradutor que fez uma notícia para a pág. 13 dessa edição não deu por ela, escrevendo: “Não existe qualquer estatuto de limitação da responsabilidade pelos crimes de guerra”.
Ainda no domínio jurídico, escreveu Nuno Curado: “Não percebo como é que num ‘jornal de referência’ não há o cuidado para evitar a tradução directa de certos termos em inglês quando estes não correspondem na língua portuguesa. Utiliza-se no texto o termo ‘evidências’ como se se tratasse da palavra ‘provas’. Isso funciona em inglês em que ‘evidence’ realmente tem esse significado”. (O leitor, que escrevia em 24 de Setembro, não disse onde é que detectou a “evidência”, e o provedor também não a localizou, mas o erro é tão frequente nos media portugueses que, mesmo assim, vale a pena o alerta).
Quanto a Rui Miguel Neiva, reparou no seguinte: “Na edição de 15 de Setembro, no artigo da pág. 20 sobre a 'guerra dos pneus' entre os EUA e a China, diz-se no final da primeira coluna: ‘(...) e vêm responder às reivindicações das uniões de trabalhadores norte-americanos’. Esse 'união dos trabalhadores' não estará a referir-se a um (ou vários) sindicatos? É que a palavra 'union' em inglês significa não só 'união' mas também 'sindicato', o que, pelo contexto do texto, parece ser o caso". Tem o leitor razão.
Se bem que o inglês seja a influência dominante, não é a única. “Pasta”, palavra italiana para “massa”, ainda não entrou no léxico português, mas está permanentemente a ser usada. Exemplo: “Para Jamie Olivier, se o azeite for bom, a pasta for fresca....” (1 de Abril, pág. 4).
E depois há o recurso abusivo a palavras estrangeiras, outro tema também já abordado nesta coluna. É o caso que levou a leitora Isabel Barros Ferreira a reclamar: “No PÚBLICO de 14 de Setembro, pág. 20, sob o antetítulo ‘Consumo - Legislação traz mais garantias aos utilizadores dos centros de atendimento’, seguia-se um artigo cujo título era: ‘Nova lei dos call centers obriga as empresas a gravarem as chamadas por 90 dias’. Se há em português o termo ‘centro(s) de atendimento’, que me parece perfeitamente adequado para traduzir o inglês ‘call center(s)’, como aliás é utilizado no antetítulo, porquê insistir três vezes, no corpo do artigo, na expressão inglesa? Não haverá tradução adequada de termos como ‘backoffice’ e ‘contact center’, para não falar de ‘time-sharing’? É que estes termos aparecem também no mesmo artigo que, presumo, seja feito para ser lido maioritariamente por portugueses. E, não sendo o inglês língua oficial de Portugal, não entendo como obrigatório que todos tenham de saber traduzir aquelas palavras”.
Mudando de tema, o leitor Paulo Rato propôs-se intitular "Vamos salvar as preposições!" a sua carta ao provedor. Eis a razão: “Tenho notado que a temível quinta coluna que, infiltrada em tudo o que é meio de comunicação de massas, actua impunemente com o intuito de descaracterizar a língua portuguesa (...), se voltou agora para as preposições. (...). Num artigo publicado no P2 de 4 de Setembro, ‘Assassinaram o perfeito Brian?’, lê-se: ‘empreiteiro encarregue pela remodelação da mansão do guitarrista’. Que significa isto em português bem ‘preposicionado’: que uma entidade, de nome ‘remodelação’, encarregara o empreiteiro da mansão. De quê? Talvez de cuidar dela, de verificar que nada lhe acontecia, coisas assim… No PÚBLICO, semanas antes, escreveu-se: ‘Salvaguardando não conhecer ao detalhe a directiva’. Dou de barato o ‘detalhe’, galicismo de há muito acolhido pelos dicionários (...), mas refiro a sua origem porque, neste caso, é admissível que a preposição também tenha vindo de França, a acompanhar o ‘detalhe’, em embalagem de alumínio, com conteúdo ‘au meunier’. (...) Acrescento outra pérola, de 5 de Setembro. (...) É nos destaques de TV que está este anúncio de uma verdadeira revolução (ou será revulsão?) da História: Roubos de Arte Nazi (...) narra a história épica do roubo sistemático, da destruição deliberada e da sobrevivência milagrosa dos tesouros artísticos europeus do Terceiro Reich e da Segunda Guerra Mundial’. Será também da doença das preposições?”
Muito há a acrescentar, mas propõe-se apenas uma reflexão aos jornalistas. Num título na pág. 10 de 17 de Julho, “Social-democratas em silêncio sobre propostas de revisão constitucional para a Madeira”, o PÚBLICO aderiu à tendência tão em voga no meios audiovisuais de fazer o plural de “social-democrata” apenas no termo final, e não, como indicam a maior parte dos filólogos, nos dois (“sociais-democratas”). Como fará quem assim procede para o plural de “democrata-cristão”?
CAIXA:
A sexta coluna
Reclamou a leitora Graça Horta: ”Foi com espanto que no PÚBLICO de 28 de Outubro reparei que os resultados [das eleições legislativas] por distrito eram dados para as forças políticas com assento parlamentar e ainda para... o MEP! Ou se dava o resultado de todos os partidos concorrentes, ou, a escolher um pequeno partido, seria da lógica mais elementar publicar o do mais votado entre os pequenos, no caso o PCTP/MRPP. (...) O PÚBLICO está interessado em promover o MEP?”
Perante facto na verdade tão insólito, reconheceu o director adjunto Paulo Ferreira: “A crítica da leitora é certeira. Tratou-se de um erro, que não devia ter acontecido mas que tem explicação simples. Cerca de duas semanas antes, o PÚBLICO começou a preparar as bases informáticas e infográficas para a edição em causa. Tratava-se de criar automatismos para que, na noite eleitoral, a elaboração dos mapas, gráficos e tabelas de resultados pudesse ser feita com rapidez e adaptada aos espaços reservados em cada página. No caso das tabelas distritais, a indicação por mim dada ao departamento informático foi no sentido de prevenir a possibilidade de se acrescentar uma sexta coluna para além dos cinco partidos habitualmente mais votados. Porquê? Porque nas eleições europeias o MEP tinha sido o sexto partido mais votado em Lisboa e, se repetisse a mesma percentagem, teria eleito um deputado nesse distrito. Essa possibilidade tinha que ficar garantida previamente, sob pena de se verificarem atrasos no fecho da edição (...). Tal não se verificou (...). O erro foi, na noite das eleições e já de posse dos resultados, não se ter apagado de todas as tabelas a coluna referente ao MEP, que pareceu estranha, e com razões para isso, a muitos leitores”.
O provedor alvitraria solução diferente: como jornal de referência que aspira a ser, e porque nem todos os seus leitores são eleitores dos “cinco grandes”, o PÚBLICO deveria divulgar os resultados distritais de todos os partidos concorrentes (além dos votos brancos e nulos) e não segregar, na base da adivinhação, quem julga que não elege deputados.
Publicada em 4 de Outubro de 2009
à(s) 10:51 1 comentários
Secção: Crónicas