quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Comentários

Uma questão técnica tem impedido a publicação dos comentários no blogue, mas o provedor conta resolvê-la ainda durante esta semana. Entretanto, foram recebidos alguns comentários relativamente ao post anterior. Diz o leitor Francisco Falé: "Um erro não deixa de ser um erro, seja na imprensa escrita, seja na TV. Não se desculpa um disparate, que presumo tenha origem na Lusa, alegando que outros o fazem." E Carlos Fonseca: "E o provedor acha que a asneira dos 'eminentes comentadores' justifica o erro do PÚBLICO?" Por fim, um anónimo comenta: "Se os outros o fazem já não faz mal?! Bela linha de pensamento. Basilar." O provedor esclarece que se limitou a constatar um facto, sem com isso pretender sancionar a falha. Um erro ortográfico é sempre um erro ortográfico, e como tal deve ser denunciado e combatido - em defesa da língua.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

O corrector volta a atacar

O corretor da SG já foi detido. Que tal "deter" o teimoso corrector? PÚBLICO online, 26/01/2008, 15h15: "Corrector terá lesado o banco em 4,9 mil milhões de euros. Polícia francesa deteve suspeito de mega-fraude na Société Générale (...). O corrector acusado pela Société Générale de ser o responsável por uma fraude que terá custado ao banco cerca de cinco mil milhões de euros foi detido esta manhã pela polícia na região de Paris, adiantou uma fonte judicial. (...) As investigações ao caso estão a ser conduzidas à procuradoria de Paris (...), depois de o segundo maior banco francês ter revelado, aquando do anúncio dos resultados anuais, que tinha detectado um rombo de 4,9 mil milhões de euros, resultante de um esquema montado por um corrector do banco, de contornos ainda não conhecidos".

Francisco Jorge Pinto

NOTA DO PROVEDOR. O provedor tem ouvido até na televisão eminentes comentadores pronunciarem "corrector" em vez de "corretor".

sábado, 26 de janeiro de 2008

Para onde foram as fontes?

Observemos várias manchetes exclusivas (ou “em primeira mão”, segundo a gíria) do PÚBLICO nos últimos dois meses: “Menezes cede ao PS para forçar acordo sobre leis eleitorais” (24/11), “Escolha de Vara para o BCP suscita suspeitas de interferências do PS” (24/12), “Joe Berardo e aliados compraram acções do BCP com crédito da Caixa” (04/01), “União Europeia preocupada com possibilidade de referendo em Portugal” (08/01) ou “Merkel, Sarkozy e Brown forçam José Sócrates a ratificar na AR tratado europeu” (09/01). Boas notícias sem dúvida (desde que autênticas, o que não está aqui causa), mas com algo em comum: nenhuma delas menciona, sequer por aproximação, a fonte ou fontes que as terão dado ao jornal, sabendo-se ser essa uma regra de ouro do jornalismo.

Duas das notícias suscitaram reclamações de leitores, as quais acabaram por servir de pretexto ao provedor para reflectir sobre a lacuna. Acerca do anúncio das preocupações europeias quanto a eventual referendo em Portugal para o Tratado de Lisboa, Sebastião Lima Rego critica a “manchete sensacionalista” e sublinha que “as peças enfatizam abertamente a alegada bondade da ratificação parlamentar, chegando mesmo a dizer que o Tratado foi negociado com a 'preocupação' (sic) de dispensar o recurso a referendos – compromisso que o primeiro-ministro negou expressamente no Parlamento.” Constata o leitor: “Não se dão quaisquer fundamentos factuais nem se citam fontes para o 'noticiado'. Tudo é adiantado como se fosse óbvio e indiscutível. É assim porque sim.” O subscritor reclama ainda: “Não é aduzido ou recordado um único argumento favorável ao referendo, uma só personalidade que defenda o referendo.”

Ao provedor – que solicitou a 15 de Janeiro um esclarecimento à jornalista Teresa de Sousa, autora da notícia, sem porém obter resposta – não pareceu haver fundamento para a queixa sobre a ausência de opiniões favoráveis ao referendo, dado não ser objecto do texto comparar prós e contras quanto ao modelo de ratificação do Tratado de Lisboa (discordando assim da ligação que o leitor faz do conteúdo da notícia à defesa da ratificação parlamentar assumida em editorial pelo director do PÚBLICO). Mas entende mais preocupantes as considerações sobre a ausência de fundamentos factuais para a manchete e de fontes às quais esta seja imputada. A notícia criava um sobressalto, já que todas as informações das semanas anteriores indiciavam a opção de José Sócrates pela via parlamentar para a ratificação do tratado – decisão aliás anunciada pelo primeiro-ministro, por curiosa coincidência, no dia seguinte ao da publicação da manchete. Sem atribuição a fontes, a notícia pode ser assim considerada sensacionalista, prática recusada tanto pelo estatuto editorial do PÚBLICO como pelo seu Livro de Estilo. Na manchete seguinte, o jornal fechava o ciclo, justificando a escolha de Sócrates, a revelar nessa tarde, por pressão exercida de véspera pelos líderes dos grandes países europeus – mais uma vez, sem imputação a quaisquer fontes (só era citado o “gabinete” do primeiro-ministro – prática aliás desaconselhada pelo Livro de Estilo –, que “não quis nem confirmar nem desmentir esta informação”).

Na ausência da explicação da jornalista, o provedor procurou ouvir um dos membros da direcção acerca da política do jornal sobre a menção às fontes de informação, a pretexto da queixa de outro leitor relativamente à notícia da compra de acções do BCP com crédito da Caixa Geral de Depósitos. João Ferreira indigna-se por o PÚBLICO, sem tentar confirmação, dizer sob a manchete que Armando Vara, então na CGD e em trânsito para o BCP, era o administrador responsável pelo pelouro do crédito na instituição bancária do Estado, o que foi desmentido por carta de dois outros administradores publicada no dia seguinte nas páginas interiores do jornal. Argumenta o leitor: “Para um jornal que se quer de referência (...), não se pode publicar uma notícia com uma tão grande falha. (...) O que me chocou foi o facto de não se ter feito, a meu ver, o básico para um jornalista: falar com o visado para lhe dar oportunidade de se defender, tarefa que é prévia à publicação. (...) Se nem o PÚBLICO cumpre o mais básico que é de exigir ao jornalismo, quem o fará?”

Dado que um dos autores da notícia era Paulo Ferreira, subdirector do PÚBLICO, o provedor, ao solicitar-lhe esclarecimentos relativos à queixa do leitor, perguntou-lhe também da razão de “não se ter citado qualquer fonte (mesmo não identificada) como origem da informação publicada”. Quanto à primeira questão, o subdirector admitiu o erro, explicando: “A informação obtida pelo PÚBLICO indicava que Armando Vara tinha participado na decisão sobre aqueles créditos por ter esse pelouro na administração. Esta informação, que não era central na notícia, estava incorrecta, como o PÚBLICO indicou na edição seguinte. A participação de Armando Vara no processo ocorreu através do Conselho Alargado de Crédito, que integrava.”

No que respeita à ausência de atribuição a fontes, justifica Paulo Ferreira: “As várias fontes contactadas pelo PÚBLICO (...) pediram, todas elas, o anonimato. (...) Não podendo identificar a origem da informação, também não se optou pela proliferação de fórmulas genéricas. Seguiram-se as regras do Livro de Estilo que estabelecem que, com informações obtidas neste contexto, ‘o jornalista deve ponderar se está em condições de assumi-las e publicá-las, sem recurso a fórmulas vagas, do género fonte próxima de’”.

O subdirector tem razão neste ponto: o Livro de Estilo do PÚBLICO possui de facto uma norma no sentido que indica, com a justificação de que “um jornal bem informado não precisa de justificar permanentemente as suas notícias – assume-as e responsabiliza-se por elas.”

Esta é talvez uma inovação a nível mundial em teoria e prática jornalísticas. Mas será uma inovação saudável? Como já atrás se disse, os manuais e cursos de jornalismo são unânimes em declarar obrigatória a imputação a fontes (mais precisas ou mais difusas, consoante o princípio da confidencialidade) de, pelo menos, factos ainda não previamente conhecidos ou amplamente divulgados, de matérias sensíveis ou de tudo o que seja controverso ou indiciador de polémica e/ou contestação. Conhecendo a origem das notícias, o público está em melhores condições para avaliar o seu contexto e julgar da sua solidez e fundamentação. Pelo contrário, a prática aconselhada pelo Livro de Estilo do PÚBLICO desobriga o jornalista de reproduzir com rigor as informações recolhidas junto das fontes, abrindo o caminho à especulação e até à fantasia. Da história deste jornal faz parte o famigerado título de 1ª página “Cavaco Silva aposta em maioria absoluta do PS”, publicado há três anos, em plena campanha para as últimas legislativas, e sustentado numa notícia que não mencionava uma única fonte, tendo levado 48 horas depois à impressão, na mesma 1ª página, de um pedido de desculpas aos leitores por parte da direcção do PÚBLICO.

E haverá fórmulas mais vagas do que “o PÚBLICO sabe que...”, “segundo o PÚBLICO apurou...” ou “segundo informações apuradas pelo PÚBLICO...”, as quais povoam sistematicamente as páginas deste jornal (inclusive nos artigos mencionados de início)? Certas notícias parecem surgir por obra e graça do Espírito Santo ou por telepatia. Mas o jornalista é um agente mediático, não mediúnico. O que o devia obrigar, sempre que não foi testemunha directa dos factos, a explicar ao público como chegou até eles.

Recomendação do provedor. Como jornal de referência, o PÚBLICO deverá ponderar, em próxima revisão do Livro de Estilo, a adopção das regras universalmente aceites quanto à invocação das fontes para fundamento das notícias.

Publicada em 27 de Janeiro de 2008

Documentação complementar

Queixa do leitor Sebastião Lima Rego:

Acerca da forma como o PÚBLICO tratou hoje, 8 de Janeiro, a questão da forma de ratificação do chamado Tratado de Lisboa, logo na primeira página, uma manchete sensçionalista: ' União Europeia preocupada com possibilidade de referendo em Portugal'. Dentro, na página 4, os textos dizem repetidamente que a hipótese de ser decidido um referendo em Portugal como condição ratificante do tratado constitucional da UE é vista com 'preocupação' pela presidência da União e pelos meios próximos do presidente da Comissão. As peças enfatizam abertamente a alegada bondade da ratificação parlamentar, chegando mesmo a dizer que o Tratado foi negociado com a 'preocupação' (sic) de dispensar o recurso a referendos -- compromisso que o primeiro-ministro negou expressamente no Parlamento -- e indo ao ponto de afirmar que existe um 'consenso' entre Presidente da República, PS e PSD para evitar o referendo. Não se dão quaisquer fundamentos factuais nem se citam fontes para o 'noticiado'. Tudo é adiantado como se fosse óbvio e indiscutivel. É assim porque sim. Não é aduzido ou recordado um único argumento favorável ao referendo, uma só personalidade que defenda o referendo. Pelo contrário, ao referirem-se razões objectivamente favoráveis ao referendo (admitindo desgarradamente que muita gente o reclama, sem explicar que gente é essa e qual o seu pensamento), desvaloriza-se de imediato esse posicionamento, tido como pretendendo desviar provavelmente as atenções de 'temas mais incómodos'.

Em suma, as duas notícias defendem de forma grosseiramente parcial a solução da ratificação parlamentar em detrimento do referendo. Sabe-se que esta é a posição do director do PÚBLICO. Se restassem dúvidas, bastaria ler o editorial de José Manuel Fernandes do mesmo dia 8. Vendo bem, tem esse direito, um editorial é a expressão de uma opinião livre e assinada. Mas, quando se faz uma notícia presumivelmente estribada em factos, há que respeitar valores de objectividade, equilíbrio e contraditório, que manifestamente estas peças não seguiram. Elas corporizam propaganda política clara sob a capa da notícia. São pois gato por lebre e podem, independentemente das intenções individuais dos protagonistas, mistificar os leitores e a opinião pública.

É pois sobre esta situação, tanto mais grave quanto o PÚBLICO é considerado um jornal de referência com influência não negligenciável nos próprios agentes políticos, que eu gostaria de ver a análise do provedor dos leitores.

Sebastião Lima Rego

Queixa do leitor João Ferreira:

Gostaria que comentasse o caso Armando Vara (AV). Num dia [4 Jan.] o jornal refere que AV tinha, como administrador da CGD, o pelouro do crédito para no outro dia, por intermédio de uma carta de dois administradores da CGD, a negar por completo essa informação, o jornal acaba por desmentir aquele facto.

É óbvio que o desmentido não teve a repercussão da notícia do dia anterior. Para um jornal que se quer de referência (...), não se pode publicar uma notícia com uma tão grande falha. A linha editorial do jornal é claramente de oposição ao actual governo. Mas não é isso que está em causa (se bem que possa ser um tema a analisar mais aprofundadamente no futuro). O que me chocou foi o facto de não se ter feito, a meu ver, o básico para um jornalista: falar com o visado para lhe dar oportunidade de se defender, tarefa que é prévia à publicação. Isso já não é um cuidado a ter antes de se publicar uma notícia? Além disso, parece-me que era extremamente fácil averiguar sobre o facto inverídico que publicaram (num banco público a informação é pública; facilmente se contactaria alguém do sector que informasse de tal situação). A notícia publicada (empréstimos da CGD a accionistas do BCP para reforçarem as suas posições) tinha interesse. Foi um bom furo. Todavia, fica sempre a pergunta: porquê a referência, tal como foi feita, a AV? Para quem lê com atenção o jornal, a resposta é simples, e já a revelei. No entanto, o que critico é a forma tosca, sem escrúpulos e ao arrepio da deontologia básica do jornalismo que a notícia demonstra. Se nem o PÚBLICO cumpre o mais básico que é de exigir ao jornalismo, quem o fará?

João Ferreira

Questão do provedor a Paulo Ferreira, subdirector do PÚBLICO:

Recebi de um leitor a participação anexa. Como apareces como um dos autores da notícia, gostaria de te solicitar os seguintes esclarecimentos:

a) Razão para não ter sido contactado Armando Vara no sentido de se confirmar se de facto ele detinha o pelouro do crédito bancário.

b) Razão para não se ter citado qualquer fonte (mesmo não identificada) como origem da informação publicada.

Joaquim Vieira

Resposta de Paulo Ferreira:

a) O PÚBLICO fez, neste caso, aquilo que é a prática corrente em relação a empresas ou instituições que têm canais formais e permanentes de contacto com a comunicação social: contactou os responsáveis pela comunicação externa e assessoria de imprensa para obter a posição da Caixa Geral de Depósitos sobre todos os aspectos da notícia, nomeadamente sobre a intervenção do administrador Armando Vara na decisão sobre as operações de crédito referidas.

Este é o procedimento utilizado diariamente em relação a centenas de instituições, públicas ou privadas, seja para obter ou confirmar informações como para permitir o exercício do contraditório, um dever básico dos jornalistas. O PÚBLICO cumpriu esse dever deontológico. A Caixa optou por não comentar, como é seu direito e foi referido a fechar a notícia.

A informação obtida pelo PÚBLICO indicava que Armando Vara tinha participado na decisão sobre aqueles créditos por ter esse pelouro na administração. Esta informação, que não era central na notícia, estava incorrecta, como o PÚBLICO indicou na edição seguinte. A participação de Armando Vara no processo ocorreu através do Conselho Alargado de Crédito, que integrava.

b) As várias fontes contactadas pelo PÚBLICO no âmbito da recolha e cruzamento de informação para a elaboração da notícia em causa pediram, todas elas, o anonimato. Esta é, infelizmente, uma tendência crescente no exercício do jornalismo e na relação dos jornalistas com as fontes de informação, trazendo consigo riscos acrescidos de manipulação do jornalista e do meio. A tentativa de evitar a multiplicação das fontes anónimas gera, por vezes, uma “negociação” dura e prolongada do jornalista com as suas fontes sobre a forma como a informação pode ser atribuída. Muitos informadores colocam mesmo como condição prévia que o jornalista não recorra sequer a fórmulas do tipo “fonte da instituição” ou “fonte próxima de”, por receio de poderem ser, de alguma forma, identificadas no círculo restrito que tem acesso aos dados em causa.

Perante estas condições, o jornalista tem que avaliar, em relação a cada caso concreto, se o interesse público da informação é suficiente para que se justifique a sua publicação, depois de devidamente cruzada e confirmada, sem fonte identificada. Foi o que aconteceu neste caso. O PÚBLICO considerou a notícia importante no contexto da escolha da nova administração do BCP para, depois de cruzar informação junto de várias fontes não relacionadas entre si, decidir publicá-la, assumindo-a.
Não podendo identificar a origem da informação, também não se optou pela proliferação de fórmulas genéricas.

Seguiram-se as regras do Livro de Estilo que estabelecem que, com informações obtidas neste contexto, “o jornalista deve ponderar se está em condições de assumi-las e publicá-las, sem recurso a fórmulas vagas, do género ‘fonte próxima de’”.

Paulo Ferreira

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Incitação à violência?

Na edição online de hoje [22/01], no artigo com o título "Eventual corte de juros atenua quebras nas bolsas", foi publicado, com data de 22.01.08, 10h10, um comentário de ZP, Lisboa, no qual o leitor muito justamente se indigna com determinadas práticas bancárias. Porém, acrescenta: "O pessoal está a ficar farto disto e devia começar a pôr bombas nos balcões para ver se esta gente ordinària tem juízo e ganha alguma dignidade". Este era o único comentário publicado na altura em que o li. Escrevi logo um outro, dirigido aos moderadores do PÚBLICO, chamando a atenção para o facto de o referido comentário não corresponder às exigências dos Critérios de Publicação, por conter uma incitação à violência, pelo que deveria ser retirado, não devendo mesmo ter sido publicado. Surgiu entretanto outro, das 10.36, de Carlos, Porto, escrevendo: "Subscrevo ZP, poucas palavras pra dizer tudo". Ou seja, já há quem vá atrás da ideia de pôr bombas nos balcões dos bancos, e o PÚBLICO continua a publicar. Incitação à violência é crime público que nada tem a ver com liberdade de expressão, pelo que espero que o PÚBLICO retire os referidos comentários e haja de futuro mais cuidado com o que se publica ou deixa publicar.

M. Silva

NOTA DO PROVEDOR. Foi solicitado esclarecimento a António Granado, editor do PÚBLICO.PT, que começa por considerar o seguinte: "O comentário em causa apenas suscitou uma reacção negativa dos leitores, precisamente a que o provedor recebeu. Não me parece, sinceramente, que ZP tivesse como intenção desatar a pôr bombas em balcões de bancos, tratando-se apenas de uma expressão de forte indignação. O próprio leitor M. Silva o diz no seu comentário das 10h48: “Na verdade, eu concordo totalmente com o espírito do comentário de ZP, e acredito que tenha sido a sua justa indignação que o tenha levado a, espero que inadvertidamente, ter escrito 'da boca para fora' a sugestão de pôr bombas nos balcões dos bancos [...].”" Admitamos de facto que se trata de uma (forte) figura de retórica. Só que, apesar disso, António Granado cita a seguir as objecções colocadas por este mesmo leitor para concluir: "Estamos de acordo, até porque o comentário viola os nossos próprios Critérios de Publicação. De futuro, evitaremos a publicação de comentários deste tipo, e agradecemos ao leitor a chamada de atenção que nos fez. Apenas como informação, refiro que o número de comentários no PÚBLICO online tem vindo a aumentar exponencialmente nos últimos meses, o que tem tornado mais difícil a sua filtragem. Em Outubro, recebemos 6.717 comentários; em Novembro, 8.381; em Dezembro, 12.021; e em Janeiro já vamos nos 15.335." O provedor nada mais tem a acrescentar.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Artista ignorado

Em Agosto, escrevi ao anterior provedor sobre o PÚBLICO nunca me ter dado resposta quanto à divulgação que ia pedindo das exposições de pintura. Resposta: “Já comuniquei à secção responsável, blá, blá”. Nesta conformidade, que poderei fazer para poder ser notado, poder ser visto e mais conhecido, neste mundo das artes? Foi na galeria Capitel que dei o salto para o mundo das artes, foi com o incentivo e persistência que aprendi a ser alguém, e, passados 14 anos, vivo exclusivamente da pintura. O que eu quero é ter tratamento igual para trabalho igual, sou um pintor sem escola, sou um autodidacta, é verdade, mas corre-me nas veias e hoje tenho obra pelo mundo inteiro…

Artur Franco (pintor)

NOTA DO PROVEDOR: A liberdade de selecção é uma prerrogativa dos críticos de um jornal independente como o PÚBLICO, assim como de quem elabora a sua agenda de eventos culturais recomendados ou simplesmente publicitados.

Corrigindo o corrector

Chamo a atenção para o facto de aparecer escrito "corrector" e não "corretor" em várias notícias sobre as bolsas mundiais, por exemplo na legenda da fotografia do dia de hoje [23/01] na página web.

Francisco Jorge Pinto

domingo, 20 de janeiro de 2008

Caça-gralhas

É uma vergonha existirem erros destes no site do PÚBLICO online.
A frase:
"Eu recomendaria ao senhor ministro da Saúde que olhasse para as populações, que olhasse para as pessoas e que percebece que em Portugal existe consagrado constitucionalmente um direito que é o direito a um Serviço Nacional de Saúde, geral e tendencialmente gratutito." (Pedro Nunes, bastonário da Ordem dos Médicos, Correio da Manhã, 20 de Janeiro de 2008).
E não digo mais nada.

António Maia

A cor do dinheiro

A ideia foi consagrada na fórmula de Henry Luce, lendário fundador da revista Time: para garantir a independência de uma publicação jornalística, a separação entre os seus departamentos editorial e comercial deve equivaler à “separação entre a igreja e o Estado”. Muito haveria a comentar sobre tal conceito e a sua evolução nas últimas décadas, mas para o que aqui importa o princípio reflecte-se na clara distinção que o leitor deve percepcionar entre matéria jornalística e matéria publicitária. O Livro de Estilo do PÚBLICO acompanha esta filosofia ao estabelecer que “a publicidade é uma área autónoma e perfeitamente demarcada nas páginas” do jornal e que “todo o material publicitário vem sempre graficamente assinalado de forma clara e explícita que evite confusões ou associações ambíguas à mancha informativa.”

Como muita gente nem olha para os anúncios num jornal, a tendência dos publicitários é para, dando largas à imaginação, penetrarem cada vez mais na mancha informativa, na certeza de que aumentará assim a eficácia da sua mensagem. E é claro que as empresas jornalísticas não fecham os olhos a tais tentações: contratos para a inserção deste tipo de anúncios são mais valiosos, e não se pode ignorar que a publicidade é o principal meio de viabilização económica de um órgão de informação. A grande questão é saber onde se situa a tal fronteira de separação entre igreja e Estado.

Alguns leitores, muito sensíveis ao problema, susceptibilizam-se logo que sentem a publicidade “invadir” o campo noticioso. Ainda há dois dias, o leitor José Batista queixava-se ao provedor de, na pág. 15 da edição do PÚBLICO dessa sexta-feira, “um anúncio publicitário cortar a meio uma notícia”, perguntando: “O jornal que se quer de referência da imprensa portuguesa deve vender-se desta maneira?” Convém esclarecer que o anúncio em causa era, correctamente, encimado pela palavra “PUBLICIDADE”, conforme determina o Livro de Estilo do PÚBLICO para prevenir situações dúbias em que se possa confundir reclame com notícia.

Mas é curioso que o mesmo anúncio, com a mesma disposição gráfica e interrompendo também a leitura de um texto, surgia na pág. 13 da edição de dois dias antes (16 de Janeiro) sem qualquer referência a publicidade, o que denota pelo menos alguma aleatoriedade na aplicação dos princípios definidos pelo Livro de Estilo quanto a esta matéria.

Essa aleatoriedade tornou-se manifesta, aos olhos do provedor, com as recentes edições do PÚBLICO de 31 de Dezembro e de 9 de Janeiro, que apareceram envoltas numa “sobrecapa” em papel couché constituindo em cada caso, dos dois lados da folha, num anúncio a uma marca. Na parte da frente, dentro do próprio anúncio, estavam inseridos o logotipo e os dizeres que caracterizam a primeira página do PÚBLICO, os quais eram repetidos na “verdadeira” primeira página, que só se descobria depois de se virar a “capa”. Na segunda vez, o anunciante havia feito o pleno da imprensa nessa manhã, já que o mesmo anúncio, pelo mesmo método, aparecia também nos outros diários. Só que, ao contrário do PÚBLICO, alguns desses diários haviam colocado a menção a publicidade sobre o anúncio, e um deles prevenira mesmo de véspera os leitores que a edição seguinte iria “chegar às bancas com uma falsa primeira página” devido a “um importante compromisso publicitário”.

Perante a forma, na aparência mais “descuidada”, com que o PÚBLICO tratou o assunto, o provedor inquiriu o seu director sobre se não haveria nos dois casos desrespeito pelas regras do Livro de Estilo. “Só existe obrigação formal de incluir a palavra ‘PUBLICIDADE’, por extenso, quando estamos perante um anúncio sob a forma de texto escrito”, começa José Manuel Fernandes por esclarecer. “Não era o caso.” Adianta ainda: “Mesmo não se tratando de um texto escrito, onde a inclusão dessa palavra se justifica para impedir que a sua mancha gráfica se confunda com a mancha gráfica das notícias e outras matérias informativas, cabe saber se existiam ou não ‘confusões ou associações ambíguas à mancha informativa’. Do meu ponto de vista, não. Por três ordens de razões: i) a publicidade estava impressa num papel de textura diferente, inconfundível com papel de jornal; ii) não existia qualquer matéria informativa nas capas publicitárias; iii) a inclusão do logotipo, da data, do número da edição, do preço e do nome dos directores não me parece constituir matéria informativa, mesmo fazendo parte da identidade editorial do jornal; em contrapartida a sua inclusão justificava-se pois era necessário que, nesses dias, os leitores, perante jornais que estariam todos envolvidos pela mesma sobrecapa, soubessem que jornais eram, pelo que todos os periódicos que aceitaram essa publicidade também imprimiram o logotipo na sobrecapa, repetindo-o na primeira página verdadeira”.

Referindo no entanto a prática da concorrência nesta situação, J.M.F. acaba por concluir: “Apesar de considerarmos que o leitor não era levado a confundir espaço editorial com espaço publicitário, a impressão dessa palavra [‘PUBLICIDADE’] será considerada da próxima vez que for feita ao PÚBLICO uma proposta comercial idêntica.”

Não terminam aqui, no entanto, as explicações do director: “Seria ainda possível questionar a opção de aceitar aquele tipo de publicidade à luz do artigo 112 do Livro de Estilo (‘O PÚBLICO [...] não subordina o interesse jornalístico ao interesse publicitário de anunciantes ou afins’). Este problema colocar-se-ia por a sobrecapa tapar a capa do jornal, impedindo os leitores de lerem as notícias sem terem de a levantar. Apesar de sabermos que essa prática é frequente em muitas publicações (desde as que são vendidas dentro de sacos de plástico opacos até a primeiras páginas totalmente ‘entregues’ à publicidade, muito vulgares nos jornais dos países nórdicos, que são também aqueles onde os índices de leitura são mais elevados), a existência do artigo 112 levou a direcção editorial [DE] a discutir com a direcção comercial os dias em que consideraria aceitável a sobrecapa. Fizemo-lo em função da agenda previsível e do dia da semana, mas assegurando que, caso ocorresse um evento imprevisto de extraordinária importância (um 11 de Setembro, por exemplo), teríamos o direito de reabrir a discussão e, eventualmente, adiar ou mesmo recusar a distribuição do jornal com as referidas sobrecapas (prerrogativa da DE prevista no ponto 122 do Livro de Estilo)”.

Nada há de errado na estimulante criatividade dos publicitários nem na angariação do máximo de anúncios por um órgão de informação, sinal da sua vitalidade económica e do seu bom posicionamento no mercado. O grande problema consiste na tal distinção de fronteiras, que, ao olhar para as edições do PÚBLICO, o leitor pode não compreender com clareza. Apesar do princípio formal enunciado por J.M.F. no início da sua resposta, o provedor, numa análise meramente ocasional e não sistemática, detectou nas págs. 13, 17, 21 e 39 da edição de 10 de Janeiro anúncios que, apesar de não se poderem, de forma alguma, confundir com a mancha gráfica da matéria noticiosa, estavam encimados com a menção ‘PUBLICIDADE’ (incluindo aos cadernos “ípsilon” e “Economia” do próprio PÚBLICO), enquanto um comunicado de uma junta de freguesia, em forma de publicidade redigida, aparecia na pág. 23 da edição de três dias depois (13 de Janeiro) sem qualquer aviso de matéria publicitária.

Pela sua anterior experiência profissional, o provedor pode garantir que os anunciantes necessitam tanto dos media como os media necessitam dos anunciantes. Não há pois que ter receio de definir regras claras a respeito da inserção de publicidade e de impor a sua aplicação com rigor, sem exclusão da abertura a propostas mais heterodoxas, eventualmente aceites após negociação. Ambas as partes ficarão a ganhar.

Recomendação do provedor. Além de transparentes e inequívocas, as normas quanto à inserção de publicidade devem ser entendíveis pelo leitor e aplicadas com rigor e método, salvaguardando, sem ambiguidades e sempre que necessário, a distinção entre espaço comercial e espaço editorial.

NOTA: Já se encontra activo o novo blogue do provedor, aberto à participação de todos os leitores.

Publicada em 20 de Janeiro de 2008

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR

Questão do provedor enviada ao director:

As edições de 31 de Dezembro e de 9 de Janeiro p.p. do «Público» apareceram envoltas por capas constituídas por publicidade. Não existindo, em ambos os casos, qualquer indicação de que se tratasse de publicidade, apesar de ter sido colocado no meio dos anúncios o logotipo da primeira página do jornal com a respectiva ficha que lhe surge associada, poder-se-á considerar estar-se perante uma violação do ponto 111 dos «Princípios e normas de conduta profissional» do «Livro de Estilo», pelo que solicito uma explicação para o sucedido.

Resposta de José Manuel Fernandes:

O ponto 111 do Livro de Estilo diz o seguinte:
"Todo o material publicitário vem sempre graficamente assinalado de forma clara e explícita que evite confusões ou associações ambíguas à mancha informativa. Publicidade sob a forma de texto escrito é encimada pela palavra 'PUBLICIDADE', por extenso."

Do que decorre:
a) Só existe obrigação formal de incluir a palavra “PUBLICIDADE”, por extenso, quando estamos perante um anúncio sob a forma de texto escrito. Não era o caso.
b) Mesmo não se tratando de um texto escrito, onde a inclusão dessa palavra se justifica para impedir que a sua mancha gráfica se confunda com a mancha gráfica das notícias e outras matérias informativas, cabe saber se existiam ou não “confusões ou associações ambíguas à mancha informativa”. Do meu ponto de vista, não. Por três ordens de razões: i) a publicidade estava impressa num papel de textura diferente, inconfundível com papel de jornal; ii) não existia qualquer matéria informativa nas capas publicitárias; iii) a inclusão do logotipo, da data, do número da edição, do preço e do nome dos directores não me parece constituir matéria informativa, mesmo fazendo parte da identidade editorial do jornal; em contrapartida a sua inclusão justificava-se pois era necessário que, nesses dias, os leitores, perante jornais que estariam todos envolvidos pela mesma sobrecapa, soubessem que jornais eram, pelo que todos os periódicos que aceitaram essa publicidade também imprimiram o logotipo na sobrecapa, repetindo-o na primeira página verdadeira.
c) Considerando que as obrigações formais do Livro de Estilo no ponto 111 foram cumpridas, a comparação com os outros jornais saídos nesse dia permitiu verificar que uns fizeram imprimir na sobrecapa a palavra “PUBLICIDADE” ou a sigla “PUB” (casos do DN e JN). Apesar de considerarmos que o leitor não era levado a confundir espaço editorial com espaço publicitário, e impressão dessa palavra será considerada da próxima vez que for feita ao PÚBLICO uma proposta comercial idêntica.

Julgo ainda que seria possível questionar a opção de aceitar aquele tipo de publicidade à luz do artigo 112 do Livro de Estilo, que reza assim:
“O PÚBLICO considera os seus anúncios como parte do conjunto de informações que os leitores procuram todos os dias nas suas páginas, mas não subordina o interesse jornalístico ao interesse publicitário de anunciantes ou afins.”

Este problema colocar-se-ia por a sobrecapa tapar a capa do jornal, impedindo os leitores de lerem as notícias sem terem de a levantar. Apesar de sabermos que essa prática é frequente em muitas publicações (desde as que são vendidas dentro de sacos de plástico opacos até a primeiras páginas totalmente “entregues” à publicidade, muito vulgares nos jornais dos países nórdicos, que são também aqueles onde os índices de leitura são mais elevados), a existência do artigo 112 levou a direcção editorial a discutir com a direcção comercial os dias em que consideraria aceitável a sobrecapa. Fizemo-lo em função da agenda previsível e do dia da semana, mas assegurando que, caso ocorresse um evento imprevisto de extraordinária importância (um 11 de Setembro, por exemplo), teríamos o direito de reabrir a discussão e, eventualmente, adiar ou mesmo recusar a distribuição do jornal com as referidas sobrecapas (prerrogativa da direcção editorial prevista no ponto 122 do Livro de Estilo).

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Penn por Eastwood

Uma vez mais detecto uma informação errada no PÚBLICO. Desta feita, alguém que se assina como "Autor do texto", na pg. 23 da edição de 04/01/08, identifica Sean Penn como realizador de Mystic River. Erro crasso, grosseiro e inadmíssivel por parte de quem escreve sobre cinema, num jornal como este. Se tivesse escrito Clint Eastwood teria acertado. Recomendo atenção e leitura, pois esquece muito a quem não sabe.

José Manuel Faustino

NOTA DO PROVEDOR: "Autor do texto" em vez do nome do autor do texto é uma falha de edição que não deveria ter existido. O Provedor comunicou à redacção a correcção do nome do realizador (erro verificado não no texto da notícia mas sim na legenda da foto - outra falha de edição), para eventual publicação na respectiva secção, o que porém não foi feito.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Edição escatológica

Permita-me que lhe dê os parabéns pela sua nova função, de cujo desempenho o "melhor jornal da paróquia" - como com humor lhe chamou, há tempos, um leitor - irá tirar profícuos resultados. E de que bem carecido anda. Como a edição de 13/01/08, a mais escatológica de que me recordo, demonstra logo na manchete ["Portugal ainda tem 656 celas onde reclusos fazem dejectos num balde"]. Razão por que vou sobre ela (manchete) tecer alguns comentários, espero que menos mal cheirosos do que o tema para que remete. De facto, para além do insólito deste (e não está em causa a pertinência da matéria que versa), há algo na expressão "fazer dejectos" que desaconselharia, de imediato, a sua utilização, até porque com vantagem substituída por "dejectam" ou "defecam" (ou, não obstante desaconselhado nos títulos, mas que aqui seria o menor dos males, o uso do artigo: "fazem os dejectos"). Hesitação que o próprio jornalista parece ter tido (ou não?), pois na pg. 6, no primeiro parágrafo, grafa: "têm de depositar os seus dejectos em baldes". Escatológica ainda por, mal refeitos da surpresa, depararmos de novo, ao cimo da pg. 15, com a mesma matéria (salvo seja!) e uma afirmação não menos inusitada: "Se calhar as pessoas não gostam do cocó porque ele não é às cores", a remeter para a pg. 46, onde a crónica de Paulo Moura (por sinal nada mal cheirosa, mas antes bem conseguida) aproveita para título a última descoberta científica à dimensão paroquial: "Cocó às cores"! Terá esta súbita propensão do PÚBLICO para a coprologia (ele que por norma é pouco proclive a estes devaneios) sido inspirada ou, no mínimo, algo que ver com os acontecimentos políticos relevantes da semana ora finda? Se subliminarmente quis prestar homenagem a tão brilhantes ideias/decisões (mormente a justificação de um secretário de Estado para o pagamento em 14 prestações suaves das pensões dos abastados reformados), então dou-lhe os parabéns, porque foi na mouche.
Mas, escatologia à parte, e sem entrar em minudências - não vá alguém apodá-lo também de "provedor dos pormenores", um aspecto sobre o qual penso dever recomendar mais atenção é o que respeita à recorrência de repetições, passe a redundância, aspecto um tanto descurado, e disso são apodixe as pgs. 14 (cinco títulos, três dos quais com o verbo querer (Menezes quer esclarecimentos / PS não quer Narciso / PS quer emissões) mais um na pg. 15 (Ministério da Cultura quer rever) e a pg. 26, em que os dois títulos maiores usam também o mesmo verbo (Região do Alto Minho aposta / Empresa de Viana do Castelo aposta).

Mário Pinto

Pontos nos is

Trago um caso do dia, tão dramático como as trocas de bebés nas maternidades: um "e" e um "i" foram trocados de lugar (e de página) na edição do PÚBLICO de 13/01/08! Onde se lê "razões iminentemente portuguesas" para Medeiros Ferreira defender o referendo ao Tratado de Lisboa (pg. 10) e que "a vitória (de Radjabov sobre Annand, em xadrez) estava eminente" (pg. 40), devia ler-se "razões eminentemente portuguesas" e "vitória iminente". São dois erros frequentes, mas nunca eu dera pelos dois em simultâneo; a escrita correcta consegue-se com uma simples troca, sem despesa acrescida para ninguém, engenheiro Belmiro incluído. São erros particularmente irritantes, porque denotam que talvez se esteja a usar as palavras "iminente" e "eminente" sem pensar nos seus significados: "poderosas" ou, neste caso, "sobretudo", para "eminente"; "quase a acontecer", para "iminente": uma diferençazita...

M.L.

A propósito de sondagens

A propósito das sondagens [crónica do Provedor de 13/01/08], chamo a atenção para um caso actual e português, que bem pode estar na origem de um erro enorme. Para o ilustrar, vou também recordar um exemplo dos EUA. Refiro-me à famosa previsão feita em 1936 pela Literary Digest sobre a eleição presidencial norte-americana, exemplo de um erro enorme devido à formação deficiente da amostra. Apesar da grandeza desta, nada menos que 10 milhões de inquiridos, a previsão revelou-se totalmente falsa, por um lado, pelo facto de a amostra ter sido constituída a partir das listas telefónicas (o que estava longe de cobrir todas as camadas da população), por outro lado, pelo facto de terem sido subestimados todos os que se tinham recusado a responder (e que foram bastantes). Tenho chamado insistentemente a atenção para o facto de, entre nós, se repetirem as sondagens em que a amostra se forma a partir dos lares possuidores de telefone fixo. Ora o exame das listas telefónicas mostra com clareza que estas se têm reduzido de ano para ano, baixando nalguns casos para cerca de metade. Os lares possuidores de telefone fixo ou são de pessoas idosas ou, em regra, de camadas sociais com rendimentos mais altos. Pois as camadas mais humildes tendem a optar pelo telemóvel. De modo que as amostras constituídas a partir de lares com telefone fixo estão cada vez mais longe de corresponder ao universo eleitoral. As listas telefónicas podem poupar tempo e o método correspondente ficar mais barato às empresas de sondagens. Mas o erro, como se verá a seu tempo, deve ser enorme. Não me parece, pois, justo pôr em causa as sondagens em geral, quando o que está, de facto, mal pode bem ser a formação da amostra.

Álvaro Mateus

Desculpas

A notícia de hoje [15/01/08] do PÚBLICO [pg. 5] com o título "Feirantes exigem pedido de desculpas à ASAE" enganou-me e bem! Por momentos pensei que os feirantes exigissem que se fizesse um pedido de desculpas à ASAE, mas o corpo da notícia indica claramente, e outra coisa não seria de esperar, que os feirantes exigem sim um pedido de desculpas da ASAE. É um pequeno pormenor, mas quem lê só as gordas pode ser levado em erro.

Pedro

Um PÚBLICO melhor

Muita adequada a última crónica do Provedor [13/01/08], acerca da vitória dada pelo PÚBLICO a Hugo Chávez em função das sondagens e não dos factos! São estes problemas que têm que não poder acontecer num jornal como o PÚBLICO, que, se repetidos, colocam menos bem um jornal que se assume como sendo de referência, logo de qualidade. Vai ter que ser essa a tarefa do Provedor, quer por sua iniciativa, quer com a colaboração dos leitores. Esperemos sempre que consiga atingir semanalmente os seus objectivos, a bem do seu trabalho, do PÚBLICO, de todos que nele trabalham e evidentemente de todos os que o lêem. Se "bem tratado" o PÚBLICO terá sempre o seu espaço, como ainda o melhor jornal diário deste país na actualidade, sendo que tem que ser e estar sempre com "atenção" ao que publica, como publica, e optar só pela qualidade, que aporta por certo quantidade, mas nunca apostar nesta para chegar àquela. Esta última versão do PÚBLICO, a actual, suscitou muitas dúvidas e muitos comentários de muitos de nós, que por certo tiveram o contributo maior ou menor de não disvirtuar o jornal, como parecia estar a acontecer. Evidentemente que se tem que dar o devido mérito a J.M.F. e a toda a sua equipa, bem como aos colunistas e à figura do Provedor, sempre bem quista. Esperemos ter pela frente mais uma fase de bom PÚBLICO, sempre com acertos de percurso quando necessários e sempre com a desejada colaboração de "todos", o que vai desde a administração e direcção aos colaboradores, colunistas, Provedor e "até" leitores.

Augusto Küttner de Magalhães

De que ri este homem?



Em 3 de Dezembro último, o PÚBLICO foi o jogador que chega ao casino para apostar toda a sua fortuna no vermelho e sai o preto. A sua manchete desse dia, sobre o referendo constitucional venezuelano, proclamava a quatro quintos da largura da página: «Venezuela diz ‘sim’ à proposta de Chávez, oposição apela à vigilância». Mas os eleitores haviam na véspera chumbado a iniciativa do presidente daquele país para reforçar os seus poderes e eternizar-se no lugar. A notícia baseava-se em sondagens à boca das urnas, dado que à hora do fecho da edição ainda não era conhecido o resultado do escrutínio. O texto relatava que, segundo essas sondagens, o «não» teria recolhido apenas 46 a 47 por cento dos votos, quando de facto atingira 50,7 por cento.

Um falhanço tão clamoroso como este (que – temos de admiti-lo – fere com gravidade o prestígio do jornal) traz inevitavelmente à memória um episódio relacionado com as eleições presidenciais norte-americanas de 1948, disputadas entre o presidente em exercício, o democrata Harry Truman (na foto), e o aspirante republicano ao cargo, Thomas Dewey. Durante a campanha eleitoral Dewey liderou sempre as sondagens, e a imprensa foi unânime em dá-lo antecipadamente como vencedor. No dia da votação, as primeiras projecções continuavam a dar-lhe a vitória e os resultados dos estados da costa leste (onde as urnas fecham mais cedo devido à diferença horária) pareciam confirmar a evidência. A tal ponto que o Chicago Daily Tribune (não uma folha de couve mas, então como hoje, um dos mais importantes diários de referência na América) se atreveu com a manchete «Dewey derrota Truman». Acabou por ser o contrário: na imagem, é esse título que no dia seguinte, já com os votos contados, um triunfante Truman mostra aos seus apoiantes. O presidente norte-americano ri dos jornalistas, analistas e comentadores que acreditam em sondagens como nas tábuas da lei. Truman ri também do PÚBLICO de 3 de Dezembro.

O título «Dewey defeats Truman» transformou-se num marco clássico da história dos media, referido em todas as escolas de jornalismo, e supunha-se que mais nenhum periódico se deixaria cair em tamanha armadilha. Mas, parafraseando um spot televisivo, uma das primeiras ilusões do mundo moderno é julgar que os erros do passado não voltam a repetir-se. O jornalismo português tem sido afectado por algumas ocorrências do género, desde projecções eleitorais à boca das urnas que não se confirmarão ao longo da noite televisiva até uma célebre consulta aos delegados de um congresso partidário dando manchete a anunciar como líder aquele que viria a ser derrotado. De volta aos EUA, ainda há escassos dias, com base nas sondagens, os media transmitiam a sua plena convicção na vitória de Barack Obama nas primárias democratas no New Hampshire, quando o sucesso coube a Hillary Clinton. E foram os americanos quem inventou as sondagens...

Os que assim procedem ignoram o princípio basilar da democracia: deixar o povo expressar-se. Sem pôr em causa a ciência estatística ou a isenção dos inquiridores, é forçoso reconhecer que as sondagens, com todas as indicações úteis que possam fornecer quanto às tendências e movimentos de opinião nos universos estudados, nos traçam um retrato virtual da sociedade, uma second life que nem sempre tem correspondência com a riqueza e a imprevisibilidade da vida real. Estão detectados, de resto, diversos factores que tornam as sondagens falíveis, como a volubilidade da opinião pública, a ausência de debate ou esclarecimento antes de inquirida a amostra, a simplificação excessiva das formas de pensamento dos cidadãos ou a falta de sinceridade dos próprios entrevistados. A este respeito, aliás, seria natural que na Venezuela, onde as ameaças à liberdade de expressão têm sido permanentes e pistoleiros ao serviço de Chávez disparam sobre manifestantes da oposição, parte dos eleitores recusasse revelar que votara «não».

O PÚBLICO reconheceu o erro na edição seguinte (em nota da Direcção nas páginas interiores) e o seu director retomou o assunto no editorial de 5 de Dezembro. Mas será que o jornal extraíu as ilações devidas, de molde a prevenir situações equivalentes? O provedor ficou céptico quanto a isso ao ler a manchete da edição de 5 de Janeiro último: «Situação financeira das famílias ao nível mais baixo dos últimos 4 anos». Acontece que também esta notícia se baseou numa sondagem: o mais recente inquérito de conjuntura do Instituto Nacional de Estatística (INE), que aliás avalia não a situação financeira dos portugueses mas sim o seu estado de espírito na matéria. Ou seja, mais uma vez se confundiram sondagens com realidade.

Perante as duas ocorrências, o Provedor solicitou a José Manuel Fernandes esclarecimentos sobre «qual é, se é que existe, o critério de valoração e de credibilidade atribuído pela direcção do PÚBLICO às sondagens e quais são as directivas que, em conformidade, são transmitidas com vista ao seu tratamento noticioso.» O director respondeu por partes, estabelecendo diferenças entre ambas as situações.

Para o caso do referendo na Venezuela, J.M.F. sintetiza de forma idêntica ao anterior mea culpa do jornal: foi «uma precipitação, sobretudo do título da primeira página quando comparado com o título e o conteúdo da notícia no interior do jornal» (reconheça-se o rigor do tratamento dado ao assunto nas páginas interiores, em contraste com a manchete).

Quanto ao inquérito do INE, o director começa por distinguir a natureza da sondagem, muito diferente da outra e supostamente mais credível: trata-se da consulta regular a uma amostra mais ou menos constante, método pelo qual o INE constrói os seus vários indicadores – o mesmo que permite avaliar coisas tão diversas como a evolução das tendências de voto e popularidade dos políticos (o tipo de sondagem preferida dos media) e as audiências televisivas. (Não sendo este o objecto da questão apresentada, o tema não será aqui desenvolvido, mas o leitor poderá ler na íntegra a resposta de J.M.F. no blogue do Provedor, onde virá a ser colocada).

Por último, quanto à manchete correspondente, o director ouviu o jornalista autor da notícia, Sérgio Aníbal, que admitiu: «A questão, neste caso, não é tanto a de ‘confundir sondagens com realidade’, mas sim a da incorrecta simplificação dos títulos, que acabam por não bater certo com o conteúdo do texto». E J.M.F. acrescenta: «Se não podemos estar seguros a 100 por cento de que a ‘situação financeira das famílias [está] ao nível mais baixo dos últimos 4 anos’, sabemos que as famílias sentem, na média da amostra, que a sua situação financeira é a pior dos últimos quatro anos. A pergunta pedia uma auto-avaliação e o INE distribuiu o indicador correspondente. Isso percebia-se no texto, estava simplificado no título.» O director reconhece a dificuldade na obtenção de um título exacto e sintético: «Estive de volta da página ensaiando várias soluções e não consegui um título que reflectisse todas estas nuances, sobretudo a diferença entre ‘situação financeira’ objectiva das famílias e a percepção por estas de qual a sua ‘situação financeira’. Esclareço que a regra actualmente em vigor no jornal não permite aumentar ou diminuir o corpo de letra dos títulos, o que com frequência torna um exercício muito difícil a sua construção.» (O Provedor julga que tudo estaria bem se a expressão «confiança dos consumidores», usada em subtítulo, tivesse sido «puxada» para título).

Pelo estatuto editorial, o PÚBLICO é «orientado por critérios de rigor», que não terão existido nos dois casos. E nenhumas regras gráficas devem ser tão draconianas ao ponto de obrigar um jornal a contrariar o seu estatuto editorial. Fica por esclarecer o entendimento que a redacção faz do valor jornalístico a atribuir às sondagens. Aliás, já feito o pedido de esclarecimento a J.M.F., o PÚBLICO titulava um dia após a votação no New Hampshire (edição de 9 de Janeiro, pág. 20): «Hillary Clinton não desiste, mesmo depois da derrota anunciada para o New Hampshire». Os fusos horários têm as costas largas, mas era bom que os jornalistas estivessem abertos a deixar-se surpreender pela realidade.

Recomendação do provedor. Um jornalismo de rigor não deve confundir sondagens, quaisquer que sejam as suas formas, com factos reais, a não ser os da sua própria existência como sondagens. Deve ser relativizado o valor noticioso das sondagens e dado na mesma proporção destaque às suas conclusões.

Publicada em 13 de Janeiro de 2008

DOCUMENTAÇÃO COMPLEMENTAR

Pedido de esclarecimento do Provedor ao Director do PÚBLICO:

A propósito da manchete de 3 de Dezembro de 2007 sobre o referendo venezuelano, tenciono suscitar na crónica do provedor a questão do tratamento jornalístico dado às sondagens. Apesar de a Direcção já ter fornecido aos leitores explicações no dia a seguir, creio que existem ilações mais alargadas a retirar, não só para a prática jornalística do Público como para os media portugueses em geral. Quer-me parecer, com efeito, que existe uma tendência para confundir sondagens com realidade. O caso de 4 de Dezembro não é único. Um exemplo foi dado de novo na edição do Público do passado sábado, 5 de Janeiro, com a manchete «Situação financeira das famílias ao nível mais baixo dos últimos 4 anos». Com efeito, analisada a notícia, verifica-se que não são adiantados elementos numéricos que sustentem a afirmação, tratando-se antes da menção a uma sondagem, especificamente ao mais recente inquérito de conjuntura do INE. Ora, o facto de os inquiridos revelarem um nível de pessimismo que é o mais elevado desde 2003 não implica necessariamente que a situação das famílias portuguesas esteja ao nível mais negativo no mesmo período. A questão que coloco é pois a seguinte: atendendo aos casos mencionados, qual é, se é que existe, o critério de valoração e de credibilidade atribuído pela direcção do Público às sondagens e quais são as directivas que, em conformidade, são transmitidas com vista ao seu tratamento noticioso.

Joaquim Vieira

Resposta do Director do PÚBLICO:

Vou dividir a resposta em três partes: a) o caso de 4 de Dezembro; b) o conteúdo da notícia de 5 de Janeiro; e, c) o título de 5 de Janeiro.

a) Julgo que está tudo dito no editorial de dia 6 de Dezembro, mais do que nas explicações do dia seguinte. Nesse caso não esteve em causa qualquer “critério de valoração e de credibilidade” das sondagens, antes uma precipitação, sobretudo do título da primeira página quando comparado com o título e o conteúdo da notícia no interior do jornal.

b) A questão de 5 de Janeiro é muito diferente, pois não estamos perante uma vulgar sondagem, como as relativas a intenções de voto, mas perante um indicador de conjuntura a que o INE chega através de um método de amostragem sistemática e com critérios coerentes ao longo dos anos. Contudo, para esclarecer melhor exactamente do que estamos a falar, pedi ao jornalista Sérgio Aníbal, autor da peça, que explicasse melhor os métodos do INE. Passo a transcrever o seu esclarecimento:

"Em relação à questão sondagens/indicadores do INE, o que se pode dizer é que a generalidade dos indicadores do INE, como a taxa de inflação, taxa de desemprego, PIB ou indicadores de confiança são calculados usando métodos de amostragem. Nos indicadores de confiança que são referidos no artigo em causa, a dimensão da amostra é de 2098 pessoas. Nesse aspecto, é tão correcto dizer, por exemplo, que “a taxa de desemprego é de 8,2 por cento”, como dizer que “a confiança dos portugueses caiu para um mínimo”. É verdade que são informações obtidas através de amostragem, mas são as mais completas que existem, são dados oficiais e não existe qualquer possibilidade de verificação com o total da população. Isto torna-as substancialmente diferentes de qualquer sondagem eleitoral."

Ou seja: com excepção do Censo (que se realiza de dez em dez anos, julgo), a maior parte dos indicadores do INE resultam de amostragens que foram sendo cuidadosamente filtradas. Por exemplo: a determinação da taxa de inflação faz-se consultando lojas escolhidas, tidas por representativas, onde mensalmente os técnicos do INE anotam a evolução dos preços de um cabaz de produtos previamente seleccionado. A amostra vai variando lentamente, não há uma amostra diferente todos os meses. Contudo, o número resultante é considerado oficial e certificado pelo Eurostat.

Já a taxa de desemprego ou os indicadores de confiança seguem um método de inquérito de amostragem mais próximo do de algum tipo de sondagens. Utilizam amostras grandes, para diminuir a margem de erro (mas menores, por exemplo, do que as habituais numa ‘sondagem à boca das urnas’). E também são certificados, constituindo-se séries longas.

Todos estes indicadores, obtidos desta forma e requerendo o recurso a inquéritos e a amostras representativas, permitem fazer comparações com o passado (devido à constância do método) e comparações internacionais (seguem, por exemplo, normas do Eurostat).

Portanto, do ponto de vista do rigor, o jornal deve utilizar esses números com o mesmo grau de confiança do INE, podendo contudo questionar os métodos (é muito discutível, por exemplo, o critério seguido para saber se alguém está ou não desempregado) ou mudanças de critérios. De resto, trata-os como números oficiais, não como resultados de sondagens avulsas. (Poderei explicar os critérios para tratamento das sondagens que encomendamos, mas não julgo que venha a propósito). Finalmente, o facto de serem números certificados pelo INE leva-nos a dar-lhes mais crédito do que, por exemplo, aos dados das audiências, que também resultam de amostragens, ou sondagens.

c) Finalmente, a questão do título. O Sérgio Aníbal também se quis pronunciar sobre isso. Volto a citá-lo:

"Agora, quando o provedor diz que “o facto de os inquiridos revelarem um nível de pessimismo que é o mais elevado desde 2003 não implica necessariamente que a situação das famílias portuguesas esteja ao nível mais negativo no mesmo período”, ele realmente tem razão. Nesse aspecto, os títulos da primeira página e do texto simplificaram muito a questão. Acho que a questão, neste caso, não é tanto a de “confundir sondagens com realidade”, mas sim a da incorrecta simplificação dos títulos, que acabam por não bater certo com o conteúdo do texto."

Ele refere-se ao seu próprio texto e ao título que fez, não apenas ao da primeira página. Estive a discutir com ele como se poderia fazer melhor, no limite das palavras (ou letras) que cabiam naquele espaço. Não era muito fácil, pois a informação relativa a 2003 não traduz apenas a confiança no futuro, mas também uma avaliação da situação presente. Objectivamente: se não podemos estar seguros a 100 por cento de que a “situação financeira das famílias [está] ao nível mais baixo dos últimos 4 anos”, sabemos que as famílias sentem, na média da amostra, que a sua situação financeira é a pior dos últimos 4 anos. A pergunta pedia uma auto-avaliação, e o INE distribuiu o indicador correspondente. Isso percebia-se no texto, estava simplificado no título. (Tudo isto, claro, partindo do princípio que estamos a falar de um indicador cujo método de fixação é realizado por amostragem mas que tem tanto valor como o da taxa de desemprego).

Estive de volta da página ensaiando várias soluções e não consegui um título que reflectisse todas estas nuances, sobretudo a diferença entre “situação financeira” objectiva das famílias e a percepção por estas de qual a sua “situação financeira”. Esclareço que a regra actualmente em vigor no jornal não permite aumentar ou diminuir o corpo de letra dos títulos, o que com frequência torna um exercício muito difícil a sua construção.

Em síntese: no caso da Venezuela houve precipitação, no da economia dificuldade de traduzir uma nuance num título. No primeiro caso a precipitação, não resultou da sobrevalorização consciente das sondagens, foi um erro cometido por se ter querido dizer o que os outros não diriam ainda no dia seguinte (o jornal esperou até tarde para tentar ter mais resultados). No segundo caso, o indicador do INE, mesmo sendo obtido por amostragem, foi tratado, e a meu ver bem, como um dado oficial passível de comparações, e não como o dado de uma sondagem eleitoral vulgar, pois não resultou de um trabalho feito com os mesmos critérios desse tipo de sondagens. Nestas, por exemplo, colocamos sempre a ficha técnica e indicamos margens de erro. Nunca fazemos o mesmo com este tipo de indicadores do INE, apesar de formalmente todos eles comportarem alguma margem de erro.

José Manuel Fernandes

Saudação

O provedor dos leitores do PÚBLICO saúda todos os que por esta via pretendam informar-se acerca das suas actividades ou participar no processo de debate sobre as normas editoriais do jornal e a sua prática. A homepage será dedicada sobretudo à participação dos leitores, sob moderação do provedor. As restantes finalidades do blogue estão explanadas na coluna da direita.

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

A regra do jogo

Esta não é ainda a primeira crónica do novo provedor do leitor do PÚBLICO. É um texto de auto-apresentação, e por isso permito-me excepcionalmente usar a primeira pessoa do singular. Dado que o cargo é unipessoal, convirá aos leitores conhecerem minimamente o perfi l de quem agora o assume. Descrevo-o na medida em que nunca antes tinha colaborado para este jornal. Possuo título profi ssional de jornalista há 33 anos, após frequentar um curto curso de formação em Paris. Fiz passagens como repórter pela RTP (incluindo os tempos áureos da Informação 2) e o Expresso (onde trabalhei com dois futuros fundadores e provedores do PÚBLICO, Jorge Wemans e Joaquim Fidalgo), acabando por aí ocupar um cargo directivo. Estive fugazmente na revista Visão, como redactor principal, antes de ser convidado por Joaquim Furtado, então director-coordenador da RTP (e também futuro provedor do PÚBLICO), para assumir a direcção de programação da RTP1 e da RTP2. Ainda voltei ao jornalismo activo como director da revista Grande Reportagem, mas nos últimos anos tenho-me dedicado sobretudo à autoria e direcção de projectos editoriais relacionados com história contemporânea e à produção e realização de documentários.

Fui co-fundador e dirijo desde há 14 anos o Observatório da Imprensa, uma associação privada sem fi ns lucrativos formada por profi ssionais ligados aos media com vista a promover a qualidade no jornalismo. Tal experiência, aliada à de professor convidado num curso universitário de Ciências da Comunicação e de formador na área profi ssionalizante do jornalismo, facilitou-me a aceitação do convite que, há mês e meio, José Manuel Fernandes, em nome da direcção do PÚBLICO, me endereçou para suceder a Rui Araújo como provedor deste periódico.

Os leitores poderão legitimamente desconfi ar da isenção de um jornalista (à semelhança, aliás, dos meus antecessores, todos já aqui citados) na avaliação de queixas contra a actuação de outros jornalistas. Nessa matéria, é inútil dar aqui garantias: o público será no futuro o melhor juiz do meu mandato de provedor. Mas tenho a pretensão de julgar que década e meia de constante crítica dos media, no âmbito já atrás mencionado, me colocam a salvo da suspeita de cumplicidades corporativas.

De qualquer modo, não acredito na existência de uma oposição entre jornalistas e público, muito menos numa luta de classes entre as duas partes. Pelo contrário, creio que ambos convergem num objectivo central – a obtenção de mais informação, o mais completa e credível que for possível. É porém natural que o público queira exprimir insatisfação por um serviço informativo que ache mal prestado (e que haja jornalistas empenhados em o aperfeiçoar). É aí que intervém o provedor.

Do meu entendimento mais específi co quanto ao exercício destas funções se aperceberão os leitores a partir do próximo domingo. Mas impõem-se ainda algumas considerações preliminares acerca do papel de uma provedoria no contexto da actividade dos media. Numa sociedade democrática, o jornalismo decorre do exercício de um direito fundamental: a liberdade de expressão e informação. Este direito é universal e não deve sofrer restrições, a não ser as que protejam outros direitos e liberdades dos cidadãos. A sua formulação ideal é porventura a da Constituição norte-americana, cuja primeira emenda proíbe o poder político de elaborar qualquer lei que impeça ou limite a liberdade de expressão ou de imprensa. No caso português, o Artigo 37º da Constituição estabelece que “todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações”.

Este princípio, uma conquista das sociedades contemporâneas ocidentais, garante naturalmente uma ampla margem de liberdade ao jornalismo (até a asneira é livre, assim como o “jornalismo de sarjeta” que tanto preocupa o actual ministro dos Assuntos Parlamentares), o que leva alguns a lançarem alarmes quanto aos “excessos” dos media , por vezes até em tom apocalíptico, como se os órgãos de informação estivessem a destruir o próprio tecido social.

Publicada em 6 de Janeiro de 2008